A
SUPREMA REALIZAÇÃO
(5ª Parte)
Rodolfo Domenico Pizzinga
Informação Preliminar
Este estudo se constitui da 5ª e última parte de um conjunto de fragmentos garimpados e eventualmente comentados na obra A Suprema Realização, de autoria de Jiddu Krishnamurti, que reúne o essencial de algumas palestras realizadas pelo grande pensador, na Índia, em 1965, nas quais ele abordou temas de crucial importância como: só a mente lúcida vê o real, o poder do amor, a virtude do silêncio, uma diferente maneira de viver, vida criadora, urge que nos transformemos, morrer para o passado etc.
Breve Biografia
Jiddu Krishnamurti
Jiddu Krishnamurti (Madanapalle, 11 de maio de 1895 – Ojai, 17 de fevereiro de 1986) foi um filósofo, escritor, orador e educador indiano. Proferiu discursos que envolveram temas como revolução psicológica, meditação, conhecimento, liberdade, relações humanas, a natureza da mente, a origem do pensamento e a realização de mudanças positivas na sociedade global. Constantemente, ressaltou a necessidade de uma revolução na psique de cada ser humano, e enfatizou que tal revolução não poderia ser levada a cabo por nenhuma entidade externa seja religiosa, seja política, seja social. Uma revolução que só poderia ocorrer através do autoconhecimento, bem como da prática correta da meditação do ser-humano-aí-no-mundo liberto de toda e qualquer forma de autoridade psicológica.
O cerne dos seus ensinamentos consiste na afirmação de que a necessária e urgente mudança fundamental da sociedade só poderá acontecer através da transformação da consciência individual. A necessidade do autoconhecimento e da compreensão das influências restritivas e separativas das religiões organizadas, dos nacionalismos e de outros condicionamentos foram por ele constantemente realçadas.
Fragmentos Krishnamurtianos
Como [ainda] não somos capazes de compreender a questão da morte, tratamos de inventar teorias que nos pareçam satisfatórias e nos proporcionem segurança, conforto e consolação. Entretanto, quando se compreende o que é falso, esse falso deixa de existir. [Mas, se raciocinarmos falsamente, o falso continuará falso, porque a Verdade não poderá surgir do que é fictício, quimérico e imaginário.] E, a menos que compreendamos a questão da morte, que entremos em direto contato com esta questão, este problema e a nossa vida serão e permanecerão sempre muito superficiais, e a nossa existência não terá nenhum significado efetivo. Assim, para compreendermos esta questão da morte, deveremos nos libertar do medo, que inventou várias teorias sobre vida futura. E esta compreensão significa entender o que é morrer e o que é Viver, e que não é simplesmente pugnar dia-a-dia, que não é estar em conflito, que não é se deixar torturar ou pior: se torturar a si próprio a fim de achar Deus. O ser humano que se tortura e que se cilicia para encontrar Deus não é digno de achá-Lo. Nunca achará Deus – [o Deus do seu Coração]! Pela deformação, não se encontra a Verdade. Necessitamos de uma mente lúcida, sã, racional e vigorosa, e não de uma mente torturada, deformada, ilógica e medrosa. E, para entrarmos em contato com a Verdadeira Vida, precisaremos nos livrar do medo, da nossa própria vida comezinha, medíocre e ridícula, de nossas ansiedades, de nossos conflitos, de nossa avareza, avidez e inveja, seja por causa de dinheiro, seja por causa de Deus, seja pelo que for. De tudo isto deveremos nos libertar, pois, só assim entraremos em contato direto com a Verdadeira Vida. Então, compreenderemos que o Viver está relacionado e amalgamado com o morrer, pois, teremos ultrapassado a nossa mente pequenina, mesquinha e trivial com suas tribulações, aflições e imprecisões. E quando soubermos o que é Viver, saberemos também o que é Morrer [pois, na verdade,
é
e
é
.]
Só a mente que puser um termo definitivo no sofrimento poderá se Libertar e alcançar a Sabedoria [ShOPhIa]. E só quem estiver livre do sofrimento poderá conhecer o Amor e saber o que significa Amar. Basicamente, por que sofremos? Sofremos porque tememos a morte, mas, na verdade, o que tememos não é o desconhecido, porém, o que tememos é perder o conhecido, pois, a ele estamos apegados. Portanto, a verdadeira questão é dar fim imediato ao medo de morrer, e não ao que acontecerá após a morte. Assim, se não soubermos pôr termo às coisas insignificantes da vida, as coisas que conhecemos e às quais a nossa mente está apegada – como, por exemplo, hábitos sexuais, hábitos psicológicos e hábitos físicos – continuaremos a viver em extrema agitação, em extrema confusão e em extremo sofrimento. Apenas a mente confusa sofre, e não aquela que pensa com lucidez, que entra em direto contato com os fatos. Morrer, pois, é morrer para as coisas que conhecemos, não apenas as desagradáveis, mas, também, as agradáveis, porque todas são retardantes e escravizantes. Todavia, morrer tanto para o prazer quanto para a dor só será possível se aplicarmos toda a nossa atenção a cada pensamento, a cada sentimento, a cada movimento que fazemos, sem contradição, sem separarmos aquilo de que gostamos de aquilo de que não gostamos. [Morrer é
para todos os apegos.]
Prestar atenção não é concentração. Quando nos concentramos, o que acontece? Estamos nos isolando, resistindo e repelindo todos os pensamentos, exceto aquele pensamento em que queremos nos concentrar. Nossa concentração, pois, gera resistência e, por conseguinte, não gera liberdade. A verdadeira concentração, que é atenção total, não exclui nada; nela não há esforço.
Viver não deve ser uma batalha, uma tortura, um desespero. Viver não é uma coisa de que tenhamos que fugir, por exemplo, para as montanhas, para uma caverna ou para um mosteiro. Se fugimos, é porque o nosso viver se tornou uma tortura, um horrível pesadelo. O fato é que, para a maioria de nós, o Amor pouco significa. Está cercado pelo ciúme e pelo ódio. Naturalmente, sem Amor, sem esse sentimento da Beleza, a vida se torna vazia. E, nos sentindo vazios, procuramos os deuses criados pelos seres-humanos-aí-no-mundo [que são especialistas em criar deuses, religiões e seitas]. Porque estamos vazios, as crenças, os dogmas e os rituais se tornam muito importantes. Queremos preencher o nosso vazio interior com essas insignificâncias autoritárias criadas pelos seres-humanos-aí-no-mundo. Assim, se desejarmos saber o que é o Amor, precisaremos estar livres do ciúme, do conflito, do desejo de dominar, do desejo de poder etc. Quer dizer, para sabermos o que é o Amor, deveremos viver em paz, não fora da vida, porém, na vida real de cada dia.
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O Eremita Esquizofrênico
— Com supercagaço de pecar
e de ir morar no inferno,
me mandei para os Himalaias.
Mas, em pensamento, continuei a pecar.— Com supercagaço de pecar
e de ir parar no inferno,
me escondi em uma caverna.
Mas, em pensamento, continuei a pecar.— Com supercagaço de pecar
e de ir parar no inferno,
me internei em um eremitério.
Mas, em pensamento, continuei a pecar.— Com supercagaço de pecar
e de ir parar no inferno,
me autoflagelei diariamente.
Mas, em pensamento, continuei a pecar.— Com supercagaço de pecar
e de ir parar no inferno,
orei e jejuei ininterruptamente.
Mas, em pensamento, continuei a pecar.— Com supercagaço de pecar
e de ir parar no inferno,
como Orígenes,1 castrei-me a mim mesmo.
Mas, em pensamento, continuei a pecar.— Lutei para não pecar,
mas, como nunca compreendi xongas,
Não me libertei dos meus milenares achismos e cousismos.
Mas, em pensamento, continuei a pecar.— E no final, já doente,
em estado de coma profundo,
é incrível, mas, é verdade,
mas, em pensamento, continuei a pecar.— O mais dantesco de tudo,
é que já morto e enterrado,
eu saçaricava no Plano Astral,
mas,, continuei a pecar.
Há uma coisa muito importante em nossa vida: a criação. Mas, a mente que se sujeita e que se escraviza à autoridade, à tradição, nunca se achará no estado de criação, porque a autoridade gera medo, e o medo impede a criação. A autoridade, em qualquer forma, é, psicologicamente, a coisa mais destrutiva que há, porque ela nos manda obedecer e nós obedecemos, sem investigar, sem compreender, sem buscar e sem descobrir por nós mesmos. Enfim, para descobrirmos e criarmos, deveremos ser a nossa própria lei, o nosso próprio guia. Temos de viver e de ser a nossa própria lei. Por conseguinte, não necessitamos de autoridade alguma, e isto significa que deveremos aprender a estar de todo sós, não exteriormente, porém, completamente só em nosso interior. Só assim não haverá medo. Só assim haverá criação. Só assim haverá Compreensão. Só assim haverá Libertação. [Só assim, de fato, nos tornaremos Deuses Conscientes Eternos.]
— Obedeça sempre,
e eu sempre obedecia.
Não questione nunca,
e eu nunca questionava.
Faça deste jeito,
e eu, cagão, fazia.
Faça daquele jeito,
e eu, cagão, fazia.
Não faça isto,
e eu, cagão, não fazia.
Não faça aquilo,
e eu, cagão, não fazia.
Seja desta forma,
e eu, submisso, era.
Seja daquela forma,
e eu, submisso, era.
Não seja desta forma,
e eu, submisso, não era.
Não seja daquela forma,
e eu, submisso, não era.
Isto não é permitido,
e eu cumpria a ordem.
Isto é permitido,
e eu sentava a pua.
Sempre obedeci
e sempre imitei
o meu nobre guru,
e nunca fui eu-mesmo,
e nunca criei nada,
e nunca Compreendi,
e nunca me Libertei.
Vivi escravo
de uma religião
e dos seus dogmas,
de um guru que comandava
e de um deus inventado,
que, quando eu era criança,
à força, me impuseram,
e dos quais nunca me livrei.
E nunca me tornei o Deus
que, na verdade, sempre fui,
e que nós todos somos.
E, em uma espécie de
buraco negro sem-fim,
joguei no lixo
a minha encarnação.
Meditação não é ficar sentado em um canto, pegando no nariz e repetindo palavras estúpidas; isto não é meditação, absolutamente: é auto-hipnotismo. Meditação é o processo de compreensão da vida, de libertação de todas as nossas lutas, não futuramente, porém, imediatamente, ou seja, é a aplicação total e consciente da atenção [Transracional]. Meditação é SILÊNCIO total da mente. [É não querer e não pedir; é não temer e não coisar; é Ser e deixar de não-ser.] Só a mente que está em SILÊNCIO, e não a que foi disciplinada, [apocopada, acorrentada e dogmatizada], Compreenderá e se Libertará. Só a Mente Silenciosa poderá Compreender a criação. Enfim, só Compreenderemos o que existe além do espaço-tempo – [no ESPAÇO-TEMPO ETERNO e INCRIADO que não é espaço-tempo, isto é, in Corde] – se a nossa Mente estiver muito Silenciosa – [totalmente Silenciosa]. Esta Mente Silenciosa não é uma mente morta, porém, sobremodo ativa. O que está ativo e se move com uma velocidade está sempre em SILÊNCIO. Enfim, só a Mente Silenciosa é Religiosa, e só ela poderá estabelecer a Paz no mundo. Só a mente capaz de Amar saberá o que é Viver em Paz – [em Paz Inverencial, com tudo, com todos, sem exceção. Enquanto, por apego – desejos, cobiças e paixões – excetuarmos o que quer que seja e quem quer que seja, pelo motivo que for, continuaremos aprisionados e escravizados a nós mesmos, e não nos libertaremos de nós mesmos. A Lei é: Mesmo + Outro = 1. Sem exceções. Toda exceção é um preconceito.]
A Ordem só poderá se realizar efetivamente se descobrirmos, por nós mesmos [e em nós mesmos], o que gera a desordem. Portanto, só da Compreensão do Verdadeiro fator da desordem, naturalmente, nascerá a Ordem. Assim, da Compreensão da desordem resultará uma Ordem Natural, e não quando nos ajustamos ao que é considerado como ordem (padrão ideológico, [padrão bolsonarista, padrão golpista, padrão lulista, padrão trumpista etc.], padrão comunista, padrão capitalista, padrão religioso, [padrão 'cousista'], padrão coletivo, padrão individual etc.). Estes tipos falsos e ilusórios de ajustamentos [senso comum] só poderão gerar cada vez mais e sempre mais desordem.
Como cada um de nós, como ente humano, é ao mesmo tempo indivíduo e sociedade, não há, propriamente, uma desordem exterior e uma desordem interior. Essencialmente, a desordem exterior e a desordem interior são uma só e a mesma coisa. E, para compreendermos a desordem ou para compreendermos a Verdade ou o nome que se preferir, necessitaremos de uma ordem extraordinária, que não é realizável mediante revolta, ajustamento ou adoção de uma fórmula, seja socialista, seja capitalista, seja religiosa, seja outra qualquer.
Precisamos estar conscientes de que uma das razões da enorme, inconciliável e destrutiva desordem que se vê no mundo são as divisões causadas por todas as religiões. Este mundo está separado pelas religiões, com seus dogmas, seus rituais, suas crenças e suas superstições, e, por isto, de modo nenhum as religiões poderão unir os homens. O fato inconteste é que as crenças organizadas, com suas igrejas e seus rituais, se converteram em enormes corporações, empresas mercantis, sem nenhum ponto de contato com a Verdadeira Religião [que, inevitavelmente, surgirá ao longo desta Era de Aquarius —› Teociência ‹— de tal sorte que os Mistérios esquecidos e ocultos da Antigüidade serão revelados, naquilo que puderem ser revelados].
O nacionalismo é um outro produto venenoso que causa desordem, pois, o nacionalismo jamais unificará os seres-humanos-aí-no-mundo. Não existe esse conceito absurdo, impróprio, incongruente, estúpido, tolo e sem sentido de guerra justa, ainda que os seres-humanos-aí-no-mundo tenham aceitado a guerra como norma da vida! Com mais armamentos, mais generais e mais soldados a paz é impossível. Enquanto houver governos soberanos haverá guerras. Matar é simplesmente iníquo. O nacionalismo, pois, é desordem e gera desordem.
Para encontrarmos a Verdade, deveremos ser livres, deveremos estar sós, deveremos nadar contra a corrente, deveremos batalhar [e lutar o Bom Combate].
Não se pode rejeitar uma coisa apenas parcialmente, porém, completamente. Não se pode rejeitar um veneno só em parte, porém, totalmente. Ou se rejeita tudo ou não se rejeita nada.
A Verdade e a Liberdade não virão através de uma certa organização, de uma certa crença, de um certo guru. Para mim, a palavra guru significa veneno.
Qualquer mudança movida pela idéia de punição [castigo] e de recompensa [prêmio] não mudará xongas, pois, não é uma verdadeira mudança. [Imperativos hipotéticos, supositícios, duvidosos, incertos e interesseiros não são modificadores, porque são procedimentos incapazes de produzir os efeitos pretendidos.] Não há punição nem recompensa. Deus não irá nos recompensar pelo nosso comportamento virtuoso. Nosso comportamento, bom ou mau, nenhuma importância tem para Deus. Considerando o que está sucedendo no mundo, sabendo que as religiões nada significam (pois, nunca significaram nada), percebendo a futilidade dos livros sagrados e o absurdo de seguir qualquer religião ou qualquer guru, por mais que isso seja vantajoso e agradável, atinando que ninguém poderá nos dar liberdade e uma mente sã, vigorosa e profundamente silenciosa, que, no porvir, não haverá punição nem recompensa e compreendendo, enfim, a necessidade de nos transformarmos radical, fundamental e intimamente, qualquer mudança ou transformação efetiva e categórica dependerá exclusivamente de nós. [A Regra é simples e não há outra: Tudo depende exclusivamente de nós.]
Ou vemos a coisa superficialmente, confortavelmente, e, iludidos, não mudamos, ou vemos a coisa efetivamente e, conscientemente, mudamos.
Não existe desperdício de tempo; existe, sim, desperdício de vontade e de intenção. [Até porque o tempo (espaço-tempo) não existe; a idéia de tempo (espaço-tempo) é uma ilusão.]
O que poderá haver de mais dramático do que a nossa incapacidade para nos libertarmos dos nossos nacionalismos, dos nossos preconceitos e das nossas religiões? Para nos libertarmos de tudo isto, na verdade, para nos libertarmos de tudo, é necessário uma extraordinária energia, investigação, aplicação e atenção, e requer que nos despojemos de todas as nossas vaidades milenares e de toda a nossa milenar estupidez.
Com relação a nada jamais poderemos dizer: — Não tenho nada com isso. [Ora, se somos todos Um, temos tudo com tudo.]
Você já reparou que a maioria das pessoas costuma não se importar muito com a questão da violência-não-violência, contanto que esteja em segurança? As pessoas preferem simplesmente boiar na corrente.
Na realidade, mudamos um tiquinho, de vez em quando, mas, sempre acompanhando a moda. Mas, se não mudarmos em uma dimensão mais elevada, em um nível diferente da Consciência e do Coração humanos, que são o Centro de todas as relações, não importa o que se faça, jamais se criará uma sociedade e entes humanos S[h]ábios, Verdadeiramente Civilizados e Religiosos. O fato é que, se continuarmos a viver no casulo das nossas próprias idéias, jamais mudaremos. A Verdadeira Mudança só poderá acontecer no Centro, o que promoverá uma revolução no âmago de nosso ser. Todavia, a simples compreensão intelectual de determinada coisa, por certo, não é a Verdadeira Compreensão. Por conseguinte, só haverá Compreensão quando o intelecto, as emoções, os nervos, os ouvidos, os olhos, ou seja, todo o nosso Ser estiver totalmente envolvido com o problema. Só quando o nosso Ser Inteiro reagir completamente a um problema específico, haverá, então, possibilidade de este problema ser, [talvez], compreendido. E esta própria Compreensão é Ação; não há primeiro Compreensão e depois Ação. Logo, a Ação não difere da Compreensão, pois, não são duas coisas separadas.
Estar em relação é estar em comunhão, é estar em mútua compreensão. Todavia, a relação-comunhão será inteiramente impossível, se continuarmos a viver na torre de marfim da nossa prisão particular [construção mental multimilenária degradada e degradante], atrás de uma máscara carcomida e medonha de astúcia, de falácia, de ambição, de egoísmo, de avidez, de inveja, de vulgaridade, de vaidade, de mesquinhez, de preconceito, de intolerância, de dissimulação, de hipocrisia, de fingimento, de desrespeito, de separatividade, de opiniões, de 'cousismos', de achismos, de religiosidade, de dogmas, de fanatismo, de ofensividade, de belicosidade, de medo, de isolamento, de desfraternidade, de crítica, de xenofobia, de nacionalismo, de não-aceitação do outro como o outro é etc. Enfim, só quando houver um estado de relação, haverá possibilidade de a ação ser acoplada e de estar conectada ao fato ou de um fato produzir uma ação concertada. E isto requer observação e atenção. A observação e a atenção para o fato, a comunhão imparcial com o fato e a relação com o fato produzirão a mudança, o avanço e a libertação. [Tudo isto pode ser resumido em uma palavra: Illuminação.]
Sou isto ou sou aquilo. Enquanto isso me der prazer, enquanto me der satisfação, continuarei a ser isto ou ser aquilo. Por exemplo: gosto de ser violento, quando compensa, e não gosto de ser violento, quando não compensa. Não há afeição, não há ternura, não há graça, não há beleza, não há amor. Percebo isto, mas, não sei como alterar essa coisa que se chama violência. Percebendo-o, pergunto a mim mesmo: como poderei promover uma radical transformação na base mesma da minha violência, ou seja, no meu ego, constituído de memórias acumuladas, de esperanças, de temores, de ansiedades, de conceitos (que sou a [personalidade-]alma, que sou o Atman, que sou Deus), essencialmente baseados no prazer e, portanto, na violência? Este é o maior problema de todos nós. O fato é que vivemos de palavras vãs [e de idéias e ideais mal constituídos e mal construídos], e, por isto, temos o Coração vazio, seco, cruel. Assim, para compreender, para entrar em comunhão direta com a violência, a coisa mais importante é não buscar explicações, nem fugas, pois, a fuga é também querer descobrir causas ou achar soluções. É necessário, portanto, que estejamos intensamente cônscios do perigo embutido na própria palavra que define um fato. E, para compreendermos e mudarmos, é necessário que estejamos conscientes de que o observador é a coisa observada, e, no caso, o observador é violência. O observador não está separado da coisa chamada violência.
Todo adiamento, toda gradualidade e todo intervalo de tempo são fatores de desordem. O tempo, pois, como adiamento, é evitação do fato. E quando evitamos ou adiamos uma coisa, estamos criando mais confusão, mais aflição, mais perturbação, mais conflito e, por conseguinte, mais desordem. O real é o fato, e toda abstração constitui uma barreira. Qualquer explicação, qualquer teoria, qualquer opinião, qualquer esforço para evitar o fato, o elemento tempo e o observador que diz que está observando a coisa são abstrações, e devem ser eliminadas. Enquanto houver a barreira da abstração, não estaremos em relação com o fato. Por conseguinte, só quando nos acharmos, todos, inteiros, em contato com o fato, este fará a revolução. Nem a vontade, nem a decisão, nem dizer farei sobre isto alguma coisa promoverão a necessária revolução em nosso interior.
Quando alguém descobre um fato e reage se tornando deprimido ou dizendo eu não queria ser assim, está evitando o fato. Só quando descobrirmos os fatos, observando-nos, será aberta uma Porta Maravilhosa com a qual nunca sonhamos. E nascerá, daí, uma Afeição ilimitada, um ilimitado Amor. Sem o Amor, o que quer que se faça, nunca haverá ordem, nem paz. Com o Amor, tudo nos será possível.
No íntimo de cada um de nós, conscientes e inconscientes, há tantas contradições, tantos conflitos não resolvidos e tantos problemas firmemente enraizados. E desejamos nos comunicar acerca destes problemas. Mas, não adianta e não resolverá nada, por exemplo, interpretar intelectualmente e seguir as coisas ditas por outros – Moisés, Davi, Jacó, Isaac, Ismael, Abraão, Sankara, Buddha, Cristo, Santo Agostinho, Santo Tomás de Aquino, Mohammed etc. Precisamos descobrir por nós mesmos as origens de todos os nossos problemas e solucioná-los. [O esforço é pessoal e inajudável. A mudança só poderá nascer dentro, em nosso Coração, nunca fora, por intermédio de nada nem de ninguém.] Precisamos descobrir, com o nosso Coração, com a nossa mente, com os nossos ouvidos, com os nossos olhos, com todo o nosso ser e estar em direta comunhão com todos os nossos problemas. Só deste modo nós poderemos resolvê-los. Temos, enfim, de compreender esta coisa que é a nossa vida, que são as nossas relações. Precisamos aprender a escutar todos os movimentos da vida, porque a vida é um movimento de relações. Temos de escutar este movimento, da manhã à noite, em todas as horas. Escutá-lo atentamente, sem procurar traduzi-lo, sem dizer isto é certo, aquilo é errado, isto é bom, aquilo é mau, isto deve ser, aquilo não deve ser. Escutar, simplesmente, a canção deste extraordinário movimento da vida. E, ao escutá-la atentamente, começaremos a compreendê-la. Porque a vida não é algo exterior, que está a passar ao nosso lado, do lado de fora e que observamos. A vida é este movimento que há dentro de nós mesmos e do qual fazemos parte; é este movimento que temos de perceber, que temos de clarificar e que temos de compreender, amar e acompanhar. Temos de nos embeber completamente do seu significado, pois, do contrário, nossa mente permanecerá superficial em extremo e continuará escravizada. [Fica esta pergunta para reflexão: o que poderá ser pior – fugir ou desistir?]
Se não nos libertarmos da contradição, do conflito, da dor e do sofrimento interiormente existentes, não haverá possibilidade de termos uma mente clara e, graças a essa claridade, silenciosa. Só a mente silenciosa é criadora; só ela poderá compreender o que é a Verdade e criar o que é Verdadeiro, pois, a Verdade não é uma coisa definitiva, porém, uma coisa viva, em perpétua criação. [Por isto, não há uma Verdade Absoluta e definitivamente alcançável e inultrapassável; para nós, a Verdade é uma construção relativa, ininterrupta e permanente, isto é: uma seqüência dialética interminável de verdades relativas relativamente compreendidas e relativamente realizadas. Logo, um céu para sempre ou um inferno para sempre são histórias da carochinha. Na verdade, são crueldades dogmáticas que foram impostas à Humanidade, e das quais poucos conseguem se livrar.]
Este trem nunca teve começo e jamais terá fim.
E surgiu a 3ª Ronda.
E pintou a 4ª Ronda.
E está vindo a 5ª Ronda.
E surgiu a 4ª Raça-raiz.
E pintou a 5ª Raça-raiz.
E está vindo a 6ª Raça-raiz.
E surgiu o Catolicismo.
E pintou o Islamismo.
E está vindo o Teocientificismo.
E surgiu a 1ª Revolução Industrial.
E pintou a 2ª Revolução Industrial.
E já está aí a 3ª Revolução Industrial.
E surgiu a 1ª Onda Digital.
E pintou a 2ª Onda Digital.
E está vindo a 3ª Onda Digital.
Não se pode dizer compreenderei, primeiro, o esforço, depois, o conflito, depois, o sofrimento e, finalmente, a ação. Todos estão estreitamente entrelaçados, e compreender qualquer um deles é compreender os demais. E a ação não pode estar baseada na fragmentação, porém, em uma ação total, em um movimento total. [Tudo, sem exceção, está entrelaçado —› Entrelaçamento Quântico Unimultiversal.]
Entrelaçamento ou Emaranhamento Quântico Unimultiversal
O estado de liberdade significa liberdade-em-si, e não estar livre de alguma coisa. [Mutatis mutandis, é como a coisa-em-si kantiana, que é algo que existe por si própria – em-si – independentemente de o observador perceber sua existência, tornando-a um objeto.]
Nada poderá ser mais destrutivo e doentio para um ser-humano-aí-no-mundo do que aceitar e se ajustar, [como gado de manada]. Nada poderá ser mais terrível do que admitirmos: foi sempre assim e assim sempre será. Nada poderá ser mais deletério do que nos acostumarmos com as coisas e ficarmos repetindo o mesmo padrão de existência, dia após dia, ano após ano, até morrermos. [O pior é que, quando reencarnarmos, voltaremos exatamente para o mesmo nível do qual saímos, para a mesma oitava na qual desencarnamos. Natura non facit saltus. A Natureza não dá saltos. Este tem sido um princípio importante da Filosofia Natural. Aparece como um axioma nas obras do matemático, filósofo, cientista e diplomata Gottfried Wilhelm Leibniz (1º de julho de 1646 – 14 de novembro de 1716): La Nature ne fait jamais des sauts (a Natureza nunca dá saltos).]
A primeira coisa que se deve aprender é não aceitar o sofrimento, e não aceitando o sofrimento nossa mente se torna alerta e penetrante e, por conseguinte, capaz de investigar e de encontrar a saída. [Mas, só poderemos não aceitar o sofrimento, se, por muito esforço, o compreendermos, porque, em última análise, por ignorância – sempre por ignorância – fomos/somos nós que o fabricamos (Causa —› Efeito). Entretanto, antes, precisaremos aprender a Amar Impessoalmente (1 ± 1 = 1). Logo, não custa nada repetir: Natura non facit saltus. E é por isto que, há milênios, estamos peregrinando. 4ª Ronda. 5ª Raça-raiz. 26ª. E a maioria da Humanidade ainda está cega, surda e muda. É também é por isto que muitos vão ficando pelo caminho e sendo deslocados para sistemas menos evoluídos. Mas, quando terminar a 49ª... Aí, não tem mais jeito! Prâlâya. Inatividade multimilenar.]
Aprender difere de acumular conhecimentos. A mente que apenas acumula conhecimento, experiência e cultiva a memória, segundo a qual atua, não aprende. Aprender significa aprender constantemente, sem acumular. Enfim, temos de nos acostumar com o conflito, e, de tal sorte, o ato de aprender é sempre novo. Então, é aprendo, não aprendi ou aprenderei.
Quando a mente não é nova, quando não está ativa no presente, a aprender, então, ou o sofrimento se torna um objeto de devoção – como no mundo cristão – ou dele tratamos de fugir, ou ainda tentamos encontrar uma causa no passado. Enquanto não aprendermos o que é o sofrimento, nunca nos libertaremos dele. A S[h]abedoria [ShOPhIa] não é compatível com a mente que se acha dominada pelo [por qualquer] sofrimento. Por mais engenhosa e erudita e por mais competente que seja, a mente em que há sofrimento é sempre uma fonte de malefícios. Definitivamente, é necessário que haja ordem – ordem absoluta. E para pormos termo no sofrimento, é necessário observação atenta de tudo o que pensamos, de tudo o que dizemos e de tudo o que fazemos.
Madureza é a compreensão da ação como um todo, e não em fragmentos. Enquanto a ação for fragmentária – religiosa, profissional, política, doméstica etc. – haverá, necessariamente, contradição e, por conseguinte, como resultado desta contradição, havará esforço, sofrimento, medo, aflição etc.
De tudo isto, fica o seguinte resumo: precisamos aprender a
, interiormente, para as nossas insignificantes ambições, nossas sutilezas, nossas miragens, nossas ilusões, nossos prazeres e nossas dores. Precisamos aprender a
, simples e naturalmente (como iremos fazer, quando nos tornarmos mais velhos). Sem a Compreensão da
, a nossa velhice será uma coisa dolorosíssima, na verdade, uma deformidade – [que não precisa ser assim]. Só
[Iniciaticamente] para essas coisas medonhas conheceremos, de fato, o Amor.
Assim, quando há Compreensão do conflito, há a terminação do sofrimento. E a terminação do sofrimento é o começo da ação total. E a ação total só será possível quando
psicologicamente para as coisas que chamamos prazer e dor. Só então existirá o Amor. Sem ele, poderemos fazer o que quisermos, mas, jamais encontraremos uma saída.
Compreensão —› Mente Silenciosa —› Disciplina —› Ordem —› Criação —› Paz.
Precisamos, definitivamente, parar de simplesmente flutuar na corrente, como faz a maioria das pessoas, inclusive os santos e todos os seus discípulos.
— Ora, deixapralá.
Mudar? Por quê?
Tudo muda por si só.
Ora, deixapralá.
Deus está comigo;
não estou só.
Ora, deixapralá.
Eu não mudarei,
até virar pó!
A verdadeira e definitiva Grande Questão é: como poderemos fazer [re]nascer o Amor em nosso Coração? [Certamente, não será de joelhos, acreditando em dogmas e em deuses inventados e tendo cagaço do inferno e dos demônios. O fato é que ou nós mudamos ou, um dia, sem esperarmos, de repente, seremos deslocados para um sistema menos evoluído, e perderemos a Grande Chance de Peregrinar nesta Onda Evolutiva Terrena. Sabe como é nome disto?
. Que isto não aconteça com ninguém. Está feito. Está selado. A.'. U.'. M.'.]
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Nota:
1. Orígenes, cognominado Orígenes de Alexandria ou Orígenes de Cesaréia ou ainda Orígenes, o Cristão (Alexandria, Egito, cerca de 185 – Cesaréia, ou, mais provavelmente, Tiro, 253), foi teólogo patrístico, filósofo neoplatônico e é um dos padres gregos mais festejados. Orígenes castrou a si mesmo ao tomar literalmente o capítulo 19, versículo 12, do Evangelho de Mateus: Porque há eunucos que assim nasceram do ventre da mãe; e há eunucos que foram castrados pelos homens; e há eunucos que se castraram a si mesmos, por causa do reino dos céus. Quem puder receber isto, receba-o. Que me perdoe São Mateus Evangelista, mas, para mim, para não dizer coisa pior, isto é uma completa maluquice. E Orígenes, que, na altura da degola, já devia estar com a biela empenada, coma arruela desconectada da grapeta e com a rosqueta desencaixada da parafuseta, esquizofrenicamente, entrou nessa de gaiato, e decepou o pirilau. Deus que me perdoe mil vezes!
Orígenes
Música de fundo:
Sinfonia nº 6 em Fá maior, Op. 68, "Pastorale": I. Allegro ma non troppo
Compositor: Ludwig van Beethoven
Interpretação: Yo-Yo Ma, Emanuel Ax & Leonidas KavakosFonte:
https://www.youtube.com/watch?v=qyr-IE8HmIs
Observação:
A Sinfonia nº 6 em Fá Maior, opus 68, de Ludwig van Beethoven, também chamada Sinfonia Pastoral, é uma obra musical precursora da música programática. Esta Sinfonia foi completada em 1808, e teve a sua primeira apresentação no Theater an der Wien, em 22 de dezembro de 1808. Dividida em cinco andamentos, tem por propósito descrever a sensação experimentada nos ambientes rurais. Beethoven insistia que essas obras não deveriam ser interpretadas como um quadro sonoro, mas, como uma expressão de sentimentos. É uma das mais conhecidas obras da fase romântica de Beethoven.
Páginas da Internet consultadas:
https://www.istockphoto.com/br
https://www.sohistoria.com.br/lendasemitos/saci/
https://dribbble.com/shots/1613906-walk-2
http://marketinghuddle.com/attitude-branding/
https://pt.wikipedia.org/wiki/Or%C3%ADgenes
https://www.bibliaonline.com.br/acf/mt/19
https://krishnamurtibox.wordpress.com/downloads/livros/
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