Outra
coisa é o verdadeiro canto. Um sopro ao nada. Um vôo em Deus.
Um vento.
O
senhor é tão jovem, tem diante de si todo começo, e
eu gostaria de lhe pedir, da melhor maneira que posso, meu caro, para ter
paciência em relação a tudo que não está
resolvido em seu Coração. Peço-lhe que tente ter amor
pelas próprias perguntas, como quartos fechados e como livros escritos
em uma língua estrangeira. Não investigue agora as respostas
que não lhe podem ser dadas, porque não poderia vivê-las.
E é disto que se trata: de viver tudo. Viva agora as perguntas. Talvez
passe, gradativamente, em um belo dia, sem perceber, a viver as respostas.
Talvez o senhor já traga consigo a possibilidade de construir e formar,
como um modo de viver especialmente afortunado e puro; eduque-se para isso.
Mas, aceite com grande confiança o que vier, e se vier apenas de
sua vontade, se for proveniente de qualquer necessidade de seu íntimo,
aceite-o e não o odeie. A carne é um fardo, verdade. Mas,
é difícil a nossa incubência, quase tudo o que é
sério é difícil, e tudo é sério. Se o
senhor reconhecer apenas isto e chegar a conquistar, a partir de si, de
sua disposição e de seu modo de ser, de sua experiência
e infância, uma relação inteiramente própria
(não dominada pela convenção e pelo hábito)
com a carne, então, o senhor não precisará mais ter
receio de se perder e se tornar indigno de sua melhor posse.
Um
ser humano amar a outro talvez seja a mais difícil das tarefas, a
mais importante, o último teste e a última prova, o trabalho
para o qual todos os trabalhos só foram preparação.
Isto
é, de forma básica, a única coragem exigida de nós:
ter coragem para o mais estranho, para o mais singular e para o mais inexplicável
que possamos encontrar.
Primeiro,
o amor não é nada. Surgem, entrega e união com outra
pessoa, e significa (para o que seria uma união de esclarecidos e
inacabados, ainda não ordenada?) um grande incentivo para o indivíduo
amadurecer.
Amor:
duas solidões se protegendo uma à outra.
Rosa!
Oh!, pura contradição!
Volúpia de ser o sono
de ninguém,
sob tantas pálpebras.
Extingue
minha visão;
eu ainda posso te ver.
Tapa meus ouvidos;
eu ainda posso te ouvir.
Mesmo sem pés,
posso caminhar em tua direção,
e, sem boca,
ainda posso suplicar por ti.
Quebra meus braços,
e eu vou te envolver
com o meu Coração,
como se fosse uma mão.
Estrangula meu Coração,
e meu cérebro ainda pulsará.
E, mesmo que meu cérebro se incendeie,
hei de te levar em meu sangue.
Ser
amado é se consumir na chama. Amar é luzir com luz inesgotável.
Ser amado é passar; amar é durar.
O
amor é a ocasião única de amadurecer, de tomar forma,
de nos tornarmos um mundo para o ser amado. É uma alta exigência,
uma ambição sem limites, que faz daquele que ama um eleito
solicitado pelos mais vastos horizontes.
Basta
sentir que se poderia viver sem escrever para já não se ter
o direito de fazê-lo.
Uma
única coisa é necessária: a solidão. A grande
solidão interior. Ir dentro de si e não encontrar ninguém
durante horas, é a isto que é preciso chegar. Estar só,
como a criança está só.1
Sou
alheio a toda e qualquer intenção crítica.
Não
há nada menos apropriado para tocar em uma obra de arte do que palavras
de crítica, que sempre resultam em mal-entendidos mais ou menos felizes.
As
coisas estão longe de ser todas tão tangíveis e dizíveis...
A maior parte dos acontecimentos é inexprimível, e ocorre
em um espaço em que nenhuma palavra nunca pisou.
Aceite
o destino e carregue-o com seu peso e sua grandeza, sem nunca se preocupar
com recompensas que possam vir de fora.
Nada
pode perturbar mais a nossa evolução [reintegração]
do que olhar para fora, e aguardar de fora respostas a perguntas
a que, talvez, somente o nosso sentimento mais íntimo possa responder,
na hora mais silenciosa.
Vejo
que as tempestades vêm aí/pelas árvores que,
à medida que os dias se tomam mornos,/batem nas minhas janelas
assustadas,/e ouço as distâncias dizerem coisas/que
não sei suportar sem um amigo,/que não posso amar
sem uma irmã...
Quão
pequeno é aquilo contra o que lutamos,/como é imenso
o que contra nós luta...
Triunfamos
sobre o que é pequeno/e o próprio êxito nos
torna pequenos./Nem o eterno nem o extraordinário/serão
derrotados por nós...
E
havia já um pouco de eternidade/nas minhas
entranhas.
A
solidão é como uma chuva./Ergue-se
do mar ao encontro das noites;/de planícies distantes e
remotas/sobe ao céu, que sempre a guarda./E do
céu tomba sobre a cidade.
Cai como
chuva nas horas ambíguas,/quando todas as vielas se voltam
para a manhã/e quando os corpos, que nada encontraram,/desiludidos
e tristes se separam;/e quando aqueles que se odeiam/têm
de dormir juntos na mesma cama:/então,
a solidão vai com os rios...
A
distância é puro sonho...
Oh!,
solidão! Oh!, perda de tempo tão pesada... Oh!, tempo estranho!
Oh!, perda de tempo! Oh!, solidão!
Oh!,
tristeza sem sentido! Oh!, sonho! Oh!, medo! Oh!, infindável abismo!
Para
onde? Para onde?
Vivo
a minha vida em círculos cada vez maiores, que se estendem sobre
as coisas. Talvez não possa acabar o último, mas quero tentar.2
As
obras de arte são de uma solidão infinita: nada pior do que
a crítica para as abordar. Apenas o amor pode captá-las, conservá-las
e ser justo em relação a elas.
Uma
obra de arte é boa quando nasceu por necessidade. Neste caráter
de origem está o seu critério – o único existente.
Tudo
quanto é velocidade não será mais do que passado, porque
só aquilo que demora nos inicia.
Relate
tudo com íntima e humilde sinceridade. Utilize, para se exprimir,
as coisas do seu ambiente, as imagens dos seus sonhos e os objetos de sua
lembrança.
Mesmo
que você se encontrasse em uma prisão, cujas paredes impedissem
todos os ruídos do mundo de chegar aos seus ouvidos, não lhe
ficaria sempre sua infância, esta esplêndida e régia
riqueza, este tesouro de recordações?
O
destino não vem do exterior para o homem, ele emerge do próprio
homem.3
Os
homens, com o auxílio das convenções, têm resolvido
tudo com facilidade e pelo lado mais fácil da facilidade; mas, é
claro que precisamos nos ater ao difícil.
Na
vida, não há aulas para principiantes; exigem-nos logo o mais
difícil.
O
nosso mundo é um pano de cena atrás do qual se escondem os
segredos mais profundos.
Há
desejos a longo prazo que duram toda a vida. De modo que, não se
pode esperar o seu cumprimento.
O
tempo não é uma medida. Um ano não conta; dez anos
não representam nada. Ser artista não significa contar, é
crescer como a árvore que não apressa a sua seiva, e resiste,
serena, aos grandes ventos da primavera, sem temer que o verão possa
não vir. O verão há de vir. Mas, só vem para
aqueles que sabem esperar, tão sossegados como se tivessem na frente
a eternidade.
Como
hei de segurar a minha alma
para que não toque na tua?
Como hei de elevá-la acima de ti,
até outras coisas?
Ah, como gostaria de levá-la
até um sítio perdido na escuridão,
até um lugar estranho e silencioso
que não se agita,
quando o teu coração treme.
Pois, o que nos toca – a ti e a mim –
isto nos une, como um arco de violino,
que de duas cordas solta uma só nota.
A que instrumento estamos atados?
E que violinista nos tem em suas mãos?
Oh!, doce canção!
Como
suportar, como salvar o visível, senão fazendo dele a linguagem
da ausência, do invisível?
Que
farás tu, meu Deus, se eu perecer?
Quem
agora chora,
em algum lugar do mundo,
Sem razão chora no mundo,
Chora por mim.
Quem agora ri,
em algum lugar na noite,
Sem razão ri dentro da noite,
Ri-se de mim.
Quem
agora caminha,
em algum lugar no mundo,
Sem razão caminha no mundo,
Vem a mim.
Quem
agora morre,
em algum lugar no mundo,
Sem razão morre no mundo,
Olha para mim.
No
mundo, a coisa é determinada. Na arte, ela o deve ser mais ainda:
subtraída a todo o acidente, libertada de toda a penumbra, arrebatada
ao tempo e entregue ao espaço, ela se torna permanência, ela
atinge a eternidade.
Quero
viver como se o meu tempo fosse ilimitado. Quero me recolher, me retirar
das ocupações efêmeras. Mas, ouço vozes, vozes
benevolentes, passos que se aproximam, e minhas portas se abrem...
Aproxime-se,
então, da Natureza. Depois, procure, como se fosse o primeiro homem,
dizer o que vê, vive, ama e perde.
Sou
o intervalo entre as duas notas que, a muito custo, se afinam, porque a
da morte quer ser mais alta… Mas, ambas, vibrando na obscura pausa,
reconciliaram-se. E é lindo o cântico.
As
folhas caem como se do alto
caíssem, murchas, dos jardins do céu;
caem com gestos de quem renuncia.
E
a Terra, só, na noite de cobalto,
cai de entre os astros na amplidão vazia.
Caímos
todos nós. Cai esta mão.
Olha em redor: cair é a lei geral.
E
a terna mão de Alguém colhe, afinal,
todas as coisas que caindo vão.
Sem
paz, sem amor, sem teto,
caminho pela vida afora.
Tudo aquilo em que ponho afeto
fica mais rico e me devora.
Quem,
se eu gritasse, em meio à legião de anjos, me ouviria?
Se
o cotidiano lhe parece pobre, não o acuse: acuse-se a si próprio
de não ser muito poeta para extrair as suas riquezas.
Não
é somente a inércia a culpada pela repetição
dos relacionamentos humanos, caso a caso, indescritivelmente, de forma monótona
e sem renovação. É a timidez diante de novas e imprevisíveis
experiências, para as quais acreditamos não estar preparados.
Portanto, somente alguém que está preparado para tudo, que
não exclui nada, nem o mais enigmático, vivenciará
a relação com o outro como algo vivo.
De
repente, ser realização, ser verão, ser Sol.
Talvez,
todos os dragões nas nossas vidas são princesas que estão
apenas à espera de nos ver agir, apenas uma vez, com beleza e coragem.
Talvez, tudo aquilo que nos assusta é, na sua essência mais
profunda, algo desamparado que quer o nosso amor.
Toda
dúvida poderá se tornar uma qualidade, se a educarmos.
Viva
suas perguntas agora, mesmo, talvez, sem saber as respostas.
Eu
asseguro que a maior tarefa para um vínculo entre duas pessoas é
a de que cada um respeite a solidão do outro.
Tudo
está florescendo cada vez mais imprudentemente. Se fossem vozes em
vez de cores, haveria uma gritadeira inacreditável no coração
da noite.
Este
é o milagre que acontece entre aqueles que realmente amam: quanto
mais dão, mais possuem.
Deixe
a vida acontecer. Acredite: a vida é direita. Sempre.
As
emoções puras ajudam você e se levantar. As emoções
impuras – que aproveitam apenas um dos lados do seu ser – só
causam distorções.
A
Primavera
está de volta. A Terra é como uma criança que sabe
poemas.
O
amor é como o sarampo. Quanto mais velho você fica, pior é
o ataque.
Nenhuma
grande arte foi feita sem que o artista tivesse conhecido o perigo.4
Eu
quero estar com aqueles que sabem coisas secretas ou quaisquer outras sozinhos.
Não
devem, por fim, essas antiqüíssimas dores se tornar mais fecundas
para nós? Não é tempo de que, amando, nos libertemos
do ser amado e, trêmulos, suportemos isso como a flecha suporta a
corda tensionada para, recolhida no ímpeto, ser mais do que ela mesma.
Pois, em nenhuma parte existe o permanecer.
Ficar
é nada.
Quem
encarar seriamente a questão do amor irá descobrir que, como
acontece com a questão da morte, difícil como é, não
existe uma resposta iluminada, nenhuma solução, nenhuma sugestão
de caminho ainda foi encontrada. E, para essas duas grandes preocupações
que carregamos com segurança, dissimuladas dentro de nós,
e que passamos para frente sem resolver, nenhum princípio reconfortante
será aprendido, nada encontrando uma concordância geral.
Que
idade alguém deveria atingir para realmente admirar o bastante, para
em nenhuma parte ficar aquém do mundo? Mas, quantas coisas ainda
subestimamos, desprezamos, desconhecemos. Deus, quantas oportunidades e
exemplos para nos tornarmos alguma coisa, e, em contrapartida, quanta indolência,
dispersão e meia-vontade de nossa parte!
Ter
uma pessoa próxima, cujas visões opostas se aliam a uma amizade
profunda e convicta, pode ser uma influência maravilhosamente instrutiva.
Pois, enquanto formos obrigados a ver o outro sempre como algo falso, mau,
hostil, em vez de simplesmente o outro, não entraremos em uma relação
tranqüila e justa com o mundo em que todos devem ter lugar: parte e
contraparte; eu e o sumamente diferente de mim. E, apenas sob o pressuposto
e a admissão de tal mundo completo, poderemos dar um arranjo amplo,
espaçoso e arejado ao nosso Eu Interior, com seus contrastes e contradições
internos.
De
ser humano para ser humano, é tudo tão difícil e não
ensaiado, tão sem modelo e sem exemplo, que deveríamos, em
cada relacionamento, viver com total atenção, criativos sempre
que se existir algo novo, e houver tarefas e questões e demandas.
Parece-me
que resulta em nada, senão em desordem, quando o empenho geral (aliás,
uma ilusão!) tem a pretensão de aliviar ou abolir, de forma
esquemática, as dificuldades. Pode ser que isto reduza a liberdade
da pessoa muito mais do que o sofrimento propriamente dito, que passa ao
indivíduo que nele confia instruções indescritivelmente
apropriadas e quase ternas, para dele escapar – se não para
o exterior, então para o interior. Querer melhorar a situação
de alguém pressupõe uma certa compreensão de suas condições,
como nem mesmo um poeta a possui a respeito de um personagem de sua própria
invenção. Muito menos, então, a pessoa que pretende
ajudar, tão infinitamente excluída e cuja distração
se torna total com sua doação. Querer mudar, melhorar a situação
de uma pessoa significa oferecer-lhe, no lugar das dificuldades em que ela
tem prática e experiência, outras dificuldades que, talvez,
a peguem ainda mais de surpresa.
A
experiência mais profunda de criar é feminina, pois, é
a experiência de receber e de suportar.
É
preciso aprender a perceber que é justo o humano que nos faz sozinhos.
Quanto mais humanos nos tornamos, tanto mais diferentes ficamos. É
como se, de repente, os seres se multiplicassem por mil; um nome coletivo,
que antes abarcava milhares, logo se tornará muito estreito para
dez pessoas, e seremos obrigados a considerar cada indivíduo inteiro.
Pense: quando um dia tivermos seres humanos, em vez de povos, nações,
famílias e sociedades; quando não será mais possível
agrupar nem mesmo três pessoas em um só nome! O mundo, então,
não deverá se tornar maior?
O
futuro entra em nós, a fim de se transformar em nós, muito
antes de ele acontecer.5
É
bom ser solitário, mas, a solidão é difícil,
e, por ser difícil, é um motivo a mais para que possamos com
ela conviver.
Há
uma multidão de seres humanos, mas, há muito mais faces, pois,
cada pessoa tem várias.
Toda
sublimidade da minha mente começa no meu sangue.
É
preciso tomar alguma decisão contra o medo...
Pode
até ser bom, mas não há casamentos agradáveis.
Cantar
verdadeiramente é uma lufada diferente.
Um
cão que se vê no espelho pensa: há um outro cão.
Há
tantas coisas sobre as quais uma pessoa idosa poderia falar, pois, quando
se envelheceu, conhecê-las é uma questão de disciplina.
Nenhum
sentimento é definitivo.
Quem
já não se sentou diante da cortina do seu próprio Coração?
Ela se levanta, e o cenário está caindo aos pedaços.
No
amor, precisamos praticar apenas uma coisa: deixar o outro partir. Segurá-lo
é fácil; nós não precisamos aprender isto.
Ou
trabalho dos olhos foi feito. Agora, faça seu Coração
trabalhar as imagens aprisionadas dentro de você.
Não
presuma que alguém que, agora, procura consolá-lo, viva despreocupado
entre as palavras simples e calmas que, às vezes, lhe fazem tão
bem. Sua vida também poderá ser muito triste e difícil,
talvez, até, muito mais do que a sua. Se não fosse assim,
ele nunca teria sido capaz de dizer as palavras certas.
E,
agora, damos as boas-vindas ao novo ano, cheio de coisas que nunca foram!
Ah!,
como é bom estar entre pessoas que estão lendo!
Faça
o seu ego poroso. Abertura, paciência, receptividade e solidão
são tudo.
De
tanto olhar as grades, seu olhar
esmoreceu e nada mais aferra.
Como se houvesse só grades na Terra:
grades, apenas grades para olhar.
As
únicas tristezas que são perigosas e insalubres são
aquelas... que tentamos afogá-las com o barulho...
É
preciso – e a nossa evolução, aos poucos, há
de se processar neste sentido – que nada de estranho nos possa advir,
senão o que nos pertence desde há muito. Já se modificaram
muitas noções relativas ao movimento; há de se reconhecer,
aos poucos, que aquilo a que chamamos destino sai de dentro dos homens,
em vez de neles entrar. Muitas pessoas não percebem o que delas saiu,
porque não absorveram o seu destino enquanto o viviam nem o transformaram
em si mesmas. Afigurou-se-lhes tão estranho que, em seu confuso espanto,
julgavam-no saído justamente naquele momento, e juravam nunca antes
ter encontrado em si algo parecido. Como os homens durante muito tempo se
iludiram acerca do movimento do Sol, assim se enganam ainda em relação
ao movimento do que está para vir. O futuro está firme, caro
Sr. Kappus, nós é que nos movimentamos no espaço infinito.
Deus,
que será de Ti quando eu morrer?/Eu sou Teu cântaro
(e se me romper?)/A tua água (e se me corromper?)/Sou
Teu agasalho, sou Teu afazer./Vai comigo o significado Teu./Não
tens mais sem mim aquela casa, Deus,/que com quentes palavras Te
acolhia./Perdem
Teus pés exaustos as macias/sandálias:
também elas eram eu.
Em
uma idéia criadora revivem mil noites de amor esquecidas, que a enchem
de altivez e altitude. Aqueles que se juntam à noite e se entrelaçam
em um baloiçar de volúpia executam obra grave, reunindo doçuras,
profundezas e forças para a canção de algum poeta vindouro,
que há de surgir para dizer indizíveis prazeres. Eles estão
evocando o futuro; mesmo que estejam enganados, que se abracem cegamente,
o futuro virá apesar de tudo; um homem novo se há de erguer.
Estamos
colocados no meio da vida como no elemento que mais nos convém. Também,
em conseqüência de uma adaptação milenar, tornamo-nos
tão parecidos com ela que, graças a um feliz mimetismo, se
permanecermos calados, quase não poderemos ser distinguidos de tudo
o que nos rodeia.
O
pesado e o difícil, contanto que o carreguemos corretamente, também
indica o peso específico da vida, e nos ensina a conhecer a unidade
de medida de nossas forças, com a qual, daí em diante, também
podemos contar, quando nos sentirmos felizes e bem-aventurados.
A
vida é transformação. O que é bom é transformação,
e o que é ruim também.
Em
cada coisa nova, o velho está todo contido, só que diferente
e bastante aumentado.
Não
creio que importe ser feliz, no sentido em que as pessoas esperam ser felizes.
Mas, consigo entender plenamente essa felicidade árdua, que consiste
em despertarmos forças com um trabalho resoluto, as quais começam
a trabalhar, elas mesmas, em nós.
Não
há senão um Caminho. Procure entrar em si mesmo.
O
único Caminho é o de dentro.
Vá
para dentro de si.
Trabalho
Impostergável
(Confiança, Humildade, Resignação)
Com
confiança, aceite o que vier.
Com
humildade, permita sem talher.
Resignado,
acolha o que desconvier.
Com
confiança, anule o aberrativo.
Com
humildade, mude o impositivo.
Resignado,
admita
o que é definitivo.
Com
confiança, mergulhe no Silêncio.
Com
humildade, desafaste o silêncio.
Resignado,
ensine o que é o
Silêncio.
Com
confiança, poupe o seu irmão.
Com
humildade, partilhe o seu pão.
Resignado,
tolere a opção pelo não.
Com
confiança, vá, mas não fique.
Com
humildade, não encare o tique.
Resignado,
ouça a léria do cacique.
Com
confiança, livre-se da prisão.
Com
humildade, receba a Iniciação.
Resignado,
lance Luz
na escuridão.
Com
confiança, rejeite a mais-valia.
Com
humildade, realize a Alquimia.
Resignado,
procure mitigar a sangria.
Com
confiança, combata o corrupto.
Com
humildade, desincline o abrupto.
Resignado,
não maldiga o interrupto.
Com
confiança, prossiga na Senda.
Com
humildade, desfrute a merenda.
Resignado,
não vitupere a exeqüenda.
Com
confiança, ouça seu Coração.
Com humildade,
levante-se do chão.
Resignado,
dê guarida à contramão.
Guaridando
a Contramão