á
muito tempo, Rae Hansen, uma menina às vésperas de
seus cinco anos, convida o amigo Richard Bach para sua festa de
aniversário.
Confiante,
ela o espera, apesar de saber que sua casa ficava além dos
desertos, das tempestades e das montanhas...
Como
Richard Bach chega até lá e o presente que ele lhe
dá são narrados nesta história mágica.
Este clássico continua a inspirar as relações
de amizade que não mais dependem do tempo nem do espaço.
Quem
já voou nas asas da gaivota encontrará aqui muitos
pensamentos para compartilhar, até que finalmente acabará
descobrindo que não precisa do anel nem de pássaro
para voar sozinho acima da quietude das nuvens, e que as únicas
coisas que importam são as feitas de verdade e de alegria.
— Rae! Obrigado por
me convidar para a sua festa de aniversário! Sua casa fica
a mil quilômetros da minha e viajo apenas pela melhor das
razões. E uma festa para Rae é a melhor, e estou ansioso
para estar ao seu lado.
Começo a viagem no
coração do Beija-Flor, que há tanto tempo você
e eu conhecemos. Ele se mostrou amigo como sempre, mas ficou espantado
quando lhe disse que a pequena Rae estava crescendo e que eu estava
indo à sua festa de aniversário, levando um presente.
Voamos algum tempo em silêncio,
até que finalmente ele disse:
— Não entendo
muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é
o fato de estar indo a uma festa.
— Claro que estou indo
à festa. — respondi. — O que há de tão
difícil de se compreender nisso?
Ele ficou calado e só
voltou a falar quando chegamos à casa da coruja: —
Podem os quilômetros separar-nos realmente dos amigos? Se
quer estar com Rae, já não está lá?
— A pequena Rae está
crescendo e estou indo à sua festa de aniversário
com um presente — falei para a coruja. Parecia estranho dizer
'indo', depois da conversa com Beija-Flor, mas falei assim mesmo
para que Coruja compreendesse.
Ela voou em silêncio
pôr um longo tempo. Era um silêncio amistoso, mas Coruja
disse ao me deixar em segurança na casa da águia:
— Não entendo muito bem o que você falou, mas
o que menos entendo é ter chamado sua amiga de pequena.
— Claro que ela é
pequena porque não é crescida — respondi. —
O que há de tão difícil de se compreender nisso?
Coruja fitou-me com os olhos
profundos, cor de âmbar, sorriu e disse: — Pense a respeito.
— A pequena Rae está
crescendo e estou indo à sua festa de aniversário
com um presente — falei para Águia. Parecia estranho
falar agora 'indo' e 'pequena', depois das conversas com Beija-Flor
e Coruja, mas falei assim mesmo para que Águia compreendesse.
Voamos juntos sobre as montanhas,
subindo nos ventos das montanhas.
E Águia finalmente
disse: — Não entendo muito bem o que você falou,
mas o que menos entendo é essa palavra aniversário.
— Claro que é
aniversário — respondi. — Vamos comemorar a hora
que Rae começou e antes da qual ela não era. O que
há de tão difícil de se compreender nisso?
Águia curvou as asas
para a descida e foi pousar suavemente sobre a areia do deserto.
— Um tempo antes de
Rae começar? Não acha que é mais a vida de
Rae que começou antes que o tempo existisse?
— A pequena Rae está
crescendo e estou indo à sua festa de aniversário
com um presente — falei para Gavião. Parecia estranho
falar 'indo', 'pequena' e 'aniversário', depois das conversas
com Beija-Flor, Coruja e Águia, mas falei assim mesmo para
que Gavião compreendesse.
O deserto se estendia interminavelmente
lá embaixo e ele finalmente disse: — Não entendo
muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é
crescendo.
— Claro que ela está
crescendo — respondi. — Rae está mais perto de
ser adulta, mais longe de ser criança. O que há de
tão difícil de se compreender nisso?
Gavião pousou finalmente
numa praia deserta.
— Mais um ano longe
de ser criança? Isto não me parece ser o mesmo que
crescer. E Gavião alçou vôo e foi embora.
Eu conhecia o bom senso de
Gaivota. Voamos juntos, pensei com muito cuidado e escolhi as palavras,
a fim de que, ao falar, Gaivota soubesse que eu estava aprendendo:
— Gaivota, por que
está me levando a voar para ver Rae, quando na verdade sabe
que estou com ela?
Gaivota sobrevoou o mar,
as colinas, as ruas, pousou suavemente em seu telhado e disse: —
Porque o importante é você saber a verdade. Até
saber, até realmente compreender, só pode demonstrá-la
em coisas menores, com ajuda externa de máquinas de pessoas
e de pássaros. Mas deve se lembrar sempre que não
saber não impede a verdade de ser verdadeira.
E
Gaivota se foi.
—
E agora, é chegado
o momento de abrir o seu presente. Presentes de lata e vidro amassam
e quebram um dia, somem para sempre. Mas eu tenho um presente melhor
para você. É um anel para você usar. Cintila
com uma luz especial e não pode ser tirado por ninguém,
não pode ser destruído. Somente você, no mundo
inteiro, pode ver o anel que lhe dou hoje, como fui o único
que pude vê-lo quando era meu. O anel lhe dá um novo
poder. Usando-o, você pode alçar vôo nas asas
de todos os pássaros que voam. Pode ver através dos
olhos dourados deles, pode tocar o vento que passa por suas penas
macias, pode conhecer a alegria de se elevar muito acima do mundo
e das suas preocupações. Pode permanecer no céu
por tanto tempo quanto quiser, através da noite, pelo descer
do Sol; e quando sentir vontade de
descer outra
vez, suas perguntas terão respostas, suas preocupações
terão acabado. Como tudo o que não pode ser tocado
com a mão nem visto com o olho, seu presente se torna mais
forte à medida que o usa. A princípio, pode usá-lo
apenas quando está fora de casa, contemplando o pássaro
com quem você voa. Mais tarde, porém, se usá-lo
bem, vai funcionar com pássaros que não pode ver,
até que, finalmente, acabará descobrindo que não
precisa do anel nem de pássaro para voar sozinho acima da
quietude das nuvens. E quando este dia chegar, deve dar seu presente
a alguém que saiba que irá usá-lo bem, alguém
que possa aprender que as coisas que importam são as feitas
de verdade e alegria, não as de lata e vidro. Rae, este é
o último dia especial de comemoração a cada
ano que estarei com você, tendo aprendido com os nossos amigos,
os pássaros. Não posso ir ao seu encontro porque já
estou com você. Você não é pequena porque
já é crescida, brincando entre suas vidas como todos
fazemos, pelo prazer de viver. Você não tem aniversário
porque sempre viveu; nunca jamais haverá de morrer. Não
é a filha das pessoas a quem chama de mãe e pai, mas
a companheira de aventuras delas na jornada maravilhosa para compreender
as coisas que são. Cada presente de um amigo é um
desejo de felicidade. É o caso do anel. Voe livre e feliz
além de aniversários e através do sempre. Haveremos
de nos encontrar outra vez, sempre que desejarmos, no meio da única
comemoração que não pode jamais terminar.