A
felicidade é o Bem por excelência e constitui
um fim em ato.1
Só
vive, em realidade, aquele que vive em ato.
A felicidade constitui o ato da
virtude completa.
A
alma se divide em duas partes: uma racional e outra irracional. Na parte
que está dotada de razão, se distinguem a prudência,
a sagacidade, a sabedoria, a instrução, a memória
e outras faculdades deste gênero. Na parte irracional, se encontra
o que chamamos virtudes: a temperança, a justiça, o valor
e todas as demais virtudes morais que são dignas de estima e de
louvor.
Fingir
ter mais do que se tem é próprio do fanfarrão2;
fingir ter menos é próprio do homem dissimulado. Entre estes
extremos, estão a franqueza e a verdade, que ocupam o termo médio.
Estar bem disposto significa não
incorrer em excessos nem em deficiências.
Posto que a virtude ocupa o meio-termo
entre as diversas paixões da alma – aflições
ou prazeres – não há virtude sem tribulação
ou júbilo. Seja como for, as coisas mais distantes do meio-termo
parecem ser igualmente as mais contrárias. Agora, é necessário
estabelecer simétrica e concertadamente o que é meio-termo!
É por isto, por exemplo, que os audaciosos e os imprudentes consideram
os valentes como covardes, e os tímidos e bem-avisados chamam os
valentes de temerários e loucos. Conclusão: o ser-no-mundo
que quiser adquirir, mediante sua moralidade, um verdadeiro equilíbrio,
deverá, com empenho e cuidado, buscar o meio em cada uma das paixões.
Lembre-se: se, de certo modo, é fácil a qualquer um traçar
um círculo, é muito difícil encontrar o verdadeiro
centro deste círculo, uma vez traçado. Enfim, aqui cabe
o ditado: tudo o que é demais é moléstia. Por tudo
isto, pode-se dizer que é tão rara a virtude. Seja do jeito
que for, de nós, exclusivamente de nós, depende fazer o
bem ou fazer o mal. De nós, exclusivamente de nós, depende
a escolha da Senda Direita ou da Senda Esquerda. De nós, exclusivamente
de nós, depende nossa evolução (reintegração)
ou entropização. A vontade e o livre-alvedrio se aplicam
igualmente ao vício e à virtude.
As
Leis que regulam o funcionamento da Natureza são, em princípio,
imutáveis. Pelo menos, neste Plano. Por exemplo: os três
ângulos internos de um triângulo (trilátero) são
iguais a dois retos (180º), e os ângulos de um quadrado (quadrilátero)
são iguais a quatro retos (360º).
O ato que provoca o desejo não
é um ato necessário porque o prazer é o resultado
do desejo, e o que se faz por prazer jamais nasce de uma necessidade inevitável.
Ou seja: se quisermos fazer, faremos; se não quisermos fazer, não
faremos. O homem costuma exercer uma ação com plena vontade,
e não se pode negar que os homens injustos são injustos
voluntariamente. Assim é que o homem corrompido é injusto
e comete uma injustiça. Logo, o homem corrompido, que não
é senhor de si mesmo, comete voluntariamente os atos de intemperança
que executa.
Todo
ato que se faz por preferência sempre é acompanhado de um
pensamento. Considerando este conceito, o ato voluntário não
é um ato de preferência, porém, o ato de preferência
sempre é um ato voluntário. E se, depois de uma madura deliberação,
preferimos fazer tal ou qual coisa, a fazemos com plena e inteira vontade.3
Temos
de estar sempre atentos, pois, geralmente, os prazeres e os desejos nos
arrastam a obrar mal, e as dores e as incertezas a fugir do dever de praticar
o bem.
Haverá
sempre um grau de indeterminação nas coisas feitas pelo
homem. Nada é ou poderá ser absoluto; tudo é relativo.
Tudo
é relativo!
A
virtude contém o princípio de tudo. O verdadeiro fim da
virtude é o Bem.
A
temperança ocupa o meio-termo entre o desregramento e a insensibilidade
em relação aos prazeres. A temperança, como em geral
todas as virtudes, é uma excelente disposição moral,
e uma excelente disposição só pode aspirar ao excelente.
A
grandeza de alma é uma espécie de meio-termo entre a insolência
e a baixeza.
A
magnificência é o meio-termo entre a ostentação
e a mesquinhez.
A
justa indignação (em grego 'némesis') é o
meio-termo entre a inveja, que se desconsola ao ver a felicidade alheia,
e a alegria malévola, que se regozija com os males do outro. Ambos
são sentimentos repreensíveis, e apenas o homem que se indigna
com justa razão deve merecer elogio. A justa indignação
é a dor que se experimenta ao ver a sorte de alguém que
não a merece;4
e o coração que se indigna justamente é o que sente
as dores deste gênero. Reciprocamente, se indigna também
ao ver sofrer alguém por uma desgraça não merecida.
É isto a justa indignação e a situação
daquele que se indigna justamente. O invejoso é o oposto, porquanto
está sempre pesaroso de ver a prosperidade de outro, quer a mereça
ou não. Como o invejoso, o malévolo, que se regozija com
o mal, se considera feliz ao ver as desgraças dos outros, sejam
estas merecidas ou não. O homem que se indigna em nome da justiça
não se parece em nada nem com um nem com outro, e situa-se no meio
entre estes dois extremos.5
A
modéstia é o meio-termo entre a imprudência, que não
respeita nada, e a timidez, que ante tudo se detém.
A veracidade é o meio-termo
entre a dissimulação e a arrogância.
Não
é possível que alguém seja justo tão-só
para si mesmo ou para alguém em particular. Quem é justo
é equânime em qualquer circunstância. A justiça
é um meio-termo entre o excesso e a deficiência, entre o
demasiado e o demasiado pouco. O homem justo não quer nem mais
nem menos do que a equanimidade. Entretanto, não se comete realmente
injustiça, mesmo quando se pratique um ato injusto, quando se
obra com completa ignorância e não se sabe nem a quem,
nem como, nem por que se há causado um dano ou um prejuízo.
Quando uma ação não é voluntária não
é culpável. (Grifo
meu).
A
Sabedoria é composta de Ciência e de Entendimento, porque
a Sabedoria, por sua vez, está em relação com os
princípios e com as demonstrações, que derivam dos
princípios e são o objeto próprio da Ciência.
É por isto que a Sabedoria toca os princípios e participa
do Entendimento. E como toca as coisas que são demonstráveis
como conseqüências dos princípios, participa da Ciência.
Logo, a Sabedoria se compõe de Ciência e de Entendimento,
e se aplica às coisas às quais se aplicam igualmente ao
Entendimento e à Ciência.
Há
virtudes inatas que são devidas à nossa natureza como seres-no-mundo.
São uma espécie de forças instintivas, que sem a
intervenção da razão arrastam o ser-no-mundo a atos
de valor, de justiça e a outros relativos às demais virtudes.
Estas virtudes se formam também sob a influência do hábito
e da vontade. Porém, só as virtudes adquiridas e as que
estão unidas à razão são por completo virtudes
e, portanto, as únicas dignas de estimação.
Homem eqüitativo —›
Discernimento. A eqüidade, que distingue exatamente as coisas, não
pode existir sem moderação.
Dar
a cada um segundo seu mérito parece ser absolutamente uma obrigação
do homem justo que quer se conduzir como é devido.
'De
cada um segundo sua capacidade;
a cada um segundo sua necessidade.'6
Se
a virtude perfeita não é possível sem o instinto
natural do Bem, muito menos pode suceder que uma virtude seja contrária
à outra virtude. Não há virtude que seja incompatível
ou antagônica à outra virtude.
Na
alma, as três qualidades que podemos chamar de más são:
o vício, a intemperança e a brutalidade – que é
o vício levado ao último grau. A virtude oposta à
brutalidade não tem um nome particular; é divina e supera
as forças do homem.7
Ninguém
faz o mal com conhecimento de causa. (Sócrates,
apud Aristóteles).8
O homem
prudente jamais será intemperante.9
Sem
prazer não há (ou haverá) felicidade possível.
O prazer é um bem. Longe de o prazer ser um obstáculo à
ação, é, pelo contrário, uma excitação
a obrar, e, em geral, uma ação não poderá
ser produzida sem prazer, que é sua conseqüência direta
e seu resultado particular.
O
entusiasmo prazeroso – conveniente e bem organizado e mais do que
a simples razão – acabará por nos conduzir à
virtude.
O
Homem é também uma alma.
Obrar
segundo a reta razão é obrar de maneira que a parte irracional
da alma não impeça a parte racional de realizar os atos
que são próprios de sua natureza.
O
corpo está sempre em bom estado quando não é um obstáculo
para a manifestação da alma.
Aquelas
coisas que se assemelham são aproximadas por um Deus.
O bem
individual está, de certa maneira, ligado ao Bem Absoluto, da mesma
forma que o objeto amado está ligado a quem o ama. Assim, o resultado
e a conseqüência do Bem são o agradável e o útil.
O que
é mau sempre busca o que é mau.10
Todos
os vícios turvam igualmente o Coração do homem, e
sempre são seus primeiros adversários e seus mais próximos
inimigos.
É egoísta também
quem guarda exclusivamente para si os atos de virtude. Já o homem
mau é puramente egoísta, e não tem motivo sequer
para se amar a si mesmo.
É
uma impiedade absurda crer que possa haver no Universo algo superior a
Deus.
Viver
com outros seres semelhantes é, ao mesmo tempo, um prazer e uma
necessidade.
O
justo é o mais belo. A saúde é o melhor. Obter o
que se ama é o que há de mais grato ao Coração.
(Versos
escritos sobre o pórtico do Templo de Latona, apud Aristóteles).
Assim
como a virtude, a prudência e o prazer são os três
maiores Bens para o homem, assim também há três gêneros
de vida: a vida política, a vida filosófica e a vida do
prazer e do gozo.
A
ação acabará por se tornar perfeita apenas, quando,
ao refletir, separa-se o raciocínio que intenta demonstrar a causa
da coisa mesma que se demonstra.
A felicidade é o maior e
o mais precioso dos bens a que pode aspirar o homem. A felicidade é
a coisa mais excelente que é dado ao homem poder obter. A felicidade
é o ato de uma vida virtuosa.
O
Bem Supremo – o melhor de todos os bens – é o Bem mesmo,
é o Bem-em-si. E ao Bem-em-si se atribuem estas duas condições:
a de ser o Bem Primordial, o primeiro de todos os bens, e a de ser, mediante
Sua presença, Causa de que todas as outras coisas, como Ele, se
façam também boas. Esta é a Idéia de Bem,
o primeiro de todos os bens e a Causa de que as demais coisas sejam bens
em diferentes graus.
A
obra produzida vale mais do que a faculdade que a produz, porque um fim
concretizado é o melhor que existe.
O
objeto principal da política consiste, certamente, em criar o afeto
e a amizade entre os membros da sociedade. E assim, a justiça e
a amizade são, até certo ponto, idênticas ou, pelo
menos, muito próximas.
A
mudança é sempre o que mais agrada.
Ah!,
cesse a discórdia entre os deuses e entre os homens! (Heráclito,
apud Aristóteles).
Ninguém
é um verdadeiro amante, se não ama sempre.
Para conhecer os Corações
necessitamos mais de um dia. (Theognis, apud Aristóteles).
A
amizade é uma igualdade. Os amigos verdadeiros não têm
mais do que una alma.
O
homem de bem é conforme a Natureza, enquanto o mau é um
ser contra a Natureza.
Toda
associação só se sustém mediante a justiça.
É na família onde se encontra o princípio e a origem
do amor, do Estado e da justiça.
Necessariamente,
o homem muito virtuoso tem poucos amigos, e cada vez terá menos.
A
melhor maneira de ser moral é a que subsiste no meio em cada caso,
e, por conseguinte, é igualmente claro que todas as virtudes, ou
pelo menos algumas delas, não são mais do que meios reconhecidos
pela razão.
Tudo
o que resulta de coisas necessárias é necessário
como elas.
O
homem é causa responsável de todas as coisas que dependem
dele fazer ou não fazer, e só dele dependem as coisas de
que é causa.
Um
ato, ao que tudo indica, só pode ter uma destas três disposições:
ou procede do desejo, ou provém da reflexão, ou deriva da
razão. É voluntário quando está em conformidade
com uma destas três coisas; é involuntário quando
é contrário a uma delas.
Todo
ato necessário é um ato penoso. (Eveno,
apud Aristóteles). Se
uma coisa é penosa, é porque é forçada; e
se é forçada, é penosa.11
É
difícil resistir à ira que acaricia o coração,
o qual goza com ela. (Heráclito,
apud Aristóteles).
Os
meios constituem as virtudes, e estas só dependem de nossa intenção.
A
razão nunca manda suportar e enfrentar os grandes perigos –
os perigos de morte – se não for uma questão de honra
fazê-lo.12
A
grandeza de alma parece ser a conseqüência natural de todas
as demais virtudes. Todas as virtudes são uma conseqüência
direta da magnanimidade ou a magnanimidade é a conseqüência
de todas as virtudes.
Quando se nasceu entre homens livres, ser liberal
é uma espécie de dever.13
O
meio-termo entre dois sentimentos é o caráter que sente
uma justa indignação – chamada pelos antigos de 'némesis'
– ou indignação virtuosa, que consiste em se afligir
com os bens ou com as desgraças alheias quando não são
merecidos, e se regozijar com os que o são. E assim, não
é estranho que de 'Némesis' se tenha feito uma deusa.
Não
há nada mais forte do que a prudência. (Sócrates,
apud Aristóteles).
A
prudência não é irracional, e sabe sempre razão
do que faz.14
A
magnanimidade é aquela virtude da alma que nos ensina a suportar,
quando convém, a boa e a adversa fortuna.15
A
desrazão é o vício da parte racional da alma, e é
a causa da desgraça dos homens. A irascibilidade é o vício
da parte fanática que se deixa levar, sem fazer a menor resistência,
pela cólera. A covardia é o vício desta mesma parte
que nos torna vulneráveis ao terror – sobretudo o terror
que produz a morte. A incontinência é o vício da parte
concupiscível que nos arrasta aos prazeres culpáveis. A
intemperança é o vício da parte cobiçosa que
nos obriga a ceder contra a razão, isto é, ao desejo cego
de gozar os prazeres repreensíveis. A injustiça é
o vício da alma que faz com que os homens pretendam mais do que
lhes é devido. A irreflexão imoderada é o vício
da alma que nos leva a procurar lucro e riqueza, quaisquer que sejam as
suas origens. Enfim, a pequenez de alma ou pusilanimidade é o vício
que nos torna incapazes de suportar o que convém a boa ou a má
fortuna, as honras ou a obscuridade.