Dostoiévski
(Excertos)
Dostoiévski
(1821 – 1881)
Penso
até que a melhor definição do homem seja: um
bípede ingrato. Mas isto ainda não é tudo,
ainda não é o seu maior defeito; o seu maior defeito
é a sua permanente imoralidade.
Bem,
e se eu estiver enganado? [...]
Se de fato o homem, quero dizer, o gênero humano, não
for canalha? Então, tudo o mais não passa de preconceitos,
tão-somente espalhados para pôr medo... Então
não há qualquer limite... E é assim mesmo que
deve ser!
... A
Natureza corrige-se, emenda-se. Se assim não fosse, ficava-se
sempre amarrado a preconceitos. Sem isto, não haveria grandes
homens.
O
erro é uma coisa positiva, porque, por ele, chega-se a descobrir
a verdade.
... Para
proceder com inteligência, a inteligência só
não basta.
A
situação mais simpática é aquela em
que as pessoas não se envergonham umas das outras, mas agem
franca e abertamente. E para quê se enganar? É a mais
vã e imprudente das ocupações.
Aqui
em baixo tudo é sem importância. Suspeitava disso há
muito tempo; mas, de súbito, adquiri a certeza plena e completa,
senti bruscamente que me seria indiferente que o mundo existisse
ou que nada houvesse em parte alguma. Comecei a perceber e a sentir
que, no fundo, nada mais existia para mim. Percebi, nesse momento,
que nada existia anteriormente, ou antes, que nunca haveria nada.
Parei então de me irritar com os homens e acabei quase não
os notando mais.
Soube
tocar o Coração do seu amigo até atingir as
cordas mais profundas e suscitar nele a primeira sensação,
ainda indefinida, daquela melancolia eterna e sagrada que uma alma
escolhida, uma vez tendo-a experimentado e conhecido, nunca mais
trocaria por uma satisfação barata.
O homem
teme a morte porque ama a vida...
Se
queres vencer o mundo inteiro, vence a ti mesmo.
É
como na religião: quanto pior vive um homem ou quanto mais
desamparado [...],
mais obstinadamente ele sonha com uma recompensa no paraíso!
Meu
amigo: a verdade verdadeira é sempre inverossímil.
Você sabia? Para tornar a verdade mais verossímil,
precisamos, necessariamente, adicionar-lhe a mentira.
Há
momentos – você chega a esses momentos – em que,
de repente, o tempo pára e acontece a eternidade.
... O
homem tem tudo nas mãos; se deixa escapar tudo,
é porque tem medo...
O
criminoso, no momento em que pratica o seu crime, é sempre
um doente.
Não
procures um prêmio, pois tens uma grande recompensa sobre
a Terra: a alegria espiritual que só o justo possui.
Partindo
de uma liberdade ilimitada chega-se a um despotismo sem limites.
Nada
serviu tanto o despotismo como as ciências e os talentos.
Decididamente,
não compreendo por que é mais glorioso bombardear
uma cidade do que assassinar alguém a machadadas.
Não
será preferível corrigir, recuperar e educar um ser
humano do que lhe cortar a cabeça?
Compara-se,
muitas vezes, a crueldade do homem à das feras; mas isso
é injuriar estas últimas.
Quanto
mais gosto da Humanidade em geral, menos aprecio as pessoas em particular,
como indivíduos.
Conhecemos
um homem pelo seu sorriso. Se na primeira vez que o encontramos
ele sorri de maneira agradável, o íntimo é
excelente.
Todas
as mulheres sabem que os ciumentos são os primeiros a perdoar.
É
claro e evidente que o mal se insinua no homem mais
profundamente do que supõem os médicos socialistas.
Em nenhuma ordem social é possível escapar ao mal
e mudar a alma humana: ela própria é a origem da aberração
e do pecado.
O
que mais receamos é o que nos faz sair dos nossos hábitos.
O
amor é mestre, mas é preciso saber adquiri-lo, porque
se adquire dificilmente, ao preço de um esforço prolongado;
é preciso amar, de fato, não por um instante, mas
até o fim.
A
falta de liberdade não consiste jamais em estar segregado;
e, sim, em estar em promiscuidade, pois o suplício inefável
é não se poder estar sozinho.
Ninguém
se salva sozinho.
Não
há assunto tão velho que não possa ser dito
algo de novo sobre ele.
A
tirania é um hábito com a propriedade de se desenvolver
e dilatar a ponto de se tornar uma doença.
É
muito fácil adquirir hábitos de luxo
e muito difícil se livrar deles quando se faz necessário.
Quando
a gente mente, ou seja, quando coloca com astúcia alguma
coisa que acontece com excessiva raridade ou que nunca acontece,
aí a mentira se torna muito mais verossímil.
De
fato, não existe nada mais deplorável do que, por
exemplo, ser rico, de boa família, de boa aparência,
de instrução regular, não tolo, até
bom, e, ao mesmo tempo, não ter qualquer talento, qualquer
peculiaridade, inclusive qualquer esquisitice, qualquer idéia
própria, ser, enfim, terminantemente como todo mundo.
As
coisas mais insignificantes têm, às vezes, maior importância;
e é geralmente por elas que a gente se perde.
... Tudo
compreender, tudo ver e vê-lo muitas vezes, de modo incomparavelmente
mais nítido do que o fazem todas as nossas inteligências
mais positivas; não se conformar com absolutamente nada e
com ninguém, mas ao mesmo tempo, não desdenhar de
nada...
Tenho
de proclamar a minha incredulidade. Para mim, não há
nada de mais elevado do que a idéia da inexistência
de Deus. O Homem inventou Deus para poder viver sem se matar. [Ainda
que nem sempre seja assim!]
Se
Deus existe, então toda a vontade é Dele, e, fora
da vontade Dele, nada posso. Se não existe, então,
toda a vontade é minha, e sou obrigado a proclamar o arbítrio.
Para
mim, não existe idéia superior à de que Deus
não existe. Tenho atrás de mim a História da
Humanidade. O homem não tem feito outra coisa senão
inventar um deus para viver, sem se matar; nisto tem consistido
toda a história do mundo. Até hoje.
A
fé e as demonstrações matemáticas são
duas coisas inconciliáveis.
Nós
somos cidadãos da eternidade.
A
Beleza salvará o mundo.
Todos
somos responsáveis por tudo, perante todos.
Nada
há de mais belo, de mais profundo, de mais perfeito do que
Cristo. Não só não há nada, mas nem
sequer pode haver.
Fonte
dos excertos:
http://pt.wikiquote.org/wiki/
Fi%C3%B3dor_Dostoi%C3%A9vski