Só Deus Basta!

Santa Teresa de Ávila, O.C.D.
(Pensamentos e Reflexões)

 

 

 

Teresa de Ávila

Teresa de Ávila
Quadro de Peter Paul Rubens (1577 – 1640)

 

 

 

 

 

ão me move,
Senhor, para Te amar
O Céu que me prometestes,
Nem me move o inferno tão temido
Para deixar, por isto, de Te ofender.

 

Tu me moves, Senhor!
Move-me ver-Te
Pregado em uma Cruz e escarnecido;
Move-me ver Teu Corpo tão ferido;
Movem-me Tuas afrontas e Tua morte.

 

Move-me, enfim, o teu amor.
E de tal maneira,
Que ainda que não houvesse Céu,
eu Te amaria;
E ainda que não houvesse inferno,
eu Te temeria.

 

Nada tens que me dar
para que eu Te queira,
Pois, mesmo que eu
não esperasse o que espero,
O mesmo que Te quero,
Eu te quereria.

 

 

Não me Move
Santa Teresa de Ávila


 

 

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

Objetivo do Estudo

 

 

 

Teresa de Ávila

Teresa de Ávila

 

 

 

Santa Teresa de Ávila ou Santa Teresa de Jesus (Gotarrendura, 28 de março de 1515 – Alba de Tormes, 4 de outubro de 1582) foi uma religiosa e escritora espanhola, famosa pela reforma que realizou no Carmelo e por suas obras místicas. Entre outras confissões, ela declarou: O fato de ter pais virtuosos e tementes a Deus e de ser tão favorecida pelo Senhor, bastar-me-ia para ser boa, se não fora tão ruim. Este estudo meramente compilatório pretendeu coligir em algumas páginas da Internet algumas reflexões e alguns pensamentos desta grande mística medieval.

 

Um diálogo de Teresa com Deus: — Senhor, se estou cumprindo Tuas Ordens, por que tenho tantas dificuldades no caminho? Deus respondeu: — Teresa, não sabes que é assim que trato os meus amigos? Teresa, honrando seu sangue espanhol, respondeu: — Ah, Senhor, então é por isto que tens tão poucos amigos!

 

 

 

 

Breve Biografia

 

 

 

Teresa de Ávila

O Êxtase de Santa Teresa de Ávila

(Animação produzida a partir de um grafito anônimo
que inesperadamente irrompeu
dos muros da cidade de Lisboa, em 1994.
O grafito é uma reprodução a partir da escultura barroca
de Gian Lorenzo Bernini, 1598 – 1680)

 

 

 

Êxtase de Santa Teresa

O Êxtase de Santa Teresa
Gian Lorenzo Bernini (1598 – 1680)

 

 

 

Teresa Sánchez de Cepeda y de Ahumada nasceu em Ávila, na Espanha, em 1515, e foi educada de modo sólido e cristão, tanto assim que, quando criança, se encantou tanto com a leitura da vida dos santos mártires a ponto de ter combinado fugir com o irmão para uma região onde muitos cristãos eram martirizados; mas nada disso aconteceu graças à vigilância dos pais.

 

Aos vinte anos, ingressou no Carmelo de Ávila, no qual viveu um período no relaxamento, pois muito havia se apegado às criaturas, aos parentes e à conversas destrutivas, como confessa em seu livro autobiográfico. Certo dia, foi tocada pelo olhar da imagem de um Cristo sofredor, assumindo, a partir desta experiência, a sua conversão. Voltou ao fervor da espiritualidade carmelita, a ponto de criar uma espiritualidade modelo.

 

Foi grande amiga do seu conselheiro espiritual São João da Cruz, que conheceu em 1567, também doutor da Igreja, místico e reformador da parte masculina da Ordem carmelita. Disse São João da Cruz: A saúde da pessoa é o amor. De Deus, alcançamos tudo o que esperamos. Com Deus estamos unidos, segundo a nossa fé; quanto mais caímos, mais unidos estamos a Deus. Por meio de contatos místicos e com a orientação desse grande amigo, iniciou, aos 40 anos de idade, com saúde abalada, a reforma do Carmelo feminino. Começou pela fundação do Carmelo de São José, fora dos muros de Ávila. Daí partiu para todas as direções da Espanha, criando novos Carmelos e reformando os antigos. A Regra primitiva, a qual Santa Teresa e São João reintroduziram por sua reforma divinamente inspirada, proporciona o meio através do qual as almas escolhidas podem cumprir o mandamento de amar a Deus e ao próximo. Cada religiosa deixa família, amigos e bens para ganhar a Jesus pelos votos de pobreza, de castidade e de obediência. Na vida carmelitana, como esposa de Nosso Senhor, ela se torna um jardim fechado no qual ela e Deus amorosamente podem comungar, e no qual Ele pode morar e pode encontrar conforto e consolação. Este abandono e dedicação total de si mesma conferem eficácia às suas orações para a Igreja, para as almas e, principalmente, para os sacerdotes. Por esta via, ela obtém a intercessão e o auxílio sobrenatural. Com a Pequena Flor Padroeira das missões como seu modelo, cada coração de uma Carmelita queima com caridade apostólica em favor dos homens, seus irmãos.

 

Enfim, Santa Teresa D’Ávila, não teve amor pelos santos de rostos tristes, e legou a cada uma de suas filhas Carmelitas, uma parte de seu próprio espírito caloroso e gracioso de alegria. A vida do Carmelo, embora necessariamente seja uma vida de trabalhos e de mortificação, é bem certamente, também, uma vida de felicidade e de paz. Como é possível que uma irmã não possua uma profunda paz quando Deus lhe deu a garantia de Seu amor por lhe presentear com tão linda vocação? As Carmelitas regozijam-se por viver e trabalhar na Sua presença.

 

Provocou, com estas mudanças, muitos ressentimentos por parte daqueles que não aceitavam a vida austera que propunha para o Carmelo reformado. Chegou a ter temporariamente revogada a licença para reformar outros conventos ou fundar novas casas.

 

Santa Teresa deixou-nos várias obras grandiosas e profundas, principalmente escritas para as suas filhas do Carmelo: O Caminho da Perfeição, Pensamentos Sobre o Amor de Deus, Castelo Interior e A Vida.

 

O seu segredo foi o amor. Conseguiu fundar mais de trinta e dois mosteiros, além de recuperar o fervor primitivo de muitas carmelitas, juntamente com São João da Cruz. Teve sofrimentos físicos e morais antes de morrer, até que em 1582 disse uma das últimas palavras: Senhor, sou filha de vossa Igreja. Como filha da Igreja Católica quero morrer.

 

Morreu em Alba de Tomas na noite de 4 de outubro de 1582, aos 67 anos, e em 1622 foi proclamada santa. Após ter recebido os últimos sacramentos, sua última frase foi: — Oh, Senhor, por fim chegou a hora de nos vermos face a face! Após sua morte, foi feita uma autópsia no corpo da Santa, e foi constatado que havia em seu coração uma cicatriz de uma ferida longa e profunda. Seu coração acha-se guardado em um precioso relicário na Igreja das Carmelitas, em Alba. No dia 27 de setembro de 1970, o Papa Paulo VI concedeu-lhe o título de Doutora da Igreja, tornando-se, assim, a primeira mulher a ser declarada Doutora da Igreja. Sua festa litúrgica é no dia 15 de outubro.

 

 


 

Pensamentos e Reflexões

 

 

 

 

Teresa de Ávila

Teresa de Ávila

 

 

 

Nada te perturbe.
Nada te amedronte.
Tudo passa, só Deus não muda.
A paciência tudo alcança.
A quem tem Deus nada falta.
Só Deus basta!

 

De todas as ordens recebidas, poucas se me afiguraram tão difíceis como a de escrever sobre assuntos de oração.

 

Quem me mandou escrever disse que essas monjas dos nossos mosteiros de Nossa Senhora do Carmo têm necessidade de que lhes esclareçam algumas dúvidas em matéria de Oração.

 

Nossa alma é como um castelo, feito de um só diamante ou limpíssimo cristal.

 

Compararei a Divindade com um polido diamante muito maior do que o Universo. Todas as nossas ações se refletem Nele, porque Ele encerra todas as coisas, tanto que fora da Sua amplitude nada existe.

 

 

 

 

Ó Senhor, experimento tanta alegria ao pensar que as minhas infidelidades fazem com que melhor conheça a Vossa misericórdia, que sinto suavizar-se a dor pelas graves ofensas que Vos fiz.

 

A porta para entrar neste Castelo [o Castelo Interior] é a Oração1 e a Meditação...

 

A oração consiste em tratar a Deus como um Pai, um Irmão, um Senhor e um Esposo.

 

Jamais creiais que adquiristes uma virtude, enquanto não a tiverdes provado com aquilo que lhe é contrário.

 

No nosso próximo, procuremos ver tão-somente as virtudes e as boas obras; e cubramos os seus defeitos considerando-os como sendo nossos pecados.

 

Diante da Sabedoria infinita, mais vale um breve desejo de humildade com algum ato, do que toda a ciência do mundo.

 

O caminho da santidade, para Santa Teresa, é a oração. Ela ensina a oração em 4 etapas: 1ª - Oração Mental: é como tirar água do poço, quando rezamos com o nosso intelecto. 2ª - Oração de Quietude: é como tirar água com a nora2 puxada por um jumento, quando rezamos com a nossa vontade. É o nosso ser-criança que ora, é ser Maria. Oração de União ou Toques: é como água corrente. É um abandono em Deus. É permitir que o Senhor nos ame. É orar com os nossos sentimentos e emoções. Não se distrai. Nesta fase, ficamos apaixonados e entusiasmados e começamos a ser Marta e a fazer obras. Oração de União Extática ou Êxtase: é como o deixar chover. A alma está absorvida por Deus. Só Deus basta.

 

Se Satanás pudesse amar, deixaria de ser mau.

 

Ser grande é amar os pequenos. Ser pequeno é odiar os grandes.

 

Ter coragem diante de qualquer coisa na vida, esta é a base de tudo.

 

É uma grande virtude considerar todos melhores que nós.

 

A virtude é uma verdade.

 

A humildade é caminhar na verdade.

 

Nas panelas também encontramos a Deus.

 

Senhor, sou filha de vossa Igreja. Como filha da Igreja Católica quero morrer. Senhor, não me rejeiteis a Vossa face. Um coração contrito e humilhado não haveis de desprezar.

 

Eu vi um anjo perto de mim, no meu lado esquerdo, em forma corporal. Isto é algo que não estou habituada a ver, a não ser muito raramente. Apesar de eu ter visões de anjos com freqüência, vejo-os apenas através de uma visão intelectual, como tenho falado antes. Foi a vontade de nosso Senhor que, nesta visão, visse o anjo desta forma. Ele não era grande, mas de pequena estatura, e era muito bonito. Seu rosto queimava, como se fosse um dos mais altos anjos, que parecem estar todos em chamas: ele deve ser um daqueles a quem nós chamamos querubins. Seu nome ele nunca me disse; mas vejo muito bem que não existe no céu tão grande a diferença entre um anjo e outro, e entre estes e os outros que eu não posso explicar. Eu vi em sua mão uma longa lança de ouro, e o ferro da ponta parecia estar em chamas. Ele pareceu empurrá-la às vezes no meu coração, e penetrou-me as entranhas. Quando ele a retirou, deixou-me toda a arder com um grande amor de Deus. A dor foi tão grande, que me fez lamentar; e, ainda assim, uma doçura foi superando essa dor, fazendo-me não desejar me livrar dela. A alma, agora, é satisfeita apenas com Deus. A dor não é física, mas espiritual; embora o organismo tenha a sua parte nela. É um amor tão doce e carinhoso, que agora existe entre a minha alma e Deus, e eu agradeço à bondade de Deus por me ter feito passar por essa experiência.

 

Teresa sem a graça de Deus é uma pobre mulher; com a graça de Deus, uma fortaleza; com a graça de Deus e muito dinheiro, uma potência.

 

Senti que Santa Maria Madalena vinha em meu socorro. E, desde então, muito progredi na vida espiritual.

 

Certa ocasião, ao se deter sob um crucifixo muito ensangüentado, perguntou: — Senhor, quem vos colocou aí? Pareceu-lhe ouvir uma voz: — Foram tuas conversas no parlatório que me puseram aqui, Teresa.

 

Santa Teresa jamais se cansava de prestar atenção aos sermões, por piores que fossem.

 

Logo depois da morte da mãe de Teresa: — Quando me dei conta da perda que sofrera, comecei a me entristecer. Então, me dirigi a uma imagem de Nossa Senhora, e supliquei, com muitas lágrimas, que me tomasse como sua filha.

 

A oração não consiste em pensar muito, senão em amar muito.

 

A respeito de São Pedro de Alcântara, após a desencarnação deste: — Tenho-o visto muitas vezes com grandíssima glória. Parece-me que muito mais me consola do que quando aqui estava.

 

A experiência me ensinou o que é uma casa cheia de mulheres. Deus nos livre deste mal.

 

Deus não parece se contentar com arrebatar a alma para Si; mas levanta também este corpo mortal, manchado com o barro asqueroso de nossos pecados.

 

A única razão que encontro para viver é sofrer; isto é o único que peço para mim.3

 

Muito devota de São José, a quem invocava como Protetor das Virgens e de nossa Mãe Maria Santíssima, narra assim algumas experiências: Eu estava na Igreja do Mosteiro do Glorioso Santo Domingo, pensando nos eventos que me desolava a vida e nos meus muitos pecados, os quais em tempos passados os havia confessado… Caí em êxtases profundo. Sentei-me e parecia que não podia ver a elevação e ouvir a Missa… Via Nossa Senhora à minha direita e meu Pai São José à minha esquerda, vestindo-me com um manto de grande brancura e esplendor. Foi-me concedido compreender que com este manto estava limpa de meus pecados. Quando estive revestida, estava cheia de grande alegria, e nossa Senhora parecia me tomar pelas mãos. Ela disse que eu havia recebido estas graças devido a ser boa devota de São José e que podia confiar que meus desejos relacionados ao convento se realizariam, que não deveria temer nenhum fracasso porque eles velariam por nós e que seu Filho prometeu estar conosco. E, como prova disto, iria me dar uma jóia. Então, pareceu que ela colocava ao redor de meu pescoço um esplêndido colar de ouro, que sustentava um crucifixo de muito valor… Os vi, então, subir ao céu com uma multidão de anjos…

 

 

 

Vivo Sin Vivir en Mí

Vivo Sem Viver em Mim
(Tradução livre minha)

 

 

 

ivo sem viver em mim.
E de tal maneira espero,
que morro porque não morro.

 

Vivo já fora de mim,
eis que já morro de amor;
porque vivo no Senhor,
que me quis para Si.
Quando o Coração me falou
Nele insculpi este letreiro:
morro porque não morro.

 

Esta divina prisão
– de amor com que eu vivo –
fez de Deus meu cativo
e livre meu Coração;
e causa em mim tal paixão
ver a Deus meu prisioneiro,
eis que morro porque não morro.

 

Ah!, como é longa esta vida!
Quão duros são estes desterros,
este cárcere, estes ferros,
em que a alma está metida!
Só de esperar a partida
me causa uma dolor tão atroz,
eis que morro porque não morro.

 

Ah!, que vida tão amarga
de não poder gozar o Senhor!
Porque se é doce o amor,
não é a esperançosa esperança.
Afasta, Deus, esta carga
mais pesada do que o aço,
eis que morro porque não morro.

 

Só com a confiança
vivo sabendo que hei de morrer,
porque o morrer é viver
– me assegura minha esperança.
A morte do viver se alcança...
Não te demores, que te espero,
eis que morro porque não morro.

 

Ouve bem: o amor é forte!
Vida, não sejas ingrata;
olha só o que me resta
para Te ganhar ou Te perder!
Vem já, ó doce morte...
O morrer? Que venha rápido,
eis que morro porque não morro.

 

Aquela vida acima
é a vida verdadeira.
Até que esta vida morra,
não se goza estando vivo.
Morte, não me sejas esquiva!
Vivo, morrendo primeiro,
eis que morro porque não morro.

 

Oh! vida! O que de melhor posso dar
ao meu Deus que vive em mim,
se não é te perder
para melhor poder gozá-Lo?
Quero morrendo alcançá-Lo,
pois tanto ao meu Amado quero,
que morro porque não morro.


 

 

O que de melhor posso dar ao meu Deus que vive em mim?

 

É maravilhoso e agradável a nosso Senhor qualquer serviço feito à sua Mãe, e sua misericórdia é grande para os que o fazem.

 

Dentre suas muitas perseguições foi chamada de herege por seus inimigos da Inquisição. Maria Santíssima lhe disse: — Não sofras porque esta causa é minha.

 

Certa vez, num oratório, apareceu-me o demônio do lado esquerdo, em abominável figura... Outra vez me atormentou durante cinco horas, com dores tão terríveis e desassossego interior e exterior, que me parecia insuportável... De muitos fatos cobrei experiência de que não há coisa de que mais fujam os demônios do que água benta... O fato é que já compreendi perfeitamente quão pequeno é o poder dos demônios contra mim, se eu mesma não for contra Deus. Por isto, quase não os temo. De nada valem suas forças, a menos que vejam almas covardes que abandonam a luta. Aqui mostram eles sua tirania.

 

Havia muito tempo que o Senhor me fazia muitas graças já referidas e outras ainda maiores, quando, um dia, estando em oração, achei-me subitamente, ao que me parecia, metida corpo e alma no inferno. Entendi que o Senhor queria me fazer ver o lugar que os demônios aí me haviam preparado, e eu merecera por meus pecados. Durou brevíssimo tempo. Contudo, ainda que vivesse muitos anos, acho impossível esquecê-lo.4

 

No inferno, o tormento interior é tal, que não há palavras para o definir, nem se pode entender como é realmente. Na alma, senti tal fogo, que não tenho capacidade para o descrever. No corpo, eram incomparáveis as dores. Tenho passado, nesta vida, dores gravíssimas. No dizer dos médicos, são as maiores dores que se podem suportar, como, por exemplo, quando se encolheram todos os meus nervos e fiquei tolhida. Já não falo de outras muitas dores de diversos gêneros, e até algumas causadas pelo demônio. Posso afirmar que tudo foi nada em comparação com o que no inferno experimentei.

 

Sim, repito: tudo mais pode se chamar nada em relação ao agonizar da alma no inferno. É um aperto, um afogamento, uma aflição tão intensa, todos acompanhados de uma tristeza tão desesperada e pungente, que não sei como posso explicar semelhante estado! Compará-lo à sensação de que vos estão sempre a arrancar a alma é pouco. Em tal caso, seria como se alguém nos acabasse com a vida. Aqui, no inferno, é a própria alma que se despedaça. O fato é que não sei como descrever aquele fogo interior e aquele desespero que se sobrepõem a tão grandes tormentos. Eu não via quem os provocava, mas sentia-me queimar e retalhar. Piores, repito, são aquele fogo e aquele desespero que me consumiam interiormente.5

 

Não entendo como, sem claridade, n o inferno se enxerga tudo, causando dor nos olhos.

 

Lia que os demônios atenazam as almas e lhes infligem outros suplícios. Tudo é nada a respeito da verdadeira pena, que é muito diferente. Em uma palavra: é tão diferente quanto o esboço o é da realidade. Queimar-se aqui na Terra é sofrimento muito leve em comparação com o fogo do inferno.

 

Em parte, nos queixamos sem motivo.

 

Sobre a inquisição: Poderiam levantar contra mim algum falso testemunho e me denunciar aos inquisidores. Achei graça na idéia. Fez-me rir porque, neste ponto, nunca temi. Tinha consciência de que, em matéria de fé, eu estava pronta a morrer mil vezes para não ir contra a menor cerimônia da Igreja ou por qualquer verdade da Escritura... Em bem mau estado andaria minha alma se nela houvesse coisa de tal natureza, que me fizesse temer a inquisição. Se eu imaginasse haver necessidade, seria a primeira a ir buscá-la.

 

Quem ama faz sempre comunidade; não fica nunca sozinho.

 

A amizade é a mais verdadeira realização da pessoa.

 

Falais muito bem com outras pessoas, por que vos faltariam palavras para falar com Deus?

 

A amizade com Deus e a amizade com os outros é uma mesma coisa; não podemos separar uma da outra.

 

Em tempos de tristeza e de inquietação, não abandones nem as boas obras de oração nem a penitência a que estás habituada. Antes, intensifica-as. E verás com que prontidão o Senhor te sustentará.

 

Quem não deixa de caminhar, mesmo que tarde, afinal chega. Para mim, perder o caminho é abandonar a Oração.

 

O Senhor não olha tanto a grandeza das nossas obras. Olha mais o amor com que são feitas.

 

O verdadeiro humilde sempre duvida das próprias virtudes e considera mais seguras as que vê no próximo.

 

A humildade é a verdade.

 

Espera um pouco e verás grandes coisas.

 

Vocês pensam que Deus não fala porque não se ouve a Sua Voz? Quando é o Coração que reza Ele responde.

 

O Senhor sempre dá oportunidade para oração quando a queremos ter.

 

Falte-me tudo, Senhor meu, mas se Vós não me desamparardes, não faltarei eu a Vós.6

 

Quem Vos ama de verdade, Bem meu, vai seguro por um amplo caminho real, longe do despenhadeiro, estrada na qual, ao primeiro tropeço, Vós, Senhor, dais a mão; não se perde, por alguma queda, nem mesmo por muitas, quem tiver amor a Vós, e não às coisas do mundo.

 

Se tiver humildade, não tenha receio; o Senhor não permitirá que se engane e nem que engane os outros.

 

Uma prova de que Deus esteja conosco não é o fato de que não venhamos a cair, mas que nos levantemos depois de cada queda.

 

Se não dermos ouvidos ao Senhor quando Ele nos chama, pode acontecer que não consigamos encontrá-Lo quando O quisermos.

 

São felizes as vidas que se consumirem no serviço da Igreja.

 

Basta uma graça para transformar uma alma por inteiro.

 

Não me parecia que eu conhecesse a minha alma, tão transformada eu a via.

 

O olhar de Deus é amar e conceder graças.

 

Eu quero ver a Deus, e, para isto, é necessário morrer. Não morro, mas entro na vida.

 

O mundo raramente honra quem é pobre. Pelo contrário, ainda que mereça ser honrado, é tido em pouco.

 

Não há tóxico no mundo que mate tão eficientemente como as ganâncias que destroem a perfeição.

 

Entre os que se amam, não há coisa difícil de suportar que não se releve com facilidade. Só um motivo muito grave dará desgosto.

 

Eu quisera que, como me mandaram escrever o meu modo de oração e as graças que me deu o Senhor, me concedessem também de contar minuciosamente e com clareza os meus grande pecados.7

 

Tenho como certo que uma alma de oração, que se entretenha com homens doutos, jamais será enganada pelo demônio, a não ser que deseje se enganar a si mesma. O demônio tem muito medo da força interior humilde e virtuosa porque sabe que seria descoberto e levaria a pior.

 

Deus tem cuidado dos nossos interesses muito mais do que nós mesmos, sabendo o que convém a cada um.

 

O edifício da oração deve sempre se alicerçar na humildade: quanto mais uma alma se mostra humilde na oração, tanto mais Deus a exalta.

 

A todos que tudo abandonam por amor de Deus, Ele se entrega totalmente.

 

Construir grandes casas com o dinheiro dos pobres é muito desconveniente, e o Senhor jamais perdoará.

 

Em assunto de contemplação, muitas vezes Deus leva vinte anos para dar a alguém aquilo que a outros dá em apenas um ano. O motivo disso somente Ele o sabe.

 

Tenho certeza de que Deus jamais deixa de favorecer as almas firmemente decididas a serem Dele.

 

O caminho da cruz é o que Deus reserva aos seus escolhidos: quanto mais os ama, mais os sobrecarrega de tribulações.

 

Existem almas tão simples que nada sabem sobre os costumes e os assuntos do mundo, mas que, no entanto, muito entendem das relações com Deus.

 

A coragem em sofrer muito ou em sofrer pouco está sempre na proporção do amor.

 

Quem pede a perfeição é inundado de tantas graças a ponto de atingir aquele elevado grau que é próprio dos que já a alcançaram.

 

Formosura que excedeis
mesmo as grandes formosuras!
Sem ferir, sofrer fazeis,
e sem sofrer desfazeis
o amor das criaturas.
Oh, laço que assim juntais
duas coisas díspares!
Não sei por que vos soltais,
pois atando força dais
para ter por bem os pesares.
Quem não tem ser vós juntais
com o Ser que não se acaba;
sem acabar, acabais,
e sem ter que amar amais,
engrandeceis o nosso nada.

 

Os cuidados deste mundo e a sedução da riqueza sufocam a Palavra.

 

 

 

Conselho Aos Pais

(Relato de Santa Teresa de Ávila
quando chegou à idade da razão)

Fonte:

http://servusservorumdei.wordpress.com/
category/santa-teresa-de-avila/

 

 

 

 

 

 

e eu tivesse de aconselhar, diria aos pais para se acautelarem com as pessoas que têm contato com seus filhos nessa idade. É grande o perigo, já que a nossa natureza tende mais para o mal do que para o bem.

 

Foi o que aconteceu comigo. Eu tinha uma irmã mais velha do que eu (María de Cepeda), e não aprendi nada com a sua grande honestidade e bondade, mas assimilei todo o mal de uma parenta que freqüentava muito a nossa casa. Sua grande leviandade levou minha mãe a se esforçar muito para afastá-la de casa; ela parecia adivinhar o prejuízo que me sobreviria, e eram tantas as oportunidades de visitas que minha mãe nada pôde fazer. Passei a gostar dessa parenta. Com ela tinha conversas e entretenimentos porque ela me ajudava em todas as diversões do meu agrado e até me atraía para elas, tornando-me ainda confidente de suas conversas e vaidades. Até o momento em que com ela convivi, por volta dos meus catorze anos ou um pouco mais, não creio ter me afastado de Deus por algum pecado nem perdido o temor d´Ele, embora fosse mais forte o sentimento da honra. Este foi forte o bastante para que eu não a perdesse de todo; e tenho a impressão de que nada neste mundo poderia me fazer mudar nesse aspecto, nem o amor de nenhuma pessoa era capaz de me fazer fraquejar quanto a isto. Teria sido muito melhor se eu tivesse usado essa força para não ofender a honra de Deus, em vez de empregar tanto esforço em não fracassar no que considerava a honra do mundo! E, no entanto, eu a perdia de tantas outras maneiras!

 

Eu exagerava nesse inútil apego à honra. Não empregava os meios necessários para conservá-la, preocupando-me apenas em não me perder por inteiro.

 

Meu pai e minha mãe tinham muito desgosto com essa amizade, repreendendo-me freqüentemente por mantê-la. Como não podiam evitar que a parenta fosse à nossa casa, foram inúteis os seus esforços, pois era grande minha esperteza para o mal. Às vezes, o prejuízo que vem das más companhias me causa espanto e, se não tivesse passado por isto, não poderia acreditar; especialmente na época da mocidade, deve ser maior o mal que isto traz. Eu gostaria que os pais, com o meu exemplo, se acautelassem e observassem bem isto. A verdade é que essa amizade me transformou a tal ponto que quase nada restou da minha inclinação natural para a virtude. E, parece-me, que ela e outra moça, que gostava do mesmo tipo de passatempo, imprimiam em mim seus hábitos.

 

Isso me faz entender o enorme proveito que vem da boa companhia, e estou certa de que se naquela idade tivesse tido contato com pessoas virtuosas, a minha virtude teria se mantido intacta, porque, se tivesse tido, nessa idade, pessoas que me ensinassem a temer a Deus, a minha alma teria se fortalecido contra a queda. Tendo perdido esse temor de Deus, ficou-me apenas o de perder a honra, o que, em tudo o que eu fazia, me trazia aflição. Pensando que não se teria como descobrir, atrevi-me a fazer coisas contra a honra e contra Deus.

 

Foram estas coisas que, em princípio, me fizeram mal, e creio que a culpa não devia ser dessa parenta, mas minha, visto que já bastava minha própria inclinação para o mal. Havia na casa criadas, que em tudo me ajudavam em minhas vaidades; se alguma me tivesse dado bons conselhos, talvez não me entregasse a pecados graves, porque não gostava, por natureza, de coisas desonestas, mas me dedicava a conversas desagradáveis – o que não impedia que eu estivesse em perigo, exposta a situações arriscadas, expondo a elas também meu pai e meus irmãos. De tudo isto Deus me livrou, e de um modo que mostrou com clareza estar Ele, procurando, até contra a minha vontade, evitar que eu me perdesse por inteiro. Mas o meu proceder não permaneceu tão oculto a ponto de não lançar dúvidas contra a minha honra e criar suspeitas em meu pai. Eu estava envolvida nessas vaidades há uns três meses, quando me levaram a um mosteiro existente no lugar (Convento de Nossa Senhora da Graça). Nele, criavam-se pessoas em condições semelhantes, embora não de costumes tão ruins quanto os meus; e isso de maneira tão discreta, que só eu e um parente o soubemos. Desta maneira, esperaram uma ocasião adequada, que não parecesse estranha: foi o casamento da minha irmã (María de Cepeda), que me deixou só, o que não parecia próprio.

 

Era tão grande o amor de meu pai por mim, e tanta a minha dissimulação, que ele não acreditava que eu fosse tão má, razão porque não perdeu a confiança em mim. Como o período dessas minhas leviandades foi curto, embora alguma coisa tivesse disso percebida, nada se podia dizer com certeza; com o grande cuidado que eu tinha para que nada se soubesse, visto que temia tanto pela minha honra, eu não via que não podia ocultar algo de quem tudo vê. Ó Deus! Que mal faz o mundo de não levar isso em conta e de pensar que alguma coisa contra Vós possa ser secreta! Estou certa de que muitos males seriam evitados se soubéssemos que o importante não é nos ocultar dos homens, mas evitar descontentar a Vós.

 

Os primeiros oito dias foram dolorosos; mais por eu temer que minha vaidade tivesse sido divulgada do que por estar ali. Na época, eu já estava cansada e passara a temer muito a Deus quando O ofendia, procurando confessar-me tão logo pudesse. Isto me causava tanto desassossego que, depois de oito dias no mosteiro, talvez antes, eu estava muito mais feliz do que na casa de meu pai. Todas estavam satisfeitas comigo, pois o Senhor me concedeu a graça de agradar a todos onde quer que eu estivesse, sendo assim muito querida. Naquele tempo, desgostava-me a idéia de tornar-me monja; apesar disso, eu apreciava ver as boas religiosas daquela casa, muito honestas, fervorosas e recatadas. E, no entanto, isto não impedia o demônio de me tentar nem as pessoas de fora de me desassossegar com recados. Como, porém, eu os desencorajasse, breve tudo teve fim. Minha alma reencontrou o bem de minha meninice, e vi o grande favor que Deus concede a quem se põe em companhia dos bons. Crio que Ele buscava incessantemente a melhor maneira de me trazer a Si. Bendito sejais, Senhor, que tanto sofrestes por mim! Amém.

 

Havia algo que, não fossem tantas as minhas culpas, talvez pudesse me desculpar: minhas amizades podiam acabar bem, resultando em casamento. Meu confessor e outras pessoas que me aconselhavam diziam que muitas coisas que eu fazia não eram contrárias a Deus.8

 

Em nosso dormitório de educandas dormia uma monja (María de Briceño) por meio da qual o Senhor quis, ao que parece, começar a me iluminar.

 

 

 

Só Deus basta!

 

 

 

 


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Notas:

1. Laborare est orareOrare est laborare... Entre todas as orações, o Pai-Nosso ocupa manifestamente o principal lugar, pois contém as cinco qualidades mais importantes requeridas para toda oração, que deve ser: confiante, conveniente, ordenada, devota e humilde. (Comentário ao Pai Nosso, de Santo Tomás de Aquino, o Doutor Angélico).

2. Nora: engenho para tirar água de poços ou cisternas, composto de uma roda que faz girar a corda a que estão presos alcatruzes (cada um dos vasos que, presos à roda da nora, servem para tirar água de poços).

3. Aqui, devo dizer que não concordo com Santa Teresa. Se a única razão para viver é sofrer, o que será, o que fazer das outras razões? Muito mais útil do que viver para sofrer ou querer viver para sofrer é amenizar a ignorância e o sofrimento alheios. Em um certo sentido, ter como meta viver para sofrer não deixa de ser uma forma de equivocada egoísmo.

4. É necessário que se entenda que visões do inferno qualquer religioso ou místico poderá ter. Mas, se tal visão acontecer, não é porque Deus nos fez ver o inferno, mas, sim, porque descemos ao nível mais inferior de nossa existência – o inferno infernal que nós próprios criamos com nossos egoísmos, nossas paixões, nossos desejos, nossas cobiças e nossos et cetera e tal. Não há inferno coletivo. Então, se, por ignorância, criamos este inferno pessoal, somos responsáveis por nossos demônios, que, afinal, também fomos nós que criamos. Mais óbvio do que isto só a certeza de que ninguém ficará para semente. Seja como for, certa vez, há muitos anos, no auge de minha Noite Negra, eu vi o meu demônio pessoal... Criado por mim!

5. Esta última frase-confissão reforça e exemplifica o que foi explicado na nota anterior.

6. Aqui, como em todo fideísmo, a fé impôs um imperativo hipotético: se!

7. Algumas vezes, no Website Pax Profundis, em alguns textos que divulguei, relatei algumas de minhas fraquezas; mas não tenho coragem de relatar meus grandes pecados do passado. Tenho vergonha.

8. Eis aqui um perigo retardantíssimo: imaginar que nossos equívocos (pecados) são maiores do que realmente são e nos culparmos absurda e crescentemente, ainda que matar uma formiguinha ou um mosquitinho seja igualmente abominável a matar uma vaca ou uma baleia. E quem come carne de animais é cúmplice: mata por tabela! E eu, que não mato e não como, também mato e também sou cúmplice. Somos ou não todos um? O pecado-ambigüidade do outro é de todos nós.

 

Páginas da Internet consultadas:

http://media.photobucket.com/image/%2522chakras
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http://www.cot.org.br/blog/pensamentos
-de-santa-teresa-de-avila-parte-1/

http://www.lepanto.com.br/
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http://ocanto.no.sapo.pt/stteresa.htm

http://looking4good.wordpress.com/
category/santa-teresa-de-avila/

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http://www.geocities.com/alkimist
_2000/teresadeavila.html

http://www.citador.pt/citacoes.
php?cit=1&op=7&author=1234&firstrec=0

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santa-teresa-d%C2%B4avila/

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?name=Content&pa=showpage&pid=8

http://www.cancaonova.com/portal/canais/
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http://pt.wikipedia.org/wiki/
Teresa_de_%C3%81vila

http://pt.wikiquote.org/wiki/
Teresa_de_%C3%81vila