Objetivo
do Trabalho
Este
trabalho está divido em três partes: 1ª) Breve Biografia
e Resumo do Pensamento Plotiniano; 2ª) Alguns Pensamentos de Plotino;
e 3ª) Considerações Finais. Nele, pretendi apresentar as
idéias principais de Plotino e, antes de concluir o texto, garimpei
aqui e ali alguns excertos das Enéadas.
Plotino
foi um Iniciado. Sendo assim, no que concerne aos excertos, é necessário
que sejam lidos devagar e com muita atenção, pois alguns são
difíceis de ser compreendidos em uma primeira leitura. Seja como for,
ainda que os fragmentos que compõem este texto tenham uma certa lógica
seqüencial, o melhor é sempre ler o autor em sua obra original.
Fontes secundárias como este trabalho, no máximo, podem funcionar
apenas como possível referência ou como um catalisador para pesquisas
ulteriores.
Breve
Biografia e
Resumo do Pensamento Plotiniano
Entre
os séculos II e III, Amônio de Sacas (175 – 242) —
que, como Pitágoras (Samos, 571 a. C. ou 570 a. C. – Metaponto,
497 a. C. ou 496 a. C.), nunca escreveu nada e manteve secretas suas opiniões
— fundou em Alexandria uma escola neoplatônica, tendo, ao lado
de Herennius, os dois Origênes, Cassius e Longinus, Plotino (204 ou
205–270) como um de seus discípulos. O pensamento filosófico
de Amônio de Sacas pode ser apenas compreendido, basicamente, através
dos escritos de Plotino. Depois de ter ouvido a primeira preleção
de seu futuro mestre, Plotino ficou em sua companhia e bebeu de sua fonte
por nada menos do que onze anos.
Mas foi só em 254 – após
ensinar em Roma por nove anos – que Plotino começou a escrever
as Enéadas (ennea em grego significa nove), conjunto
de cinqüenta e quatro tratados, que Porfírio (232 – 304),
seu discípulo dileto, dividiu metafisicamente em seis grupos de nove,
ou seja, 54 = 6 (número da perfeição) x 9 (número
da totalidade). Do texto Legado Filosófico Helênico-Romano,
de Evaldo Pauli, recolhi: O agrupamento das partes obedece a uma
ordem sistemática ascendente, de acordo com a mística plotiniana:
a primeira parte, se refere ao homem e à Moral; a segunda e terceira,
ao mundo sensível e à Providência; a quarta, à
Alma; a quinta, à Inteligência; e a sexta, ao Uno e ao Bem. Esta
disposição, entretanto, é de ordem geral, porque, na
verdade, a exposição de Plotino é dispersiva, tratando
de todas as questões, sem atender a uma ordem sistemática e
escolar, como fariam depois os escolarcas [do grego, skholárkhés]
neoplatônicos, particularmente Proclus (412-487). Seja como for,
o conteúdo das Enéadas é um caminho para a Sabedoria
e uma condução em direção ao Bem Absoluto.
As
considerações filosóficas plotinianas (uma reelaboração
do idealismo de Platão, com notável influência das concepções
cosmogônicas de Aristóteles) tinham um princípio cardeal:
ensinar a seus discípulos – e à Humanidade – a se
libertar das ilusões e dos prazeres terrenos, para poderem contemplar
e se unir extaticamente a Deus. O próprio Porfírio foi um escritor
incansável, mas a maioria de suas obras se perdeu. Anna Maria Moog
Rodrigues, no trabalho Diálogo de Sampaio Bruno com Amorim Vianna:
a Relação da Razão com a Fé assevera que
a filosofia plotiniana realizou a última grande síntese
do pensamento da Antigüidade, ao mesmo tempo em que proporcionou a primeira
síntese do misticismo oriental com elementos do platonismo já
trabalhados pelas escolas aristotélicas do período helenista.
Com isto em mente, a articulista reconhece ter sido Plotino o inspirador de
todas as filosofias ocidentais que o sucederam, as quais tenham tomado por
fundamento de suas metafísicas específicas a Unidade de todo
o Ser.
Talvez
se possa acrescentar que muitos princípios plotinianos encontraram
guarida e estão inseridos nos ensinamentos de fraternidades místicas
hoje abertas e disponíveis para pesquisa e afiliação.
Deve ser acrescentado que Plotino foi um Iniciado, tendo sido, posteriormente,
autorizado a ampliar os ensinamentos que recebeu e, dos quais, era depositário.
A síntese de seu pensamento (que se resume a uma incognoscibilidade
transcendente e metafísica do Uno, origem de tudo o que existe, por
meio de emanações sucessivas), como se afirmou, está
gravada nas Enéadas, obra publicada por Porfírio trinta
anos após a morte de Plotino em uma edição completa e
muito bem estruturada, ainda que dispersiva e sem atender a uma ordem sistemática
e escolar.
A
Filosofia Plotiniana concebeu, preliminar e analogamente, um Uno Inefável,
razão de ser de toda a Unidade e Causa Primária da existência
do conjunto e do múltiplo, portanto potência de todas as coisas.
Este Uno não está numericamente ligado nem à
aritmética nem à geometria e, por isso, deve ser interpretado
como Uno–em–si. Há, entretanto, os números
ligados ao mundo do sensível e aos tipos terrenos. Segundo Plotino,
nas Enéadas, livro quarto, as coisas que chegaram à
existência e que subsistem foram previamente compreendidas em número.1
Este conceito bebe no pensamento pitagórico.
Tetractys
(Unidade IAO) Pitagórica
(4 = 4 + 3 + 2 + 1 = 10 = 1)
O Uno–em–si, ou
simplesmente Uno, está acima da própria criação,
sendo Causa de tudo. Ele é como quis ser, Causa de Si mesmo, portanto,
transcendente a Si mesmo. Em KaBaLa, há o entendimento de
que Um está acima de Três... Concordando com Parmênides
de Eléia (cerca de 530 a. C. – 460 a. C.), admitiu Plotino: Com
razão disse, pois, Parmênides, que o Ser é Uno, que é
imutável, não porque não haja outra coisa que não
possa modificá–Lo, mas porque é o Ser. Só o Ser,
efetivamente, possui existência por si mesmo.2
Plotino
propôs diversas imagens representativas para a procedência das
coisas do Uno, sendo a mais significativa a derivação do todo
criado por irradiação sucessiva de um Primeiro Centro
para um segundo, a partir dos quais se propaga um terceiro círculo
concêntrico: Luz da LLuz. Neste processo gerador,
nada empobrece o Uno nem O condiciona, dada a sua perene e perpétua
permanência. A processão das coisas do Uno não se constitui
em mera necessidade, pois se trata, no entender plotiniano, de absoluta
liberdade. A interpretação deste mecanismo, oferecido por
Reale e Antisere, é: ... Deus não cria livremente o outro
de Si, mas se autocria livremente a Si mesmo; trata-se de um ’Si’
que se autocria livremente como potência infinita, que necessariamente
se expande, produzindo o outro de Si.3
Do
Uno deriva Nous (Espírito que pode ser entendido
como Mente); de Nous deriva a Alma. Voltando–se para sua origem
e através dela, a Alma vê e pode retornar ao Nous, já
que Dele, em verdade, nunca esteve desvinculada ou separada. Este entendimento,
em verdade, sempre foi o das Escolas de Mistério, desde a mais remota
Antigüidade. Nesse sentido, pode–se, ainda, informar que as fraternidades
iniciáticas contemporâneas sustentam esses mesmos ensinamentos,
sentidos já em meados da Terceira Raça-Raiz da atual Ronda –
Lemúria. Assim, Nous é uma imagem do Uno,
conformando–se à Unidade sem intermediação; e a
Alma é uma imagem de Nous, conformando–se ao Espírito
como seu original. Logo se percebe que a verdadeira essência reside
no mundo inteligível.4
A
natureza e a finalidade da Alma, segundo Plotino, é dar vida a todas
as outras coisas, ordenando–as, dirigindo–as e comandando–as,
entretanto, permanecendo, ela mesma realidade incorpórea. A título
de ilustração, a Ordem
Rosacruz – AMORC
entende que há uma distinção entre Alma e Personalidade–Alma.
Todas as Personalidades–Almas, em verdade, nunca estiveram, estão
ou estarão desvinculadas da Consciência Cósmica ou da
Alma Universal. Os ensinamentos da Tradicional Ordem Martinista (TOM), que
teve seu estabelecimento ancorado nas ensinanças de Louis–Claude
de Saint–Martin (1743 – 1803), refletem e examinam esta especulação
místico-metafísica da mesma forma. Observa–se que a Tradição
Primordial e desde sempre idêntica a si mesma (presente nas duas Ordens
referidas e em outras Fraternidades autênticas) tem um entendimento
dessemelhante daquele apresentado pelas principais religiões conhecidas,
pelo menos no que é veiculado exotericamente.
Procedência
das Coisas do Uno
(Segundo Plotino)
Assim,
no seio da Consciência Universal, há uma hierarquia de personalidades–Alma,
isto no que concerne à Sabedoria desenvolvida e à manifestação
da própria Consciência Cósmica em cada personalidade–Alma.
Plotino, dando expressão ao seu entendimento sobre essa hierarquia,
permite que se possa esquematizá–la da forma abaixo:
UNO |
|
Nous |
|
Alma
Suprema |
|
Alma
do Todo |
|
Almas
Particulares |
Hierarquia
das Almas
(Segundo Plotino)
Da figura anterior (Hierarquia
das Almas), depreende–se que, na doutrina plotiniana, todas as
Almas derivam da Alma Universal (ou Suprema), sendo, entretanto, Dela distintas,
mas Dela, também, inseparáveis, todas, em essência, constituindo–se
em uma coisa só. Ampliando estas lucubrações, nas Enéadas,
livro segundo, Plotino deixou escrito: Do mesmo
modo que a Alma de cada animal é una... do mesmo modo que a Alma sensitiva
é igualmente una nos seres que sentem, e do
mesmo modo que a Alma vegetativa está
íntegra em cada parte dos vegetais, assim a minha Alma e a tua formam
somente uma, e a Alma Universal, presente em todos os seres, é una,
porque não está dividida à semelhança do corpo,
mas que, onde quer que esteja [e o que quer que seja], é a
mesma.5
Assim,
Plotino entendeu que se a Alma dos seres humanos (a minha e a tua) procedem
da Alma Universal, e essa Alma sendo Una, todas as Almas serão essencialmente
unas e estarão interligadas em comunicação recíproca,
ainda que esta intercomunicação, na maioria das vezes, seja
inconsciente e involuntária. Isto equivale a dizer que Tudo é
Um e que somos todos Um. O que varia é a percepção individual
consciente do Uno. Este é o verdadeiro e irreduzível
entendimento de Fraternidade Universal. Todavia, lamentavelmente, ainda que
educativamente, a tão desejada Fraternidade Universal, nesta Dimensão,
em seu Summum Bonum estrito, é (quase!) uma idealidade utópica,
porque a fragmentação e a multiplicidade não podem compreender
a Unidade, enquanto se manifestarem fragmentadas e múltiplas. Então,
devemos desistir? Não; jamais. Ora; Lege; Labora!
O surgimento da matéria, segundo
Plotino, deriva da exaustão e do enfraquecimento progressivos da própria
potência do Uno. E como há, segundo Plotino, minimização
freqüencial do próprio Uno no Plano Material, a matéria
é um mal, não porque se oponha ao Uno–em–si,
mas por, neste Plano, ser praticamente quase imperceptível a Sua presença.
Nesse processo de afastamento do Uno (e apesar de a Alma individualizada estar
enfraquecida, porque se volta mais para si do que para Nous) é
ela quem cria, dá forma e se esforça para retornar para a Luz.
É um processo permanente de criação e de luta pela redenção
da matéria criada e pela sua própria (igualização),
porque a redenção da Alma está, segundo Plotino, implicitamente
atrelada à redenção da matéria por ela gerada.
Já a Alma do homem, afirmou
Plotino, é preexistente no estado de Alma pura, mas deve, ainda que
temerariamente, descer aos corpos para concretizar as potencialidades de Nous.
Nesse sentido, o homem é fundamentalmente uma Alma, e seu destino cósmico
a Reconjugação com o Uno, o que é possível
e desejável ainda neste Plano. Isto é plausível, no entendimento
de Plotino, através de um processo sucessivo de purificações,
cujo estágio final é o da Imersão no Uno pelo Silêncio
Metafísico Interno da Contemplação. Para Plotino,
nessa imersão há o Êxtase, que é um estado de Hiperconsciência
da Alma. Observa–se aqui nítida aproximação entre
os pensamentos pitagórico, platônico e plotiniano. O estado contemplativo
plotiniano é o mesmo entendido e anunciado por Pitágoras e por
Arístocles (428/27 – 347 a. C.), conhecido como Platão
(Plátos), apelido que fazia referência à sua
característica física, tal como o porte atlético ou os
ombros largos, ou, ainda, à sua ampla capacidade intelectual de tratar
de diferentes temas.
Enéadas
(Alguns Pensamentos de Plotino)
Esforço-me
para reunir o que há de divino em mim ao que há de Divino no
Universo.
O que é conhecido pelos sentidos
não é senão uma imagem ou espécie da coisa e o
sentido não atinge a coisa em si mesma; ela fica fora dele.
A
Alma só é bela pela Inteligência, e as outras coisas,
tanto nas ações como nas intenções, só
são belas pela Alma que lhes dá a forma da Beleza... Beleza,
primeira toda bela, não tem nenhuma parte em que sua Beleza esteja
falha.
Tudo,
para existir, implica em uma composição que se decompõe
naturalmente nos elementos de que se compõe; mas a Alma é de
natureza una, simples, e existe atualmente no fato da vida. Por isto, não
perecerá.
A
prova é a transformação dos elementos uns nos outros;
a corrupção do elemento que se transforma não é
uma descrição completa. Uma substância não pode
perecer e se aniquilar, e, inversamente, o elemento engendrado não
pode passar do modo absoluto à existência. Toda transformação
se opera de uma forma a uma outra; mas ela deixa subsistir um sujeito que
recebe a nova forma e perde a antiga.
Nas sensações não
há verdade, mas somente opinião; é por ser receptiva,
que ela é opinião.
Os objetos da sensação
parecem se revestir de um testemunho sobre si mesmos com a maior evidência.
Contudo, nos deixam duvidar se eles têm uma existência aparente
que estaria não na realidade mas nas afecções dos sentidos;
e ele tem necessidade, como critério, da Inteligência e da reflexão.
Poderia
a Inteligência – a real e verdadeira Inteligência –
enganar-se e possuir juízos falsos? Não, absolutamente. Como
seria ela ainda Inteligência, se lhe faltasse Inteligência? É
preciso, pois, que ela saiba sempre e não esqueça jamais; seu
conhecimento não comporta conjectura, ambigüidade e informação,
por assim dizer. Ela não usa demonstração.
Deus
é despido de qualquer formalidade. Como principalmente a essência
da unidade é a produtora de todas as coisas, não é Deus
nenhuma destas. Portanto, nem é uma realidade determinada, nem nada
de qualificativo ou quantitativo, nem espírito, nem Alma. Nem é
móvel nem está em repouso; não está no espaço
nem no tempo. Mas é uniforme como tal, ou antes, é sem forma,
porque é anterior à toda forma, anterior ao movimento e ao repouso,
que se atém ao ser e o multiplica.
A
aspiração do homem não deveria se limitar a não
ser culpado, mas, sim, a ser Deus.
Quando ela [a
Alma] não nada pensa, ela nada enuncia; não tem a impressão
de modo. Mas, quando pensa na matéria, recebe em si mesma a impressão
daquilo que é sem forma. Tão bem como quando ela pensa em objetos
que têm uma forma ou uma grandeza, ela os concebe como composição,
como coisas coloridas ou providas de outras qualidades, e, então, pensa
o todo, pensa também em seus componentes. Então um, o pensamento
ou a sensação dos atributos, se apresenta claramente, enquanto
que o outro, o conhecimento do sujeito sem a forma, permanece obscuro, porque
não é uma forma. O que ela percebe no conjunto composto com
os atributos pode dissociar e separar dos atributos; depois, este resíduo
da análise, ela o pensa obscuramente porque ele é obscuro; entenebrada
por estas trevas, a Alma pensa sem pensar verdadeiramente.
Mas
embora o retorno se processe por um esforço, ele se faz com base ontológica,
porque a Alma se liga a Deus pelo interior do processo emanativo, através
da Inteligência. Por natureza, a Alma ama a Deus, a quem ela quer se
unir, como uma virgem ama um pai honesto.
Em
que consiste a purificação, visto que a Alma não sofreu
nenhuma mancha? Que quer dizer separar a Alma do corpo? A purificação
consiste em isolar a Alma, a não deixá-la se unir a outras coisas;
que ela não as olhe; que ela não tenha opiniões estranhas
à sua natureza, como as opiniões que se chamam paixões;
que não olhe seus fantasmas que produzem as paixões.
Se
há um segundo termo depois do Uno… de que maneira procede dele?
É uma irradiação Sua, Dele, que permanece imóvel,
como a resplandecente luz que circunda ao Sol e nasce Dele, ainda que o Sol
sempre se mantenha imóvel. Todos os seres, além disso, enquanto
existem, produzem a seu ao redor necessariamente, por sua própria essência,
uma realidade que tende ao exterior e depende de seu poder; esta realidade
é como uma imagem dos seres que a produzem; assim o fogo faz nascer
de si o calor, e a neve não retém todo seu frio. A melhor prova
disto são os objetos aromáticos… parte deles uma emanação,
verdadeira realidade da que participa de tudo quanto os rodeia.
Na
verdade, quanto mais a Beleza se estende indo em direção à
matéria, tanto mais sem vigor é em relação àquela
que permanece no Uno [Unidade
originária].
Assim
também Fídias [que criava segundo as formas] produziu
Zeus, sem referência a nada de sensível, mas colhendo [do
intelecto] como seria se Zeus quisesse aparecer a nós visivelmente.
A
Inteligência, colocando um véu sobre os outros
objetos e se recolhendo em sua intimidade, não vê nenhum objeto.
Ela contempla então uma Luz, que não está em outra coisa,
mas que lhe apareceu subitamente só, pura, e existindo em si mesma.
[In Corde loquitur nostro Vox Dei. Em nosso Coração
fala a Voz de Deus.]
E
certamente, na verdade, há mais Beleza quando tu vês a Sabedoria
[o Saber (Phrónesis) da Alma] em alguém e
ficas admirado não olhando para o rosto — este poderia ser na
verdade feio — mas deixando de lado todo o aspecto exterior, tu segues
a sua Beleza interior.
Então,
existe também em a Natureza um princípio racional [lógos]
modelo da Beleza corpórea; mas o princípio [Intelecto]
que está na Alma é mais belo do que o que está em
a Natureza, e deste provém o princípio racional que está
em a Natureza. Certamente, o princípio que está na Alma nobre
é muito fúlgido e já supera em Beleza. De fato, adornando
a Alma e fornecendo Luz, proveniente de uma Luz Maior que é primeiramente
Beleza, estando este [princípio] na Alma, a faz deduzir qual
é o princípio antes dele que não nasce nem é outro,
mas que está em si mesmo. Por isto, não é nem mesmo um
princípio racional, mas o criador do primeiro princípio racional
da Beleza, que está na matéria da Alma.
Cada
coisa tem todas as coisas nela mesma e, por outro lado, vê todas as
coisas no outro, de modo que todas as coisas estão em toda parte e
tudo é tudo e cada coisa é tudo6, e o esplendor
é infinito.
Imaginai-vos
uma fonte que não tem origem. Entrega toda a sua água aos rios,
não se esgota por isso e se mantém em seu mesmo nível.
Os rios que dela partem confundem suas águas antes de tomar cada um
seu curso particular.
Todas
coisas, na medida que lhes é possível, imitam o Princípio
em eternidade e em bondade.
Pensar é mover-se para o Bem
e desejá-Lo; o desejo [do Bem] engendra a Inteligência.
Alguém
poderia ver a grandeza e a potência da sapiência pelo fato de
ela ter nela mesma os seres e os ter produzido e de todas as coisas derivarem
dela. Ela mesma é os seres, eles nasceram com ela, e ambos são
uma única coisa, e o ser lá é sapiência.
Uma sapiência [o mundo inteligível]
cria todas as coisas que são geradas, seja as coisas produzidas
pela arte seja as coisas naturais, e a sapiência governa a criação
por toda parte.
A
sapiência verdadeira é o Ser e o verdadeiro Ser é a sapiência.
E também o Ser adquire valor da sapiência e enquanto adquire
valor da sapiência é o verdadeiro Ser. [O Ser inteligível].
Ainda
que todas as coisas sejam mantidas pelas formas do princípio ao fim,
primeiramente, a matéria é mantida pelas formas dos elementos
e, em seguida, se acrescentam outras formas sobre as formas e depois, ainda
outras. Por isto é até mesmo difícil encontrar a matéria
escondida sob muitas formas. Pois que também esta [matéria]
é uma forma última. Tudo é Forma e todas as coisas são
formas, já que o modelo era Forma. Além disso, o Universo inteligível
criava sem ruído porque isto que cria é tudo, seja ser, seja
forma. Por esta razão, a criação é também
sem fadiga. E a criação era do todo, porque o criador é
todas as coisas.
Porque
há um princípio7, todas estas coisas seguem
imediatamente [sem que exista raciocínio ou projeto] e deste
modo; e com razão se diz não buscar causas de um princípio,
sobretudo de um tal princípio perfeito que coincide com o fim; mas,
este que é princípio e fim é, ao mesmo tempo, o todo
e sem nenhuma falta.
Este Universo – permanecendo
cada uma das partes isto que é, sem se misturar – é todas
as coisas juntas em uma... Este Universo é... potência universal
que vai ao infinito, potente ao infinito.
o
único Deus é todos.
Tanto
o Ser é desejável porque é o mesmo que o Belo, quanto
o Belo é amável porque é o Ser.
Esta
falsa essência [ousía] daqui tem necessidade
de um simulacro de belo adquirido do exterior, seja para aparecer bela, seja,
em geral, para ser bela, e é bela tanto quanto participa da Beleza
que é segundo a Forma e, recebendo-a, quanto mais a recebe, mais é
perfeita. De fato, a essência é ainda mais Essência na
medida em que é Bela.
Por
isto também 'Zeus', ainda que seja mais velho do que os outros deuses,
que Ele mesmo guia, primeiro avança em direção à
contemplação deste Universo, e o seguem os outros deuses, os
demônios e as Almas que são capazes de ver estas coisas. E o
mundo inteligível aparece a eles de um lugar invisível e, elevando-se
no alto sobre eles, ilumina tudo e os enche de esplendor, e cega, como se
fosse o Sol, aqueles que estão embaixo [os que estão mais
próximos da matéria], e estes se voltam não sendo
capazes de vê-Lo. Na verdade, alguns suportam a sua Luz e olham; outros
ficam turbados, quanto mais longe Dele estão. Mas aqueles que são
capazes de ver, quando olham, todos voltam o olhar para Ele...
De
fato, a Beleza Ilumina todas as coisas e sacia aqueles que estão lá,
ao ponto que também esses se tornam belos, como muitas vezes os homens
subindo sobre lugares elevados, no momento em que a Terra de lá adquire
uma cor dourada, são inundados por aquela cor tornando-se semelhantes
à Terra sobre a qual caminham. Mas lá a cor que floresce é
Beleza, ou ainda, tudo é cor e Beleza em profundidade. Pois o Belo
não é alguma coisa de diverso, como se fosse um simples florescimento
em superfície.
Mas aqueles que não vêem
o Todo crêem somente na impressão externa. Ao contrário,
àqueles que estão, por assim dizer, totalmente embriagados e
saciados de néctar – já que a Beleza penetrou toda a Alma
– é consentido que sejam não apenas espectadores, porque
não existe mais uma coisa externa e uma outra, aquela que olha, por
sua vez também externa; mas isto que vê com a vista aguda possui
em si mesmo isto que é visto [Unidade]. Todavia, mesmo possuindo
isto que é visto, muitas vezes ignora que o possui, e olha como se
o objeto fosse exterior, já que olha como se isto fosse uma coisa visível
e porque quer vê-lo como tal. Tudo isto que alguém olha como
se fosse visível, olha do exterior. Mas, agora, é preciso transferir
o objeto visível em si mesmo e olhar para ele como se fosse uma Unidade
e vê-lo como si mesmo, como se alguém possuído por um
Deus – inspirado por Febo ou por uma Musa – gerasse em si mesmo
a visão de Deus, se tivesse a força de olhar um Deus em si
mesmo. (Grifo meu). [Ora, o que isto quer dizer? Simplesmente, que
não ascensionamos para dentro porque não queremos,
ou melhor, porque ainda não podemos, pois, ainda não temos a
Força necessária para olhar um Deus em nós mesmos –
in Corde. E assim, preferimos continuar a aceitar os deuses egregóricos
que nos são apresentados e nos são impostos pelos outros. Por
isto, ensina Plotino: No ato de se voltar para o seu Deus, há este
ganho: no início, o homem se percebe a si mesmo até o momento
em que é diverso do Deus; mas, correndo para o seu próprio interior
tem tudo, e, deixando para trás a percepção, por medo
de ser diverso Dele, torna-se uno com o Ser de lá. Há liberdade-Beleza
maior do que esta? Continua Plotino: É necessário que, de
agora em diante, se abandone ao seu íntimo, e que se torne, ao invés
de um sujeito que vê, objeto de visão de um Outro que olha, resplandecendo
com aqueles pensamentos que chegam dali. De tal forma que, o sujeito
que vê e o Outro que olha são Um.]
Como é possível
alguém estar no Belo sem vê-lo? Por outro lado, vendo o Belo
como outro, não está ainda no Belo, mas, depois de se ter tornado
Belo, está, deste modo, absolutamente no Belo... Pois, quando também
nós mesmos somos belos, o somos pelo nosso próprio ser. Ao contrário,
somos feios quando passamos a uma outra natureza. E, assim, somos belos quando
conhecemos a nós mesmos, mas feios quando ignoramos a nós mesmos.
Só
quando a Inteligência se encontra consigo, no sentido mais verdadeiro
do termo, quando se acha em si mesma, aí, só aí, ela
n'Ele se encontra, no Deus supremo.
Quando
pronunciar o Nome de Deus ou quando n'Ele pensar, faça abstração
de tudo, abandone todo o resto. Basta uma palavra: Ele. Nada acrescente. E
pergunte se só Ele mesmo ficou neste pensamento.
Se
fosse possível para a Inteligência não se fixar em algo,
ela nunca deixaria de estar diante do Primeiro Princípio, ou, de se
fazer Uma com Ele.
Quanto
maior for o número de mediações maior a será a
dualidade. O Espírito e o Uno se fundem em Um e nada os separa.
A
visão que enche os olhos de Luz, não nos faz ver algo exterior,
mas a própria Luz que é, em si mesma, idêntica ao objeto
da visão... Só existe uma única iluminação
que gera a subsistência do Espírito nela... Portanto, obter a
visão do Infinito é obra própria de quem quer obter tal
visão.
O
que nos instrui [para o Bem], são as analogias, as negações,
o conhecimento dos seres... e sua gradação ascendente; mas o
que nos conduz até o Bem são nossas purificações,
nossas virtudes, nossa ordem interior.
Se
alguém experimentou o Uno compreenderá o que digo: a Alma vive
outra Vida quando se aproxima Dele, quando está junto a Ele e quando
Dele participa, de tal modo que sabe ter presente o verdadeiro dom da Vida.
E já nada necessita, senão que há de renunciar a todo
o resto e se manter só Nele e se fazer Una com Ele, suprimindo toda
adição, de tal maneira que consiga sair de tudo e se ver livre
de tudo que possa atá-la às outras coisas, para se voltar ao
seu próprio ser, e não ter em si parte alguma que não
se una com o Divino. Então, é possível ver o Uno e se
ver a si mesma, se é que realmente se pode ver o Uno, mas iluminada,
plena de Luz inteligível, ou melhor, como se a Alma mesmo fosse uma
Luz pura, imponderável, leve; como se ela estivesse convertida em Deus,
suspensa... Todavia, chegará um momento em que a contemplação
será contínua, nua, sem nenhum obstáculo corporal que
a impeça.
O
que importa é a natureza do Bem, pois assim convém a nosso raciocínio.
Dele, diremos que é a realidade da qual tudo depende e a que aspiram
também todos os seres, pois é seu princípio e aquilo
que precisamente lhes falta. O Bem, por sua vez, não tem necessidade
de nada, basta-se a si mesmo e não depende de nenhum outro ser; ao
contrário, é medida e limite de todas as coisas e Ele proporciona,
por si mesmo, a Inteligência, o Ser, a Alma e a Vida, incluindo a atividade
intelectual que lhe é própria... O mesmo Bem está acima
do Belo e das coisas que têm a primazia na região do inteligível,
pois nesta é soberano o Bem Supremo.
Últimas
palavras: Procurai sempre conjugar o divino que há em vós
com o divino que há no Universo.
Considerações
Finais
Plotino ensinou que na radiação
do Uno (Primeiríssima Unidade, desde sempre e para sempre
una), cada esfera de criação permanece em si mesma, e o que
dela se irradia pertence a um grau inferior. Contudo, na verdade, evidentemente,
não há separação ou interrupção
entre os diversos graus da criação pensada por Plotino. Tudo,
segundo o autor estudado, está interligado a tudo, e todas as coisas
criadas estão ligadas ao Uno (Primeiríssimo Um). E
neste Plano, segundo a doutrina plotiniana, o ser humano é a suprema
criação autoconsciente derivada do Uno–em–si
(Primeiríssimo Um), com capacidade absoluta e irrestrita (dependendo,
todavia, só dela) de a Ele agostiniana e conscientemente se [re]ligar,
já que é potencialmente uma criação divina.
Esotericamente, não posso deixar
de rapidamente comentar, mutatis mutandis, isto equivale ao entendimento
de que Deus Homo est, isto significando que o Mestre-Deus de cada
um (de nós) está in Corde, adormecido em potência,
dependendo tão-só de cada qual se dispor a acordá-Lo,
para, quem sabe, um dia, Nele mergulhar e passar a ser seu próprio
Deus, e independer definitivamente de deuses egregóricos alheios, que
são criados e evaporam tal qual nuvens passageiras arrastadas pelo
vento. Haveremos de aprender e de conceber que cada um de nós é
uma estrela individual com curso próprio e com vontade própria.
Mas, para complicar um pouquinho, essa mesma individualidade é como
que uma espécie de ilusão sensória que precisa ser vencida,
pois, só assim nos tornaremos, efetivamente, unos com todos no seio
do Uno–em–si indigitado por Plotino (que primariamente
está em nós). Melhor, então, seria dizer e entender:
estrela individual com órbita própria temporária e com
vontade própria temporária. O Caminho é: da descendente
e educativa individualidade para a ascendente e sempiterna Unidade. Quando
caímos, acontece o quê? Continuamos tombados ou nos levantamos?
Muito mais do que panteístico, este conceito-entendimento é
profundamente Místico-iniciático. Por isto, os Treze são
Um, a Ordem Rosa+Cruz Eterna, Verdadeira e Invisível é Uma e
não há duas Grandes Lojas Brancas. Tudo é misticamente
Um.
Em
suma, o retorno ao Uno (já que a individualidade é
uma ilusão) é um processo que, segundo Plotino, deve acontecer
em três estágios: PURIFICAÇÃO, DIALÉTICA
E ÊXTASE. Por isso, concordo com Antônio Henrique Campolina Martins,
que ao concluir seu trabalho intitulado A Unidade em Plotino, consolidou:
E assim, podemos afirmar concluindo, com Plotino, que o real nunca é
o somatório de elementos de uma existência separada, múltipla;
mas é essencialmente polaridade de termos que se sustentam, ou seja,
Unidade, no sentido mais absoluto do termo. Não
se pode deixar de aqui observar que, sob este aspecto, o Budismo Esotérico
(não–religioso) contempla esse mesmo ideário. Com Plotino,
desta forma, completa–se o desenho do Triângulo–3P da Filosofia
Antiga: Pitágoras, Platão e Plotino.
Ao
partir para a Grande Jornada, aos sessenta e cinco anos, em 270 d. C., as
últimas palavras do Grande Iniciado neoplatônico ao médico
Eustóquio foram: Procurai sempre conjugar o divino que há
em vós com o divino que há no Universo.
______
Notas
e referências bibliográficas:
1.
Op. cit., p. 7.
2. Las Enneadas, Plotino, vol. IV, p. 37.
3. História da Filosofia, Giovanni Reale e Dario Antiseri,
vol. I, p. 343.
4. Las Enneadas, Plotino, vol. II, p. 175.
5. Op. cit., vol. II, p. 358.
6. Ou seja, no inteligível os deuses são, ao mesmo tempo, espetáculo
e espectadores, pois o conhecimento do outro é sempre conhecimento
de si. (Nota explicativa de Luciana Gabriela E. C. Soares).
7. Isto é, porque existe a realidade de lá como princípio.
(Nota explicativa de Luciana Gabriela E. C. Soares).
Bibliografia:
LOGOS
(Enciclopédia Luso-brasileira de Filosofia). Volume IV. Lisboa/São
Paulo: Editorial Verbo, 1992.
MORA,
José Ferrater. Diccionario de Filosofía. Volume III.
7ª reimpressão. Madrid: Alianza Editorial, 1990.
PLOTINO.
Las enneadas (precedidas de la vida de Plotino por su discipulo Porfirio).
Versión castellana de J. M. Q. Vol. I a IV. Madrid: Imp. De L. Rubio,
1930, 1165 p.
REALE,
Giovanni e ANTISERI, Dario. História da filosofia./Il pensiero
occidentale dalle origini adoggi. Trad. São Paulo: Paulinas, v.1,
1990, 693 p.
______.
Meditação sobre o horizonte metafísico. In:
Presença Filosófica, Rio de Janeiro, 3 (2 e 3): 11–19,
abr./ set., 1981.
______.
Perspectiva Ontológica de ser – dever ser. In: Presença
Filosófica, Rio de Janeiro, 10 (1 e 2): 193–8, jan./jun., 1984.
Páginas
da Internet e Websites consultados:
http://pt.wikipedia.org/
wiki/Plat%C3%A3o
http://209.85.165.104/search?q=cache:
MTjtxfkUDaAJ:www.cfh.ufsc.br/~simpozio/
Megahist-filos/Hel-Rom/2642y462.html+en
%C3%A9adas&hl=pt-BR&ct=clnk&cd=1&gl=br
http://br.geocities.com/
discursus/filotext/plotifil.html
http://www.revistamirabilia.com/
Numeros/Num2/plotino.html
http://www.eticaefilosofia.ufjf.br/
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http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100
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http://pt.wikipedia.org/
wiki/Plotino
http://usuarios.advance.com.ar/
simetriadelespacio/home-0.htm
http://www.geocities.com/Vienna/2809/plotino.html
http://www.mundodosfilosofos.com.br/
neoplatonismo.htm#C
http://soldedomingo.blogspot.com/
2007_04_01_archive.html
Música
de fundo:
Nuvem
Passageira (Hermes de Aquino)
Fonte:
http://www.romantichome.net/