Fédon
(transliteração de Phaídon) é uma obra filosófica
escrita já na maturidade de Platão (Atenas, 428/427 –
Atenas, 348/347 a.C.) que, através de diálogos, relata os
últimos ensinamentos de Sócrates (Atenas, 469 – Atenas,
399 a.C.), o pai da maiêutica (parto das idéias), antes de
tomar a cicuta (pois fora condenado à morte pelo Estado). Na ocasião
da morte de Sócrates, segundo Fédon, estavam Apolodoro, Critobulo
e seu pai, Hermógenes, Epígenes, Ésquines, Antístenes,
Ctesipo, de Peânia, Menexeno, Símias, o Tebano, Cebes, Fedondes,
Euclides e Terpsião, além de outros. Segundo Fédon,
Platão se encontrava doente.
De
acordo com a Apologia de Sócrates (por vezes simplesmente
Apologia), de Platão – que narra o processo e a sua
condenação à morte – Sócrates foi acusado
por Meleto, Anitos e Licão de ser culpado
de investigar, em excesso, os fenômenos subterrâneos e celestes,
de fazer prevalecer sobre a melhor causa a pior e de ensinar aos outros
esta doutrina. O texto da acusação, tal como se
encontra descrito por Diógenes Laércio (200 – 250),
é o seguinte: Esta
acusação jurada é de Meleto, filho de Meleto, natural
do demo piteu, contra Sócrates, filho de Sofronisco, natural do demo
alopecense. Sócrates é culpado de não acreditar nos
deuses em que acredita a cidade e de introduzir divindades novas; é
ainda culpado de corromper a juventude. Pena pedida: a morte.
Em resumo: em certo sentido, um precursor-anunciador dos princípios
cristãos, Sócrates foi acusado de perverter os jovens atenienses,
instilando-lhes o veneno inaceitável da Liberdade (que Liberta) nos
Corações.
Este
estudo – que, em um certo sentido, é uma complementação
de outro que já divulguei – é uma reflexão mais
completa, detalhada e comentada desta obra, escrita posteriormente ao julgamento
de Sócrates, mas anterior à sua execução com
a cicuta, na qual se admite que Platão estaria apenas usando Sócrates
como personagem principal dos diálogos para divulgar seu entendimento
iniciático do Mundo das Idéias – sua máxima Teoria
– e seu próprio projeto filosófico. Não esqueçamos
de que Platão esteve por um certo tempo no Egito, e lá foi
devidamente Iniciado na Organização hoje conhecida como Grande
Fraternidade Branca, que é uma Hierarquia harmonicamente estabelecida
e composta de Discípulos, Adeptos e Altos Illuminados
que atuam em silêncio na evolução (dos seres vivos)
da Terra. É necessário que se entenda que os Membros desta
Augusta Loja, em princípio, não podem ser contatados; mas,
por mérito + necessidade, se for o caso, um de seus
integrantes poderá estabelecer uma comunicação.
Devo
finalmente informar, que, originariamente, esta monografia
foi o trabalho final que apresentei no Seminário de História
da Filosofia Antiga, em 1986, uma exigência acadêmica da disciplina
que cursei no doutorado em Filosofia do Departamento de Filosofia da Universidade
Gama Filho, sob a orientação da professora e minha muito querida
amiga Anna Maria Moog Rodrigues. Como, na época, a Anna Maria deve
ter se enganado e meu deu nota 10 (dez) nesta monografia, respirei fundo,
tomei coragem e resolvi, agora, com diversos acréscimos, modificações,
ampliações e atualizações, divulgá-la
para vocês, pois, entre outros ensinamentos relatados por Fédon,
a pedido de Equécrates, Sócrates fala sobre a morte, a idéia
e o destino da personalidade-alma, que, penso, sejam temas que interessem
a todos nós. Mas, se você quiser ler a versão eletrônica
do diálogo platônico Fédon,
feita por Carlos Alberto Nunes, por favor, dirija-se a:
http://www.dominiopublico.gov.br/
download/texto/cv000031.pdf
Recensão
e Considerações
Sobre o Fédon,
de Platão
Prolegômenos
O
tema central deste diálogo – o mais famoso e o mais discutido
de Platão – é a morte. No Fédon, é
narrada a última conversa mantida por Sócrates com alguns
amigos e discípulos mais próximos. A derradeira conversa do
Mestre – melhor seria considerá-la sua última aula,
seus últimos ensinamentos – é levada a efeito na própria
prisão onde estava encarcerado Sócrates. A cidade é
Atenas, o ano é 399 a.C. e o tempo é de injustiça.
Mas Sócrates não desistiu da vida justa; na hora aprazada,
bebeu, calma e dignamente, a cicuta!
Entretanto,
preliminarmente, é necessário esclarecer o porquê de
Sócrates estar injustamente detido, qual o delito que supostamente
cometeu e quais as acusações infundadas que sobre ele pesavam.
Sócrates,
controvertida figura, cultivou fama de destemido, adquirida nos tempos da
guerra e reforçada por uma independência pessoal originada
na negação à
convivência com a sórdida trama política urdida pelos
trinta Tiranos, que durante alguns anos haviam dominado Atenas.
Desinteressado
dos bens temporais, a partir de um dado momento de sua vida, Sócrates
se dedicou a dialogar com as pessoas, de
modo a fazê-las tentar justificar os conhecimentos, as virtudes ou
as habilidades que lhes eram atribuídas. A finalidade
dos diálogos por ele conduzidos objetivava levar seu interlocutor
a reconhecer a própria ignorância, ou seja, tornar patente
a fragilidade das opiniões, a inconsistência dos argumentos
e a obscuridade dos conceitos de cada uma das pessoas que participavam do
diálogo. Para alguns, o
método proporcionava um verdadeiro renascimento, não deixando
de ser, de certa forma, um processo Iniciático – a Iniciação
à Transrazão, a Iniciação ao Autoconhecimento
Transracional. Para outros, lamentavelmente, era
a pulverização do prestígio em plena praça pública.
O
resultado de tantos anos tentando arrancar das trevas um povo quase incapaz
de compreender sua mensagem, suas palavras, foi o de ter sido acusado, diante
do tribunal popular, pelo
poeta Meleto, pelo rico curtidor de peles e influente orador e político
Anitos e por Licão, personagem de pouca importância,
de corrupção dos jovens atenienses, corrupção
esta que incluía não
acreditar nos deuses em que acredita a cidade e de introduzir divindades
novas. Para a época, isto era demais. Contudo, segundo
Platão, durante sua defesa, em nenhum momento Sócrates fraqueja,
em nenhum momento apela para a adulação, em nenhum momento
pede perdão ou solicita misericórdia. Está convicto
de que cumpria uma missão confiada
pelo Deus Delfos, que o tornara um vagabundo loquaz: dialogar,
conversar e ensinar as pessoas o caminho de um viver reto, virtuoso e puro.
Em sua defesa, segundo Platão, afirmou: Dos
haveres não vem a virtude para os homens; mas da virtude vêm
os haveres e todos os outros bens particulares e públicos.
Para Sócrates, a riqueza está na virtude.
Mas
o tempo não era de justiça terrena. Os deuses atenienses entenderam
de ensinar àquela gente estupidificada por caminhos tortuosos. E
Sócrates foi condenado. O Filósofo, como era de praxe naquela
época, foi convidado a escolher sua pena, em contraposição
à pena de morte pedida por Mileto. Para a assembléia, teria
sido um alívio a proposição por Sócrates de
qualquer punição alternativa. Umas poucas moedas lhe teriam
salvo a vida, contentado seus juízes e acalmado o estado de ânimo
reinante. Mas Sócrates, como era de se esperar, não transige.
Propor qualquer pena, no seu entender, era aceitar as acusações
que lhe imputavam. E, por isto, altivo, enfrentou seus acusadores e juízes.
A
morte de Sócrates (1787)
Jacques-Louis David (1748 – 1825)
Na
Defesa de Sócrates, Platão descreve a pena que Sócrates
considerava merecer:
Ora,
o homem propõe
a sentença de morte. Bem, e eu que pena vos hei de propor em troca,
atenienses? A que mereço, não é claro? Qual será?
Que sentença corporal ou pecuniária mereço, eu que
entendi de não levar uma vida quieta? Eu
que, negligenciando o de que cuida toda a gente –
riquezas, negócios,
postos militares, tribunas e funções públicas, conchavos
e lutas que ocorrem na política, coisa em que me considero de fato
por demais pundonoroso para me imiscuir sem me perder – não
me dedique àquilo a que, se me dedicasse, haveria de ser completamente
inútil para vós e para mim? Eu que me entreguei à
procura de cada um de vós em particular, a fim de proporcionar
o que declaro o maior dos benefícios, tentando persuadir cada um
de vós a cuidar menos do que é seu do que de si próprio,
para vir a ser quanto melhor e mais sensato, menos dos interesses do povo
que do próprio povo, adotado o mesmo princípio nos demais
cuidados? Que sentença mereço por ser assim? Algo de bom,
atenienses, se há de ser a sentença verdadeiramente proporcionada
ao mérito; não só, mas algo de bom adequado à
minha pessoa. O que é adequado a um benfeitor pobre, que precisa
de lazeres para vos viver exortando? Nada tão adequado a tal homem,
atenienses, como ser sustentado no Pritaneu;1
muito mais do que a um de vós que haja vencido, nas Olimpíadas,
uma corrida de cavalos, de bigas ou de quadrigas. Esse vos dá a
impressão da felicidade; eu, a felicidade; ele não carece
de sustento, eu careço. Se, pois, cumpre que me sentenciem com
justiça e em proporção ao mérito, eu proponho
o sustento no Pritaneu.
O
pouco caso de Sócrates ante a possibilidade de morrer, sua grandeza
ante os acusadores, a nobreza durante o julgamento e a proposta de ser alimentado
no Pritaneu enquanto fosse vivo tornaram impossível desfazer a condenação.
Para não abrir mão dos princípios que sempre nortearam
sua consciência, Sócrates optou nobremente pela morte. E assim
se fez. E assim se cumpriu. De um só gole, calmamente, tomou a cicuta
que lhe foi oferecida pelo carcereiro.
Os
momentos finais da vida de
Sócrates, extraídos do Fédon e transcritos
abaixo, demonstram a serenidade do Filósofo perante a morte e a injustiça:
Sócrates
pôs-se a dar umas voltas no quarto, até que declarou sentir
as pernas pesadas.
Deitou-se, então, de costas, assim como lhe havia recomendado o
homem. Ao mesmo tempo, este, aplicando as mãos aos pés e
às pernas de Sócrates, examinava-os por intervalos.
Em seguida, tendo apertado fortemente o pé, perguntou a Sócrates
se o
sentia. Sócrates respondeu que não. Depois disto, recomeçou
no tornozelo, e subindo aos poucos, nos fez ver que Sócrates começava
a ficar frio e a se enrijecer. Continuando a apalpá-lo, declarou-nos
que quando aquilo chegasse ao coração, Sócrates ir-se-ia.
Sócrates já se havia tornado rijo e frio em quase toda a
região inferior do ventre, quando disse estas palavras, as derradeiras
que pronunciou:
— 'Críton, devemos
um galo a Asclépio; não te esqueças de pagar esta
dívida.'
— 'Assim farei' — respondeu
Críton. —
'Mas
vê se não tens mais nada para nos dizer.'
O
pedido de Críton ficou sem resposta. Ao cabo de um instante, Sócrates
fez um movimento. O homem, então, o descobriu. O olhar de Sócrates
estava
fixo. Vendo isto, Críton lhe cerrou a boca e os olhos.
—
'Tal
foi, Equécrates, o fim do nosso companheiro – o homem de
quem podemos bendizer que, entre todos os do seu tempo que nos foi dado
conhecer, era o melhor, o mais sábio e o mais justo — lamentou
Fédon.'
Os
diálogos do Fédon originaram-se da necessidade de
Platão informar às gerações futuras o que se
passou naquela cela que acolheu Sócrates nos últimos dias
de sua vida. A primeira informação importante contida no Fédon
é a de que, apesar de sentenciado, Sócrates transmitia felicidade,
tal era a nobreza
que havia no seu fim. Isto reforça a idéia de
que a morte nada mais é do que um aspecto da Vida – a Vida
Eterna. E Sócrates sabia isto muito bem. Preparar-se para morte,
em vida, é preparar-se para a Vida Eterna. Para aquele, como Sócrates,
que levou vida reta, digna e que procurou seguir os ditames de sua consciência,
a morte é a completação, o remate imediato do ciclo
da existência. A morte é como que o fim de um curso em que
o estudante se habilita à diplomação. É o momento
em que, rompido o Cordão de Prata, inicia-se, se houver
mérito, uma nova fase do processo existencial em um plano vibratório
mais elevado, em um nível de consciência mais refinado. Como,
então, temer a morte? Como se horrorizar com esta insuperável
inevitabilidade? Como, enfim, não aceitá-la serenamente? Sócrates
era sabedor de tudo isto, e demonstrou este conhecimento efetiva e cabalmente
nos momentos terminais de sua vida. Honrou o que sabia. É tão-só
o desconhecimento e a ignorância que geram a dúvida, a angústia
e o medo, quando não o inconformismo e o desespero. Sócrates
não! Pelo que se pode inferir dos escritos de Platão e de
Xenofonte, era um intuitivo nato. Acreditava, inclusive, ter sido distinguido
pelos deuses para uma missão especial. Assim, na medida em que tinha
acesso a um Conhecimento Esotérico, vedado aos profanos, e, possivelmente,
aos seus próprios discípulos, distinguia-se dos demais; e
liderava naturalmente pelos conceitos insólitos que emitia. Admito
que sua fonte de inspiração fosse seu próprio interior,
em uma espécie de Comunhão Cósmica, que ele, pelos
padrões da época, admitia (ou queria que admitissem) ser o
deus de Delfos. A época exigia que fosse assim. Deste modo, portanto,
determinava a prudência, que, no caso de Sócrates, acabou pouco
valendo.
É
com sua força interior, com a certeza absoluta em um porvir na LLuz
em paz e de inefável Beleza, que Sócrates, quando todos estão
em trevas, desesperados ante a iminente possibilidade de o perder, ainda
encontra serenidade para chamá-los à ordem: — 'Acalmai-vos,
vamos! Dominai-vos'! É a força do Iniciado ante
a ignorância reinante. É a certeza que sobrepuja a descompostura
e a paúra.
O
Prazer e a Dor
Tanto
o prazer como a dor não são simultâneos no homem. O
prazer poderá provocar a dor, e vice-versa, mas a concomitância
inexiste. A dor, que muitas vezes por ser intensa, manifestando-se no homem
das mais variadas formas (física, emocional, moral etc.), poderá
levar aquele que sofre a cometer suicídio. Para Sócrates,
tal ato é abominável. Leiamos o que disse Sócrates
sobre este tema:
Para
todos os homens, há uma absoluta necessidade de viver, necessidade
invariável mesmo para aqueles para os quais a morte seja preferível
à vida... O corpo, segundo os Adeptos dos Mistérios, é
uma espécie de prisão... Mas é um dever não
libertar ninguém nem permitir que alguém seja dali levado.
Meditando
sobre esta matéria, estou convencido de que o processo evolutivo-reintegrador
do ser-no-mundo, a ascensão de sua consciência e o
progressivo alcançamento da liberdade, operam-se, nesta dimensão,
obrigatoriamente, pela encarnação da personalidade-alma em
um corpo físico. Em outras dimensões isto pode ser diferente.
Nesta dimensão, neste plano, a coisa parece se dar assim: a personalidade-alma,
provavelmente, não evolui enquanto tal; precisa, portanto, encarnar
para evoluir. Assim, fazem sentido as afirmações anteriores.
A supressão da vida cancela, ato contínuo, o processo evolucionista,
e o suicida, particularmente, não alcançará um plano
vibratório mais elevado nem um nível de consciência
mais refinado, coisa que poderia acontecer se a vida tivesse sido vivida
de fio a pavio. Há um corte no processo mencionado; e se há
um corte no processo mencionado, a pena capital, por exemplo, é,
no mínimo, um equívoco. Assassinar (com ou sem amparo legal)
é suicidar-se; suicidar-se é assassinar.
No
curso da vida, o maior ou menor inferno que cada ser-no-mundo possa
eventualmente experimentar – porque o produziu – é incomparável
com o inferno que experimentará naquilo que se conhece como o cone
de sombra da Terra. Não
o cone de sombra projetado no espaço derivado de um eclipse da Lua,
pelo fato de ela entrar no cone de sombra da Terra. O cone
de sombra do
desespero rememorativo – ainda que, geralmente, temporário
(não o cone,
mas a estada no cone)
– não provém de um fenômeno físico; é
de outra natureza.
Não
é isto; mas, pictoricamente, é mais ou menos isto.
No
cone de sombra
do desespero rememorativo
habitam temporariamente aquelas personalidades-alma que, extremamente materializadas
e que cometeram delitos – como, por exemplo, o suicídio –
passam pela dolorosa experiência de rever seus atos em toda a intensidade
em que foram praticados, sublinhados, agora, pela convicção
íntima de que oportunamente deverão ser compensados. Mas,
normalmente, este estágio não é definitivo; o amor
impessoal, a tolerância irrestrita e a misericórdia sem julgamento
dos que misericordiam imparcialmente agirão, no devido tempo, em
favor do transgressor das Leis Universais. Logo, a idéia de punição
é errônea; e, se não há punição,
a permanência no cone
não é irrevogável. O Cósmico não galardoa
nem pune; é o nosso livre-arbítrio que nos conduz por um céu
de brigadeiro ou por um mar emborrascado. Não há fortuitidade;
em tudo e para tudo há uma causalidade acionadora inconsciente (porque
se houvesse consciência, haveria julgamento, e se julgamento houvesse,
teria havido preteritamente uma escolha entre isto ou aquilo, entre cominar
ou laurear, entre relevar ou acriminar). As coisas acontecem porque uma
ou várias causas concorreram para que ela acontecesse. Não
há de araque; em tudo e para tudo há uma razão de ser
assim, assado, frito, gratinado, refogado ou ensopado – há
sempre um motivo gerador e movimentador. Logo, penso que seja inacontecível
um tsunami
no miolo do Deserto do Saara, tanto quanto é improbabilíssimo
que ocorra uma tempestade de areia no meio do Oceano Pacífico. Mutatis
mutandis, isto é mais ou menos como bala perdida. Ora, não
existe bala perdida; existe bala com endereço bem certinho. E Coragyps
atratus não caga na cabeça de ninguém por
acaso. Agora, a sacanagem das sacanagens é dar de presente um PlayStation
para um ceguinho!
A
Morte como
Libertação do Pensamento
Em
um outro passo deste ensaio comentei que se preparar para morte, em vida,
é preparar-se para a Vida Eterna. Preparar-se para a Vida Eterna
é buscar e perseguir o Sumo Bem e navegar rumo à Illuminação;
mas, como afirma o Frater Velado na obra, Meus Últimos Dias (Diálogos
com o Mestre),
só se atinge a Illuminação através da Via
do Amor, que é alcançada pelo caminho das Boas Obras. Assim,
a mortificação pura e simples leva apenas à exaustão
do corpo físico.
Mas, como deve um homem se preparar para estar em condições
de realizar as Boas Obras? Primeiro, deve estar limpo por dentro. Ele não
pode ter dentro de si outros sentimentos conflitantes com o amor, como,
por exemplo, o ódio, a cobiça, a ira, a luxúria, o
medo, a insegurança, a inveja, a vaidade, a ambição,
a leviandade, a avareza e a falsidade. Depois, ele deve estar limpo por
fora, para que a aura, proveniente do interior, possa se manifestar. Limpo
por fora é o homem que pode se olhar no espelho e dizer, fitando
seus olhos: — Eu não minto. Sócrates,
por outras palavras, diz no Fédon: o
homem que consagrou sua vida à Filosofia2
é senhor
de legítima convicção no momento da morte, pois possui
a esperança de ir encontrar para si, para além, excelentes
bens quando estiver morto... Quando uma pessoa se dedica à Filosofia
sua única ocupação consiste em se preparar para morrer
e em estar morto.
Assim,
de um modo geral, os Filósofos se ocupam com a morte e para ela se
preparam, dando pouca ou nenhuma importância às posses materiais,
considerando-as tão-somente na justa medida de sua utilidade, para
delas se servirem para poder viver. As (pre)ocupações dos
Filósofos, portanto, não
se dirigem, de modo geral, para o que diz respeito ao corpo; é para
a alma que estão voltadas. O corpo, segundo Sócrates,
é um entrave à Sabedoria (SOPhIa),
e sempre engana radical e ilusoriamente a alma em suas investigações,
em sua busca, em seu aprimoramento.
O
corpo, para Sócrates, é uma coisa
má, um estorvo à plena expressão da personalidade-alma.
O corpo, com suas paixões próprias, com suas concupiscências,
faz dos homens pobres e míseros escravos, impedindo, até mesmo
quando se encontram em paz e em tranqüilidade, pela desorganização
mental que muitas vezes provoca, o conhecimento de uma verdade ascensionária,
que se eleva, que se dirige para cima, que vai progredindo, aumentando,
ainda que sempre relativa. Neste sentido, e se assim é, a morte libera
da demência
do corpo, e o pensamento, também livre, pode conhecer,
relativamente, tudo
o que é.
Todavia,
é preciso que se entenda que cada ser-no-mundo ao passar
pela Iniciação maior da vida – que é a morte
ou transição – atuará psiquicamente no nível
de compreensão que possuía em vida. Nada é acrescentado.
Não seria, pois, injusto ou mesmo absurdo, cosmicamente raciocinando,
que todos os entes, daqui e dali, depois de mortos, passassem a se manifestar
no mesmo céu, no mesmo inferno ou no mesmo sei-lá-onde, passando
por experiências insólitas e adquirindo conhecimentos imerecidos?
Por acaso, suas vidas na Terra teriam sido rigorosamente iguais ou inflexivelmente
equivalentes? Por isto, repito: poderemos,
depois, conhecer, relativamente
e só relativamente,
tudo o que é. Por
este motivo, o tudo
só será absoluto se e quando se fizer o
.
Seja
como for, como o Universo é um perene vir-a-ser, todos os entes têm,
por mérito, a possibilidade de progredir, pela encarnação,
e de se reintegrar no
,
que representou e simbolizou, enquanto vivos, o Deus de seus Corações,
o Deus de sua compreensão. Mas, no
de todas as experiências individualizadas, e aí já não
mais como individualidades, mas, por assim dizer, como uma espécie
de conjunto unitário, o
será percebido, compreendido e sintetizado como Deus de uma única
compreensão e de um só Coração. Portanto, enquanto
houver o
,
o
, o
etc., não haverá o
.
Só se fará o
quando houver unicidade. E assim, enquanto houver um único ser afastado
da LLuz,
esta mesma LLuz
não brilhará em toda a sua intensidade. É neste sentido
que todos nós somos irmãos e que o maior mandamento é
o da fraternidade. Por isto, pode-se escrever:

Fim da
1ª parte.
2ª
parte: http://paxprofundis.org/livros/fedd/on1.htm
3ª
parte: http://paxprofundis.org/livros/feddd/on1.htm
______
Notas:
1.
Pritaneu (Prytaneium
ou Prytaneum)
era o nome dado pelos antigos gregos ao edifício-coração
da cada cidade, que era representado por um fogo eterno que queimava em
um altar, tal qual queimava um
fogo nas casas privadas em um altar doméstico,
no pátio interior. Na cidade, nada havia de mais sagrado do que este
altar, sobre o qual ardia ininterruptamente um fogo sagrado. Para os gregos,
o Pritaneu era o centro da vida pública e a terra sagrada da pátria.
2. Filosofia
no sentido gnóstico de Filo-SOPhIa.
SOPhIa
é aquilo que detém o Sábio. Na tradição
gnóstica, SOPhIa
é uma figura feminina, análoga à alma humana e simultaneamente
um dos aspectos femininos de Deus. Os gnósticos afirmam que SOPhIa
é a Sizígia
de Jesus (ou seja, a Noiva Alquímica do Cristo) e o Espírito
Santo da Trindade. Nos textos da Biblioteca de Nag Hammadi, SOPhIa
é considerada o mais baixo dos Aeons
ou a expressão antrópica da emanação da LLuz
de Deus. Pistis
Sophia é um texto Gnóstico que relata os ensinamentos
Gnóstico-iniciáticos do Jesus transfigurado aos seus Apóstolos
(incluindo Maria Madalena, Maria, mãe de Jesus, e Marta), quando
o Cristo ressucitado havia passado onze anos falando com seus discípulos.
Na obra, as estruturas complexas e as hierarquias celestes familiares nos
ensinamentos Gnósticos são reveladas.
Bibliografia:
BORNHEIM,
Gerd A. (org). Os
filósofos pré-socráticos. Cultrix: São
Paulo, 1999.
CABALLERO,
Alexandre. A filosofia
através dos textos. 2ª edição. Cultrix:
São Paulo, 1972.
CONFÚCIO.
Os analectos.
Tradução de Múcio Porphyrio Ferreira. São Paulo:
Pensamento, s.d.
GARAUDY,
Roger. Para conhecer
o pensamento de Hegel. Tradução de Suely Bastos.
Porto Alegre: LPM Editores, 1983.
LEWIS,
H. Spencer. Manual
rosacruz. Curitiba: Grande Loja do Brasil, AMORC, 1964.
MONDIN,
Battista. Curso
de filosofia. 2ª edição. Tradução
de Benôni Lemos. São Paulo: Paulinas, 1981.
MORA,
José Ferrater. Diccionário
de filosofia. 5ª edição. Volume I. Buenos
Aires: Editorial Sudamericana, 1965.
PLATÃO.
Defesa de Sócrates/Platão.
Ditos e feitos
memoráveis de Sócrates; Apologia de Sócrates/Xenofonte.
As nuvens/Aristófanes.
3ª edição. Seleção de textos de José
Américo Motta Pessanha. Tradução de Jaime Bruna, Líbero
Rangel de Andrade e Gilda Maria Reale Starznski. São Paulo: Abril,
1985.
_____.
Diálogos
II. Fédon; Sofista; Político. Tradução
de Jorge Paleikat e João Cruz Costa. Rio de janeiro: Tecnoprint,
s.d.
SEMAT,
Henry. Física
atomica y nuclear. 4ª edição. Tradução
de José Miro Nicolau e Luis Bravo Gala. Madri: Aguilar, 1966.
Páginas
da Internet consultadas:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Sophia
_(gnosticismo)#Pistis_Sophia
http://pt.wikipedia.org/wiki/Pistis_Sophia
http://svmmvmbonvm.org/ultimos/
http://media.photobucket.com/image/%252522
tsunami.gif%252522/d3stroy3r/Tsunami2.gif
http://books.google.com.br/
http://pt.wikilingue.com/ca/Pritaneu
http://www.cefetsp.br/edu/eso
/filosofia/comentarioapologia.html
http://filosofiapraticasoniarodrigues.blogspot.com/
http://www.homeoesp.org/meditacao_
espiritualidade/022%20-%20SOCRATES.pdf
http://www.mundodosfilosofos.com.br/
socrates1.htm
http://www.guia.heu.nom.br/grecia.htm
http://ialexandria.sites.uol.com.br/textos/
israel_textos/introducao_a_platao.htm
http://www.dominiopublico.gov.br/
download/texto/cv000031.pdf
http://pt.wikipedia.org/wiki/F%C3%A9don
Fundo
musical:
Zorba
the Greek (Mikis Theodorakis)
Fonte:
http://www.faliraki-info.com/greek-midi-music/
Observação:
Se
você quiser ver o Anthony Quinn dançando Zorbas com Alan Bates,
por favor, dirija-se a:
http://www.youtube.com/watch?
v=jeNsr_nQEfE&feature=related