JOÃO DA CRUZ

 

 

 

João da Cruz (Doctor Mysticus)
(Por Francisco de Zurbarán)

 

 

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

Objetivo da Trabalho

 

 

Nesta hora tão difícil que todos nós estamos vivendo, agosto de 2021, este trabalho tem por objetivo apresentar uma pequena coleção de pensamentos de João da Cruz. Ainda que eu não concorde inteiramente com alguns pensamentos são-joaninos, sinceramente, espero que os seus ensinamentos ajudem a todos a encontrar, em seus Corações, a força necessária para não desanimar... E sempre seguir caminhando. Um dia, esta PanCOVIDmia terminará. A questão é: o que faremos depois dela? Se continuarmos na mesma, não teremos apreendido a lição!

 

 

Breve Biografia

 

 

João da Cruz (Doctor Mysticus)

 

 

Nascido Juan de Yepes Alvarez, em 1542, em Fontiveros, Ávila, Espanha, João da Cruz, (em castelhano: Juan de la Cruz), Ordem dos Carmelitas Descalços (O.C.D.), foi um místico, sacerdote e frade carmelita espanhol venerado como santo pelos católicos. Foi um dos mais importantes expoentes da Contra-reforma (movimento criado pela Igreja Católica, a partir de 1545, e que, segundo alguns autores, teria sido uma resposta à Reforma Protestante, de 1517, iniciada por Martinho Lutero).

 

João da Cruz foi um grande reformador da Ordem Carmelita, e é considerado, juntamente com Santa Teresa de Ávila, o fundador dos Carmelitas Descalços. João da Cruz também é conhecido por suas obras literárias, e tanto sua poesia quanto suas investigações sobre o crescimento da personalidade-alma são consideradas o ápice da literatura mística, se destacando entre as grandes obras da Literatura Espanhola.

 

João da Cruz é amplamente considerado como um dos principais poetas da língua espanhola. Apesar de seus poemas contarem com menos de 2.500 versos, dois deles – o Cântico Espiritual e A Noite Escura da Alma (que narra a jornada da personalidade-alma de sua casa corpórea até sua união com Deus) – são considerados obras-primas da poesia espanhola, tanto do ponto de vista estilístico formal quanto por seu rico simbolismo. Suas obras teológicas são majoritariamente comentários sobre estes poemas. Todas as suas obras foram escritas entre 1578 e sua morte em 1591, o que resultou numa grande consistência das idéias nelas apresentadas.

 

João da Cruz morreu em 14 de dezembro de 1591 (aos 49 anos), em Úbeda, Jaén, Espanha, e, em 1728, foi canonizado por Bento XIII. É um dos Doutores da Igreja Católica Apostólica Romana.

 

 

Pensamentos de João da Cruz

 

 

Cristo de San Juan de la Cruz
(Por Salvador Dalí)

 

 

Não se contentar com o que diz o confessor é orgulho e falta de fé.

 

Onde é que te escondeste,
Amado, e me deixaste com gemido?
Havendo-me ferido;
Saí, por ti clamando, e eras já ido.

 

A mosca que pousa no mel não pode voar; a [personalidade-]alma que fica presa ao sabor do prazer sente-se impedida em sua liberdade e contemplação.

 

O mais leve movimento de uma [personalidade-]alma animada de puro amor é mais proveitoso do que todas as demais obras reunidas.

 

Por causa de prazeres passageiros, sofremos grandes tormentos eternos.

 

Deixei os trajos de festa,
Os de trabalho tomava,
Pendurei nos salgueirais
A música que levava,
Colocando-a na esperança
Daquilo que em Ti esperava.

 

Meus são os Céus, minha é a Terra, meus são os homens, meus são os justos e meus são os pecadores. Os Anjos são meus, minha é a Mãe de Deus e todas as coisas são minhas. O próprio Deus é meu e é para mim, pois, Cristo é meu e é tudo para mim.

 

Não faça coisa alguma, nem diga palavra alguma que Cristo não faria ou não diria, se se encontrasse nas mesmas circunstâncias.

 

Renuncie aos desejos, [às cobiças, às paixões, aos negacionismos, às fake news, às conspiratas, aos preconceitos, aos ódios, às separatividades, aos malfeitos, aos egoísmos, às vantagens, às miragens, às ilusões etc.], e você encontrará o que o seu Coração deseja.

 

Por sobre aquelas correntes
Que em Babilônia encontrava,
Ali me sentei chorando,
Ali a terra regava,
Recordando-me de ti,
Ó Sião, a quem amava.

 

Que felicidade o homem poder se libertar de sua sensualidade! Isto não pode ser bem compreendido, a meu ver, senão por quem o experimentou. Só então se verá claramente como era miserável a escravidão em que se estava.

 

Quem se queixa ou murmura não é cristão perfeito nem mesmo um bom cristão.

 

Estava me consumindo,
E só em ti respirava.
Em mim, por Ti, eu morria
E por Ti ressuscitava,
Porque a lembrança de Ti
Dava vida e a tirava.
Finava-me por finar-me
E a vida me matava,
Porque ela perseverando,
De ver-me, a mim, me privava.
Mofavam os estrangeiros,
Entre os quais cativos estava.

 

Senhor, quero padecer e ser desprezado por amor de Vós.

 

Extingue meus anseios,
Porque ninguém os pode desfazer.
E vejam-te meus olhos,
Pois, deles és a luz,
E para Ti somente os quero ter.

 

A pessoa que está presa por algum afeto a alguma coisa, mesmo pequena, não alcançará a união com Deus, mesmo que tenha muitas virtudes. Pouco importa se o passarinho está preso com um fio grosso ou fino, pois, ficará sempre preso e não poderá voar.

 

Para possuir Deus plenamente, é preciso nada ter, porque se o coração pertencer a Ele, não pode se voltar para outro.

 

O demônio teme a [personalidade-]alma unida a Deus como ao próprio Deus.

 

Onde é que te escondeste
Amado, e me deixaste com gemido?
Como o cervo fugiste,
Havendo-me ferido;
Saí por ti clamando, e eras já ido.
Buscando meus amores,
Irei por estes monte e ribeiras
Mas, não colherei as flores.

 

O afeto e o apego da [personalidade-]alma à criatura a torna semelhante a esta mesma criatura. Quanto maior a afeição, maior a identidade e semelhança, porque é próprio do amor tornar aquele que ama semelhante ao amado.

 

Dar tudo pelo Tudo.

 

De paz e de piedade
Era a ciência perfeita,
Em profunda soledade
Entendida (via reta);
Era coisa tão secreta,
Que fiquei como gemendo,
Toda ciência transcendendo.

 

A pessoa que caminha para Deus e não afasta de si as preocupações nem domina suas paixões caminha como quem empurra um carro encosta a cima.

 

No Amado acho as montanhas,
Os vales solitários nemorosos,
As ilhas mais estranhas,
Os rios rumorosos,
E o sussurro dos ares amorosos.

 

A constância de ânimo, com paz e tranqüilidade, não só enriquece a pessoa, como a ajuda muito a julgar melhor as adversidades, dando-lhes a solução conveniente.

 

Eu não soube onde entrava,
Porém, quando ali me vi,
Sem saber onde estava,
Grandes coisas entendi.
Não direi o que senti,
Que quedei não sabendo,
Toda ciência transcendendo.

 

O amor não consiste em sentir grandes coisas, mas, em se despojar e sofrer pelo amado.

 

O progresso da pessoa é maior quando ela caminha às escuras e sem saber.

 

Em noite tão ditosa,
E num segredo em que ninguém me via,
Nem eu olhava coisa,
Sem outra luz nem guia,
Além da que no Coração me ardia.

 

Deus quer mais de você um mínimo de obediência e de docilidade, do que todas as ações que você realiza por Ele.

 

Mesmo carregado de grandes e molestas tentações, o homem pode ir a Deus, desde que sua razão e vontade não consintam nelas.

 

Montes, vales, ribeiras,
Águas, ventos, ardores,
E, das noites, os medos veladores...

 

Não podendo o Espírito Santo dar a entender a abundância de seu sentido por termos vulgares e usados, fala misteriosamente por estranhas figuras e semelhanças.

 

Você deverá se tornar, no padecer, algo semelhante a este nosso grande Deus, humilhado e crucificado, pois, que esta vida só tem razão de ser se for para imitá-Lo.

 

Caminho de Espírito de Imperfeição: Do céu – nem isso; glória – nem isso; gozo – nem isso; saber – nem isso; consolo – nem isso; descanso – nem isso. Quanto mais quis buscá-los, com tanto menos me encontrei.

 

Todas as coisas da Terra e do céu, comparadas com Deus, nada são. Daí, se conclui que todas as criaturas nada são. Todo o ser das criaturas comparado ao ser infinito de Deus nada é.

 

Quando não o quis com amor de propriedade, foi-me dado tudo sem que eu buscasse. Depois que me pus em nada, acho que nada mais me falta: Sabedoria, Ciência, Fortaleza, Conselho, Inteligência, Piedade, Temor de Deus, Justiça, Força, Prudência, Temperança, Caridade, Alegria, Paz, Longanimidade, Paciência, Bondade, Benignidade, Mansidão, Fé, Modéstia, Continência, Castidade, Segurança, Amor, Esperança, Divino Silêncio, Divina Sabedoria, Perene Convívio. Só mora neste Monte a honra e a glória de Deus.

 

Quando a [personalidade-]alma se acha livre e purificada de tudo, em união com Deus, nenhuma coisa poderá aborrecê-la. Daqui se origina para ela, neste estado, o gozo de uma contínua vida e tranqüilidade, que ela nunca perderá nem jamais lhe faltará.

 

Para vir a saber TUDO, não queiras saber algo em nada. Para vir a saborear TUDO, não queiras saborear algo em nada. Para vir a possuir TUDO,não queiras possuir algo em nada. Para vir a ser TUDO, não queiras ser algo em nada. [Este TUDO deve ser entendido relativamente, em relação a tudo. A absolutividade de qualquer coisa é impossível. Se a absolutividade do que quer que seja fosse possível, ela produziria uma espécie de estaticidade, coisa que não prevalece no Unimultiverso.]

 

Minha [personalidade-]alma está desprendida
De toda coisa criada.
E sobre si levantada,
Numa saborosa vida,
Só em Deus arrimada.

 

Tal é a [personalidade-]alma que está enamorada de Deus. Não pretende vantagem ou prêmio algum, a não ser perder tudo e a si mesma, voluntariamente, por Deus, e nisto encontra todo o seu lucro.

 

Para chegares ao que não és hás de ir por onde não és.

 

Não fujas dos sofrimentos, porque neles está a tua saúde.

 

Deus é inacessível. Não repares, portanto, no que as tuas faculdades podem compreender nem teus sentidos experimentar, para que não te satisfaças com menos, e, assim, perderes a presteza necessária para chegar a Ele.

 

Mesmo que realizes muitas coisas, não progredirás na perfeição, se não aprenderes a negar a tua vontade e a te sujeitares, deixando a preocupação de ti próprio e das tuas coisas.

 

Nada, nada, nada. Nem a pele nem os ossos, tudo para Jesus Cristo. [Aproveito para recordar que a entidade Jesus Cristo não existe; o Cristo e o Mestre Jesus são entidades distintas.]

 

Parece-me que o segredo da vida consiste em aceitá-la tal como ela é. [Penso que aceitar passivamente as coisas não seja o caso; precisamos lutar e nos esforçar para mudar o que puder ser mudado. O que não devemos é nos revoltar ou nos insurgir contra as vicissitudes e as adversidades que a vida, a cada instante, de repente, nos oferece. Tudo é aprendizagem, e ninguém aprenderá nada, se viver amotinado. Na atualidade, o exemplo mais flagrante disto é esta PanCOVIDmia que estamos todos atravessando.]

 

No crepúsculo da vida, seremos julgados pelo amor.

 

A única linguagem que Deus
ouve é o silêncio do Amor.
Mas, o silêncio não é o amor,
porém, um preâmbulo para o Amor.

 

Sofrer por Deus é melhor que esperar milagres.

 

À medida que a noite se aproxima,
faz-me de novo lembrar,
que a alma que caminha no Amor,
não descansa nem se cansa.

 

O indício mais verdadeiro de que o Espírito está nos consumindo, é o fato de termos chegado a apreciar a solidão em silêncio.

 

Até que aprendamos
a esquecer e abrir mão
das exigências de nossas paixões,
e aprendamos a disciplinar nossa memória
e nossa imaginação,
nosso coração está destinado
a ficar sempre em tumulto,
e nossa
[personalidade-]alma nunca estará em paz.

 

 

 

 

Vivemos insatisfeitos com nós mesmos, indispostos com nosso próximo e preguiçosos em nosso relacionamento com Deus. Enfim, com nossa força espiritual enfraquecida, adoecemos.

 

Se permitirmos que nossas lembranças e nossa imaginação atravanquem nosso Coração, restará pouco ou nenhum espaço para Deus.

 

Jamais desfrutaremos da suavidade pura da união com Deus enquanto nos satisfizermos com as consolações passageiras desta vida. [Consolações passageiras desta vida = Miragens + Ilusões.]

 

 

Como isto pode ser possível? Pois é,
mas, muitos lorpas querem que seja!

 

 

Precisamos nos mover do conhecido para o desconhecido, da luz do dia para a noite escura da fé. [Aqui, penso que seja exatamente o oposto, isto é: precisamos nos mover do desconhecido (ignorância) para o conhecido (Sabedoria), da noite escura da fé (credulidade dogmático-religiosa) para a LLuz do Dia (Iniciação). Mas, reconheço que isto ainda é para poucos.]

 

Quando vemos com os olhos da fé, estamos vendo na escuridão. [Aqui também penso que não seja assim, pois, enquanto olharmos com os olhos da fé, continuaremos na escuridão.]

 

O amor é a inclinação, a força e a virtude de que a [personalidade-]alma se serve para ir a Deus, pois, é por meio do Amor que ela se une a Ele.

 

Que felicidade o homem poder se libertar da sua sensualidade! Isto não pode ser bem compreendido, a meu ver, senão por quem o experimentou. Só então verá claramente como era miserável a escravidão em que se estava.

 

Agrada mais a Deus uma obra, por pequena que seja, feita às escondidas e sem pretensão de que seja conhecida, do que mil feitas com desejo de que os homens as conheçam.

 

Sem arrimo e com arrimo,
sem luz e às escuras vivendo,
todo me vou consumindo.

Minha alma está desprendida
de toda a coisa criada,
e sobre si levantada
numa saborosa vida
só em seu Deus arrimada.
Por isso já se dirá
a coisa que mais estimo;
que minha alma se vê já
sem arrimo e com arrimo.

E se trevas eu padeço
em minha vida mortal,
não é tão grande o meu mal,
porque, se de luz careço,
tenho vida celestial;
porque o amor dá tal vida
quando mais cego vai sendo,
que tem a alma rendida,
sem luz e às escuras vivendo.

Tal obra faz o amor,
depois que eu o conheci,
que, se há bem ou mal em mim,
tudo o torna de um sabor
e transforma a alma em si;
e em sua chama bem temp’rada,
a qual em mim estou sentindo,
veloz e sem deixar nada,
todo me vou consumindo.

 

A Sabedoria entra pelo amor, pelo silêncio e pela mortificação; grande sabedoria é saber calar e não olhar os ditos, os feitos e as vidas alheias. [Tudo menos mortificação! Tudo menos flagelação do corpo!]

 

 

Absurdum Absurdorum
The Da Vinci Code
(Paul Bettany – Silas)

 

 

A linguagem que Deus mais ouve é o amor silente.

 

Para se enamorar de uma [personalidade-]alma, Deus não põe os olhos na sua grandeza, mas, na grandeza da sua humildade.

 

Mais do que quantas obras possas fazer, Deus prefere de ti a pureza de consciência, ainda que no menor grau.

 

Sem caridade, nenhuma virtude é graciosa diante de Deus.

 

Para chegarmos aonde queremos estar, é preciso passar por onde não queremos estar. Para chegarmos a possuir tudo, não deveremos desejar possuir nada. Para chegarmos a ser tudo, não deveremos desejar ser nada.

 

O que mais queres, ó [personalidade-]alma,
e que mais procuras
fora de ti,
se dentro de ti
tens as tuas riquezas,
os teus deleites,
a tua satisfação,
o teu Amado,
Aquele que a tua
[personalidade-] alma
deseja e busca?

Rejubila-te e alegra-te
no teu recolhimento
interior com Ele,
pois, o tens tão perto.

 

Quem para tudo souber morrer terá vida em tudo.

 

A [personalidade-]alma deve renunciar a todo o apetite voluntário, por mínimo que seja, o que significa não consentir, com pleno conhecimento e advertência, em imperfeição alguma, e chegar a um estado de liberdade e posse de si mesma.

 

Escolhe para ti um espírito forte, não apegado a coisa alguma, e encontrarás doçura e paz em abundância, porque a fruta mais saborosa e duradoura é colhida em terra fria e seca. [Entenda terra fria e seca como sendo, fundamentalmente, ausência de desejos, de cobiças e de paixões.]

 

A união não consiste em compreender, gostar, sentir ou imaginar Deus, nem está em qualquer outra coisa, senão na pureza e no amor, isto é, na desnudez e na resignação perfeitas de todas as coisas unicamente por Deus.

 

As paixões, quando desordenadas, produzem na [personalidade-]alma todos os vícios e imperfeições, e, quando ordenadas e bem dirigidas, geram todas as virtudes.

 

 

 

 

É manso quem sabe suportar o próximo e se tolerar a si mesmo.

 

Um ato de virtude gera na [personalidade-]alma suavidade, paz, consolação, luz, pureza e fortaleza.

 

Procurai lendo e encontrareis meditando; clamai orando e abrir-se-vos-á contemplando.

 

Em uma noite escura,
De amor em vivas ânsias inflamada
Oh! ditosa ventura!
Saí sem ser notada,
Já minha casa estando sossegada.

Na escuridão, segura,
Pela secreta escada, disfarçada,
Oh! ditosa ventura!
Na escuridão, velada,
Já minha casa estando sossegada.

Em noite tão ditosa,
E num segredo em que ninguém me via,
Nem eu olhava coisa,
Sem outra luz nem guia
Além da que no coração me ardia.

Essa luz me guiava,
Com mais clareza que a do meio-dia,
Aonde me esperava
Quem eu bem conhecia,
Em sítio onde ninguém aparecia.

Oh! noite que me guiaste!
Oh! noite mais amável que a alvorada!
Oh! noite que juntaste
Amado com amada,
Amada já no Amado transformada!

Em meu peito florido,
Que, inteiro, para Ele só guardava,
Quedou-se adormecido.
E eu, terna, O regalava,
E dos cedros o leque O refrescava.

Da ameia a brisa amena,
Quando eu os seus cabelos afagava
Com sua mão serena
Em meu colo soprava,
E meus sentidos todos transportava.

Esquecida, quedei-me,
O rosto reclinado sobre o Amado.
Tudo cessou. Deixei-me,
Largando meu cuidado,
Por entre as açucenas olvidado.

 

Aquela Eterna Fonte está escondida,
Mas, bem sei onde tem sua guarida,
Mesmo de noite.
Sei que não pode haver coisa tão bela,
E que os céus e a Terra bebem dela,
Mesmo de noite.

 

Nossa [personalidade-]alma deve estar despida [vazia] de tudo, para que seja um altar digno de servir de morada à Divina Majestade.

 

E é de tão alta excelência
Aquele Sumo Saber,
Que não há arte ou ciência
Que O possam apreender.
Quem se souber vencer,
Com um não-saber-sabendo,
Irá sempre transcendendo.

 

 

Que Venha a Noite
(Um Poema Inspirado em João da Cruz)

 

 

Que venha a Noite.
Que venha o que vier.
Que inicie já o 'Conticinium'.
1
Eu estou pronto.
Não quero mais
continuar um tonto.

Que venha a Noite.
Que venha o que vier.
Que inicie já o 'Conticinium'.
Chega destes dias...
Tontos desencontros...
Tontas euforias...

Que venha a Noite.
Que venha o que vier.
Que inicie já o 'Conticinium'.
Cansei de mim mesmo...
Das 'miralusões'...
2
De viver a esmo...

Que venha a Noite.
Que venha o que vier.
Que inicie já o 'Conticinium'.
Cansei das alegrias vadias...
Das idas e vindas...

Das aflições e acedias...

Que venha a Noite.
Que venha o que vier.
Que inicie já o 'Conticinium'.
Cansei de não-ser...
De ver sem Enxergar...

De saber sem S(h)aber...

Que venha a Noite.
Que venha o que vier.
Que inicie já o 'Conticinium'.
Cansei ajoelhar e rogar...
De orar e pedir...

De estar sem Estar...

Que venha a Noite.
Que venha o que vier.
Que inicie já o 'Conticinium'.
Milênios nesta Cruz.
Enojei destes dias!
Mas... Verei a LLuz?

 

 

 

 

 

______

Notas:

1. Na Doutrina Mística de Santo António de Lisboa, que nasceu em Lisboa no final do século XII, o Conticinium (Conticínio) a primeira fase da Noite, em que tudo está silente. É o tempo, em que são satisfeitas as seduções blandiciosas da carne – carnis suavia blandimenta. O Santo ensinou que, para vencer as tentações próprias do Conticínio, é preciso meditar sobre as iniqüidades praticadas, considerar o exílio (e desejar ardentemente a reintegração) e contemplar o Criador. Auxiliado pela razão e pela discrição, o principiante vai subindo, degrau por degrau, a escada da crucifixão: a razão dominando os sentidos e esclarecendo sobre o bom caminho (o Bom Combate). Assim, derramando lágrimas, envergonhado, vexado e cabisbaixo, vai o postulante trilhando a Senda que levará à Illuminação. Lentamente, os sentidos físicos e os apetites do corpo vão sendo dominados, e os incipientes passam para o estádio de aproveitantes – fase da Media Nox (Meia-Noite). Todavia, no que concerne ao sofrimento moral, este se vai intensificando. É o reconhecimento tácito da queda, do afastamento da LLuz, do exílio de Deus, da consciência plena da ainda permanência nas trevas da ignorância. É a angústia por desejar alcançar a LLuz Maior, por desejar ardentemente realizar o Cristo Interno e, em graça total, contemplar o Criador. É o desespero por ter, tenuemente, vislumbrado a possibilidade de se tornar uno com o Pai – o Deus de seu Coração – e de não ter podido, ainda, realizar o sonho dos sonhos, a Beleza das belezas. É uma dor lancinante. Um desespero sufocante. Um horror atemorizante. É a Noite Negra. É a crucificação individual. É o inferno interior. É a compreensão do exílio da Vida. A Noite Negra traz à lembrança a fase negra da Crisopéia. Mas... Um Dia... Aurora (Aurora)! Benedicta Aurora! Aurora Incomparabìlis! Divinização consciente! Entretanto, para tudo isto, precisamos estar preparados ou nos preparar, pois, a Noite Negra não tem, ordinariamente, a duração de uma noite física. Poderá durar uma vida... Poderá durar zil vidas... Tudo depende de nós.

2. Miralusões = Miragens + Ilusões.

 

Música de fundo:

Dark Night of the Soul
Composição e interpretação: Philip Wesley

Fonte:

https://wapos.mobi/track/Nicky%20Bendix%2
0-%20Dark%20Night%20of%20the%20Soul

 

Páginas da Internet consultadas:

https://www.livrosgratis.com.br/

https://dribbble.com/shots/717569-Animation-The-Devil

https://castelointerior-moradas.net/tag/noite-
escura-da-alma-sao-joao-da-cruz/

https://alexcastro.com.br/noite-escura-de-joao-da-cruz/

https://jovensconectados.org.br

https://giphy.com

https://jovensdacruz.com.br/oito-conselhos
-de-sao-joao-da-cruz-para-todo-catolico/

https://www.pensador.com/autor/sao_joao
_da_cruz_canticos_espirituais_canto_1/

https://www.pensador.com

https://inglesnarede.com.br

https://tenor.com

https://giphy.com/search/confused

https://pt.wikiquote.org/wiki/São_João_da_Cruz

https://alexandroroque.blogspot.com/2017/04/
cristo-de-san-juan-de-la-cruz-salvador.html

https://br.pinterest.com/pin/607071224751543989/

https://pt.wikipedia.org/wiki/João_da_Cruz

 

Direitos autorais:

As animações, as fotografias digitais e as mídias digitais que reproduzo (por empréstimo) neste texto têm exclusivamente a finalidade de ilustrar e embelezar o trabalho. Neste sentido, os direitos de copyright são exclusivos de seus autores. Entretanto, como nem sempre sei a quem me dirigir para pedir autorização para utilizá-las, se você encontrar algo aqui postado que lhe pertença e desejar que seja removido, por favor, entre em contato e me avise, que retirarei do ar imediatamente.