HABITUS

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

 

Pensamentos de Pierre Félix Bourdieu

 

 

 

Pierre Félix Bourdieu

 

 

Habitus é um sistema subjetivo de estruturas interiorizadas, esquemas de percepção, de concepção e de ação que são comuns a todos os membros do mesmo grupo ou da mesma classe. É um sistema das disposições socialmente constituídas que, enquanto estruturas estruturadas e estruturantes, constituem o princípio gerador e unificador do conjunto de práticas e das ideologias características de um grupo de agentes.

 

A escola é um espaço de reprodução de estruturas sociais e de transferência de capitais de uma geração para outra. É nela que o legado econômico da família se transforma em capital cultural.

 

Não há Democracia efetiva sem um verdadeiro poder crítico.

 

A ordem social se confunde com a ordem do mundo.

 

Conformar-se com a ordem social é primordialmente respeitar os ritmos, acompanhar a medida, não andar fora do tempo. Pertencer ao grupo significa ter o mesmo momento do dia e do ano, o mesmo comportamento de todos os outros membros do grupo.

 

A ordem social é, antes de tudo, um ritmo, um tempo.

 

Princípio de uma autonomia real em relação às determinações imediatas da situação, o habitus não é, por isto, uma espécie de essência a-histórica, cuja existência seria o seu desenvolvimento, enfim, destino definido uma vez por todas. Os ajustamentos que são incessantemente impostos pelas necessidades de adaptação às situações novas e imprevistas podem determinar transformações duráveis do habitus, mas, dentro de certos limites: entre outras razões porque o habitus define a percepção da situação que o determina.

 

A correspondência que se observa entre os espaços das posições sociais e o espaço dos estilos de vida resulta do fato de que condições semelhantes produzem habitus substituíveis, que engendram, por sua vez, segundo a sua lógica específica, práticas infinitamente diversas e imprevisíveis em seu detalhe singular, mas, sempre encerradas nos limites inerentes às condições objetivas das quais elas são produto e às quais elas estão objetivamente adaptadas. O estilo de vida é um conjunto unitário de preferências distintivas que exprimem, na lógica específica de cada um dos subespaços simbólicos, mobília, vestimentas, linguagem ou hexis corporal1, a mesma intenção expressiva, princípio da unidade de estilo que se entrega diretamente à intuição e que a análise destrói ao recortá-lo em universos separados.

 

Capital social é o conjunto de recursos atuais ou potenciais que estão ligados à posse de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas de interconhecimento e de inter-reconhecimento ou, em outros termos, à vinculação a um grupo, como conjunto de agentes que não somente são dotados de propriedades comuns (passíveis de serem percebidas pelo observador, pelos outros ou por eles mesmos), mas, também são unidos por ligações permanentes e úteis.

 

Os seres aparentes diretamente visíveis – quer se tratem de indivíduos quer de grupos existem e subsistem na e pela diferença, isto é, enquanto ocupam posições relativas em um espaço de relações, que, ainda que invisível e sempre difícil de expressar empiricamente, são a realidade ('ens realissimum', como dizia a Escolástica) e o princípio real dos comportamentos dos indivíduos e dos grupos.

 

As práticas que o habitus produz (enquanto princípio gerador de estratégias que permitem fazer face a situações imprevisíveis, e que, sem cessar, são renovadas) são determinadas pela antecipação implícita de suas conseqüências, isto é, pelas condições de seu princípio de produção, de modo que elas tendem a reproduzir as estruturas objetivas das quais elas são, em última análise, o produto.

 

O melhor exemplo de disposição é, sem dúvida, o sentido do jogo. O jogador, tendo interiorizado profundamente as regularidades de um jogo, faz o que faz no momento em que é preciso fazê-lo, sem ter a necessidade de colocar explicitamente como finalidade o que deve fazer.

 

O gosto é uma escolha forçada pelas condições da existência. O gosto é o operador prático da transmutação das coisas em sinais distintos e distintivos, das distribuições contínuas em oposições descontínuas. O gosto faz com que as diferenças inscritas na ordem física dos corpos tenham acesso à ordem simbólica das distinções significantes.

 

Habitus é uma estrutura que organiza as práticas e a percepção dessas práticas, portanto serve como forma de classificar indivíduos.

 

Os bens de luxo são os mais predispostos a exprimir diferenças sociais, pois, neles, as relações de distinção estão inscritas mais objetivamente.

 

Há duas formas de ostentação da liberdade: acréscimo de exigências e acréscimo de novas regras de consumo.

 

 

 

Uma competência de consumo só tem valor quando existir um mercado para ela.2

 

A diferença maior entre um campo e um jogo é que o campo é um jogo no qual as regras do jogo estão elas próprias em jogo.

 

Todo campo tem seus dominantes e seus dominados, seus conservadores e sua vanguarda, suas lutas subversivas e seus mecanismos de reprodução.

 

A determinado volume de capital herdado corresponde um feixe de trajetórias praticamente equiprováveis que levam a posições praticamente equivalentes – trata-se do campo dos possíveis oferecido objetivamente a determinado agente; e a passagem de uma trajetória para outra depende, muitas vezes, de acontecimentos coletivos (guerras, crises etc.) ou individuais (encontros, ligações amorosas, privilégios etc.) descritos, comumente, como acasos (felizes ou infelizes), apesar de dependerem, por sua vez, estatisticamente, da posição e das disposições de aqueles que vivenciam tais eventos.

 

Há uma dialética que se estabelece no decorrer de uma vida, entre as disposições e as posições, entre as aspirações e as realizações.

 

A confirmação mais indiscutível do sentido imediato das compatibilidades e das incompatibilidades sociais é, sem dúvida, a endogamia de classe ou, até mesmo, de fração de classe. A estrutura dos circuitos de trocas matrimoniais tende a reproduzir a estrutura do espaço social.

 

A adaptação a uma posição dominada implica uma forma de aceitação da dominação.3

 

A força do pré-construído está em que, achando-se inscrito ao mesmo tempo nas coisas e nos cérebros, se apresenta com as aparências da evidência, que passa despercebida porque é perfeitamente natural.

 

A televisão tem um monopólio de fato sobre o que acontece na cabeça de uma parte significativa da população e o que ela pensa.

 

O papel da Sociologia, a partir de todas as ciências, é revelar o que está oculto.

 

Se as mulheres, submetidas a um trabalho de socialização que tende a diminuí-las, a negá-las, fazem a aprendizagem das virtudes negativas da abnegação, da resignação e do silêncio, os homens também estão prisioneiros e, sem se aperceberem, vítimas, da representação dominante. Tal como as disposições à submissão, as que levam a reivindicar e a exercer a dominação não estão inscritas em a Natureza e têm que ser construídas ao longo de todo um trabalho de socialização, isto é, de diferenciação ativa em relação ao sexo oposto. Ser homem, no sentido de vir, implica o dever-ser, uma virtus, que se impõe sob a forma do “evidente por si mesma”, sem discussão.

 

As pressões econômicas fazem da televisão um formidável instrumento de manutenção da ordem simbólica.

 

A televisão tem uma espécie de monopólio de fato sobre a formação das cabeças de uma parcela muito importante da população. Ao insistir nas variedades, preenchendo esse tempo raro com o vazio, com (quase) nada, afastam-se as informações pertinentes que o cidadão deveria possuir, para exercer seus direitos democráticos.

 

A violência simbólica é uma violência que se exerce com a cumplicidade tácita dos que a sofrem e também, com freqüência, dos que a exercem, na medida em que uns e outros são inconscientes de exercê-la ou de sofrê-la.

 

 

 

 

Disposições incessantemente reforçadas pela própria temporalidade da prática jornalística que, obrigando a viver e a pensar no dia-a-dia e a valorizar uma informação em função de sua atualidade (é o ‘viciado em atualidades’ dos jornais televisivos), favorece uma espécie de amnésia permanente, que é o avesso negativo da exaltação da novidade e também uma propensão a julgar os produtores e os produtos segundo a oposição entre o 'novo' e o 'ultrapassado'.

 

A concorrência, longe de ser automaticamente geradora de originalidade e de diversidade, tende, muitas vezes, a favorecer a uniformidade da oferta.

 

O Estado foi a maior criação político-social do ser humano, aperfeiçoada gradualmente ao longo de milênios e, em seguida, modificada aos poucos, conforme as mutáveis instâncias demográficas, militares, econômicas, geográficas e culturais.

 

Mundo Social = Campo + Habitus + Capital.

 

Meios de Comunicação = Dominados pela lógica do comércio e produtores lixo cultural em larga escala.

 

O poder simbólico, na maioria das sociedades, é distinto do poder político ou econômico, estando concentrado nas mãos das mesmas pessoas que detêm o controle dos grandes grupos de comunicação, e que controlam o conjunto dos instrumentos de produção e de difusão dos bens culturais.

 

 

Observação:

Pierre Félix Bourdieu (Denguin, França, 1º de agosto de 1930 – Paris, França, 23 de janeiro de 2002) foi um sociólogo francês. De origem campesina, filósofo de formação, foi docente na École de Sociologie du Collège de France. Desenvolveu, ao longo de sua vida, diversos trabalhos abordando a questão da dominação, e é um dos autores mais lidos, em todo o mundo, nos campos da Antropologia e da Sociologia, cuja contribuição alcança as mais variadas áreas do conhecimento humano, discutindo em sua obra temas como educação, cultura, literatura, arte, mídia, lingüística e política. Também escreveu muito sobre a Sociologia da Sociologia. A sociedade cabila, na Argélia, foi o palco de suas primeiras pesquisas. Seu primeiro livro, Sociologia da Argélia (1958), discute a organização social da sociedade cabila, e em particular, como o sistema colonial interferiu na sociedade cabila, em suas estruturas e desculturação. Dirigiu, por muitos anos, a revista Actes de la Recherche en Sciences Sociales e presidiu o CISIA (Comitê Internacional de Apoio aos Intelectuais Argelinos), sempre se posicionado claramente contra o Liberalismo e a globalização. O mundo social, para Bourdieu, deve ser compreendido à luz de três conceitos fundamentais: campo, habitus e Capital. Foi consagrado como Doutor Honoris Hausa das Universidades Livre de Berlim (1989), Johann-Wolfgang-Goethe de Frankfurt (1996) e de Atenas (1996).

 

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Notas:

1. A hexis corporal é uma maneira prática de experimentar e de exprimir o sentido que se tem do próprio valor social. A relação mantida com o mundo social e o nosso lugar atribuído a esse mundo nunca são declarados tão bem quanto através do espaço e do tempo... pela maneira, segura ou agressiva, desenvolta ou inconsciente, de se apropriar deste tempo.

2. Um exemplo disto é o caso dos toxicodependentes, que, geralmente, não sabem ou não dão a menor pelota, mas, ao comprarem uma trouxinha de maconha ou um papelote de cocaína estão, no mínimo, fomentando a violência e o tráfico de armas. Neste caso, o carma é duplo, triplo, quádruplo... O carma não deriva apenas das conseqüências, mas, também da conseqüencialidade das conseqüências. Precisamos ter em conta que um ato prejudicial (ou proveitoso) qualquer não afeta apenas uma pessoa (ou uma situação/condição estabelecida), mas, várias. Isto é denominado de efeito dominó, efeito em cascata ou efeito em cadeia. É por isto que as retribuições, às vezes, demoram milênios para serem integralmente compensadas. E vai doendo! E vai sangrando! Por outro lado, é por isto também que sou francamente favorável à descriminalização das drogas (que já está acontecendo em diversas partes do mundo). Todas elas, leves ou pesadas. E isto nada tem a ver com levantar bandeiras revolucionárias e/ou libertárias; é uma obviedade salutífera que só não enxerga quem não quer. Medidas repressivas e autoritárias (ou totalitárias), para o que quer que seja, não adiantam, nunca adiantaram e jamais adiantarão bulhufas. Mutatis mutandis, isto vale para o dito terrorismo também. Na verdade, vale para tudo. A incompreensão não será jamais mitigada, resolvida ou sanada na porrada – que só produz traumas psicológicos. Além disto, a porrada é a mãe da indignação, da insubmissão e da retaliação. Enfim, por exemplo, combater o Estado Islâmico com canhões, bombas e veículos aéreos não-tripulados (VANT) ou veículos aéreos remotamente pilotados (VARP), mais conhecidos como drones, não porá fim à insurgência islâmica. Acaba-se com um grupo aqui, e, a toda a pressa, nasce outro ali. Como sói acontecer.

 

 

Efeito Dominó, Efeito em Cascata ou Efeito em Cadeia

 

 

3. Isto é claro. Quem não topa ser colonizado não é colonizado de jeito nenhum. A coisa toda é como disse o escritor, argumentista, teatrólogo, ensaísta, jornalista, dramaturgo, contista, romancista e poeta português José de Sousa Saramago (Golegã, Azinhaga, 16 de novembro de 1922 – Tías, Lanzarote, 18 de junho de 2010): Aprendi a não tentar convencer ninguém. O trabalho de convencer é uma falta de respeito, é uma tentativa de colonização do outro.

 

 

 

 

 

Dúplice Abominação

 

 

 

 

Às vezes, abominamos,

sem o porquê conhecer.

Outras vezes, gostamos,

cucando o porquê saber.

 

E, amando e desprezando,

com os burriquetes na água,

vira-e-mexe, vamos dando...

E, que se lixe o Aconcágua!

 

Habitus de colonizar...

Habitus de transgredir...

Habitus de se apossar...

Habitus de interdizer...

 

Habitus de tirar meleca...

Habitus de oscular a mão...

Habitus de ir à abicheca...

Habitus de recusar o pão...

 

Habitus de horar/dormir...

Habitus de pré-qualificar...

Habitus de se descomedir...

Habitus de curto-circuitar...

 

Dialetizando um tantinho,

muda-se qualquer habitus.

É só meter lá um esforcinho,

e lá se vão todos os ai-jesus!

 

O busílis é ter intrepidez

para confrontar o espelho.

Difícil? Só na primeira vez.

Mas, arrombado o bedelho...

 

Entrementes, a tromba dilata,

o bucéfalo não se candidata

e a pizza tão-só rechoncha.

 

 

 

Isto não é teste de coordenação índex-nariz;
é habitus
melequento —› dilação da tromba.

 

 

 

Páginas da Internet consultadas:

http://blog.ninapaley.com/2012/05/10/cartoon-violence/

http://www.stockfreeimages.com/2341605/Sad-moon.html

http://www.newrem.com/animated-
gif-man-adventures/comics/109/fight

http://pt.wikipedia.org/wiki/Pierre_Bourdieu

https://sapientia.ualg.pt/bitstream/10400.1/1758/1
/Microsoft%20Word%20-%20TeseMestrado.pdf

http://www.conteudojuridico.com.br/pdf/cj046324.pdf

http://www.unigran.br/mercado/paginas/arquivos/edicoes/3/8.pdf

http://www.fespsp.org.br/seminario2013/artigos
/IISeminarioPesquisa_YasmimN%C3%B3brega.pdf

http://www.frasesgo.com/autores/frases-de-pierre_bourdieu.html

http://euvivonasociologia.blogspot.com.br/p/
pierre-bourdieu-pierre-felix-bourdieu-1.html

http://www.gelbc.com.br/pdf_teses/gabriel_delgado.pdf

http://www.citador.pt/frases/aprendi-a-nao-tentar-convencer
-ninguem-o-trabalh-jose-de-sousa-saramago-15282

http://brgaudencio.wordpress.com/

http://en.wikipedia.org/wiki/Unmanned_aerial_vehicle

http://revistavisaojuridica.uol.com.br/advogados-leis-jurisprudencia
/86/descriminalizacao-das-drogas-do-debate-a-guerra-293295-1.asp

http://www.theredheadriter.com/2014/03/12-
fascinating-gif-animations-that-will-amaze-you/

http://pt.wikipedia.org/wiki/Efeito_domin%C3%B3

http://www.sevenoaksart.co.uk/iphone_animations.htm

http://www.linkirado.net/dia/22/06/2011

http://www.bourdieu.com.br/p/h.html

http://www.dicionarioinformal.com.br/hexis%20corporal/

http://www.histedbr.fe.unicamp.br/
revista/edicoes/38/art09_38.pdf

http://infoparaliberdade.blogspot.com.br/
2012/11/educacao-pierre-bourdieu.html

http://bourdieuducacao.blogspot.com.br/
2011/06/vida-obras-pensamento-teoria-e.html

 

Música de fundo:

La Question
Compositores: Francoise Hardy & Tuca
Interpretação: Francoise Hardy

Fonte:

http://minhateca.com.br/

 

Direitos autorais:

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