ZYGMUNT BAUMAN
(Pensamentos)

 

 

 

Zygmunt Bauman

 

 

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

Introdução e Objetivo do Estudo

 

 

 

Um renomado periódico espanhol referiu-se recentemente a Zygmunt Bauman (19 de novembro de 1925) como um dos poucos sociólogos contemporâneos nos quais ainda se encontram idéias. É sobre o pensamento deste sociólogo polonês mundialmente reconhecido – que iniciou sua carreira na Universidade de Varsóvia – que hoje decidi estudar, e divulgar para vocês alguns excertos que garimpei.

 

Desde 1971, Zygmunt está radicado na Inglaterra, e, indiferente às fronteiras disciplinares, é um dos líderes da chamada Sociologia Humanística, ao lado de Peter Berger, Thomas Luckmann e John O'Neill, entre outros.

 

Holocausto, globalização, sociedade de consumo, amor, comunidade e individualidade são algumas das questões pensadas e tratadas por Zygmunt, sempre salientando as dimensões ética e humanitária que devem nortear tudo o que diz respeito à condição humana. Preocupado com o fado dos oprimidos, Zygmunt é uma das vozes a permanentemente questionar a ação dos Governos neoliberais, que promovem e estimulam as chamadas forças do mercado, ao mesmo tempo em que abdicam da responsabilidade inabdicável de promover a Justiça (social).

 

Bolas! Quem não conhece esta mesquiséria (mesquinharia + miséria)? A coisa sempre foi e, more or less, continua sendo como dizia Justo Veríssimo, um dos personagens criados por Chico Anysio:

 

 

 

Justo Veríssimo

 

 

 

Breve Biografia de Zygmunt

 

 

 

Zygmunt Bauman (19 de novembro de 1925, Poznan) é um sociólogo polonês que iniciou sua carreira na Universidade de Varsóvia, onde teve artigos e livros censurados e em 1968 foi afastado da Universidade. Logo em seguida emigrou da Polônia, reconstruindo sua carreira no Canadá, Estados Unidos e Austrália, até chegar à Grã-Bretanha, onde, em 1971, se tornou professor titular da Universidade de Leeds, cargo que ocupou por vinte anos. Lá, conheceu o filósofo islandês Ji Caze, que influenciou sua prodigiosa produção intelectual, pela qual recebeu os prêmios Amalfi (em 1989, por sua obra Modernidade e Holocausto) e Adorno (em 1998, pelo conjunto de sua obra). Atualmente é professor emérito de Sociologia das Universidades de Leeds e Varsóvia. Tem mais de dezesseis obras publicadas no Brasil, dentre as quais Amor Líquido, Globalização: as Conseqüências Humanas e Vidas Desperdiçadas. Bauman tornou-se conhecido por suas análises das ligações entre a modernidade e o holocausto, e o consumismo pós-moderno.

 

 

 

Pensamentos Zygmuntianos

 

 

 

O mundo pode ser diferente e melhor do que é.

 

 

 

 

A 'subjetividade' dos consumidores é feita de opções de compra – opções assumidas pelo sujeito e seus potenciais compradores; sua descrição adquire a forma de uma lista de compras. O que se supõe ser a materialização da verdade interior do 'self' é uma idealização dos traços materiais – 'objetificados' das escolhas do consumidor.

 

Hoje em dia, os maiores obstáculos para a justiça social não são as intenções invasivas do Estado, mas sua crescente impotência, ajudada e apoiada todos os dias pelo credo que oficialmente adota: o de que 'não há alternativa'.

 

Este nosso mundo precisa do Socialismo como nunca antes. Mas um Socialismo que não se oponha a nenhum modelo de sociedade, sob a condição de que essa sociedade teste permanentemente sua habilidade de corrigir as injustiças e de aliviar os sofrimentos que ela própria causou. Este Socialismo deve ser uma faca afiada prensada contra as flagrantes injustiças da sociedade.

 

Pode-se dizer que o consumismo é um tipo de arranjo social resultante da reciclagem de vontades, desejos e anseios humanos rotineiros, permanentes e, por assim dizer, 'neutros quanto ao regime', transformando-os na principal força propulsora e operativa da sociedade, uma força que coordena a reprodução sistêmica, a integração e a estratificação sociais, além da formação de indivíduos humanos, desempenhando, ao mesmo tempo, um papel nos processos de auto-identificação individual e do grupo, assim como na seleção de execução de políticas de vida individuais. O 'consumismo' chega quando o consumo assume o papel-chave que na sociedade dos produtores era exercido pelo trabalho.

 

São Paulo, no Brasil, por exemplo, é uma cidade que, com sua abundância de muros ao redor de residências, prédios, parques etc., mostra o lado mais brutal e inescrupuloso das tendências segregantes e exclusivistas.

 

Tal como experimentado por seus membros, o tempo na sociedade moderna não é cíclico nem linear, como costumava ser para os membros de outras sociedades. Em vez disso, para usar a metáfora de Michael Maffesoli (Graissessac, 14 de novembro de 1944), ele é 'pontilhista', um tempo pontuado, marcado (senão mais) pela profusão de rupturas e descontinuidades. A vida, seja individual ou social, não passa de uma sucessão de presentes, uma coleção de momentos experimentados em intensidades variadas.

 

 

Tempo 'Pontilhista'

 

 

A vida ‘agorista' tende a ser apressada. A oportunidade que cada ponto pode conter vai segui-lo até o túmulo; para aquela oportunidade não haverá 'segunda chance'. Cada ponto pode ter sido vivido como um começo total e verdadeiramente novo, mas se não houve um rápido e determinado estímulo à ação instantânea, a cortina pode ter caído logo após o começo do ato, com pouca coisa acontecendo no intervalo. A demora é o 'serial killer' das oportunidades. Na vida 'agorista' dos cidadãos da era consumista o motivo da pressa, é em parte, o impulso de adquirir e juntar. Mas o motivo que torna a pressa de fato imperativa é a necessidade de descartar e substituir.

 

Desejei ardentemente dedicar minha vida a desvendar os mistérios e enigmas do Universo e a solucionar esses enigmas. Meus estudos, no entanto, foram interrompidos pelo apelo das armas, quando eu tinha 18 anos, para jamais serem retomados.

 

Como Auguste Comte [Montpellier, 19 de janeiro de 1798 – Paris, 5 de setembro de 1857] disse na origem do mais modernista dos objetivos científicos, 'il faut savoir pour prévoir e prévoir pour pouvoir'. [É preciso saber para prever e prever para poder].

 

O mantra do dia não é mais a salvação pela sociedade; infelizmente, o que se ouve agora, como homilias insistentes, é que devemos buscar soluções individuais para problemas produzidos socialmente e sofridos coletivamente.

 

O projeto de ilustração pode ser entendido, para usar a famosa Alegoria de Platão, como a vontade de levar o produto da contemplação das verdades brilhantes e ofuscantes dos Filósofos para os habitantes das cavernas e, deste modo, retirá-los dos bancos aos quais estavam atados, permitindo que vissem, absorvessem e retivessem algo mais valioso do que as meras sombras das coisas refletidas nas paredes. Em outras palavras: a Sociologia nasceu da intenção, do desejo de compartilhar a sabedoria dos filósofos com 'hoi polloi', as pessoas comuns, e de, com isso, elevá-las da ignorância e da superstição para o conhecimento e o entendimento genuínos. Inclino-me a pensar que, na sua origem, a Sociologia era um programa de educação filosófica universal. Li o apelo à razão como uma faculdade universal dos seres humanos, contido em 'Was is Aufklarung' (O que é Iluminismo) de Kant, como um manifesto sociológico (dentre outras coisas, é claro).

 

A Sociologia faz diferença no mundo. Diria mesmo que, considerando sua ligação com a condição humana, há alguma afinidade entre o papel da Sociologia e o da Engenharia. A Engenharia em que a Sociologia se engaja, quer deliberadamente ou não, pode ser de dois tipos, e faz uma imensa diferença saber de qual deles se trata. Desde os anos de 1950, cunhei os termos 'engenharia pela manipulação' e 'engenharia pela racionalização', para diferenciar os dois tipos de engajamento e esclarecer para mim mesmo a qual tipo eu deveria aderir e de qual eu deveria me afastar. Penso que fui atraído para a Sociologia por motivos exatamente opostos aos que moviam os praticantes e propagandistas da 'engenharia pela manipulação'. Suponho que o que me seduziu foi a esperança de ampliar a extensão e a potência da liberdade dos atores sociais, oferecendo a eles um melhor 'insight' na organização social na qual desempenham suas tarefas de vida e que eles co-produzem (a maior parte das vezes inconscientemente). Desde sempre, acreditei que, se a vocação sociológica tem alguma utilidade para os seres humanos, esta utilidade se deve aos serviços que presta e pode prestar ao esforço de compreender, dar sentido e adquirir um 'modicum' de controle sobre suas vidas. É por isto que tendo a descrever o que faço como um contínuo diálogo com a experiência humana. Era isto, ao menos, o que Stanislaw Ossowski, um dos maiores sociólogos poloneses e um dos meus mais persuasivos professores em Varsóvia, considerava a premissa central de sua muito peculiar Sociologia Humanística.

 

A Sociologia era e é para mim uma crítica da realidade social. Entendo que cabe à Sociologia expor publicamente a contingência, a relatividade do que é 'a ordem', para abrir a possibilidade de arranjos sociais e modos de vida alternativos; em outras palavras, ela deve militar contra as ideologias e as filosofias de vida estilo TINA ('there is no other alternative') e manter outras opções vivas.

 

Eu me regozijaria se, algum dia, dissessem de mim o que Kracauer disse de Simmel: 'É sempre o homem – considerado o construtor de cultura e um ser espiritual e intelectual maduro, agindo e avaliando com total controle dos poderes de sua alma e ligado fraternalmente aos outros homens em sentimento e em ação coletiva que está no centro da visão de Simmel'.

 

Sou moralista no sentido de que creio que todas as decisões que o ser humano toma em seu ambiente social (pois ninguém está sozinho, todos nós estamos conectados a outras pessoas) têm significado ético, têm um impacto em outras pessoas, mesmo quando só pensamos no que ganhamos ou perdemos com o que fazemos.

 

A extensão planetária da televisão não nos permite mais dizer 'eu não sabia' como desculpa para nossa inação. Contemplamos diariamente como se faz o mal, como se sofre a dor, e dizer que nada podemos fazer pelo outro é uma desculpa fraca e pouco convincente, até mesmo para nós próprios. Não há como negar que em nosso Planeta, abarrotado e intercomunicado, dependemos todos uns dos outros, e somos, num grau difícil de precisar, responsáveis pela situação dos demais; enfim, que o que se faz em uma parte do Planeta tem um alcance global.

 

 

Ninguém pode dizer: — Eu não sabia!

 

 

O único tipo de conhecimento pelo qual Tony Blair se interessa é aquele que lhe diz qual movimento deve ser feito para ser mais popular. Outras coisas, como o bem da sociedade, não lhe interessam muito.

 

Vivemos em tempos de desregulamentação, de descentralização, de individualização, em que se assiste ao fim da Política com P maiúsculo e ao surgimento da 'política da vida', ou seja, que assume que eu, você e todo o mundo devemos encontrar soluções biográficas para problemas históricos, respostas individuais para problemas sociais. Nós, indivíduos, homens e mulheres na sociedade, fomos, portanto, de modo geral, abandonados aos nossos próprios recursos.

 

A experiência individual é normalmente muito estreita para que o indivíduo seja capaz de ver os mecanismos internos da vida. Não saberíamos o que está acontecendo nesse mundo da modernidade líquida, se não fôssemos alertados para as possíveis conseqüências do processo em andamento. Explicar como as coisas funcionam, ampliar a visão necessariamente limitada dos indivíduos, alargar seus horizontes cognitivos, enfim, dar a eles condições de enxergar além de seu próprio nariz é o que cabe à Sociologia agora. Como disse Ulrich Beck, que mais do que ninguém nos alertou sobre os intricados mecanismos do que ele chama de Risikogesellschaf – a sociedade de risco 'nós, cidadãos, perdemos a soberania sobre nossos sentidos e, portanto, também sobre nosso julgamento... ninguém é mais cego para o perigo do que aqueles que continuam a confiar em seus próprios olhos'.

 

Os riscos de hoje são de outra ordem. Não se pode sentir ou tocar muitos deles, apesar de estarmos todos expostos, em algum grau, às suas conseqüências. Não podemos, por exemplo, cheirar, ouvir, ver ou tocar as condições climáticas que, gradativamente, mas sem trégua, estão se deteriorando. O mesmo acontece com os níveis de radiação e de poluição, a diminuição das matérias-primas e das fontes de energia não-renováveis e os processos de globalização sem controle político ou ético, que solapam as bases de nossa existência e sobrecarregam a vida dos indivíduos com um grau de incerteza e ansiedade sem precedentes. Diferentemente dos perigos antigos, os riscos que envolvem a condição humana no mundo das dependências globais podem não só deixar de ser notados, mas também deixar de ser minimizados, mesmo quando notados. As ações necessárias para exterminar ou limitar os riscos podem ser desviadas das verdadeiras fontes do perigo e canalizadas para alvos errados. Quando a complexidade da situação é descartada, fica fácil apontar para aquilo que está mais à mão como causa das incertezas e das ansiedades modernas. Veja, por exemplo, o caso das manifestações contra imigrantes que ocorrem na Europa. Vistos como 'o inimigo' próximo, eles são apontados como os culpados pelas frustrações da sociedade, como aqueles que põem obstáculos aos projetos de vida dos demais cidadãos. A noção de 'solicitante de asilo' adquire, assim, uma conotação negativa, ao mesmo tempo em que as leis que regem a imigração e a naturalização se tornam mais restritivas, e a promessa de construção de 'centros de detenção' para estrangeiros confere vantagens eleitorais a plataformas políticas. Para confrontar sua condição existencial e enfrentar seus desafios, a Humanidade precisa se colocar acima dos dados da experiência a que tem acesso como indivíduo. Ou seja, a percepção individual, para ser ampliada, necessita da assistência de intérpretes munidos com dados não amplamente disponíveis à experiência individual. E a Sociologia, como parte integrante deste processo interpretativo – um processo que, cumpre lembrar, está em andamento e é permanentemente inconclusivo – constitui um empenho constante para ampliar os horizontes cognitivos dos indivíduos e uma voz potencialmente poderosa nesse diálogo sem-fim com a condição humana.

 

Combinação entre sentimento de liberdade e de propósito é uma felicidade de que a maioria dos acadêmicos contemporâneos infelizmente carece, quer tenham ou não consciência do que estão perdendo.

 

Atualmente, parece haver poucos fregueses, se é que algum, para os modelos de 'boa sociedade', o que costumava ser a preocupação central e o forte da Sociologia com inclinações humanísticas. As classes educadas não estão mais interessadas na tarefa de ilustração e de elevação espiritual do povo. Os intelectuais pararam, em grande parte, de se definir pela responsabilidade que têm para com o povo, a nação e a Humanidade.

 

O que quer que as universidades façam, elas não conseguirão jamais pôr um fim à curiosidade humana, que, talvez, tenha de sair da academia para se satisfazer.

 

 

 

 

Estar 'fora de lugar', ao menos em parte do nosso ser, não concordar completamente, manifestar divergência e dissensão, é o único meio de resguardarmos nossa autonomia e liberdade. Estar 'dentro' mas parcialmente 'fora' é também um meio de preservar o frescor, a inocência e a abençoada ingenuidade de visão. Quem está assim situado tende a fazer perguntas que não ocorreriam àqueles estabelecidos mais solidamente; tende a notar o estranho no familiar, o anormal no óbvio. Exílio é muito freqüentemente uma situação de sofrimento, mas também de expansão do pensamento crítico, de independência, de 'insight' e de criatividade.

 

Observei que o Marxismo era um imenso obstáculo para a recepção e a manutenção da mensagem ética de Marx. Imagino que meu entusiasmo por Emmanuel Lévinas [Kaunas, 30 de novembro de 1906 — Paris, 25 de dezembro de 1995] tenha sido, em grande parte, predeterminado pela minha antiga inoculação com a idéia de Marx de que a qualidade da sociedade deve ser testada pelos critérios de justiça e de 'fair play' [tratamento imparcial; eqüidade] que regulamentam a coletividade humana: a sociedade deve se justificar pelos padrões éticos, e não o contrário, os padrões éticos pela sociedade.

 

O meu Socialismo se resume na convicção de que, assim como o poder de carga de uma ponte se mede não pela força média de todos os pilares, mas pela força de seu pilar mais fraco, a qualidade de uma sociedade também não se mede pelo PIB ou pela renda média de sua população, mas pela qualidade de vida de seus membros mais fracos.

 

Socialismo, para mim, não é o nome de um tipo particular de sociedade. É, exatamente como o postulado de Marx de justiça social, uma dor aguda e constante de consciência que nos impulsiona a corrigir ou a remover variedades sucessivas de injustiça. Não acredito mais na possibilidade (e até no desejo) de uma 'sociedade perfeita', mas acredito em uma 'boa sociedade' – definida como aquela que se recrimina sem cessar por não ser suficientemente boa e não estar fazendo o suficiente para se tornar melhor...

 

O rebelde se recusa a aceitar o que existe; mas, também, se abstém de rejeitar totalmente o que existe. Ele não desculpa a condição humana pela sua desumanidade, por não se equiparar ao que ela poderia ser; mas também não a despreza. Aceita a condição humana 'realmente existente', completa, com todas as suas desumanidades.

 

As leis da História oferecem a fuga mais eficaz da culpa de crueldade ao fazer a inevitabilidade histórica do progresso tomar o lugar da distinção entre o bem e o mal.

 

'Existe a beleza e existem os humilhados. Quaisquer que sejam as dificuldades que o empreendimento possa apresentar, gostaria de nunca ser infiel quer aos segundos quer à primeira.' [Albert Camus (Mondovi, 7 de novembro de 1913 – Villeblevin, 4 de janeiro de 1960), apud Zygmunt Bauman].

 

Defino o Socialismo de um modo muito simples: pela qualidade de vida de seus membros mais fracos.

 

Se o Liberalismo quer que todos os seres sejam autônomos e autoconfiantes, então, para ser livre, é necessário que se tenha recursos, que haja um chão firme no qual se apoiar.

 

A idéia de Lord Beveridge (5 de março de 1879 – 16 de março de 1963), que infelizmente não se impôs, era que toda a assistência social, todo o bem-estar social, toda a provisão eram necessários como medidas temporárias. E isto porque ele partia do pressuposto de que, para ter a coragem, a ousadia de ser aventurosas e se arriscar, as pessoas precisam se sentir seguras – e segurança elas não podem obter por si próprias, mas deve ser oferecida e garantida pela grande sociedade. Se as pessoas se arriscam sozinhas, correm o perigo de ser abatidas por um grande fracasso, uma tragédia, uma crueldade ou coisa semelhante. Deve haver, portanto, essa garantia do Estado, o que eu chamo de 'seguro coletivo contra o infortúnio individual'. Se isto existe, as pessoas se enchem de coragem e, sem receio de tentar, logo podem se tornar prósperas.

 

Se se considera o melhor na história do Liberalismo e o melhor na história do Socialismo, eles sempre convergem, há sempre essa conexão entre os dois. Para resumir, tudo se reduz à questão muito simples de que há dois valores igualmente indispensáveis para uma vida humana decente e digna: liberdade e segurança. Não se pode ter uma sem que se tenha a outra. Mas, infelizmente na prática política, eles são normalmente justapostos e apresentados como tendo propósitos opostos, como sendo necessário sacrificar a segurança sob o argumento de que quanto maior ela for menos livre se é. A acusação mais comum, hoje em dia, é que o Estado de bem-estar social torna as pessoas dependentes, já que ninguém pode ser livre se depende de assistências de qualquer natureza: saúde, caridade e coisas do gênero. Isto tudo me soa muito cruel, porque eu sou um ser moral na medida em que me considero dependente de você. Em certo sentido, meu bem-estar depende do seu bem-estar, minha autonomia depende da sua autonomia. Assim, qualquer que seja a perspectiva da qual se parta, chega-se sempre à mesma questão de que ou liberdade e segurança são obtidas juntas ou não serão obtidas de modo algum. Este é o ponto de encontro entre Socialismo e Liberalismo.

 

Aprendi a não perguntar de onde uma determinada idéia vem, mas somente como ela ajuda a iluminar as respostas humanas à sua condição — assunto tanto da Sociologia como das 'belles-lettres'.

 

A lida diária com médias estatísticas, tipos, categorias e padrões facilmente faz com que se perca de vista a experiência.

 

Kant, que estabeleceu as fundações de nosso pensamento, nas suas tentativas de explicar o humano, ele desconsiderou todo o aspecto da condição humana que não fosse a razão, deixando de lado, portanto, as características emocionais, irracionais, erráticas, que também fazem parte desta condição. Isto nos deixa com um quadro da Humanidade muito empobrecido, que, se, por um lado, pode aumentar a elegância teórica e o prazer estético do relato lógico, de outro, perde a comunicação com a experiência humana diária.

 

O que aprendi com Borges? Acima de tudo, aprendi sobre os limites de certas ilusões humanas: sobre a futilidade de sonhos de precisão total, de exatidão absoluta, de conhecimento completo, de informação exaustiva sobre tudo. Enfim, sobre as ambições humanas que, no final, se revelam ilusórias e nos mostram impotentes.

 

Ao contrário dos acadêmicos, os romancistas podem, aberta e sem a menor vergonha, recorrer a estratégias que os primeiros desconsiderariam arrogantemente como 'meras intuições', 'puras suposições' ou mesmo 'construções da imaginação'. É por agirem assim que os romancistas podem abrir novas possibilidades interpretativas que os profissionais de 'bona fide' dificilmente iriam suspeitar ou mesmo notar. Mas, acima de tudo, a maior vantagem da narrativa dos romancistas é que ela se aproxima mais da experiência humana do que a maioria dos trabalhos e relatórios das ciências sociais. Elas são capazes de reproduzir a não-determinação, a não-finalidade, a ambivalência obstinada e insidiosa da experiência humana e a ambigüidade de seu significado – todas características muito marcantes do modo de o ser humano estar-no-mundo, mas que a ciência social se inclina a ver como 'impressões falsas', originárias da ignorância ou do conhecimento insuficiente.

 

Maurice Blanchot (27 de setembro de 1907 – 20 de fevereiro de 2003) disse certa vez, em palavras que ficaram famosas, que 'as respostas são a má sorte das perguntas'. De fato, cada resposta implica fechamento, fim da estrada, fim da conversa. Também sugere nitidez, harmonia, elegância; enfim, qualidades que o mundo narrado não possui. Tenta forçar o mundo numa camisa-de-força na qual ele definitivamente não cabe. Corta as opções, a multidão de sentidos e possibilidades que a condição humana implica a cada momento. Promete falsamente uma solução simples para uma busca provocada e impelida pela complexidade. Também mente, pois declara que as contradições e as incompatibilidades que provocam as questões são fantasmas – efeitos de erros lingüísticos ou lógicos, em vez de qualidades endêmicas e irremovíveis da condição humana.

 

Creio que a experiência humana é mais rica do que qualquer uma de suas interpretações, pois nenhuma delas, por mais genial e 'compreensiva' que seja, poderia exauri-la. Aqueles que embarcam em uma vida de conversação com a experiência humana deveriam abandonar todos os sonhos de um fim tranqüilo de viagem. Esta viagem não tem um final feliz – toda a felicidade se encontra na própria jornada.

 

As perguntas mais intrigantes e provocantes emergem, geralmente, após as respostas. No decurso dos anos, aprendi a apreciar a queixa de Adorno [Theodor Ludwig Wiesengrund-Adorno (Frankfurt am Main, 11 de setembro de 1903 – Visp, 6 de agosto de 1969)] sobre a convenção linear da nossa escrita: por causa dela nós não conseguimos transmitir a lógica do pensamento que, diferentemente da escrita, move-se em círculos e está invariavelmente forçada, por seu próprio progresso, a fazer perpétuos retornos.

 

 

 

 

Uma das razões pelas quais passei a falar em 'modernidade líquida' e não em 'pós-modernidade' (meus trabalhos mais recentes evitam esse termo) é que fiquei cansado de tentar esclarecer uma confusão semântica que não distingue Sociologia pós-moderna de Sociologia da pós-modernidade, 'pós-modernismo' de 'pós-modernidade'. No meu vocabulário, 'pós-modernidade' significa uma sociedade (ou, se se prefere, um tipo de condição humana), enquanto 'pós-modernismo' refere-se a uma visão de mundo que pode surgir, mas não necessariamente, da condição pós-moderna. Procurei sempre enfatizar que, do mesmo modo que ser um ornitólogo não significa ser um pássaro, ser um sociólogo da pós-modernidade não significa ser um pós-modernista, o que definitivamente não sou. Ser um pós-modernista significa ter uma ideologia, uma percepção do mundo, uma determinada hierarquia de valores que, entre outras coisas, descarta a idéia de um tipo de regulamentação normativa da comunidade humana, assumindo que todos os tipos de vida humana se equivalem, que todas as sociedades são igualmente boas ou más. Enfim, é uma ideologia que se recusa a fazer qualquer julgamento e a debater seriamente questões relativas a modos de vida viciosos e virtuosos, pois, no limite, acredita que não há nada a ser debatido. Isto é pós-modernismo. Mas eu sempre estive interessado na Sociologia da pós-modernidade, ou seja, meu tema tem sempre sido compreender este tipo curioso e, em muitos sentidos, misterioso de sociedade, que vem surgindo ao nosso redor; e a vejo como uma condição que ainda se mantém eminentemente moderna na suas ambições e 'modus operandi' (ou seja, no seu esforço de modernização compulsiva, obsessiva), mas que está desprovida das antigas ilusões de que o fim da jornada estava logo adiante. É neste sentido que pós-modernidade é, para mim, modernidade sem ilusões. Diferentemente da sociedade moderna anterior, que chamo de 'modernidade sólida', que também tratava sempre de desmontar a realidade herdada, a de agora não o faz com uma perspectiva de longa duração, com a intenção de torná-la melhor e novamente sólida. Tudo está agora sendo permanentemente desmontado, mas sem perspectiva de alguma permanência. Tudo é temporário. É por isto que sugeri a metáfora da 'liquidez' para caracterizar o estado da sociedade moderna: como os líquidos, ela se caracteriza pela incapacidade de manter a forma. Nossas instituições, quadros de referência, estilos de vida, crenças e convicções mudam antes que tenham tempo de se solidificar em costumes, hábitos e verdades 'auto-evidentes'. Sem dúvida a vida moderna foi desde o início 'desenraizadora', 'derretia os sólidos e profanava os sagrados', como os jovens Marx e Engels notaram. Mas, enquanto no passado isto era feito para ser novamente 're-enraizado', agora, todas as coisas – empregos, relacionamentos, 'know-hows' etc. – tendem a permanecer em fluxo, voláteis, desreguladas, flexíveis. A nossa é uma era, portanto, que se caracteriza não tanto por quebrar as rotinas e subverter as tradições, mas por evitar que padrões de conduta se congelem em rotinas e tradições. Como um exemplo desta perspectiva, li outro dia que um famoso arquiteto de Los Angeles estava se propondo a construir casas que permanecessem lindas 'para sempre'. Ao ser perguntado o que queria dizer com isso, ele teria respondido: 'até daqui a vinte anos!' Isto é 'para sempre', grande duração, hoje. O que me interessa é, portanto, tentar compreender quais as conseqüências desta situação para a lógica do indivíduo, para o seu cotidiano. Virtualmente, todos os aspectos da vida humana são afetados quando se vive a cada momento sem que a perspectiva de longo prazo tenha mais sentido. Jean-Paul Sartre aconselhou seus discípulos em todo o mundo a ter um projeto de vida, a decidir o que queriam ser e, a partir daí, implementar este programa consistentemente, passo a passo, hora a hora. Ora, ter uma identidade fixa, como Sartre aconselhava, é, hoje, nesse mundo fluido, uma decisão de certo modo suicida. Se se toma, por exemplo, os dados levantados por Richard Sennett — o tempo médio de emprego em Silicon Valley, por exemplo, é de oito meses — quem pode pensar em um 'projet de la vie' nestas circunstâncias? Na época da modernidade sólida, quem entrasse como aprendiz nas fábricas da Renault ou da Ford iria, com toda a probabilidade, ter ali uma longa carreira e se aposentar após 40 ou 45 anos. Hoje em dia, quem trabalha para Bill Gates por um salário talvez cem vezes maior não tem idéia do que poderá lhe acontecer dali a meio ano! E isto faz uma diferença incrível em todos os aspectos da vida humana. No meu livro mais recente, Liquid Love, exploro o impacto desta situação nas relações humanas, quando o indivíduo se vê diante de um dilema terrível: de um lado, ele precisa dos outros como o ar que respira, mas, ao mesmo tempo, tem medo de desenvolver relacionamentos mais profundos que o imobilizem em um mundo em permanente movimento.

 

 

 

 

 

 

Não acredito que haja um progresso linear no que diz respeito à felicidade humana. Podemos dizer que, como um pêndulo, nos movemos de tempos mais felizes para tempos menos felizes e de menos felizes para mais felizes. Hoje, temos medo e somos infelizes do mesmo modo como também tínhamos medo e éramos infelizes há cem anos, mas por razões diferentes. A modernidade sólida tinha um aspecto medonho: o espectro das botas dos soldados esmagando as faces humanas. Virtualmente, todo mundo, quer da esquerda quer da direita, assumia que a Democracia, quando existia, era para hoje ou para amanhã, mas que uma ditadura estava sempre à vista; no limite, o totalitarismo poderia sempre chegar e sacrificar a liberdade em nome da segurança e da estabilidade. Por outro lado, como Richard Sennett (Chicago, 1º de janeiro de 1943) mostrou, a antiga condição de emprego poderia destruir a criatividade e as habilidades humanas, mas construía, por assim dizer, a vida humana, que podia ser planejada. Tanto os trabalhadores como os donos das fábricas sabiam muito bem que iriam se encontrar novamente amanhã, depois de amanhã, no ano seguinte, pois os dois lados dependiam um do outro. Os operários dependiam da Ford assim como esta dependia dos operários, e porque todos sabiam disso podiam brigar uns com os outros, mas, no final, tendiam a concordar com um 'modus vivendi'. Esta dependência recíproca mitigava, em certo sentido, o conflito de interesses e promovia algum esforço positivo de coexistência, por menor que fosse. Bem, nada disto existe hoje. Os medos e as infelicidades de agora são de outra ordem. Dificilmente outro tipo de stalinismo voltará e o pesadelo de hoje não é mais a bota dos soldados esmagando as faces humanas. Temos outros pesadelos. O chão em que piso pode, de repente, se abrir como num terremoto, sem que haja nada ao que me segurar. A maioria das pessoas não pode planejar seu futuro muito tempo adiante. Os acadêmicos são umas das poucas pessoas que ainda têm essa possibilidade. Na maioria dos empregos, podemos ser demitidos sem uma palavra de alerta. Você chama isso nostalgia? Não sei... Para pessoas que viveram no tipo de sistema Ford, semitotalitário, que tinha uma tendência totalitária inerente, como Hannah Arendt dizia, nossas apreensões devem parecer incompreensíveis! A questão é que, como já disse antes, aproximando-me dos meus 80 anos, não mais acredito que possa existir algo como uma sociedade perfeita. A vida é como um lençol muito curto: quando se cobre o nariz os pés ficam frios, e quando se cobrem os pés o nariz fica gelado. Há sempre um custo a ser pago para a melhora em uma determinada direção. Mas insisto que a sociedade que obsessivamente se vê como não sendo boa o suficiente é a única definição que posso dar de uma boa sociedade.

 

Pessimismo? No meu entender, o otimista é aquele que acredita que este é o melhor dos mundos possíveis. E o pessimista é aquele que suspeita que o otimista tem razão. Neste quadro, não me identifico nem com o otimista nem com o pessimista, pois acredito que o mundo possa ser melhorado, e que essa mera crença é instrumental em torná-lo melhor...

 

Gostaria que os jovens tentassem, apesar de tudo, apesar de todas as tendências em contrário e de todas as pressões de fora, reter na consciência e na memória o valor da durabilidade, da constância, do compromisso. Eles não podem mais contar, como a antiga geração, com a natureza permanente do mundo lá fora, com a durabilidade das instituições que tinham antes toda a probabilidade de sobreviver aos indivíduos. Isto não é mais possível e, na verdade, a vida humana individual, apesar de ser muito curta, abominavelmente curta, é a única entidade da sociedade de agora que tem sua longevidade aumentada. Sim, somente a vida humana individual vê crescer sua durabilidade, enquanto a vida de todas as outras entidades sociais que a rodeiam – instituições, idéias, movimentos políticos – é cada vez mais curta. Assim, o único sentido duradouro, o único significado que tem chance de deixar traços, rastos no mundo, de acrescentar algo ao mundo exterior, deve ser fruto de seu próprio esforço e trabalho. Os jovens podem contar unicamente com eles próprios, e só haverá em suas vidas o sentido e a relevância que forem capazes de lhes dar. Sei que esta é uma tarefa muito difícil, mas é a única coisa que posso lhes dizer.

 

Que os seres humanos sempre preferiram a felicidade à infelicidade é uma observação banal, um pleonasmo, já que o conceito de 'felicidade' em seu uso mais comum diz respeito a estados ou eventos que as pessoas desejam que aconteçam, enquanto a 'infelicidade' representa estados ou eventos que elas queiram evitar. Os dois conceitos assinalam a distância entre a realidade tal como ela é e uma realidade desejada. Por esta razão, quaisquer tentativas de comparar graus de felicidade experimentados por pessoas que adotam modos de vida distintos em relação ao ponto de vista espacial ou temporal só podem ser mal interpretadas e, em última análise, inúteis.

 

A maior atração de uma vida de compras é a oferta abundante de novos começos e novas ressurreições (chances de renascer). 'Consumir', portanto, significa investir na avaliação social de si próprio, o que, em uma sociedade de consumidores, traduz-se em 'vendabilidade': obter qualidades para as quais já existe uma demanda de mercado ou reciclar as que já possui, transformando em mercadorias para as quais a demanda pode continuar sendo criada.

 

Os membros da sociedade de consumidores são eles próprios mercadorias de consumo, e é a qualidade de ser uma mercadoria de consumo que os torna membros autênticos desta mesma sociedade.

 

Logo que a liberdade se estabelece e se transforma em uma rotina diária, um novo tipo de terror, não menos apavorante do que aqueles que a liberdade deveria banir, empalidece as memórias de sofrimentos e rancores de passado: o terror da responsabilidade.

 

Os sofrimentos humanos mais comuns nos dias de hoje tendem a se desenvolver a partir de um excesso de possibilidades, e não de uma profusão de proibições, como ocorria no passado. E se a oposição entre possível e impossível superou a antinomia do permitido e do proibido como arcabouço cognitivo e critério essencial de avaliação e escolha da estratégia de vida, deve-se apenas esperar que a depressão nascida do terror da inadequação venha substituir a neurose causada pelo horror da culpa (ou seja, da acusação de inconformidade que pode se seguir à quebra das regras) como a aflição psicológica mais característica e generalizada dos habitantes da sociedade de consumidores.

 

Outro serviço que uma existência vivida sob estados de emergência recorrentes ou quase perpétuos (ainda que produzidos de maneira artificial ou enganosamente proclamados) pode oferecer à saúde mental de nossos contemporâneos é uma versão atualizada da 'caça à lebre', de Blaise Pascal, ajustada a um novo ambiente social. Trata-se de uma caçada que, em total oposição a uma lebre já morta, cozinhada e consumida, deixa o caçador com muito pouco tempo, ou mesmo nenhum, para refletir sobre a brevidade, o vazio, a falta de significado ou a inutilidade de suas ações mundanas e, por extensão, de sua vida na Terra como um todo.

 

As relações amorosas estão hoje entre os dilemas mais penosos com que precisamos nos confrontar e solucionar. Nestes tempos líquidos, precisamos da ajuda de um companheiro leal, 'até que a morte nos separe', mais do que em qualquer outra época. Mas qualquer coisa 'até a morte' nos desanima e assusta: não se pode permitir que coisas ou pessoas sejam impedimentos ou nos obriguem a diminuir o ritmo de nossa vida. Compromissos de tempo indeterminado ameaçam frustrar e atrapalhar as mudanças que um futuro desconhecido e imprevisível pode exigir. Mas, sem este compromisso e a disposição para o auto-sacrifício em prol do parceiro, não se pode pensar no amor verdadeiro. De fato, é uma contradição sem solução. A esperança, ainda que falsa, é que a quantidade poderia compensar a qualidade: se cada relacionamento é frágil, então, vamos ter tantos relacionamentos quanto forem possíveis.

 

Quanto mais fácil se torna terminar relacionamentos, menos motivação existe para se negociar ou buscar vencer as dificuldades que qualquer parceria sofre, ocasionalmente. Afinal, quando os parceiros se encontram, cada um traz a sua biografia, que precisa ser conciliada, e não se pode pensar em conciliação sem fazer concessões e auto-sacrifício... No fim das contas, é uma questão de escolha, do valor que se dá a estar junto com o parceiro, e da força do amor que torna o auto-sacrifício em prol do amado algo natural, doce e prazeroso, em vez de amargo e desanimador.

 

Nos comportamos exatamente como o tipo de sociedade apresentada nos 'reality shows', como, por exemplo, o 'Big Brother'. A questão da realidade , como insinuam os programas desse tipo, é que não é preciso fazer algo para 'merecer' a exclusão. O que o 'reality show' apresenta é o destino e a exclusão – é o destino inevitável. A questão não é 'se', mas 'quem' e 'quando'. As pessoas não são excluídas porque são más, mas porque outros demonstram ser mais espertos na arte de passar por cima dos outros. Todos são avisados de que não têm capacidade de permanecer porque existe uma cota de exclusão que precisa ser preenchida. É exatamente essa familiaridade que desperta o interesse em massa por este tipo de programa. Muitos de nós adotamos e tentamos seguir a mensagem contida no lema do programa 'Survivor': 'não confie em ninguém!' Um 'slogan' como esse não prediz muito bem o futuro das amizades e parcerias humanas.

 

A globalização negativa cumpriu sua tarefa. As fronteiras que já foram abertas para a livre circulação de Capital, mercadorias e informações não podem ser fechadas para os humanos. Podemos prever que quando e se os atentados terroristas desaparecerem, isto irá acontecer, apesar da violência brutal das tropas. O terrorismo só vai diminuir e desaparecer se as raízes sociopolíticas forem eliminadas. E isto vai exigir muito mais tempo e esforço do que uma série de operações militares punitivas. A guerra real e capaz de se vencer contra o terrorismo não é conduzida quando as cidades e vilarejos arruinados do Iraque ou do Afeganistão são devastados, mas quando as dívidas dos países pobres são canceladas, os mercados ricos são abertos à produção dos países pobres e quando as 115 milhões de crianças atualmente sem acesso a nenhuma escola são incluídas em programas de educação.

 

 

 

 

 

Até agora, a nossa globalização é totalmente negativa. Todas as sociedades já estão abertas. Não há mais abrigos seguros para se esconder. A 'globalização negativa' cumpriu seu papel, mas sua contrapartida 'positiva' nem começou a atuar. Esta é a tarefa mais importante em que o nosso século terá que se empenhar. Espero que um dia seja cumprida. É questão de vida ou morte da Humanidade!

 

A civilização moderna não tem tempo nem vontade de refletir sobre a escuridão no fim do túnel. Ela está ocupada resolvendo sucessivos problemas, e, principalmente, os trazidos pela última ou penúltima tentativa de resolvê-los. O modo com que lidamos com desastres segue a regra de trancar a porta do estábulo quando o cavalo já fugiu e provavelmente já correu para bem longe para ser pego. E o espírito inquieto da modernização garante que haja um número crescente de portas de estábulos que precisam ser trancadas. Ocasiões chocantes como o 11 de Setembro, o 'tsunami' na Ásia e o furacão Katrina deveriam ter servido para nos acordar e fazer agir com sobriedade. Chamar o que aconteceu em Nova Orleans e redondezas de 'colapso da lei e ordem' é simplista. Lei e ordem desapareceram como se nunca tivessem existido.

 

Esse excesso de população precisa ser ajudado a retornar ao convívio social assim que possível. Eles são o 'exército reserva da mão-de-obra' e lhes deve ser permitido que voltem à vida ativa na primeira oportunidade. Os 'redundantes' são obrigados a conviver com o resto da sociedade, o que é legitimado pela capacidade de trabalho e de consumo. Em vez de permanecer, como era visto anteriormente, como um problema de uma parte separada da população, a designação de 'lixo' torna-se a perspectiva potencial de todos. Há partes do mundo que se confrontaram com o antes desconhecido fenômeno de 'população sobrando'. Os países subdesenvolvidos não se disporiam, como no passado, a receber as sobras de outros povos, e nem podem ser forçados a aceitar isso.

 

O número de 'pessoas desnecessárias' crescerá. E aí há o grande problema que, mais cedo ou mais tarde, teremos que enfrentar: capacitar ou não China, Índia e Brasil a imitar o modelo de 'bem-estar' adotado nos Estados Unidos em uma época em que modernização ainda era um privilégio de poucos? Para dar vazão, seriam necessários três planetas, mas nós só temos um para dividir.

 

Até onde vai a situação de nosso Planeta com um único superpoder, confundido e subjugado pela ilusão de sua repentina ilimitada liberdade? A elevação súbita dos Estados Unidos à posição de superpotência absoluta e uma incontestada hegemonia mundial pegou líderes políticos americanos e formadores de opinião desprevenidos. É muito cedo para declarar a natureza deste novo império e generalizar seu impacto no Planeta. Seu comportamento é, possivelmente, o fator mais importante da incerteza definida como 'Nova Desordem Mundial'. Um império estabelecido pela guerra tem que se manter por guerras. Acabamos de ver isto no Iraque, apesar de todos saberem que era óbvio que bombardear e invadir o País não aniquilaria o terrorismo.

 

O que é chamado de 'jeitinho brasileiro' é a maneira que a modernização nos obrigou a reagir. Um dos resultados cruciais da modernização é a dependência dos processos da vida humana pelos 'jeitinhos'. Isto implica o outro lado da mesma moeda: a vulnerabilidade crescente dos legítimos modos instruídos de viver.

 

Pierre Félix Bourdieu (Denguin, 1º de agosto de 1930 – Paris, 23 de janeiro de 2002) ressaltou que o número de personalidades do cenário político que podem compreender e articular expectativas e demandas está encolhendo. Precisamos aumentá-lo, e isto só pode ser feito apresentando problemas e necessidades. O próximo século pode ser o da catástrofe final ou um período no qual um novo acordo entre os intelectuais e as pessoas que representam a Humanidade seja negociado e trazido à tona. Vamos esperar que a escolha entre estes dois futuros ainda seja nossa.

 

Riscos e contradições continuam a ser socialmente produzidos; são apenas o dever e a necessidade de enfrentá-los que estão sendo individualizados.

 

A fluidez dos vínculos, que marca a sociedade contemporânea, encontra-se inevitavelmente inserida nas próprias características da modernidade.

 

Os relacionamentos a dois não podem se desenrolar à parte da cena social, das regras do jogo estabelecidas pela sociedade global. Nada pode fugir deste complexo panorama, do moderno fenômeno conhecido como globalização.

 

A ambivalência, possibilidade de conferir a um objeto ou evento mais de uma categoria, é uma desordem específica da linguagem, uma falha da função nomeadora (segregante) que a linguagem deve desempenhar… A ambivalência é, portanto, o 'alter ego' [um segundo eu; substituto perfeito] da linguagem e sua companheira permanente – com efeito, sua condição normal.

 

Por causa da nossa capacidade de aprender e de memorizar, temos um profundo interesse em manter a ordem do mundo… A situação torna-se ambivalente quando os instrumentos lingüísticos de estruturação se mostram inadequados; ou a situação não pertence a qualquer das classes lingüisticamente discriminadas ou recai em várias classes ao mesmo tempo.

 

Sem a negatividade do caos, não há positividade da ordem; sem o caos, não há ordem.

 

A prática tipicamente moderna, a substância da política moderna, do intelecto moderno, da vida moderna, é o esforço para exterminar a ambivalência: um esforço para definir com precisão – e suprimir ou eliminar tudo que não poderia ser ou não fosse precisamente definido.

 

A soberania do Estado moderno é o poder de definir e de fazer as definições pegarem. Tudo que se autodefina ou que escape à definição assistida pelo poder é subversivo. O outro dessa soberania são as áreas proibidas de agitação e desobediência, de colapso da lei e da ordem… A resistência à definição coloca um limite à soberania, ao poder, à transparência do mundo ao seu controle, à ordem.

 

A história da modernidade é uma história de tensão entre a existência social e sua cultura.

 

Alguns pensadores enxergam a dominação política, econômica e militar no ocidente, delineando os modos alternativos de vida, como uma autodefesa da modernidade. Ela obliquamente reafirma e reforça o mito etiológico da civilização moderna como um triunfo da razão sobre as paixões – a crença de que este triunfo foi um passo inequivocamente progressista no desenvolvimento histórico da moralidade pública.

 

Ao longo de toda a era moderna, a razão legislativa dos filósofos combinou bem com as práticas demasiadamente materiais dos Estados… Legislar e impor as leis da razão é o fardo daqueles poucos conhecedores da verdade – os Filósofos.

 

A ciência moderna nasceu da esmagadora ambição de conquistar a Natureza e de subordiná-la às necessidades humanas… Despojada de integridade e significado inerentes, a Natureza parece um objeto maleável às liberdades do homem.

 

'Nunca tanto poder se combinou com tão pouca indicação sobre o seu uso. Ainda assim há uma compulsão, uma vez existente o poder, para usá-lo de qualquer forma.' (Hans Jonas (10 de maio de 1903 – 5 de fevereiro de 1993, apud Zygmunt Bauman).

 

O que a lição do holocausto nos ensinou foi a duvidar da sabedoria pretensiosa dos cientistas ao dizerem o que é bom ou mau, da capacidade da ciência como autoridade moral, enfim, da capacidade dos cientistas de identificar questões morais e de fazer um julgamento moral dos efeitos de suas ações.

 

A ambigüidade que a mentalidade moderna acha difícil de tolerar e as instituições modernas se empenharam em aniquilar reaparece como a única força capaz de conter e isolar o potencial destrutivo genocida da modernidade.

 

A ambivalência se situa entre amigo e inimigo, entre a ordem e o caos, dentro e fora. Ela representa a deslealdade dos amigos, o gracioso disfarce dos inimigos, a falibilidade da ordem, a vulnerabilidade interna.

 

Ser um estranho significa, primeiro e antes de tudo, que nada é natural; nada é dado por direito, nada vem de graça. A união primitiva do nativo entre o eu e o mundo foi dividida. Cada lado da união foi colocado sob o foco da atenção – como um problema e uma tarefa. Tanto o eu como o mundo são claramente visíveis. Ambos requerem constantemente exame e precisam urgentemente ser 'operados', 'manejados', 'administrados'. Sob todos esses aspectos, a situação do estranho difere drasticamente do modo de vida nativo com conseqüências de longo alcance.

 

'O que difere do existente parecerá ao existente bruxaria, enquanto figuras de pensamento como proximidade, lar, segurança mantêm o mundo imperfeito sob seu feitiço. Os homens têm medo de que perdendo esta mágica percam tudo, porque a única felicidade que conhecem, mesmo em pensamento, é a de ser capaz de se ater a algo – a perpetração da falta de liberdade. (Theodor Adorno, apud Zygmunt Bauman).

 

A autoridade social da especialização pode ser assim descrita: a individualização crescente faz com que a pessoa se feche e contenha em si no sonho de uma vida feliz; a identidade ambígua na pós-modernidade gera uma infelicidade que o individuo procura resolver com o tratamento especializado; cada causa de infelicidade tem um tipo específico de solução especializada que o individuo procura solucionar; o descontrole e as frustrações resultantes da assimilação da sociedade moderna, com o advento de problemas emocionais específicos direcionam a solução na busca de saídas privatizadas; as habilidades privatizadas desalojam habilidades interpessoais tradicionais, sem que se precise recorrer à ajuda externa; as pessoas têm habilidades naturais à sua disposição que permitem a própria solução de problemas individuais; as ciências controlam fontes de incerteza ou desconhecimento popular, produzindo ciclos de padrão da dependência e poder; o descontrole das autoridades no mundo da vida sacrifica as reais necessidades do ser humano na sociedade moderna; e a fragilidade nascida no culto à racionalidade da escolha e da conduta em si mesmo preferem a ordem, em vez da diversidade e ambivalência.

 

A prova cabal da ciência é o credo da superioridade do conhecimento científico sobre qualquer outro conhecimento, ou seja, o direito de a ciência validar e invalidar, de legitimar e deslegitimar.

 

A modernidade atinge a construção do conhecimento quando é capaz de enfrentar o fato de que o aumento do conhecimento expande o campo da ignorância, que a cada passo ao horizonte novas terras desconhecidas aparecem, e que, para colocar a coisa de maneira mais genérica, a aquisição do conhecimento não pode se exprimir de nenhuma outra forma que não a da consciência de mais ignorância.

 

A regulação normativa da vida diária é, com freqüência, sustentada por iniciativa de base popular de natureza heterodoxa, e tem de ser protegida contra transgressões de cima.

 

A tolerância só pode evitar agressões quando se transforma em solidariedade, no reconhecimento universal de que a diferença é uma universalidade que não está aberta à negociação, e que o ataque ao direito universal de ser diferente é o único afastamento face a universalidade que nenhum dos agente solidários, por mais diferente que seja, pode tolerar, exceto com perigo para si e todos os outros agentes.

 

A política que reduziu as responsabilidades assumidas em relação à segurança pública, retirando-se das tarefas da administração social, efetivamente dessocializou os males da sociedade e traduziu a injustiça social como inépcia ou negligência individual.

 

A conquista da Natureza produziu mais desperdício do que felicidade humana.

 

Hoje, cada vez menos pessoas acreditam na capacidade mágica do crescimento econômico e na expansão tecnológica. Uma coisa que as pessoas acham que a tecnologia produz infalivelmente e cada vez mais é um crescente desconforto e perigo – novos riscos, menos previsíveis e remediáveis.

 

Nossos ancestrais eram esperançosos: quando falavam de ‘progresso’, se referiam à perspectiva de cada dia ser melhor do que o anterior. Nós estamos assustados: ‘progresso’, para nós, significa uma constante ameaça de ser chutado para fora de um carro em aceleração.

 

O impulso de transgredir, de substituir e de acelerar a circulação de mercadorias rentáveis não dá ao fluxo uma oportunidade de abrandar, nem o tempo necessário para condensar e se solidificar em formas estáveis, com uma maior expectativa de vida.

 

 

 

 

A questão não é de 'abrir os olhos'. O verdadeiro problema é: quem é capaz de fazer o que deve ser feito para evitar o desastre que já podemos prever? O problema não é a nossa falta de conhecimento, mas a falta de um agente capaz de fazer o que o conhecimento nos diz ser necessário fazer, e urgentemente. Por exemplo: estamos todos conscientes das conseqüências apocalípticas do aquecimento do Planeta. E todos estamos conscientes de que os recursos planetários serão incapazes de sustentar a nossa filosofia e prática de 'crescimento econômico infinito' e de 'crescimento infinito do consumo'. Sabemos que estes recursos estão rapidamente se aproximando de seu esgotamento. Estamos conscientes, mas, e daí? Há poucos (ou nenhum) sinais de que, de própria vontade, estamos caminhando para mudar as formas de vida que estão na origem de todos estes problemas.

 

A atual crise financeira poderá ou não mudar a forma como vivemos. Primeiro, a crise está longe de terminar. Ainda veremos suas conseqüências de longo prazo (um grande desemprego, entre outras). Em segundo lugar, as reações à crise não foram até agora animadoras. A resposta quase unânime dos Governos foi de recapitalizar os bancos, para fazê-los voltar ao 'normal'. Mas foi precisamente esse 'normal' o responsável pela atual crise. Esta reação significa armazenar problemas para o futuro. Mas a crise pode nos obrigar a mudar a maneira como vivemos. A recapitalização dos bancos e instituições de crédito resultou em dívidas públicas altíssimas, que precisão ser pagas pelos nossos filhos e netos – e isto pode empobrecer as próximas gerações. As dívidas exorbitantes podem levar a uma considerável redistribuição da riqueza. São os países ricos agora os mais endividados. De qualquer forma, não são as crises que mudam o mundo, e, sim, nossa reação a elas.

 

Os contatos 'on-line' têm uma vantagem sobre os 'off-line': são mais fáceis e menos arriscados – o que muita gente acha atraente. Eles tornam mais fácil se conectar e se desconectar. Casos as coisas fiquem 'quentes' demais para o conforto, você pode simplesmente desligar, sem necessidade de explicações complexas, sem inventar desculpas, sem censuras ou culpa. Atrás do seu 'laptop' ou do 'iPhone', com fones no ouvido, você pode se cortar fora dos desconfortos do mundo off-line. Mas não há almoços grátis, como diz um provérbio inglês: se você ganha algo, perde alguma coisa. Entre as coisas perdidas estão as habilidades necessárias para estabelecer relações de confiança, as para o que der vier, na saúde ou na tristeza, com outras pessoas. Relações cujos encantos você nunca conhecerá a menos que pratique. O problema é que, quanto mais você busca fugir dos inconvenientes da vida off-line, maior será a tendência a se desconectar.

 

Amor líquido é um amor 'até segundo aviso', o amor a partir do padrão dos bens de consumo: mantenha-os enquanto eles te trouxerem satisfação, e os substitua por outros que prometem ainda mais satisfação. O amor com um espectro de eliminação imediata e, assim, também de ansiedade permanente, pairando acima dele. Na sua forma 'líquida', o amor tenta substituir a qualidade por quantidade – mas isto nunca pode ser feito, como seus praticantes mais cedo ou mais tarde acabam percebendo. É bom lembrar que o amor não é um 'objeto encontrado', mas um produto de um longo e muitas vezes difícil esforço e de boa vontade.

 

Em um mundo 'líquido', em rápida mutação, 'compromissos para a vida' podem se revelar como sendo promessas que não podem ser cumpridas, deixando de ser algo valioso para virarem dificuldades. O legado do passado, afinal, é a restrição mais grave que a vida pode impor à liberdade de escolha. Mas, por outro lado, como se pode lutar contra as adversidades do destino sozinho, sem a ajuda de amigos fiéis e dedicados, sem um companheiro de vida, pronto para compartilhar os altos e baixos? Nenhuma das duas variedades de relação é infalível. Mas a vida também não é. Além disto, o valor de um relacionamento é medido não só pelo que ele oferece a você, mas também pelo que oferece aos seus parceiros. O melhor relacionamento imaginável é aquele em que ambos os parceiros praticam esta verdade.

 

Em uma vida regulada por mercados consumidores, as pessoas passaram a acreditar que, para cada problema, há uma solução. E que esta solução pode ser comprada na loja. Que a tarefa do doente não é tanto usar sua habilidade para superar a dificuldade, mas para encontrar a loja certa que venda o produto certo que irá superar a dificuldade em seu lugar. Não foi provado que essa nova atitude diminua nossas dores. Mas foi provado, além de qualquer dúvida razoável, que a nossa induzida intolerância à dor é uma fonte inesgotável de lucros comerciais. Por esta razão, podemos esperar que esta nossa intolerância se agrave ainda mais, em vez de ser atenuada.

 

Não é o ideal de perfeição que lubrifica as engrenagens da indústria de cosméticos, mas o desejo de melhorar. E isto significa seguir a moda atual. Todos os aspectos da aparência corporal são, atualmente, objetos da moda, não apenas o cabelo ou a cor dos lábios, mas os tamanhos dos quadris ou dos seios. A 'perfeição' significaria um fim a outras 'melhorias'. Na cirurgia plástica, são oferecidos aos clientes cartões de 'fidelidade', garantindo um desconto nas sucessivas cirurgias que eles certamente irão realizar. Assim como a indústria de celebridades, a indústria cosmética não tem limites, e a demanda por seus serviços pode, a princípio, se expandir infinitamente.

 

O 'grande público' precisa de celebridades, de pessoas que estejam no centro das atenções. Pessoas que, na ausência de autoridades confiáveis, líderes, guias, professores, se oferecem como exemplos. Diante do enfraquecimento das comunidades, estas pessoas fornecem 'assuntos-chave' em torno dos quais as quase-comunidades, mesmo que apenas por um breve momento, se condensam —para desmoronar logo depois e se recondensar em torno de outras celebridades momentâneas. É por isto que a indústria de celebridades está garantida contra todas as depressões econômicas.

 

Na lógica das armas de fogo, uma vez carregadas, em alguém ou em alguma coisa elas deverão ser descarregadas.

 

No Brasil, as favelas servem como uma lixeira para um número enorme de pessoas tornadas desnecessárias em partes do País onde suas fontes tradicionais de sustento foram destruídas – para quem o Estado não tinha nada a oferecer nem um plano de futuro. Mesmo que não declararem isso abertamente, as agências estatais devem estar felizes pelo fato de o povo nas favelas tomar os problemas em suas próprias mãos. Por exemplo, ao construir seus barracos rapidamente e de qualquer forma, usando materiais instáveis, encontrados ou roubados, na ausência de habitações planejadas e construídas pelas autoridades estaduais ou municipais para acomodá-los.





 

 

 

Epilogando
(Pondo o Dedo na Ferida)

 

 

 

Chorando, chiando, clamando – justiça!

somos todos atores na mesma injustiça.

O imposto que é pago por um pão francês

é o mesmo... Pobre ou rico seja o freguês!

 

É isto que nos diferencia dos animais:

cagamos e acumpliciamos cada vez mais.

Pensamos assim: — Nada tenho com isso.

Primeiro, a família; outro é meu compromisso.

 

Entretanto, até a raiz dos nossos cabelos

– pêlo por pêlo – todos os nossos pêlos

estão envenenados pela cumplicidade.

 

Quando será que compreenderemos?

Quando será que nos comiseraremos?

Quando gritaremos: — Enfim, Fraternidade!?

 

 

 

 

 

 

Páginas da Internet consultadas:

http://vidraguas.com.br/ Vale a pena ver este vídeo.

http://www.asminasgerais.com.br/

http://www.sitedecuriosidades.com/
ver/significado_de_curiosidade.html

http://djhenzo-henzler.blogspot.com/
2011/06/o-homem-que-trabalha-perde-tempo.html

http://pages.cs.wisc.edu/~
ergreen/honors_thesis/IFS.html

http://www.istoe.com.br/

http://www.consciencia.org/modernidade
-e-ambivalencia-zygmunt-bauman

http://www.infoescola.com/
biografias/zygmunt-bauman/

http://matapurga.blogspot.com/
2010/11/zygmunt-bauman-pensamento.html

http://www.zahar.com.br/doc/t0932.pdf

http://macroscopio.blogspot.com/2007/07/
uma-entrevista-interessante-zygmunt.html

http://grifando.wordpress.com/2008/10/01/
vida-para-consumo-zygmunt-bauman/

http://www.malybu57.kit.net/

http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-
20702004000100015&script=sci_arttext

 

Música de fundo:

Sem Deus com a Família
Composição e interpretação: César Roldão Vieira

Fonte:

http://www.4shared.com/get/aCZy7tj9/14
_-_Csar_Roldo_Vieira_-_Sem_D.html