Outro
dia, recebi um e-mail muito interessante com esta historinha,
que reproduzo (editado) abaixo:
Era
uma vez, um rapaz muito bem-intencionado que perguntou a uma garota
se ela queria se casar com ele. A garota, enfática, disse:
— Não;
nem pensar.
E,
assim, ela viveu feliz para sempre.
Sem
lavar...
Sem
cozinhar...
Sem
passar roupas para ninguém...
Saindo
com suas amigas...
Ficando
com quem queria...
Gastando
seu dinheiro consigo...
E
sem trabalhar para ninguém...
O problema é que não
nos contam isto, continua o e-mail,
quando somos crianças. Ao contrário; nos enchem a
cabeça com o maldito príncipe encantado! Para todos
aqueles homens que perguntam para
que comprar a vaca se posso ter o leite gratuito?, temos
que dizer: — Hoje
em dia, 80% das mulheres estão contra o matrimônio.
Sabe o porquê? Porque as mulheres se deram conta de que não
vale a pena comprar o porco inteiro por uma lingüicinha.
Comentando
um Pouquinho
Comprar
o porco inteiro por uma lingüicinha? Ora, convenhamos,
na verdade, o casamento não é obrigatório para
ninguém; nem pelo porco, nem pela lingüiça, nem
por nada. Quem quer casar casa; quem não quer casar não
casa. Mas, de uma forma ou de outra – solteiros, casados,
separados, divorciados ou tico-ticos no fubá – um dia,
haveremos de compreender o poema Eros
e Psique de Fernando Pessoa, em seu sentido mais profundo
e esotérico:
Conta
a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada.
Ele
tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A
Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera.
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe
o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado.
Ele dela é ignorado.
Ela para ele é ninguém.
Mas
cada um cumpre o Destino –
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E,
se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E, vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,
E,
inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.
Não
custa nada lembrar de novo: isto nada tem a ver com o esquisito,
extravagante, excêntrico e incorreto conceito de almas
gêmeas, que, cosmicamente, inexiste, só tendo
curso mesmo na cachola dos sonhadores desinformados ou mal informados.
Seja como for, entre outras
coisas, é o buraco existencial, que cada um sente dentro
de si, que faz
existir a estrada, que faz existir a interminável
procura física e a irrevocável busca metafísica.
Pensando bem, o ser-no-mundo encarna e vive para procurar,
para buscar e para realizar, de permeio compensando o que educativamente
deve ser compensado.
Por
sermos seres incompletos... procuramos e buscamos. Por sermos seres
desarmoniosos... fazemos tudo para nos harmonizar. Por estarmos
meio perdidos... lutamos bravamente para encontrar e para nos encontrarmos.
E onde e por meio de quê isto é possível? Onde:
—› na Terra (por enquanto). Por meio de quê: —›
pela encarnação. Apenas se nascermos, poderemos efetivar
nossas expectativas e ir corrigindo o rumo do nosso barco. Se não
nascermos, nada feito. Daí, o
crescei, multiplicai-vos e enchei a Terra... do Gênesis
I, 28, cujo sentido iniciático-esotérico é:
fraternamente e categoricamente oportunizai. Mas isto não
sugere e muito menos quer dizer ter ou fazer filhos irresponsavelmente
a três por dois e à bangu. Por outro lado, é
muito melhor que não tenhamos filhos, do que tê-los
e não os alimentarmos adequadamente, não os educarmos
convenientemente, não os provermos do que é necessário,
não isto e não aquilo. Ter filhos para os deixar largados
no mundo a pão e margarina? Neste caso, por que não
a camisinha? O que há de tão demoníaco com
ela? Agora, quem teve um filho cumpriu direitinho o que deveria
ter sido cumprido.
Então,
pense comigo: quando evitamos ou impedimos, seja lá pelo
meio que for, o nascimento de uma personalidade-alma, estamos, desfraternalmente,
determinando que ela permaneça como é e onde está.
Mais do que egoísmo, esta decisão impediente funciona
como uma espécie de contraceptivo/retardativo do movimento
cósmico. Quanto aos casais que, por alguma disfunção
orgânica, não podem ter filhos, isto é outra
coisa.
Eu
poderia ficar examinando esta matéria quase indefinidamente,
mas deixarei que você chegue às suas conclusões
sobre o assunto. Concluirei dizendo que, talvez, o maior ato compensatório
– de amor e de abnegação – seja mesmo
permitir que, por meio de nós, casando ou não casando,
uma personalidade-alma possa encarnar, se reciclar e se reengenheirar,
para seguir em frente em sua trajetória/peregrinação
universal.
Enfim,
o inquestionável é que – seja a princesa
encantada, seja o infante
de além do muro da estrada, seja você,
seja eu, seja quem seja – todos nós precisamos sair
do sono. E ninguém poderá despertar sozinho; todos
nós precisamos do auxílio e do concurso cordial de
todos, particularmente de nossos pais. Isto, muito corretamente,
é chamado de fraternidade. Somos todos um!