CARTA OCTOSSÍLABA

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

 

 

A música de fundo deste trabalho é o famoso Concierto de Aranjuez (2º movimento), de autoria de Joaquín Rodrigo, com seqüência em arquivo .mid de Stan Tracy.

 

 

 

 

 

Segundo o psicoterapeuta e jornalista Roque Theophilo, a transdisciplinaridade não é um simples conjunto de conhecimentos ou um novo modo de organizá-los. Trata-se de uma postura de respeito pelas diferenças culturais, de solidariedade e de integração à Natureza. O termo data de 1970, quando Jean Piaget afirmou durante um congresso sobre interdisciplinaridade, que aquela etapa deveria ser sucedida por uma etapa transdisciplinar. O prefixo trans remete ao que está entre, através e além das disciplinas. A transdisciplinaridade vai além do que chamamos disciplina, que é a memória do conhecimento. Uma das propostas da transdisciplinaridade é o rompimento da dicotomia entre sujeito e objeto. Fala-se de diferentes níveis de percepção aos quais correspondem diferentes níveis de realidade, pois que, a transdisciplinaridade propõe uma alternância em três níveis da razão sensível, razão experiencial e razão prática. A transdisciplinaridade, como paradigma emergente, propõe transcender o universo fechado da ciência e trazer à tona a multiplicidade fantástica dos modos de conhecimento, assim como o reconhecimento da multiplicidade de indivíduos produtores de todos estes novos e velhos modos de conhecimento. A partir de então, surge a necessidade de reafirmar o valor de cada sujeito como portador e produtor legítimo de conhecimento. Sendo assim, a transdisciplinaridade chama a atenção para a potencialização de tendências heterogêneas, seja no campo das subjetividades ou no da produção de conhecimento, abrindo áreas de tensão com as tendências homogeneizantes. Pode a transdisciplinaridade, de fato, viabilizar a valorização de processos de caráter heterogêneo no campo das subjetividades e da produção de conhecimento, num contexto marcado pelas possibilidades abertas com o advento da virtualização? Transdisciplinaridade é um neologismo correto. Não deve ter hífen, nem precisa ser escrito em itálico, ou entre aspas. Basarab Nicolescu fomenta a transdisciplinaridade como uma forma de ser, saber e abordar, atravessando as fronteiras epistemológicas de cada ciência, praticando o diálogo dos saberes sem perder de vista a diversidade e a preservação da vida no planeta, construindo um texto contextualizado e personalizado de leitura dos fenômenos. Os participantes do Congresso, Ciência e Tradição: Perspectivas Transdisciplinares para o século XXI, realizado pela UNESCO, no período de 02 a 06 de dezembro de 1991, em Paris, emitiram um Comunicado Final no qual salientaram, dentre outros pontos, que a transdisciplinaridade não procura construir sincretismo algum entre a ciência e a tradição, cujas práticas entendem ser radicalmente diferentes da metodologia da ciência moderna, mas, sim, que a transdisciplinaridade procura pontos de vista a partir dos quais seja possível torná-las interativas, procura espaços de pensamento que as façam sair de sua unidade, respeitando-se as diferenças que têm entre si, apoiando-se em uma nova concepção da Natureza, de maneira que o desafio da transdisciplinaridade é gerar uma civilização em escala planetária que, por força do diálogo intercultural, se abra para a singularidade de cada um e para a inteireza do ser.

 

Na realidade, depois de refletirmos sobre as palavras de Roque Theophilo acima e de lermos a Carta da Transdisciplinaridade logo a seguir, facilmente perceberemos contemplados diversas normas de conduta e diversos princípios tão caros a todos os Rosacruzes, como, por exemplo, o que está prescrito no Artigo 8 da referida Carta: A dignidade do ser humano é também de ordem cósmica e planetária. E como está preceituado no Artigo 11º: A educação transdisciplinar reavalia o papel da intuição, da imaginação, da sensibilidade e do corpo na transmissão dos conhecimentos. E também como está aconselhado no Artigo 14º: A tolerância é o reconhecimento do direito às idéias e às verdades contrárias às nossas.

 

Bem, é com imensa alegria e profundo sentimento de gratidão que confesso que logo que entrei para Ordem Rosacruz AMORC, o que mais me comoveu foi este Lema Rosacruz: A mais ampla tolerância na mais estrita independência. E nos meus quarenta e um anos de afiliação à esta Augusta Ordem jamais vi ou soube de qualquer ato de intolerância por parte de seus oficais. Só o fato de a Ordem me aturar já é um bom exemplo.

 

 

 

 

 

 

 

 

CARTA DA TRANSDISCIPLINARIDADE

 

 

 

 




(Elaborada no Primeiro Congresso Mundial da Transdisciplinaridade, Convento de Arrábida, Portugal, 2-6 novembro 1994)

 

 

Preâmbulo



Considerando que a proliferação atual das disciplinas acadêmicas conduz a um crescimento exponencial do saber que torna impossível qualquer olhar global do ser humano;

Considerando que somente uma inteligência que se dá conta da dimensão planetária dos conflitos atuais poderá fazer frente à complexidade de nosso mundo e ao desafio contemporâneo de autodestruição material e espiritual de nossa espécie;

Considerando que a vida está fortemente ameaçada por uma tecnociência triunfante que obedece apenas à lógica assustadora da eficácia pela eficácia;

Considerando que a ruptura contemporânea entre um saber cada vez mais acumulativo e um ser interior cada vez mais empobrecido leva à ascensão de um novo obscurantismo, cujas conseqüências sobre o plano individual e social são incalculáveis;

Considerando que o crescimento do saber, sem precedentes na história, aumenta a desigualdade entre seus detentores e os que são desprovidos dele, engendrando, assim, desigualdades crescentes no seio dos povos e entre as nações do Planeta;

Considerando simultaneamente que todos os desafios enunciados possuem sua contrapartida de esperança e que o crescimento extraordinário do saber pode conduzir a uma mutação comparável à evolução dos hominídeos à espécie humana;

Considerando o que precede, os participantes do Primeiro Congresso Mundial de Transdisciplinaridade (Convento de Arrábida, Portugal 2 - 7 de novembro de 1994) adotaram o presente Protocolo entendido como um conjunto de princípios fundamentais da comunidade de espíritos transdisciplinares, constituindo um contrato moral que todo signatário deste Protocolo faz consigo mesmo, sem qualquer pressão jurídica e institucional.

 


Artigo 1

 


Qualquer tentativa de reduzir o ser humano a uma mera definição e de dissolvê-lo nas estruturas formais, sejam elas quais forem, é incompatível com a visão transdisciplinar.

 


Artigo 2

 


O reconhecimento da existência de diferentes níveis de realidade, regidos por lógicas diferentes é inerente à atitude transdisciplinar. Qualquer tentativa de reduzir a realidade a um único nível regido por uma única lógica não se situa no campo da transdisciplinaridade.

 


Artigo 3

 


A transdisciplinaridade é complementar à aproximação disciplinar: faz emergir da confrontação das disciplinas dados novos que as articulam entre si; oferece-nos uma nova visão da Natureza e da realidade. A transdisciplinaridade não procura o domínio sobre as várias outras disciplinas, mas a abertura de todas elas àquilo que as atravessa e as ultrapassa.

 


Artigo 4

 


O ponto de sustentação da transdisciplinaridade reside na unificação semântica e operativa das acepções através e além das disciplinas. Ela pressupõe uma racionalidade aberta, mediante um novo olhar sobre a relatividade das noções de "definição" e de "objetividade". O formalismo excessivo, a rigidez das definições e o absolutismo da objetividade, comportando a exclusão do sujeito, levam ao empobrecimento.

 

 

Artigo 5

 


A visão transdisciplinar é resolutamente aberta na medida em que ela ultrapassa o campo das ciências exatas devido ao seu diálogo e à sua reconciliação não somente com as ciências humanas, mas, também, com a arte, com a literatura, com a poesia e com a experiência espiritual.

 


Artigo 6

 


Com relação à interdisciplinaridade e à multidisciplinaridade, a transdisciplinaridade é multirreferencial e multidimensional. Embora levando em conta os conceitos de tempo e de história, a transdisciplinaridade não exclui a existência de um horizonte trans-histórico.

 


Artigo 7

 


A transdisciplinaridade não constitui nem uma nova religião, nem uma nova filosofia, nem uma nova metafísica, nem uma ciência das ciências.

 


Artigo 8

 


A dignidade do ser humano é também de ordem cósmica e planetária. O surgimento do ser humano sobre a Terra é uma das etapas da História do Universo. O reconhecimento da Terra como pátria é um dos imperativos da transdisciplinaridade. Todo ser humano tem direito a uma nacionalidade, mas, a título de habitante da Terra, ele é, ao mesmo tempo, um ser transnacional. O reconhecimento pelo direito internacional de uma dupla cidadania – referente a uma nação e a Terra – constitui um dos objetivos da pesquisa transdisciplinar.

 

 

Artigo 9

 

 

A transdisciplinaridade conduz a uma atitude aberta em relação aos mitos, às religiões e àqueles que os respeitam em um espírito transdisciplinar.

 

 

Artigo 10º

 

 

Não existe um lugar cultural privilegiado de onde se possam julgar as outras culturas. A abordagem transdisciplinar é, ela própria, transcultural.

 

 

Artigo 11º

 

 

Uma educação autêntica não pode privilegiar a abstração no conhecimento. Deve ensinar a contextualizar, concretizar e globalizar. A educação transdisciplinar reavalia o papel da intuição, da imaginação, da sensibilidade e do corpo na transmissão dos conhecimentos.

 

 

Artigo 12ª

 

 

A elaboração de uma Economia transdisciplinar está baseada no postulado de que a Economia deve estar a serviço do ser humano e não o inverso.

 

 

Artigo 13º

 

 

A Ética Transdisciplinar recusa toda atitude que se negue ao diálogo e à discussão, seja qual for sua origem – de ordem ideológica, científica, religiosa, econômica, política ou filosófica. O saber compartilhado deve conduzir a uma compreensão compartilhada, baseada no respeito absoluto das diferenças entre os seres, unidos pela vida comum sobre uma única e mesma Terra.

 

 

Artigo 14º

 

 

Rigor, abertura e tolerância são características fundamentais da atitude e da visão transdisciplinar. O rigor na argumentação, que leva em conta todos os dados, é a melhor barreira contra possíveis desvios. A abertura comporta a aceitação do desconhecido, do inesperado e do imprevisível. A tolerância é o reconhecimento do direito às idéias e às verdades contrárias às nossas.

 

 


Artigo Final

 

 

 

A presente Carta Transdisciplinar foi adotada pelos participantes do Primeiro Congresso Mundial de Transdisciplinaridade, que não reivindicam nenhuma outra autoridade exceto a do seu próprio trabalho e a da sua própria atividade.

 

Segundo os procedimentos que serão definidos de acordo com as mentes transdisciplinares de todos os países, esta Carta está aberta à assinatura de qualquer ser humano interessado em promover nacional, internacional e transnacionalmente as medidas progressivas para a aplicação destes artigos na vida cotidiana.


Convento de Arrábida, 6 de novembro de 1994.

 

Fonte:

http://www.redebrasileiradetransdisciplinaridade.net


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Páginas da Internet consultadas:

http://www.sociologia.org.br/tex/ap40.htm

 

Música de fundo:

Concierto de Aranjuez (2º movimento)
Composição: Joaquín Rodrigo
Seqüência: Stan Tracy

Fonte:

http://www.eadcentral.com/go/1/1/0/
http://www.stanthea.plus.com/stansmusicpage/