Ludwig van Beethoven

 

 

 

 

Divindade, Tu vês do alto o fundo de mim mesmo; sabes que o amor pela Humanidade e o desejo de fazer o bem me habitam.

 

Ludwig van Beethoven

 

 

 

 

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

Objetivo do Estudo

 

 

 

Este estudo é um despretensioso resumo sobre a vida e a obra, as reflexões e os pensamentos, de um dos maiores gênios que a Humanidade já produziu: Ludwig van Beethoven. Para o Imperator da Orden Rosacruz, jurisdição da Espanha (Gran Canarias), Angel Martín Velayos (Sâr Anael), Beethoven – ao lado de Leonardo da Vinci, Raimundo Lulio, Newton, Miguel Servet, Leibnitz, Descartes, Paracelso e de muitos outros personagens que se destacaram em todos os ramos do saber – esteve vinculado ao Movimento Rosacruz de seu tempo. Isto poderá escandalizar alguns devido ao temperamento heterodoxo e impulsivo característico da personalidade de Beethoven. Ora, quem pode não reconhecer que já foi heterodoxo e irrefletido uma ou muitas vezes? Quem pode dizer que é um santo? Quem pode se declarar isento de mácula? Quem pode atirar a primeira pedra? Se o Rosacrucianismo tivesse sido bolado só para os invulneráveis e para os bem-comportados, seu projeto, provavelmente, jamais teria sido efetivado, e eu, certamente, ainda estaria vagando em meu vale de agonia e de lágrimas, pois não poderia ter sido aceito em qualquer Fraternidade Rosacruz.

 

Quanto ao estudo beethoveniano ora divulgado, todo o material que pesquisei nas diversas páginas da Internet para compor o texto está listado ao final. Agora, leitor, não espere de Beethoven um misticismo lacrimogêneo ou balsâmico, pois você não encontrará. Seu misticismo é de outra natureza, no qual o amor, o bem e a liberdade que ele vivenciou, sentiu e experimentou estão consignados em sua magistral obra. Bolas! Misticismo abestalhante não divisa o Leste nem com sextante! Beethoven, longe de ter sido um abestalhado balsamífero, foi, sim, ao contrário, um anticonformista lato e stricto sensu. Basta lembrar a passagem em que seu professor, certa vez, comentou que ele utilizava harmonias inadmissíveis, e Beethoven respondeu: — Quem proibiu essas harmonias ? Eu admito cada uma delas.

 

 

 

 

Breve Biografia

 

 

 

 

Ludwig van Beethoven nasceu em 16 de dezembro de 1770, em Bonn, Alemanha. Mas sua ascendência era holandesa: o nome de sua família é derivado do nome de uma aldeia na Holanda, Bettenhoven (horta de beterrabas), e tem a partícula van, muito comum em nomes holandeses – não confundir com o nobiliárquico alemão von.

 

Seu pai, Johann van Beethoven, percebeu que o pequeno Ludwig tinha talento incomum para música, e tratou de encaminhá-lo à carreira de músico. Mas o fez de forma desastrosa. Obrigava o filho a estudar música horas e horas por dia, e não raro o batia. Neste sentido, a educação musical de Beethoven teve aspectos de verdadeira tortura medieval.

 

Desde os treze anos, Beethoven ajudou no sustento da casa, já que o pai se afundava cada vez mais na bebida. Trabalhava como organista, cravista ensaiador do teatro, músico de orquestra e professor, e assim, precocemente, como uma espécie de arrimo, assumiu a chefia da família. Era um adolescente introspectivo, tímido e melancólico, freqüentemente imerso em devaneios e distrações, como seus amigos testemunharam.

 

Em 1784, Beethoven conheceu um jovem conde, de nome Waldstein, tornando-se amigo dele. O conde percebeu logo o talento do compositor e o enviou para Viena, para que se tornasse aluno de Mozart. Mas tudo parece indicar que Mozart não lhe deu muita atenção, embora reconhecendo seu gênio, e a tentativa de Waldstein não logrou êxito. Em duas semanas, Beethoven voltou para Bonn.

 

Em Bonn, começou a fazer cursos de literatura – até para compensar sua falta de estudo geral, já que saíra da escola com apenas 11 anos – e lá teve seus primeiros contatos com as fervilhantes idéias da Revolução Francesa, que ocorria, com o Aufklärung (Iluminismo) e com o Sturm und Drang (Tempestade e Ímpeto), correntes não menos fervilhantes da literatura alemã, de Goethe e Schiller. Esses ideais acabariam por se tornar fundamentais na arte e na imagética de Beethoven.

 

Foi apenas em 1792 que Beethoven haveria de partir definitivamente para Viena. Novamente, por intermédio do conde Waldstein, agora foi aceito como aluno de Haydn – ou melhor, papai Haydn, como o novo pupilo o chamava. A aprendizagem com o velho mestre não foi tão frutífera quanto dela era esperado. Haydn era afetuoso, mas um tanto descuidado, e Beethoven logo tratou de arranjar aulas com outros professores para complementar seu estudo.

 

Seus primeiros anos vienenses foram tranqüilos, com a publicação de seu Opus 1, uma coleção de três trios, e a convivência com a sociedade vienense, que lhe fora facilitada pela recomendação de Waldstein. Era um pianista virtuose de sucesso nos meios aristocráticos, e soube cultivar admiradores. Apesar disso, continuou a acreditar e a manter os ideais revolucionários franceses – ideais libertários, fraternitários e eqüitários que permaneceram com ele até a morte.

 

Então, começaram a surgir os primeiros sintomas da grande tragédia beethoveniana – a surdez. Em 1796, na volta de uma turnê, começou a se queixar de dores nos ouvidos, e foi diagnosticada uma congestão dos centros auditivos internos. Tratou-se com médicos e melhorou sua higiene, a fim de recuperar a boa audição que sempre teve, e escondeu o problema de todos o máximo que pôde. Só dez anos depois, em 1806, revelou seu problema de saúde em uma frase anotada nos esboços do Quarteto nº 9: Não guardes mais o segredo de tua surdez, nem mesmo em tua arte!

 

Antes disso, em 1802, Beethoven escreveu o que seria o seu documento mais famoso: o Testamento de Heiligenstadt. Trata-se de uma carta, originalmente destinada aos dois irmãos, mas que nunca foi enviada, onde reflete, desesperado, sobre a tragédia da surdez e da sua arte. Ele estava, por recomendação médica, descansando na aldeia de Heiligenstadt, perto de Viena, e teve sua crise mais profunda, quando cogitou seriamente o suicídio. Era um pensamento forte e recorrente. O que o fez mudar de idéia? Ele mesmo revelou: Só a arte me amparou! Pareceu-me impossível deixar o mundo antes de haver produzido tudo o que eu sentia me haver sido confiado, e, assim, prolonguei esta vida infeliz.

 

O resultado foi o nascimento de um músico que doou toda a sua obra à Humanidade. Para Beethoven, sua música era uma verdadeira missão. A Sinfonia nº 3, Eroica, sua primeira obra monumental, surge em seguida à crise fundamental de Heiligenstadt.

 

Beethoven nunca se casou, e sua vida amorosa foi uma coleção de insucessos e de sentimentos não-correspondidos. Apenas um amor foi correspondido e realizado intensamente, e sabemos disso exatamente através de três cartas escritas por ele, em 1812. Nelas, o compositor se derrama em apaixonadíssimos sentimentos a uma certa bem-amada imortal. A identidade da bem-amada imortal nunca ficou muito clara e suscitou grande enigma entre os biógrafos de Beethoven. Maynard Solomon, em 1977, após inúmeros estudos, concluiu que ela seria Antonie von Birckenstock, casada com um banqueiro de Frankfurt – logo, um amor realizado, mas ao mesmo tempo impossível.

 

Em 1815, seu irmão Karl morreria, deixando um filho de oito anos para que ele e a mãe cuidassem. Contudo, Beethoven nunca aprovou a conduta da mãe dessa criança, e lutou na justiça para ser seu único tutor. Foram meses de um desgastante processo judicial que acabou com o ganho de causa dado ao compositor. Agora, Beethoven, que sempre fora desajeitado com a vida doméstica, teria que cuidar de seu sobrinho.

 

Nos anos seguintes, Beethoven entraria em grande depressão, da qual só sairia em 1819, e de forma exultante. A década seguinte seria um período de supremas obras-primas: as últimas sonatas para piano, as Variações Diabelli, a Missa Solene, a Nona Sinfonia e, principalmente, os últimos quartetos de cordas.

 

Foi nessa atividade, cheio de planos para o futuro (uma décima sinfonia, um réquiem, outra ópera), que ficou gravemente doente – pneumonia, além de cirrose e infecção intestinal. No dia 26 de março de 1827, morreria Ludwig van Beethoven – segundo a lenda, levantando o punho em um último combate contra o destino. Cerca de 10.000 pessoas compareceram às ruas de Viena para acompanhar o funeral e prestar homenagem ao compositor que tinha mudado o clima musical da Europa Ocidental para sempre. Com ele, encerrou-se o ciclo clássico e tem início o romantismo musical do século XIX.

 

Enfim, a idéia de liberdade universal, de igualdade e de fraternidade era apreciada e festejada pelo compositor. Este tríplice tema é expressado poderosa e formosamente no movimento final da monumental Sinfonia nº 9, em Ré menor, que compôs em 1824 quando já estava completamente surdo.

 

 

 

 

Sobre Beethoven

 

 

 

 

Beethoven casou-se com sua música. (Lewis Lockwood).

 

Tudo passará e o mundo perecerá, mas a Nona Sinfonia permanecerá. (Mikail Bakunin).

 

Atenção a este rapaz. Ele dará muito o que falar de si. (Mozart).

 

O resumo de sua obra é a liberdade. A liberdade das belas-artes, a liberdade política, a liberdade artística, a liberdade de escolha e de credo, enfim, a liberdade individual em todos os aspectos da vida. (Paul Bekker).

 

Tudo em sua aparência é forte. Grande parte dela é rude, como seu rosto de ossos marcados, com a testa alta e larga, com seu nariz curto e angular, com seu cabelo arrepiado, dividido em duas grossas mechas. Mas ele foi abençoado com uma boca delicada e com olhos eloqüentes que refletem, a cada momento, as suas idéias e os seus sentimentos. (Christian Muller).

 

Nenhum artista que eu já tenha ouvido chegou perto das alturas que Beethoven alcançava com sua maneira de tocar. A riqueza das idéias que nele afloravam, os caprichos aos quais se rendia, a variedade de tratamentos e de dificuldades eram inesgotáveis. (Ferdinand Ries).

 

A Nona Sinfonia foi o pesadelo de todos os compositores que vieram depois de Beethoven. Eles a tomaram como um ideal a ser alcançado. Depois, perceberam que era uma tarefa impossível. (Claude Debussy).

 

Escutar atrás de si o ressoar dos passos de um gigante. (Definição que Brahms deu à Nona Sinfonia de Beethoven).

 

A partir de Beethoven, a música nunca mais foi a mesma. As suas composições eram criadas sem a preocupação em respeitar regras que, até então, eram seguidas. Considerado um poeta-músico, foi o primeiro romântico apaixonado pelo lirismo dramático e pela liberdade de expressão. Foi sempre condicionado pelo equilíbrio, pelo amor à natureza e pelos grandes ideais humanitários. (Clube Di Giorgio).

 

Suas emoções, quando atingiam o auge, eram quase divinas. Ele deu uma grandeza alpina à música. (H. L. Mencken).

 

Para onde quer que seu espírito o movesse, ele tirava sangue de pedra. E ele fazia rubis a partir do sangue, platina a partir dos resíduos das pedras e ainda organizava esses produtos miraculosamente... (Robert Haven Schauffler).

 

A Nona sinfonia possui um uma marca, uma aura, uma identidade, sem igual em toda a literatura orquestral. Ela permanece maior, mais alta em direção ao infinito do que qualquer outra obra. (Irving Kolodin).

 

A joyous celebration of freedom goes on wherever people can hear Beethoven. Uma alegre celebração da liberdade acontece onde quer que as pessoas escutem Beethoven. (Jim Powell).


 

 

 

A Verdadeira Fortuna de Beethoven

 

 

 

 

Conta-se que, um dia, Beethoven foi visitar o irmão mais novo, Johann, que, naquela altura, era um homem rico. Na entrada da mansão, um criado ofereceu-lhe, em uma salva de prata, um cartão de visitas onde estava escrito: Johann van Beethoven, proprietário de terras. O compositor pegou o cartão e, instantes depois, devolveu-o ao criado, após escrever no verso do papel a seguinte anotação: Ludwig van Beethoven, proprietário de um cérebro.

 

 

 

 

Frases e Pensamentos Beethovenianos

 

 

 

 

Retratos de Beethoven

 

 

 

Divindade, Tu vês do alto o fundo de mim mesmo; sabes que o amor pela Humanidade e o desejo de fazer o bem me habitam.

 

A música é uma revelação superior à toda sabedoria e à qualquer filosofia.

 

Quando um príncipe opinou que em vez de três fagotes bastavam dois, ele respondeu: — Se Sua Alteza assim quer instrumentar, estou cagando.

 

O que eu sou, eu devo apenas a mim.

 

Ainda não se levantaram as barreiras que digam ao gênio: daqui não passarás.

 

O gênio é composto por 2% de talento e por 98% de perseverante aplicação.1

 

É preciso ser alguma coisa para parecer alguma coisa.

 

Sobre sua mãe, Maria Magdalena Kewerich: Ela era uma mãe tão amorosa. Era minha melhor amiga!

 

A verdadeira arte é imperecível.

 

O dia-a-dia esgota-me!

 

A arquitetura é uma música de pedras; a música é uma arquitetura de sons.

 

Bach2 não é um riacho, mas um mar.

 

Bach é o pai da harmonia.

 

Frase anotada nos esboços do Quarteto nº 9: Não guardes mais o segredo de tua surdez, nem mesmo em tua arte!

 

No paraíso, eu vou ouvir!

 

Atingi tal grau de perfeição que me encontro acima de qualquer crítica.

 

Não confies um segredo nem ao teu mais íntimo amigo; não poderás lhe pedir discrição si tu mesmo não a tiveste.

 

Eu me apoderarei do destino agarrando-o pelo pescoço. Ele não me dominará.

 

Era-me impossível dizer às pessoas: 'fale mais alto, grite, porque sou surdo'. Como eu poderia confessar uma deficiência do sentido que em mim deveria ser mais perfeito do que nos outros, um sentido que eu antes possuía na mais alta perfeição?

 

Meus ouvidos ribombam dia e noite sem parar.

 

Ao príncipe Lichnowsky, um de seus patronos e mecenas: Príncipe, o que vós sois, o sois por acaso e por nascimento; o que sou, sou através de mim. Príncipes houve e ainda haverá aos milhares; Beethoven, só há um.

 

Música é revelação – é o terreno elétrico no qual nosso espírito vive, pensa e inventa.

 

A partir do foco do entusiasmo, devo libertar a melodia em todas as direções; persigo-a e capturo-a apaixonadamente; vejo-a voando longe e desaparecendo em uma massa de movimentos variados; depois, apodero-me dela novamente, com uma paixão renovada, e dela não consigo me separar; sou impulsionado por modulações aceleradas a multiplicá-las e, enfim, conquisto-as: e eis, uma sinfonia!

 

Ninguém deveria barganhar com um artista.

 

Oh! júbilo, centelha clara e ardente do divino fulgor, luz essencial! Ébrios de teu clarão onipotente, penetrantes em teu santuário ideal. Une-se ao teu prestígio, novamente, tudo o que separou, na vida, o mal. De novo, os homens trêmulos se irmanam ao resplendor de tua chama celestial! Aquele a quem os fados concederam um amigo na vida, o que achou de uma doce companheira à sombra apetecida, venha conosco, em júbilo cantar. Sim, todos os que podem chamar sua alma, neste vale de agonia. Mas, o que não logrou essa conquista, fuja, chorando, a nossa companhia, pois, não nos pode acompanhar! Sorvem júbilo puro os seres todos no seio ultriz da natureza clara, sejam bons, sejam maus, hinos e ápodos todos são filhos seus.

 

A alma sensível é como uma harpa que ressoa com um simples sopro.

 

Há momentos em que acho que a língua ainda não é absolutamente nada.

 

Não existe verdadeira inteligência sem bondade.

 

O único sinal de superioridade que conheço é a bondade.

 

Quem entender a minha música nunca mais será infeliz.

 

Tenho paciência e penso: todo o mal traz consigo algum bem.

 

A música saída do Coração chegará ao Coração.

 

Recomende aos seus filhos moralidade. Somente isto, não dinheiro; e, assim, eles poderão ser felizes.

 

Esta é a marca de um homem realmente admirável: firmeza e constância quando se vê diante de um problema.

 

A música é capaz de reproduzir, em sua forma real, a dor que dilacera a alma e o sorriso que inebria.

 

Milhares de pessoas cultivam a música; poucas, porém, têm a revelação dessa grande arte.

 

A verdadeira amizade pode basear-se somente na união de modos de ser semelhantes.

 

Não há nada de mais belo do que distribuir a felicidade por muitas pessoas.

 

O que está em meu Coração precisa sair à superfície. Por isto, preciso compor.

 

Mesmo que seja por um trono, jamais renegar a verdade.

 

Um dia, seu professor comentou que ele utilizava harmonias inadmissíveis. Beethoven respondeu: — Quem proibiu essas harmonias? Eu admito cada uma delas.

 

De quem deverei temer ou com quem deverei medir minha força?

 

Aquele que trabalha reta e nobremente pode, por ele mesmo, suportar qualquer infortúnio.

 

Beethoven em uma carta a um amigo: Eu não negocio. Ponho o preço e eles pagam.

 

Nunca quebres o silêncio se não for para o melhorar. Um grande poeta é a jóia preciosa de uma nação.

Os músicos utilizam todas as liberdades que podem.

 

A música deve fazer brotar fogo do coração de um homem e lágrimas dos olhos de uma mulher.

 

É mais difícil o estoicismo para um artista do que para qualquer outro.

 

Não há nada tão belo como nos aproximarmos da Divindade e espalhar os seus raios pela raça humana.

 

Meu Deus! Deita sobre mim o Teu olhar!

 

Três cartas escritas por Beethoven à sua amada imortal:

Primeira carta (manhã de 6 de julho de 1812): Meu anjo, meu tudo, meu ser. Apenas algumas palavras hoje, à caneta (a tua). Até amanhã a minha morada estará definida. Que desperdício de tempo. Por que [sinto] esta tristeza profunda quando a necessidade fala? Pode o nosso amor resistir ao sacrifício, em não exigir a totalidade um do outro? Pode mudar o fato de que tu não és toda minha nem eu sou todo teu? Oh, Deus! Olha para a beleza da natureza e conforta o teu coração com o que deve ser. O amor exige tudo e com razão. Assim, eu estou em ti e tu estás em mim. Mas tu te esqueces facilmente que preciso viver para mim e para ti. Se estivéssemos completamente unidos, tu sentirias esta dor tão próxima quanto eu a sinto. A minha viagem foi terrível; só cheguei ontem às 4 horas da manhã, uma vez que na falta de cavalos, o cocheiro escolheu um outro caminho... Mas que caminho terrível. Na penúltima parada, fui avisado para não viajar à noite. Fiquei com medo da floresta, e isso só me deixou mais ansioso – mas eu estava errado. O cocheiro precisou parar na estrada, uma estrada imprestável e barrenta. Se estivesse sem os apetrechos que levo comigo, teria ficado preso na estrada. Esterhazy, percorrendo este caminho habitual, teve o mesmo destino com oito cavalos que eu tive com quatro. Senti algum prazer nisso, como sempre sinto quando supero com sucesso as dificuldades. Agora uma rápida mudança das coisas externas para as internas. Provavelmente, nos veremos em breve; mas, hoje, não posso compartilhar contigo os pensamentos que tive durante estes poucos dias dias sobre a minha vida. Se os nossos corações estivessem sempre juntos, eu não teria nenhum deles. O meu coração está repleto. Alegra-te. Tu permaneces [sendo] a minha verdade, o meu tesouro, o meu tudo, como eu sou o teu. Os deuses devem nos mandar o restante; aquilo que deverá ser para nós, será. Seu fiel Ludwig.

Segunda carta (noite de 6 de julho de 1812): Tu estás sofrendo, minha querida criatura. Só agora percebi que as cartas precisam ser enviadas nas segundas ou nas quintas de manhã bem cedo – os únicos dias em que o correio vai daqui para K. Tu sofres! Ah!, não importa onde eu estiver, tu estarás lá! Eu arrumarei tudo para que possamos viver juntos. Que vida! Sem ti, perseguido pela bondade humana, o pouco que quero merecer é o que já mereço. A humildade do homem diante do homem me machuca. E, quando me considero, em relação ao Universo, o que eu sou e o que é Ele, a quem chamamos de maior, ainda assim, penso que nisto resida a divindade do homem. Choro ao pensar que provavelmente não receberás a minha primeira carta antes de sábado. Por mais que tu me ames, eu te amo ainda mais. Mas nunca te ocultes de mim. Boa noite. Devo ir dormir. Oh, Deus! Tão perto! Tão longe! Não é o nosso verdadeiro amor uma construção celestial firme como as colunas do céu?

Primeira carta (7 de julho de 1812): Embora ainda esteja na cama, os meus pensamentos vão até ti, minha Amada Imortal, agora felizes, depois tristes, esperando para saber se o destino nos ouvirá ou não. Eu só posso viver completo contigo ou não poderei viver. Sim, estou decidido a vaguear assim por muito tempo longe de ti, até que possa voar para os teus braços e dizer que estou em casa, e poder enviar a minha alma envolta em você ao reino dos espíritos. Sim, isto deve ser tão infeliz. Tu serás mais contida quando souberes da minha fidelidade à ti. Outra jamais poderá ter o meu coração. Nunca! Nunca! Oh, Deus! Por que um precisa estar separado do outro quando se ama. E, no entanto, a minha vida em Viena é agora uma vida miserável. O teu amor me faz ao mesmo tempo o mais feliz e o mais infeliz dos homens. Na minha idade, eu preciso de estabilidade, de uma vida tranqüila. Pode ser assim na nossa relação? Meu anjo, acabo de ser informado que o carteiro sai todos os dias. Por isto, devo terminar logo para que tu possas receber a carta logo. Fica tranqüila. Somente através da consideração tranqüila de nossa existência podemos atingir o objetivo de vivermos juntos. Fica tranqüila; me ame, hoje, ontem. Desejos sofridos por você, você, você, minha vida, meu tudo. Adeus. Oh!, continua a me amar! Jamais duvida do coração fiel de teu amado. Sempre teu. Sempre minha. Sempre nosso.

 

No seu leito de morte, em 1827: Aplaudam, meus amigos, a comédia chegou ao fim.

 

Texto integral do testamento de Beethoven feito em 6 de outubro de 1802, na localidade austríaca de Heilingenstadt:

 

Ó homens que me tendes em conta de rancoroso, insociável e misantropo, como vos enganais. Não conheceis as secretas razões que me forçam a parecer deste modo. Meu coração e meu ânimo, desde a infância, sentiam-se inclinados para o terno sentimento de carinho, e sempre estive disposto a realizar generosas ações; porém, considerai que, de seis anos à esta parte, vivo sujeito a uma triste enfermidade, agravada pela ignorância dos médicos. Iludido constantemente na esperança de uma melhora, fui forçado a enfrentar a realidade da rebeldia desse mal, cuja cura, se não for de todo impossível, durará talvez anos! Nascido com um temperamento vivo e ardente, sensível mesmo às diversões da sociedade, vi-me obrigado a isolar-me em uma vida solitária. Por vezes, quis colocar-me acima de tudo, mas fui, então, duramente repelido, ao renovar a triste experiência da minha surdez!

Como confessar este defeito de um sentido que devia ser, em mim, mais perfeito do que nos outros, de um sentido que, em tempos atrás, foi tão perfeito como poucos homens dedicados à mesma arte possuíam! Não me era, contudo, possível dizer aos homens: 'Falai mais alto, gritai, pois eu estou surdo'. Perdoai-me se me vedes afastar-me de vós! Minha desgraça é duplamente penosa, pois, além do mais, faz com que eu seja mal julgado. Para mim, já não há encanto na reunião dos homens, nem nas palestras elevadas, nem nos desabafos íntimos. Só a mais estrita necessidade me arrasta à sociedade. Devo viver como um exilado. Se me acerco de um grupo, sinto-me preso de uma pungente angústia, pelo receio que descubram meu triste estado. E assim, vivi este meio ano em que passei no campo. Mas que humilhação quando ao meu lado alguém percebia o som longínquo de uma flauta e eu nada ouvia! Ou escutava o canto de um pastor e eu nada escutava!

Estes incidentes me levaram quase ao desespero, e pouco faltou para que, por minhas próprias mãos, eu pusesse fim à minha existência. Só a arte me amparou! Pareceu-me impossível deixar o mundo antes de haver produzido tudo o que eu sentia me haver sido confiado, e, assim, prolonguei esta vida infeliz. Paciência é só o que aspiro até que as Parcas3 inclementes cortem o fio de minha triste vida. Melhorarei, talvez! Talvez não! Mas terei coragem. Na minha idade, já obrigado a filosofar, não é fácil, e mais penoso ainda se torna para o artista. Meu Deus! Deita sobre mim o Teu olhar! Ó homens! Se vos cair isto um dia debaixo dos olhos, vereis que me julgastes mal! O infeliz consola-se quando encontra uma desgraça igual à sua. Tudo fiz para merecer um lugar entre os artistas e entre os homens de bem.

Peço-vos, meus irmãos (Karl e Johann) assim que eu fechar os olhos, se o professor Schimith ainda for vivo, fazer-lhe em meu nome o pedido de descrever a minha moléstia, e juntai a isto que aqui escrevo para que o mundo, depois de minha morte, se reconcilie comigo. Declaro-vos, ambos, herdeiros de minha pequena fortuna. Reparti-a honestamente e ajudai-vos um ao outro. O que contra mim fizestes, há muito, bem sabeis, já vos perdoei. A ti, Karl, agradeço as provas que me destes ultimamente. Meu desejo é que seja a vossa vida menos dura do que a minha. Recomendai a vossos filhos a virtude. Só ela poderá dar a felicidade, não o dinheiro, digo-vos por experiência própria. Só a virtude me levantou de minha miséria. Só a ela e à minha arte devo não ter terminado em suicídio os meus pobres dias. Adeus e conservai-me vossa amizade.

Minha gratidão a todos os meus amigos. Sentir-me-ei feliz debaixo da terra, se ainda vos puder valer. Recebo com felicidade a morte. Se ela vier antes que realize tudo o que me concede minha capacidade artística, apesar do meu destino, virá cedo demais e eu a desejaria mais tarde. Entretanto, sentir-me-ei contente, pois ela me libertará de um tormento sem-fim. Venha quando quiser, e eu, corajosamente, a enfrentarei.

Adeus e não vos esqueçais inteiramente de mim na eternidade. Bem o mereço de vós, pois muitas vezes, em vida, preocupei-me convosco, procurando dar-vos a felicidade.

Sede felizes!

Helligenstadt, 6 de outubro de 1802.

Ludwig van Beethoven.

 

Resignação! Que triste palavra! E, no entanto, é o único refúgio que fica.

 

É um homem ignóbil o que não sabe morrer. Eu o sabia desde os quinze anos.

 

Na hora de sua morte, sua última frase foi: É já tarde!

 

 

 

 

Beethoven e Claude Monet

 

 

 

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Notas:

1. Isto poderia ter sido dito de outra forma: O gênio é composto por 2% de inspiração e por 98% de transpiração.

2. Segundo o maestro, pianista e compositor alemão do período romântico Hans von Bülow (1830 – 1894), Bach, ao lado de Beethoven e Brahms, é um dos três bês da música.

3. Em Roma, as Parcas (equivalentes às Moiras na mitologia grega) eram três deusas: Nona (Cloto), Décima (Láquesis) e Morta (Átropos). Determinavam o curso da vida humana, decidindo questões como vida e morte, de maneira que nem Júpiter (Zeus) podia contestar suas decisões. Nona tecia o fio da vida; Décima cuidava de sua extensão e caminho; e Morta cortava o fio. Eram também designadas fates, daí o termo em ingles fate (destino). É interessante notar que em Roma havia a estrutura de calendário solar para os anos e lunar para os atuais meses. A gravidez humana é de nove luas, não nove meses; portanto, Nona tece o fio da vida no útero materno, até a nona lua. Décima representa o nascimento efetivo, o corte do cordão umbilical, o início da vida terrena, o indivíduo definido, a décima lua. Morta é a outra extremidade, o fim da vida terrena, que pode ocorrer a qualquer momento.

 

Páginas da Internet consultadas:

http://www.elasere.com/interes/
ShowFrases.asp?id=79&Letra=L&exist=yes

http://www.quotableonline.com/frases/Beethoven.html

http://www.rivalcir.com.br/frases/beethoven.html

http://www.pensador.info/p/beethoven_frases/1/

http://sandrawaihrichtatit.blogspot.com/2007/
07/biografia-de-ludwig-van-beethoven.html

http://sanhas.blogspot.com/2006/05/
carta-de-beethoven-amada-imortal.html

http://www.jefferson.blog.br/2008/07/
cartas-minha-amada-imortal-de-ludwig.html

http://nl.wikiquote.org/
wiki/Ludwig_van_Beethoven

http://www.miniweb.com.br/
artes/artigos/beethoven.html

http://www.ronaud.com/frases-pensamentos
-citacoes-de/ludwig-van-beethoven

http://www.ponteiro.com.br/vf.php?p4=8403

http://www.thefreemanonline.org/featured/ludwig-van
-beethovens-joyous-affirmation-of-human-freedom/

http://www.ordemlivre.org/node/306

http://www.clubedigiorgio.com.
br/biografias.php?id=81

http://www.luanda.diplo.de/
Vertretung/luanda/pt/Seite__Beethoven.html

http://www.pensador.info/autor/
Ludwig_van_Beethoven/

http://www.movimento.com/
mostraconteudo.asp?mostra=3&codigo=10

http://www.dw-world.de/
dw/article/0,,3613283,00.html

http://musicaclassica.folha.com.br/
cds/03/curiosidades.html

http://biografias.netsaber.com.br/
ver_biografia_c_2547.html

http://www.starnews2001.com.br/
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http://www.starnews2001.com.br/
beethoven/lamour.html

http://www.starnews2001.com.br/
beethoven/galeria.htm

http://www.terra-quadrada.com.br/terra/modules.php?
op=modload&name=News&file=article&sid=326

http://pt.wikipedia.org/wiki/Parcas

http://pt.wikisource.org/wiki/
Carta_%22Minha_Amada_Imortal%22

http://pt.wikiquote.org/wiki/
Ludwig_van_Beethoven

 

Fundo musical:

4º movimento da Sinfonia nº 9 - Coral
Compositor: Ludwig van Beethoven

Fonte:

http://www.classicos.hpg.ig.com.br/beethove.htm

 

Observação:

A imortal Nona Sinfonia, criada pouco antes da morte de Beethoven, foi declarada patrimônio da Humanidade pela UNESCO. Até hoje, a Nona Sinfonia não é apenas um dos grandes clássicos da música erudita. A famosa parte do coral de seu último movimento, baseada na Ode à Alegria, de Friedrich Schiller, é, desde 1985, o hino oficial da União Européia. Provavelmente, esta versão musical de Beethoven tenha imortalizado a frase de Schiller: os homens todos voltam a ser irmãos. Na noite do dia 1º de maio de 2004, vários países comemoraram o ingresso na União Européia, e o ponto alto de cada festa foi a apresentação da Ode à Alegria, da Nona Sinfonia.