Eu
não sou rampeiro!
Política não se faz
com ódio, pois não é função hepática.
É filha da consciência, irmã do caráter, hóspede
do coração.
Se
acham que com essa história de velho vão me dar por vencido,
se enganam. Velho sim, velhaco não!
Sou
louco pelo poder, seduzido pelo poder e é para isso que eu vivo.
Essa
coisa de trocar de partido, em muitos casos, é como trocar de mulher:
a pessoa só troca de defeitos.
Há
uma urna no fim do túnel.
Eu
como eleições diretas, bebo eleições diretas,
durmo eleições diretas. Ainda bem que eleição
é uma palavra feminina!
Vamos
tomar essa Bastilha nojenta e repugnante, que é o Colégio
Eleitoral – um câncer que está apodrecendo a política
e matando a nação.
Os
partidos políticos existem para alcançar o poder.
O Governo quer tangenciar os problemas
fundamentais. Falam em mudar os nomes dos partidos. Logo vão querer
mudar o nome da inflação. É isso que nos assusta.
Já vi político brigar
com a mãe, com o pai, com o filho e até com o papa. Mas nunca
vi um que esteja disposto a brigar com os eleitores.
A
pior das crises é a crise do dicionário – disse Ortega
Y Gasset. É a que infelicita o Brasil. Falam em Constituição
com A1-5; em liberdade, com cavalos e cachorros dissolvendo manifestações
ordeiras de trabalhadores, de estudantes, de donas-de-casa, do MDB; em Democracia,
com Governadores de proveta e senadores biônicos; em direitos dos
operários, com o confisco de seus salários; em liberdade de
comunicação, com a censura ao rádio, à televisão
e a Lei Falcão; que a Arena é o maior partido do ocidente,
embora quem ganhe as eleições no Brasil seja o MDB; em independência
externa, com 40 bilhões de dívidas; em governo de estadistas,
com inflação crônica de 50%; em 'milagre brasileiro',
com o flagelo da fome, da falta de teto, da carência do INPS, da taxa
crescente de analfabetismo.
O que há de dramático
no óbvio, notadamente em política, é ser muito declamado
e pouco praticado. A biografia dos santos e dos estadistas é o exercício
do óbvio: a fraternidade, o perdão, o amor ao povo e a verdade.
Por isto são presos, caluniados, apedrejados, crucificados, exilados
e cassados.
Eu
tenho ódio e nojo à ditadura.
A
grande força da Democracia é confessar-se falível de
imperfeição e impureza, o que não acontece com os sistemas
totalitários, que se autopromovem em perfeitos e oniscientes para
que sejam irresponsáveis e onipotentes.
O
poder não corrompe o homem; é o homem quem corrompe o poder.
O homem é o grande poluidor.
Há fidelidade e finalidade,
como há cadeia e cadeia. Há a cadeia do opróbrio –
que é a cadeia do ladrão, do assassino, do proxeneta. Há
a cadeia que é honra e glória – a cadeia de Tiradentes,
de Mangabeira, de Siqueira Campos, de Juscelino Kubitschek, de Armando Sales
Oliveira, de Júlio de Mesquita, de Sobral Pinto, dos jornalistas
Castelo Branco e Wladimir Herzog.
A Revolução de 1964
ressuscitou do cemitério da oligarquia perrepista,1
sepultado que foi pela Revolução de 1930, o lema cínico
de que 'feio em política é perder as eleições'.
Feio é prender arbitrariamente, fraudar eleições pelo
dinheiro e pela pressão da máquina administrativa, admitir
ou remover funcionários por perseguição, espancar estudantes,
nomear parentes, amigos e sexagenários. A inflação
não é feia. Feio é perder as eleições
para o MDB.
A
burocracia pode ser preguiçosa, descortês,
incapaz e até corrupta. Não é exclusivamente na Dinamarca;
em qualquer reino sempre há algo de podre. Rematada insânia
tornar impublicáveis lacunas, faltas ou crimes, pois contamina de
responsabilidade o governante que a ordena ou tolera.
Em
política, estar com a rua não é o mesmo que estar na
rua.
Governo
xique-xique, este que aí está. Não dá sombra
nem encosto. Para a Nação, não dá. Para os amigos,
parentes e protegidos, presenteia com governadorias, senatorias biônicas,
embaixadas, empréstimos e negócios. Passa, então, a
ser o governo sombra e água fresca.
Minha
paciência é tão infinita como a do povo brasileiro.
Só se irrita com o bêbado e com o chato. O chato é o
inimigo do gênero humano. É o vento encanado que acaba com
qualquer reunião, é o maçante a quem você pergunta
'como vai?' e ele resolve contar. Na conceituação exata de
Benedito Croce – que Santiago Dantas me revelou – o chato não
lhe faz companhia e não deixa você ficar só. Governo
chato é esse que aí está; a impaciência nacional
chegou à exaustão.
Quando
se tira o voto ao povo, o povo é expelido do centro para a periferia
da história, perde o pão e a liberdade; o protesto passa a
ser agitação e a greve rotulada de subversão.
O
MDB ingressa na via indireta para destruí-la como acesso ao poder,
pois é cidadela do arbítrio e a fonte envenenada dos males
que desesperam o povo.
O
AI-5 é forte para cassar mandatos, demitir, exilar, prender e torturar.
Mas é fraco até a pusilanimidade frente à inflação,
e é diariamente derrotado pelo custo de vida.
Foi
o homem quem derrotou Hitler. Derrotaram-no as Nações baseadas
na liberdade e nos direitos humanos, em que o homem é fim e não
meio.
A verdade não desaparece quando
é eliminada a opinião dos que divergem. A verdade não
mereceria esse nome se morresse quando censurada.
Na
ditadura, à sombra de Marco Aurélio, pululam e ficam impunes
os Calígulas sangüinários, os Torquemadas da Inquisição
e da intolerância, os enxundiosos Faruks da corrupção.
Na
política, como na vida, é fundamental ser dono de seu tempo.
Ai dos que se esquecem da advertência vital do filósofo grego:
'Do que se gasta na vida, o tempo é o mais caro. Não pode
ser reposto, nem readquirido.'
É
terrível o ofício dos que dependem da opinião pública.
Tantos são assassinados, crucificados, arruinados, frustrados. Foi
trágico o fim de Cristo, Kennedy, Garrincha, Marilyn Monroe, Elvis
Presley. Os Asilos dos Artistas testemunham as terríveis palavras:
Sic transit gloria mundi.2
Não
se pode fazer política com o fígado, conservando o rancor
e os ressentimentos na geladeira. A Pátria não é capanga
de idiossincrasias pessoais. É indecoroso fazer política uterina
em benefício de filhos, de irmãos e de cunhados. O bom político
costuma ser mau parente.
É
claro que a política não é o ofício da bagatela,
a pragmática da ninharia. Quem cuida de coisas pequenas acaba anão.
No
famoso quadro de Pedro Américo – que glorifica o Grito do Ipiranga
– aparece a figura atônita e circunstancial do tropeiro, símbolo
do povo, que via mas não participava do acontecimento.
O
presidencialismo foi fatal para o Brasil. Refiro-me à mímica
presidencialista encenada no País. O sestro nominalista, peculiar
à América Latina, importou o rótulo sem a droga, o
continente sem o conteúdo, o breviário sem as orações.
É a mímica no cumprimento do dever: faz o gesto, mas não
pratica o ato.
A
verdade não tem proprietário exclusivo e infalível.
A
injustiça contra um é a ameaça contra todos.
A estátua dos estadistas não
é forjada pelo varejo da rotina ou pela fisiologia do cotidiano.
Mais
miserável do que os miseráveis é a sociedade que não
acaba com a miséria.
O
povo na rua é minha verdadeira estátua. A outra, de cimento
armado, não me interessa, porque passarinho faz cocô na cabeça.
A
censura é a inimiga feroz da verdade. É o horror à
inteligência, à pesquisa, ao debate, ao diálogo. Decreta
a revogação do dogma da falibilidade humana e proclama os
proprietários da verdade.
O
poder absoluto, erigido em infalível pela censura, corrompe e fracassa
absolutamente.
Calígula
A política é mais perigosa
do que a guerra. Lá, o inimigo fica de frente. Na política,
há os quinta-colunas3
e os traidores, que apunhalam pelas costas.3
Enquanto
houver cachaça, samba, carnaval, mulata e campeonato de futebol,
não haverá rebelião no Brasil. O Corinthians segura
mais o povo do que a Lei de Segurança Nacional.
Ao repudiar Pompéia, embora
inocentando-a de infidelidade, com o dito famoso – 'Não basta
à mulher de César ser honesta, deve parecer honesta' –
César fundou o PSD. Esta tirada hábil tem versão brasileira
no antológico 'em política, o que importa é a versão,
não o fato'. Disputam-lhe a autoria José Maria Alkmin e Gustavo
Capanema, embora, em verdade, seja atribuída a Antonio Carlos.
A
liberdade de expressão é apanágio da condição
humana e socorre as demais liberdades ameaçadas, feridas ou banidas.
'É a rainha das liberdades', disse Rui Barbosa.
A terra não pode ser mera
reserva de valor para os que especulam com o seu preço, porque só
nela os homens encontram a vida.
A civilização é
a longa e fascinante história da libertação do homem.
A liberdade é o roteiro da civilização. Toda invenção
é o triunfo da libertação humana. Com a roda, o homem
começou a libertar-se do espaço e do tempo; com a agricultura,
do nomadismo e da fome; com a medicina, da doença; com a casa, a
roupa e o fogo, das intempéries, do frio e das feras; com a escola,
da ignorância; com a sociedade, da solidão; com a Imprensa,
o rádio e a televisão, da desinformação; com
a Democracia, dos tiranos.
Desenvolvimento
sem liberdade e sem justiça social não tem esse nome. É
crescimento ou inchação, é empilhamento de coisas e
valores, é estocagem de serviços, utilidades e dívidas,
estranha ao homem e seus problemas, é inacessível tesouro
no fundo do mar, inatingível pelas reivindicações populares.
Senhores
Convencionais, a caravela vai partir. As velas estão pandas de sonho,
aladas de esperança. O ideal está no leme e o desconhecido
se desata à frente. No cais alvoroçado, nossos opositores
– como o Velho do Restelo de todas as epopéias, com sua voz
de Cassandra e seu olhar derrotista – sussurram as excelências
do imobilismo e da invencibilidade do 'estabilishment'. Conjuram que é
hora de fiar e não de se aventurar. Mas, no episódio, nossa
carta de marear não é de Camões, e, sim, de Fernando
Pessoa, ao recordar o brado: navegar é preciso, viver não
é preciso! Posto hoje no alto da gávea, espero em Deus que
em breve possa gritar ao povo brasileiro: alvíssaras, meu capitão,
terra à vista! Sem sombra, medo e pesadelo, à vista a terra
limpa e abençoada da liberdade.
Quando
as elites políticas pensam apenas na sobrevivência do poder
oligárquico colocam em risco a soberania nacional. A governabilidade
está no social.
Uma
Quadrinha Final
Nunca
mais.
Oh!,
abominanda (claus)ura!
Fel demais!
Dr.
Ulysses Diretas
Guimarães