Ceilão,
antiga Taprobana, hoje República Democrática Socialista do
Sri Lanka: primavera do princípio século passado. Um chela
e seu Mestre faziam uma Viagem Iniciática pelo interior do país
insular asiático. O Mestre, observando seu chela, comentou:
— Não
sei; estou achando você meio preocupado.
O
chela respondeu: — É
Mestre, estou mesmo.
— Mas,
preocupado? Por quê? Com o quê?
O
chela se sentiu um pouco invadido, ficou meio envergonhado, mas, relutante,
disse: — 'Mâyâ'.
Eu me esforço, mas, não consigo ficar livre dela. Não
passa um dia que eu não me sinta envolvido por pensamentos esdrúxulos
e pecaminosos, que não sei de onde vêm, mas, tenho certeza
de que não são meus. E estes pensamentos provocam desejos,
cobiças e paixões que me atormentam e me enchem de vergonha.
Eu não sei mais o que fazer.
O
Mestre ficou condoído pela preocupação do seu chela,
pensou alguns segundos e perguntou: — Você
está vendo aquela árvore?
— Sim
— respondeu
o chela.
— E
qual é a cor das folhas?
— Verde
— respondeu
o chela.
— Todas
as folhas?
— Sim;
todas.
O
Mestre fez uma pausa, e comentou: — Pois
é. São verdes, mas, duas coisas devem ser observadas. Na realidade,
a cor verde não é a mesma para todas as folhas, e cada um,
digamos assim, vê cores verdes ligeiramente diferentes. Não
há duas pessoas que enxerguem rigorosamente a mesma cor, como não
há duas pessoas que ouçam exatamente o mesmo som. Não
há, enfim, duas pessoas que tenham sensações exatamente
iguais, sejam elas visuais, olfativas, táteis, gustativas, auditivas,
de fome, de sede, de alegria, de opressão, de liberdade ou quaisquer
outras. E essas diferenças percepcionais dependem de diversos fatores,
e são elas que nos fazem diferentes e provocam em nós reações
psicológicas e emocionais diferentes. E há, ainda, as diferenças
culturais. Da ignorância à Illuminação há
uma eternidade de distância. Da prisão à liberdade há
uma
eternidade de ciclos a serem vividos
e experienciados. Mas, não temos a eternidade para apreender as coisas;
há um limite para tudo.
— Desculpe,
Mestre. Mas qual a relação disto com 'mâyâ',
com os meus pensamentos
agonientos e
com a minha preocupação? —
argüiu o chela.
O
Mestre deu uma sonora gargalhada, e prosseguiu: — Veja
bem, o que para uns é uma montanha, para outros é um grão
de areia. O que para uns é ouro, para especialistas é ouro
besouro – uma liga de cobre e zinco que imita o ouro. O que para uns,
talvez,
seja verde-abacate, para outros poderá ser verde-bexiga
ou verde-garrafa. Uns sentem frio, outros estão termicamente confortáveis.
Uns são religiosos fervorosos, outros reputam inacessível
ou incognoscível ao entendimento humano a compreensão dos
problemas propostos pela Metafísica ou pelas religiões. Há
quem não suporte música clássica e canto gregoriano.
E por aí vai. Isto vale para tudo na vida, por uma única razão:
somos diferentes. E por que somos diferentes? Porque, basicamente, nossas
experiências anteriores foram diferentes, o que nos faz, hoje, ter
experiências pessoais, parcial ou totalmente, diferentes, e ir, depois
da morte, para planos vibratórios distintos, e deles, depois, voltar
a encarnar. Com isto, não estou querendo dizer que existam tantos
planos vibratórios quanto as pessoas encarnadas na Terra. Na verdade,
nem sei exatamente quantos planos vibratórios ou dimensões
existem no Universo global, e isto, realmente, não interessa. O que
interessa, e interessa muito, é estarmos conscientes das nossas limitações,
seja de que natureza forem. Por isto, por causa destas limitações,
é que, particularmente no âmbito do noviciado, uns chelas têm
mais facilidade em lidar com aquilo que costumeiramente é chamado
de tentação, e outros têm menos. Você é
jovem, e eu sei que a vida de um chela não é fácil.
Mas, lembre-se de Paulo, o Apóstolo, também conhecido como
Mestre Hilarion – o Chohan do Quinto Raio
– que
disse: 'Todos os dias, irmãos, morro...' Ir morrendo a cada dia é
ir suportando – e vencendo –
os pensamentos esdrúxulos
e pecaminosos que provocam desejos, cobiças e paixões. Disciplinar
a mente é um trabalho constante, diário e leva anos. Às
vezes, encarnações!
— Mas,
saber isto não alivia as minhas preocupações. Eu não
quero decepcioná-lo. —
ponderou o chela.
O
Mestre observou atentamente o seu chela, e disse: — Você
não tem que acrescentar esta preocupação às
que já tem. Não tem que se inquietar se vai me decepcionar
ou se vai me contentar. Eu não importo nada; para você, quanto
a isto, só quem importa é você. Agora ouça: neste
Caminho prestigioso que escolhemos, 'mâyâ' nos atormentará
sempre. Aliás, é impossível nos livrarmos dela. Ou
você acha que eu também não estou sujeito à ela,
à quedas eventuais, a temores variados, à múltiplas
dúvidas, à diversas angústias e a diferentes tormentos
espirituais?
— Está?
— 'Mâyâ'
sempre estará presente na caminhada de todos nós. É
verdade que, com o tempo, ela vai sendo diluída, vai mitigando, mas,
não poderá ser eliminada jamais. 'Mâyâ' sempre
será relativa à nossa menor ou maior compreensão da
Grande Lei da Unidade Cósmica. Logo, nossa escravização
à ela depende só de nós. Como você sabe, é
'mâyâ' que provoca e alimenta o 'samsara', o fluxo incessante
de renascimentos através dos mundos. Daí a importância
do triângulo de ouro beneditino: 'Pax, Ora et Labora.'
— Então,
o que eu devo fazer? Como devo proceder? —
perguntou o chela.
— A
primeira regra —
disse o Mestre —
é jamais
desistir. Quem desiste, em um certo sentido, perde uma vida, e fica para
trás. Por outro lado, por incrível que possa parecer, 'mâyâ'
é nossa amiga, porque nos dá a oportunidade de separar
o minério da
ganga, o belo do feiúme, a virtude da desvirtude. Então, como
já lhe disse, só
conquistaremos a Illuminação se vencermos as tentações,
as cobiças, os desejos e as paixões. Mas, como não
há dia sem noite e verão sem inverno, não há
também sucesso sem esforço. 'Mâyâ' e os impulsos
ou estímulos inferiores são os nossos testadores. Vencendo
as provas do Caminho, seremos diplomados.
— Continuo
sem saber o que fazer? —
admitiu o chela.
— É
simples
—
estimulou o Mestre.
Não se sinta ofendido com os seus pensamentos nem se insurja contra
eles. Deixe que venham; deixe que dancem em sua mente. Não tente
enxotá-los; dialogue com eles. Se eles tentarem convencê-lo
de que em um triângulo retângulo, a área do quadrado,
cujo lado é a hipotenusa, não é igual à soma
das áreas dos quadrados, cujos lados são os catetos, não
se amofine; você sabe perfeitamente bem que Pitágoras não
era maluco e que isto está errado. Pense bem: seus pensamentos diabólicos
não podem obrigá-lo a agir contra a sua vontade. Sua vontade
é e sempre será soberana. E lembre-se: seu Corpo Astral não
tem poder absoluto sobre o seu Eu Interior. E, ainda que mágica ou
psiquicamente você imploda seus pensamentos diabólicos, eles
voltarão diversamente coloridos e vestidos com outras roupas. E voltarão
como uma bênção, porque ninguém jamais poderá
ser Illuminado, se não for tentado. Ninguém jamais poderá
Ascensionar se não passar pela Noite Negra da Alma e sobrepujá-la.
Todos os Hierofantes que você conhece, sem exceção,
foram tentados milhares de vezes, e só alcançaram a Mestria
porque dialogaram com seus demônios e os venceram. E tudo o que os
Hierofantes
puderam fazer, outros homens podem igualmente. Seja
como for, ainda que não haja dia sem noite e verão sem inverno,
no Universo só há dia e primavera permanente, mesmo
que ele se manifeste em 'mânvântâras' e 'prâlâyas'
multifacetados e com dissímeis durações. Esta é
a essência da sua perene unidade. As noites e os invernos estão
em nós, porque, por insciência, os partejamos e a eles damos
curso. Disto, a conclusão é: não devemos nos preocupar
tanto com os nossos 'pecados'; eles são produto da nossa ignorância.
Logo, efetivamente, não existem como tais, porque, esclarecida a
ignorância, os 'pecados' somem. Aliás, 'pecado', céu,
inferno, prêmio e punição são coisas
que o Universo não conhece. E, como bem disse Damodar K. Mavalankar,
é por isto que o Ocultismo não atribui nenhum lugar ou localidade
desagradáveis para aqueles que não aceitam as suas doutrinas.
O fato é que o Universo não se alterará se agirmos
desta ou daquela maneira. Uma gota de tinta vermelha não muda a cor
da água do oceano. Agora, ouça este poeminha:
Em
meio a Noites insones,
fui remoendo e lamentando.
Em
meio a dilúvios e ciclones,
fui
rechovendo e trovejando.
Todavia,
não desisti: lutei
contra
o não e contra o ou.
E,
um certo Dia, conquistei
a
regalia de dizer: Eu-sou.
Hoje,
já 'Nirmânâkâya',
retornei
pela Humanidade.
Vim
impulsionar o 'nyaya',
para
a compreensibilidade.
Asserções
serão contestáveis,
se
não puderem ser validadas.
se
estiverem mal consolidadas.
É
isto que vim controverter:
a
superstição esmagadora.
E
vim objetar e contradizer
a 'ex cathedra' abauladora.
Enfim,
só pela Transrazão
será Illuminada a Estrada.
E
isto só virá pela Iniciação,
pois,
abaixo Dela é o nada.
O
chela não disse uma palavra. Mas, a última frase do poema
ficou martelando em sua cabeça: Abaixo
da Iniciação é o nada.
E seguiram a Viagem Iniciática para poderem participar da Sagrada
Cerimônia que estava programada para dali a três dias.
Música
de fundo:
Não
Existe Pecado ao Sul do Equador
Composição: Chico Buarque & Ruy Guerra
Interpretação: Ney
Matogrosso
Fonte:
http://mp3lover.eu/ney/ney-matogrosso-
nao-existe-pecado-ao-sul-do-equador-mp3
Páginas
da Internet consultadas:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Regra_de_S%C3%A3o_Bento
http://www.grandefraternidadebranca.com.br/chela.htm
http://pt.wikipedia.org/wiki/Samsara
http://fin6.com/2013/08/green-tree-2014/
http://www.customjersey.com/
http://www.animationlibrary.com/sc/78/Devils/
http://pt.wikipedia.org/wiki/
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