SAN TIAGO DANTAS
(Pensamentos)

 

 

 

San Tiago Dantas

 

 

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

Objetivo do Estudo

 

 

 

Perseguindo o pensamento de brasileiros ilustres, nesta oportunidade estou divulgando uma pequena coletânea da inteligência reflexiva do jornalista, advogado, professor e político brasileiro Francisco Clementino de San Tiago Dantas (Rio de Janeiro, 30 de agosto de 1911 – Rio de Janeiro, 6 de setembro de 1964).

 

 

 

 

Breve Biografia de San Tiago Dantas

 

 

 

Francisco Clementino de San Tiago Dantas nasceu no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, em 30 de agosto de 1911, filho do Almirante Raul de San Tiago Dantas e de Violeta de Melo de San Tiago Dantas.

 

Concluiu o curso de Direito em fins de 1932 e, apesar da pouca idade, tornou-se professor catedrático interino de Legislação e de Economia Política na Escola Nacional de Belas-Artes. Mais tarde, se tornaria catedrático da Faculdade Nacional de Direito, da Universidade do Brasil.

 

Em 1949, assumiu a vice-presidência da Refinaria de Petróleo de Manguinhos, no Rio de Janeiro. Atuou como assessor pessoal de Getúlio Vargas durante os estudos preparatórios do anteprojeto de criação da PETROBRÁS, encaminhado ao Congresso em outubro de 1951.

 

Foi eleito deputado federal pelo Estado de Minas Gerais em outubro de 1958.

 

Em 22 de agosto de 1961, foi nomeado por Jânio Quadros, embaixador do Brasil na ONU. Entretanto, não chegou a assumir o cargo em virtude da renúncia do Presidente, ocorrida três dias depois.

 

Em 7 de setembro de 1961, João Goulart assume a Presidência da República e escolhe San Tiago Dantas para ser seu Ministro de Relações Exteriores. San Tiago foi empossado no dia 11 seguinte. Em 25 de junho de 1962, San Tiago Dantas deixou a chefia do Ministério, desincompatibilizando-se para tentar renovar seu mandato de deputado federal nas eleições previstas para outubro. Foi reeleito.

 

Após o plebiscito, havido em janeiro de 1963, quando foi escolhido, pelo povo brasileiro, o regime presidencialista para o País, o Presidente João Goulart formou um gabinete, empossando San Tiago Dantas na pasta da Fazenda, no dia 24 daquele mês. San Tiago permaneceu no cargo até o dia 20 de junho de 1963, quando renunciou por problemas de saúde, retornando à sua cadeira na Câmara dos Deputados.

 

San Tiago Dantas foi casado com Edmea de San Tiago Dantas. Faleceu no Rio de Janeiro, em 6 de setembro de 1964. Como relata Mário Gibson Barboza no texto Estrela de Primeira Grandeza, homem de fé, San Tiago não o demonstrava, porém. Em seus últimos momentos de vida, pediu por escrito à sua dedicada esposa Dona Edmea (pediu por escrito, pois havia perdido a voz, ironia cruel num homem que se expressava mais pela palavra falada do que pela escrita): 'Segure minha mão e reze um Padre Nosso; e chame um padre, mas não um intelectual'.

 

 

 

 

Sobre San Tiago Dantas

 

 

 

Grande expositor, inteligência incomum, parlamentar brilhante e professor inspirado, San Tiago Dantas foi uma da figuras mais expressivas da cultura brasileira, no século XX. Como diplomata, San Tiago Dantas, que acumulou uma legião de admiradores e amigos, teve uma atuação altamente representativa, ressaltando-se o seu trabalho no sentido de reatar nossas relações diplomáticas com a União Soviética, quando Vasco Leitão da Cunha foi embaixador em Moscou. (Arnaldo Niskier).

 

Foi a mais poderosa máquina de pensar que conheci, e que aliava a uma inteligência privilegiada em cada um dos seus gestos e atitudes, bem como possuía um inesgotável manancial de saber, acumulado durante uma curta vida. (Mário Gibson Barboza).

 

San Tiago Dantas foi um político sintonizado com o seu tempo. Em seus discursos, sobressaía a preocupação com a manutenção da paz, com os males do subdesenvolvimento e os desníveis sociais dele decorrentes. Reivindicou de maneira constante, para o Brasil, uma participação ativa nas decisões internacionais. Possuía uma percepção incomum de que a ação externa do Brasil, além dos seus méritos próprios no plano internacional, guardava também uma capacidade de reverberação interna, auxiliando mudanças sociais tão necessárias ao País. Mudanças que, na época, geravam muitas expectativas. San Tiago não só deu continuidade à política de Jânio Quadros/Afonso Arinos, como deu forma à Política Externa Independente. (Celso Amorim).

 

Conheci San Tiago em Paris. Formamos logo um grupo. E não sei por que resolvemos que naquela noite iríamos percorrer os 'nightclubs' de Paris. O que fizemos até o amanhecer. Onde os violinos cantavam finos demais e perto demais de nós, saíamos. Mas acontece que em noite longa bebe-se. E eu não sei beber. Se bebo, ou me dá sono ou choro um pouco. Mas se continuo a beber, começo a ficar brilhante, a dizer coisas. E não sei o que é pior. Nesta noite, aconteceram ambas. San Tiago, se era de chorar, não demonstrava. Sua lucidez, na verdade, era um grande controle e não frieza... Até que começou a madrugar, a quase amanhecer devagar. Ninguém tinha sono, mas era a hora. Fomos andando. E San Tiago descobriu, nas esquinas de Paris, as primeiras vendedoras de flores. Não posso dizer quantas rosas ele comprou para mim. Sei que eu andava pelas ruas sem poder carregar tantas, e, à medida que eu andava, as rosas caiam pelo chão. Se jamais fui bonita, foi naquele amanhecer de Paris com rosas caindo de meus braços plenos. E um homem que enfeita uma mulher não tem lucidez fria. Passou-se o tempo. Quando ele ia a Washington dava-me a alegria de me telefonar na mesma hora. Jantava lá em casa, ficávamos conversando até mais de três horas da madrugada. (Clarice Lispector).

 

Intelectual, San Tiago fazia da inteligência um instrumento de sua atividade criadora. Os posicionamentos esnobes, muito em voga entre os homens de espírito, não o atraiam e, muito menos, aquele ceticismo vago e distante em que se esterilizam alguns dos nossos melhores talentos. Era um homem de fé, de frio e calculado otimismo no homem brasileiro e crente ardoroso na materialização de suas potencialidades. (Tancredo Neves).

 

Foi imensa a sedução intelectual que San Tiago Dantas exerceu sobre a minha geração. Talvez tenha sido o melhor cérebro daquela época: polimorfo sem superficialidade, luminoso sem eclipse, acadêmico e, contudo, operacional, capaz do rigor da ciência e da luminosidade das artes. (Roberto Campos).




 

San Tiago Dantas
(Alguns Pensamentos)

 

 

 

A sobrevivência da Democracia e da liberdade, no mundo moderno, depende de nossa capacidade de estendermos todo o povo, e não de forma potencial, mas efetiva, os benefícios, hoje reservados a uma classe dominante, dessa liberdade e da própria civilização.

 

Nada falseia mais o espírito jurídico, nada o afasta mais perigosamente do seu verdadeiro sentido, do que a convicção, favorecida pelos longos períodos de estabilidade, de que a vida social deve se ajustar aos conhecimentos jurídicos, em vez de se adequarem estes àquela.

 

A continuidade da civilização, com o seu resultado final que é a reconciliação dos homens, depende da nossa capacidade de preservar a paz, substituindo a competição militar entre os povos por técnicas cada vez mais estáveis de cooperação e de convivência, e caminhando para uma integração econômica que nivele as oportunidades, com a rápida eliminação dos resíduos do imperialismo e das rivalidades nacionais.

 

Aqueles que urdem o sonho absurdo de tornarem compatível a sobrevivência da liberdade política com a sobrevivência da desigualdade econômica e social, nada mais são do que os coveiros, talvez inconscientes, das instituições e princípios por que se batem.

 

Não é exato, como aliás já são poucos os que pretendem, que a Democracia possa se salvar como fórmula política, apenas mediante o apego a certos ideais jurídicos, que deram expressão adequada, em outras épocas, a formas então válidas de supremacia social. Também não é certo, como muitos ainda querem crer, que o futuro da Democracia dependa apenas do desenvolvimento econômico, e que o seu fortalecimento possa se medir no crescimento da renda nacional ou do seu índice 'per capita'. O crescimento da renda nacional, mesmo quando se processa a uma taxa superior à do aumento demográfico, pode reverter, graças à má distribuição social da riqueza, em benefício de setores limitados da população, e agravar temporariamente, em vez de atenuar, as tensões sociais internas, que comprometem a estabilidade das instituições democráticas e dela fazem um poderoso instrumento, não a serviço da reconciliação, mas a serviço da opressão.

 

Ao contrário da inteligência, que não é contagiosa, burrice pega.

 

 

 

 

Se o pensamento democrático não for capaz de formular, em termos válidos e inteligíveis, o seu esquema de reforma social, esta abrirá seu caminho anti-democraticamente, porque, no quadro das tensões internas da sociedade atual, as forças que aspiram a uma participação mais ampla nos benefícios da vida comum são superiores em intensidade às que procuram deixar em segundo plano essa ampliação, para se limitarem à defesa das chamadas garantias democráticas.

 

No Brasil, o povo, enquanto povo, é melhor do que as elites, enquanto elites.

 

Toda contemporização ou insinceridade na abertura de um rumo eficaz de reforma social se liquida em um reforço do processo anti-democrático e na debilitação a curto prazo da própria Democracia.

 

Não pode haver moralidade política sem prudência, isto é, sem considerar as conseqüências políticas de uma ação aparentemente moral.

 

A preservação e o fortalecimento da Democracia representativa constituem um objetivo inalienável da nossa civilização, e que só através dela alcançaremos uma forma de convivência política verdadeiramente isenta de opressão. Em primeiro lugar, a Democracia, no quadro comparativo das instituições políticas conhecidas, não foi superada como forma de proteção do homem na sua confrontação cotidiana com o poder. Em segundo lugar, nenhum outro regime, por mais convincentes que sejam seus resultados no campo econômico ou tecnológico, logrou oferecer mecanismo mais impessoal e mais capaz de absorver e compensar as formas primárias de violência, do que o democrático, sobretudo no episódio culminante, que é o da transferência do poder.

 

O homem real é um composto de homem econômico, homem político, homem moral, homem religioso etc. Um homem que não fosse nada mais que um homem político seria um animal, pois careceria por completo de prudência.

 

A reforma social não poderá, em qualquer país, mas notadamente entre nós, fugir a certas características e objetivos: 1º) terá de ser uma reforma incorporada às aspirações do povo, que suba das próprias bases sociais, debatida e filtrada nas organizações de classe, e não uma reforma outorgada pela classe dominante, expressiva apenas de uma concessão sem conciliação; 2º) terá de ser uma reforma que fira de frente o problema vital da segurança econômica do indivíduo na sociedade, pois na sociedade burguesa, em cujas formas já decompostas ainda vivemos, a segurança econômica é o privilégio do proprietário, do chamado homem-independente, enquanto a forma universal de participação do indivíduo na sociedade é o trabalho, e o 'status' que a todos corresponde é o de trabalhador; e 3º) terá de produzir, a curto prazo e sem violência, com respeito dos direitos subjetivos, uma redistribuição da renda social, de modo que esta, através do salário, dos serviços coletivos e dos investimentos no setor público e privado, atinja a sociedade no seu todo, eleve o padrão de vida e crie o número crescente de ocupações e atividades requeridas pelo aumento e pela ativação da população. Para que uma reforma preencha estes requisitos, não basta que ela se exprima em leis capazes de operar com resultados tecnicamente positivos sobre a realidade nacional. É necessário não esquecer que esta realidade já exprime e institucionaliza formas inveteradas de opressão social e de dominação, estabelecidas em proveito de classes, de grupos e de interesses nacionais ou estrangeiros diferenciados, e sem a liquidação progressiva e completa destas formas de opressão não será possível criar, no País, condições que, sendo acauteladoras da justiça, também o sejam da eficiência e da continuidade do crescimento.

 

Não sou liberal nem comunista; sou Brasileiro.

 

A reforma agrária nem pode ser um confisco mal disfarçado de terras nem uma gigantesca operação imobiliária, montada à base de indenização prévia, para transformar em dinheiro líquido inversões antieconômicas, para as quais falta, inclusive, um mercado permanente com capacidade de absorção. Com a reforma agrária estaremos passando do feudalismo ao Capitalismo, nos campos, e dando oportunidade ao surgimento de uma nova classe agrária, dinâmica, operosa, lançada à sombra de uma assistência técnica e financeira concentrada, capaz de elevar as condições de produtividade em áreas selecionadas para o abastecimento do País.

 

O Estado é a manifestação dos interesses públicos. O público não é algo de total e de constante, mas é formado de grupos de interessados, que surgem, ampliam-se, restringem-se ou desaparecem, conforme as irradiações, retrações e expansões da convivência humana.

 

Um país onde se desencoraja a empresa privada ao mesmo tempo que se deteriora a empresa pública, nem se está preparando para uma expansão capitalista nem para uma socialização, mas se está simplesmente deixando ir ao impulso de uma corrente descendente, que pode ancorá-lo em uma estagnação a longo prazo ou precipitá-lo na desordem social.

 

O suposto 'ser racional' dos gregos e o suposto 'indivíduo' de Stuart Mill são dois produtos altamente elaborados, não sendo inata senão a possibilidade de determinado organismo humano se fazer um e outro, se a sua história, se as suas experiências, se as pessoas com quem conviver e se agrupar, ou seja, se a sua educação a isto o ajudarem.

 

Nenhum projeto nacional é válido e nenhuma política interna é auto-sustentável, se não lograrem inserir o País no rumo histórico do seu tempo, e superpor harmonicamente o nacional e o universal.

 

Somente pela educação poderemos produzir o homem racional, o homem independente, o homem democrático... As escolas deverão ser, assim, organizações locais, administradas por conselhos leigos e locais, com o máximo de proximidade das instituições que venham a dirigir e com o máximo de autonomia que lhes for possível dar.

 

O pan-americanismo deve ser um instrumento de luta pela emancipação econômica e social das nações deste hemisfério.

 

A instabilidade das instituições democráticas no hemisfério tem sua origem no subdesenvolvimento econômico e no sistema egoísta de um certo tipo de empresas de âmbito internacional, que perturbam o funcionamento normal dos regimes e, muitas vezes, alimentam as sedições.

 

Na ONU, o Brasil deve manter uma posição de independência em relação aos diversos blocos em que se dividem os Estados-membros, votando em cada caso tendo em vista os objetivos permanentes de nossa política internacional e a defesa dos interesses do Brasil.

 

Os interesses reais da Nação não se chocam, mas, pelo contrário, se harmonizam com o objetivo de segurança e elevação de nível de vida contido nas reivindicações da classe operária, mas também coincidem com os interesses da produção, ansiosa por alcançar níveis eficazes de produtividade, e se libertar de condições herdadas do passado, contrárias à consolidação do seu desenvolvimento.

 

É do ajustamento perfeito entre elites, capazes de se modernizarem, e o povo, que nos testemunha todos os dias sua vitalidade, que sinceramente espero ver surgir, por eletrólise, essa realidade que pressentimos: o futuro do Brasil.

 

Nos povos primitivos, sempre se encontram vestígios de duas formas de matrimônio: o rapto e a compra. O matrimônio se apresenta como ato de apreensão da mulher, ato que exige, a princípio, o emprego da força, e em uma época talvez mais evoluída, exige o pagamento de um preço. O homem é sujeito do ato; a mulher o objeto. Deve-se ao Direito Romano ter elevado a mulher, na Antigüidade, à categoria de sujeito do matrimônio, esboçando uma profunda transformação moral e jurídica, que o Cristianismo iria aperfeiçoar e terminar.

 

Quem só Direito sabe, nem o Direito sabe.

 

 

 

 

 

 

 

Páginas da Internet consultadas:

http://trocandoemmiudos2009.blogspot.com
/2009/07/burrice-pega.html

http://advogadoiniciante.blogspot.com/
2010/04/francisco-clementino-de-san-tiago.html

http://webcache.googleusercontent.com/

http://www.observatoriodaimprensa.com.br/
artigos.asp?cod=297AZL004

http://virtualbib.fgv.br/

http://www.senado.gov.br/senado/
grandesMomentos/pron2.shtm

http://www.istd.org.br/index.php/
san-tiago-dantas/depoimentos

http://www.sapientia.pucsp.br/tde_busca/
arquivo.php?codArquivo=5722

http://www.itamaraty.gov.br/

http://www.sbhe.org.br/novo/congressos/
cbhe1/anais/075_jose_antonio.pdf

http://prazerdapalavra.com.br/

http://blogln.ning.com/profiles/
blogs/frases-e-uma-pena-que-nao

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_
arttext&pid=S0102-01882004000100013

 

Música de fundo:

The Coffee Song (They've Got An Awful Lot Of Coffee In Brazil)
Compositores: Bob Hilliard & Dick Miles
Interpretação: Frank Sinatra

Fonte:

http://mp3.viewin.mobi/?search=brazil%20song