TEMPO IMPLACÁVEL

— E a questão da (re)eleição —

 

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

 

Eis que, quando menos se espera, algo inusitado pode acontecer e tudo ficar muito pior. Muito pior mesmo. Principalmente se você for uma mulher já entrada em anos!

As pessoas deveriam sempre se olhar no espelho antes de comentar ou dizer o que quer que seja sobre os outros. Ora bolas! Gentileza não paga imposto. Já aconteceu de você se sentir desconfortável ao olhar as pessoas da sua idade e pensar: estarei também assim tão velha? Pois é. Insinuar ou dizer que alguém é ou está velho é mesmo um verdadeiro horror. A gente sabe que está velha, mas não quer que os outros digam ou dêem a entender.

Se isso já lhe aconteceu, então, você vai des–gostar desta estória. Se não aconteceu, prepare-se; um dia, infelizmente, poderá acontecer e se transformar em uma tragédia. Eu estava sentada na sala de espera para a minha primeira consulta com um novo dentista – para avaliar o estado da minha dentadura superior – quando observei que o seu diploma estava dependurado na parede. Levantei e fui dar uma espiadinha. Estava escrito o seu nome, e, de repente, eu me recordei de um moreno encantador, bonitão, olhos castanhos de encantos tamanhos, que eu conheci com esse mesmo nome. Era o menino mais bonito do colégio e estudava na minha classe do primário, há mais ou menos uns 60 anos, e eu me perguntei: poderia ser o mesmo garoto por quem eu havia me apaixonado perdidamente naquela época? O fato é que eu, até então, só sabia o primeiro nome daquele dentista com quem marcara aquela consulta: Heusthákyo. Mas depois de ler seu nome completo no diploma pendurado na parede, a ficha caiu. Era ele! Só poderia ser ele!

Quando entrei na sala de atendimento, imediatamente afastei esse pensamento do meu espírito. Aquele homem alquebrado, sem o revestimento piloso natural, rosto marcado e profundamente enrugado era demasiadamente velho para ter sido o meu amor secreto do quarto ano primário. Não poderia mesmo ser ele, apesar dos velhos olhos castanhos de encantos tamanhos serem muitos parecidos. Até porque amor secreto não envelhece!

Depois que ele examinou a minha estrutura superior de dentes artificiais e apresentou o orçamento para fazer uma nova, por curiosidade, resolvi perguntar se ele havia sido aluno no Colégio Curso Infantil, que ficava na Travessa Santa Leocádia, em Copacabana.
Sim — respondeu-me o calvo macróbio.
Lembra-se da Dona Eva e da Professora Mazé? — emendei.
Sim, eu me lembro muito bem — confirmou.
Quando se formou? — continuei.
Em 1959. Mas por que a senhora está perguntando tudo isso? — questionou o velho homem, que, com uma certa dificuldade, já havia se sentado.
Eh... Bem... Você era da minha classe. Nós... Lembra? — exclamei meio encabulada.

E então, aquele velho abominável de olhos cor de castanha passada de desencantos estranhos, deplorável, execrável, pavoroso, 'horrético', careca, cretino, decrépito, arruinado, caduco, gagá, tremelicoso e sei lá mais o quê teve a inacreditável falta de pejo de me perguntar:
A senhora era professora de quê?

Tudo começou a girar, e eu desmaiei. Só me recuperei, e mesmo assim não inteiramente, seis meses depois! E resolvi ficar definitivamente com o meu antigo conjunto superior de formas geométricas na forma de dentes postiços. E, claro, não voltei lá para continuar o tratamento de permuta.

 

 

 

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Pois é!

O tempo passa...

Envelhecemos...

Esquecemos...

Os coronés?

Continuam os mesmos.

Envelhecemos...

Esquecemos...

Os políticos?

Sempre os mesmos.

Envelhecemos...

Esquecemos...

Os donos do poder?

Invariavelmente os mesmos.

Envelhecemos...

Esquecemos...

Se bobearmos...

Se esquecermos...

Acabaremos votando

nos mesmos ladrões.

Podemos envelhecer.

Certamente,

todos nós,

estamos envelhecendo!

Mas...

Envelhecer...

É uma coisa.

Esquecer

de quem

sempre nos roubou...

É outra...

Bem diferente.

Eleger...

É uma coisa.

Reeleger...

É outra...

Bem diferente.

Curral?

Ora! Não somos vacas!

 

 

 

 

 

 

Website consultado:

http://www.ehrlesparty.com/CostumeAccessories-Masks.htm

 

 

Em 2006, eleja mas não reeleja!