Schelling

Schelling

 

 

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

Objetivo do Texto

 

 

 

Para alguns, Schelling foi o maior filósofo alemão de todos os tempos. Eu não chegaria a tanto, até porque maior e menor, mais e menos, ignorância e conhecimento et cetera e et cetera e tal são coisas relativas. Seja como for, este trabalho, que ora estou divulgando, resume alguns dos mais expressivos pensamentos de Friedrich Wilhelm Joseph von Schelling, cujo pensamento, como perceberam Giovanni Reale e Dario Antiseri, evoluiu incessantemente, até terminar em uma Filosofia Positiva baseada, além de na razão pura, também na religião e na revelação.

 

 

 

 

Breve Biografia de Schelling

 

 

 

Schelling

Schelling

 

 

 

Friedrich Wilhelm Joseph von Schelling (Leonberg, 27 de janeiro de 1775 – Bad Ragaz, 20 de agosto de 1854) foi um filósofo alemão, um dos representantes do Idealismo alemão, assim como Fichte e Hegel. Aos 15 anos, Schelling entrou para o Seminário Teológico de Tübingen, que pertencia à Universidade, iniciando uma amizade com o poeta Friedrich Hölderlin e com o filósofo Hegel, ambos cinco anos mais velhos do que ele. Em 1792, termina a graduação em Filosofia e em 1795 termina sua tese para a obtenção do doutorado em Teologia, De Marcione Paullinarum Epistolarum Emendatore. De 1796 a 1798, estudou matemática e ciências naturais em Leipzig. Nesse período, começou o estudo de Kant e de Fichte, dos quais recebeu uma grande influência. Em 1798, foi nomeado professor em Jena, com o apoio de Goethe. Nesta cidade, mantém relações com Schlegel, Tieck e Novalis, que pertenciam ao movimento romântico. Em 1803, casou com Caroline Schlegel. Entre 1803 e 1806, foi professor em Wilrzburg (Würzburg). Em 1806, assume o cargo de Secretário de Belas Artes em Munique. Em 1809, Caroline morreu e três anos mais tarde ele se casou com Pauline Gotter. Em 1841, é nomeado professor em Berlim, para suceder Hegel, onde passa a comandar o movimento contra este filósofo. Em 1847, pára de ensinar.

 

Schelling foi um autor variado e fecundo. As faces do seu pensamento são fundamentalmente duas: o período da Filosofia da Identidade, e o da Filosofia da Liberdade. O pensamento de Schelling é, fundamentalmente, idealista: o Espírito, o Sujeito e o Eu são princípio de tudo. Como Fichte, admite que a Natureza é uma produção necessária do Espírito; recusa, porém, o conceito de Fichte de que a Natureza tenha uma existência puramente relativa ao Espírito. Para ele, a Natureza – embora concebida idealisticamente tem uma realidade autônoma com respeito ao sujeito, à consciência. A Natureza é o Espírito na fase de consciência obscura, como o Espírito é a Natureza na fase de consciência clara.

 

Enfim, os mais festejados românticos alemães são Schlegel e Novalis. A estes podem ser acrescentados Schelling e Schleiermacher; são eles, propriamente, filósofos idealistas, mas pertencem também ao movimento romântico, pela íntima unidade espiritual do Romantismo e do Idealismo.

 

 

 

 

Reflexões e Pensamentos Schellinguianos

 

 

 

Schelling

Schelling

 

 

 

É uma objeção pobre contra um filósofo dizer que é ininteligível. A Filosofia tem, de fato, algo que, segundo a sua natureza, sempre permanecerá ininteligível à grande multidão. Mas é algo inteiramente outro se a ininteligibilidade está na coisa mesma. Ocorre, freqüentemente, que cabeças que, com grande exercício e habilidade, mas sem possuírem propriamente inventividade para tarefas mecânicas, se dispõem, por exemplo, a inventar uma máquina de tornear garrafas – fabricam perfeitamente uma, mas o mecanismo é tão difícil e artificioso ou as engrenagens rangem tanto, que se prefere voltar a tornear garrafas com as mãos, à moda antiga. O mesmo pode perfeitamente se passar na Filosofia. O sofrimento com a ignorância sobre os objetos primeiros, sobre os maiores, para todos os homens que sentem, que não são embotados ou estreitamente auto-suficientes, é grande e pode aumentar até se tornar insuportável. Mas se o martírio de um sistema antinatural é maior do que aquele fardo da ignorância, prefere-se, no entanto, continuar a suportar este. Pode-se bem admitir que também a tarefa da Filosofia, se é em geral resolúvel, tem de acabar por se resolver com poucos traços, grandes e simples, e que não há de ser sem valor, precisamente na maior das tarefas humanas, a invenção que se reconhece em todas as tarefas menores.

 

 

 

Filósofo melequento, mas inteligibilíssimo!

 

 

Quem meditou sobre a liberdade e a necessidade descobriu por si que estes princípios têm se ser unificados no Absoluto – a liberdade porque o Absoluto age por potência autônoma incondicionada, a necessidade porque, justamente por isso, Ele só age em conformidade com as leis do seu Ser, com a necessidade interior da Sua Essência. Nele não há mais nenhuma vontade, que poderia se afastar de uma lei, mas, também, nenhuma lei mais, que Ele não desse a Si mesmo apenas por Suas ações, nenhuma lei que, independentemente de Suas ações, tivesse realidade. Liberdade absoluta e necessidade absoluta são idênticas.

 

Onde há liberdade absoluta, há bem-aventurança absoluta, e inversamente. Mas, com a liberdade absoluta, também não é mais pensável nenhuma autoconsciência. Uma atividade para a qual não há mais nenhum objeto, nenhuma resistência, nunca retorna a si mesma. Somente pelo retorno a si mesmo surge uma consciência. Somente uma realidade limitada é efetividade para nós. Onde cessa toda a resistência há extensão infinita. Mas a intensidade da nossa consciência está na proporção inversa da extensão do nosso ser. O momento mais alto do ser é, para nós, passagem ao não-ser, momento de anulação. Aqui, no momento do ser absoluto, a suprema passividade unifica-se com a mais ilimitada das atividades. A atividade ilimitada é... calma absoluta, epicurismo perfeito.

 

Toda essa idéia de uma felicidade como recompensa – que outra coisa seria, portanto, senão uma ilusão moral: um título de crédito com o qual se compra de ti, homem empírico, os teus prazeres sensíveis de agora, mas que só é pagável quando tu mesmo não precisas mais do pagamento. Pensa sempre nessa felicidade como um todo de prazeres que são análogos aos prazeres sacrificados agora. Ousa, apenas, dominar-te agora; ousa o primeiro passo de criança em direção à virtude: o segundo já se tornará mais fácil para ti. Se continuares a progredir, notarás com espanto que aquela felicidade que esperavas como recompensa do teu sacrifício, mesmo para ti não tem mais nenhum valor. Foi intencionalmente que se colocou a felicidade em um ponto do tempo em que tens de ser suficientemente homem para te envergonhares dela. Envergonhar, digo eu, pois, se nunca chegas a te sentir mais sublime do que aquele ideal sensível de felicidade, seria melhor que a razão jamais te tivesse falado. É exigência da razão não precisar mais de nenhuma felicidade como recompensa, tão certo quanto é exigência tornar-se mais conforme à razão, mais autônomo, mais livre. Pois, se a felicidade ainda pode recompensar-nos – a não ser que se interprete o conceito de felicidade contrariamente a todo o uso da linguagem – ela é, então, uma felicidade que não é trazida, já, pela própria razão (pois como poderiam razão e felicidade jamais coincidir?), uma felicidade que, justamente por isto, aos olhos de um ser racional, não tem mais nenhum valor. Deveríamos, diz um antigo escritor, considerar que os deuses imortais são infelizes porque não possuem capitais, bens territoriais, escravos? Não deveríamos, antes, exaltá-los como os únicos bem-aventurados, justamente porque são os únicos que, pela sublimidade da sua natureza, já estão despojados de todos aqueles bens? O mais alto a que podem se elevar as nossas ideias é manifestamente um ser que, com auto-suficiência absoluta, frui somente do seu próprio ser, um ser que cessa toda a passividade, que não é passivo em relação a nada, nem mesmo em relação a leis, que age com liberdade absoluta, apenas em conformidade com o seu ser, e cuja única lei é a sua própria essência. (Grifo meu).

 

 

 

 

 

A arte deve preservar o homem do vazio, da debilidade, da nulidade interior, esperando que tente alcançar a beleza por uma sábia harmonia.

 

O poder do discurso musical está em sua capacidade de evocar a exterioridade do universo sem violar os limites de sua Ontologia.

 

Schelling considera que o Estado é o organismo objetivo da liberdade, partindo do princípio que o organismo é um objeto indivisível, completo em si mesmo, subsistente por si mesmo. É o elemento em que a ciência, a religião e a arte se compenetram reciprocamente, de maneira a tornarem-se num todo vivo e objetivo na própria unidade. Neste sentido, o Estado é um organismo que não pode ser dominado, mas apenas desenvolvido, e a história como um todo é um desvendamento contínuo e progressivo do Absoluto. Ele é não só o arquiteto do organismo, o artista criador das artes plásticas, no qual se desvenda a idéia divina de Direito, como também a união do real e do ideal, a reunião da liberdade e da necessidade.

 

Tudo o que é é Uno; a Unidade [in]depende [da perceptibilidade] do Eu.

 

A Natureza inteira, tanto no homem quanto na fauna e na flora, são a expressão visível de Deus.

 

Não há em suprema e última instância nenhum outro ser senão o querer. O querer é ser-originário. Apenas a este cabem todos os seus predicados, isto é, ausência-de-fundamento, eternidade, independência do tempo, auto-afirmação. Toda a Filosofia se esforça apenas em encontrar a sua suprema expressão.

 

Deus tem em si um fundamento íntimo de sua existência, que nesse sentido Lhe antecede enquanto existente. Mas, por seu turno, Deus é de novo o 'prius fundamentum', na medida em que o fundamento, enquanto tal, não poderia sê-lo, se Deus não existisse como 'actu'.

 

A Lei Moral tem, em última instância, como fonte, um estado em nós do qual não podemos ser conscientes, a não ser pelo ato do querer mesmo.

 

O Absoluto Incondicionado manifesta-se no mundo mediante um prazer infinito, tendo-se nesta manifestação o seu afirmar-se-a-si-mesmo como querer ao infinito, em todas as formas, graus e potências da realidade.

 

Há uma absoluta identidade do Espírito em nós e da Natureza fora de nós.

 

O sistema da Natureza é, ao mesmo tempo, o sistema do nosso Espírito.

 

A Natureza deve ser o Espírito visível; o Espírito a Natureza invisível. É aqui, portanto, na absoluta unidade de Espírito em nós e da Natureza fora de nós, que se deve resolver o problema de como é possível uma Natureza fora de nós.

 

Uma teoria perfeita da Natureza seria aquela pela qual toda a Natureza se resumisse em uma inteligência.

 

A Natureza alcança o seu mais elevado fim, que é o de se tornar inteiramente objeto para si mesma, com a última e mais elevada reflexão, que nada mais é do que o homem ou, mais geralmente, o que nós chamamos de razão...

 

O homem — o fim último da Natureza.

 

Como físico, Descartes dizia: ' Dai-me matéria e movimento que construirei o Universo. O Filósofo Transcendental diz: dai-me uma Natureza de atividades contrapostas, uma das quais se desdobrando ao infinito e a outra se esforçando por instruir a si mesma nessa infinitude que eu farei nascer a inteligência com todo o seu sistema de representações.

 

Todas as ciências pressupõem a inteligência como coisa já formada. O Filósofo olha-a em seu devir, fazendo-a quase nascer diante de seus olhos.

 

A Filosofia teórica é Idealismo; a Filosofia prática é Realismo. Somente juntas formam o sistema completo do Idealismo Transcendental.

 

A Natureza nada mais é do que inteligência cristalizada em um ser, sensações apagadas em um não-ser, arte formadora de idéias que transforma em corpos.

 

A quem não possui a intuição do Absoluto não se pode fornecer qualquer demonstração, exatamente porque, como Absoluto, Ele é condição de toda demonstração. Só nos elevamos ao Absoluto com intuição originária.

 

Chamo de Razão a Razão Absoluta ou a Razão enquanto pensada como indiferença total do Subjetivo e do Objetivo...

 

Filosofia, que palavra acertada... Todo o nosso saber sempre permanecerá filosofia, isto é, sempre um saber apenas em progresso, cujo grau superior ou inferior devemos apenas ao nosso amor à sabedoria, isto é, à nossa liberdade.

 

O mundo objetivo nada mais é do que a poesia primitiva e ainda inconsciente do Espírito. O órgão universal da Filosofia – e a chave mestra de todo o seu edifício – é a Filosofia da Arte.

 

O primeiro passo na Filosofia e a condição sem a qual não se pode sequer ingressar nela é a intuição de que o Absoluto Ideal é também o Absoluto Real e de que fora dele, em geral, só pode haver realidade sensível e condicionada, mas não absoluta e incondicionada...

 

Fora da Razão não há nada; tudo está nela.... O único conhecimento absoluto é o da Identidade Absoluta, o Todo Uno... A Razão é simplesmente una; é simplesmente igual a si mesma...

 

 

 

 

Atuar em toda a sua pureza ('schlechthin') se chama querer. Portanto, só no querer o Espírito se faz imediatamente consciente de seu atuar, e o ato de querer, em geral, é a condição mais alta da autoconsciência.

 

O mundo inteiro se acha, por assim dizer, capturado na razão. Contudo, a pergunta é: Como chegou a este entrelaçamento?

 

Deus é essencialmente ação.

 

A razão é, no homem, o que, segundo os místicos, é o 'Primum Passivum' em Deus, isto é, a Sabedoria Original na qual todas as coisas estão juntas e ao mesmo tempo singularizadas – são uma e, todavia, cada uma é livre a seu modo.

 

O todo, do qual provém a Filosofia-da-natureza, é o idealismo. A Filosofia-da-natureza não precede o Idealismo nem lhe é de alguma maneira oposta, caso ele seja Idealismo absoluto, mas só na medida em que ele é idealismo relativo e, por conta disso, apreende apenas um lado do ato

 

O que sobra quando toda propriedade está suprimida é a perfeita pureza – a pura desnudez.

 

A vontade é nada e é tudo. É nada enquanto não apetece ser ativa ('wirkend') nem aspira à alguma realidade. É tudo porque dela, como da liberdade eterna, provém toda a força, porque tem todas as coisas sob si: domina tudo e por nada é dominada.1

 

Nenhum ente pode ser como tal sem outro fora de si – nenhum eu sem um não-eu.2

 

 

 

 

Deus é uma Essência Real que, no entanto, não tem nada antes ou fora de Si. Tudo aquilo que Ele é, o é por Si Mesmo. Ele provém inicialmente de Si Mesmo para, no fim, acabar de novo puramente em Si Mesmo. Em suma: Deus faz-se a Si Mesmo. E, da mesma forma que é certo que Ele se faz a Si Mesmo, também é certo que Ele não está concluído e feito desde o início, porque, caso contrário, não teria necessidade de Se fazer.3

 

Nada do que existe é sem fundamento. Nada que chegou a existir poderia haver sido o que é se não houvesse um substrato do qual se desprendeu livremente.4

 

Chama-se 'unheimlich' tudo o que deveria permanecer secreto, escondido, e se manifesta.5

 

 



 

 

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Notas:

1. Em resumo: a vontade é potência.

2. Somos todos UM.

3. Este conceito filosófico está absolutamente de acordo com o Misticismo Iniciático, ainda que o sentido do pensamento schellinguiano não seja este. Isto poderá ser sentido assim, se não idealizarmos um Deus transcendente ou mesmo imanente, egregórico ou não, e admitirmos como Verdade a ser perseguida – ad semper – o Mestre-Deus de nosso Coração. Então, vou reproduzir parte do fragmento schellinguiano, para uma profunda reflexão: Deus faz-se a Si Mesmo. E, da mesma forma que é certo que Ele se faz a Si Mesmo, também é certo que Ele não está concluído e feito desde o início, porque, caso contrário, não teria necessidade de Se fazer. E acrescento: este mesmo Deus (o Mestre-Deus de nosso Coração) jamais poderá estar ou ser concluído, porque se pudesse estar ou ser concluído, isto seria sinônimo de fim ou de começo. E como fim e começo – metafisicamente – também são sinônimos e não existem ou poderão existir como fim definitivo ou como começo determinado, ad infinitum teremos que (se desejarmos!) edificar o Mestre-Deus de nossos Corações. Eu, que começo a ficar irritado quando vai me dando sono, acho esta idéia ótima!

4 Cabe insistir: Tudo é Um; somos todos UM.

 

 

 

 

5. O estranho é algo que deveria ter permanecido oculto, mas veio à luz.

 

Bibliografia:

REALE Giovanni e ANTISERI Dario. História da Filosofia (do Romantismo até nossos dias). Vol. III. São Paulo: Paulinas, 1991.

 

Páginas da Internet consultadas:

http://school.discoveryeducation.com/
clipart/clip/diploma.html

http://penta3.ufrgs.br/twiki/bin/view/
Teleducacao2007/WebHome

http://ppgav.ceart.udesc.br/ciclo3/
anais/Amanda%20Nascimento.doc

http://www.mundodosfilosofos.com.br/
poskant.htm

http://pt.wikipedia.org/wiki/
Friedrich_Wilhelm_Joseph_von_Schelling

http://paxprofundis.org/livros/
schelling/schelling.htm

http://docs.google.com/

http://www.vestibular1.com.br/
revisao/romantismo.doc

http://maltez.info/aaanetnovabiografia/
Autores/schelling.htm

http://www2.uol.com.br/percurso/
main/pcs03/BernardoUnheimlich.htm

http://www.citador.pt/pensar.php?
op=10&refid=200505230800

http://www.citador.pt/pensar.php?
op=10&refid=200505310005

http://www.citador.pt/pensar.php?
op=10&refid=200506112300

http://www.citador.pt/pensar.php?
op=10&refid=200506252350

 

Fundo musical:

Noturno 9 (Chopin)

Fonte:

http://www.coraldelchiaro.com.br/Midis_Casamentos.htm