PECCATUM  MUNDI

 

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

 

 

Qual será o maior peccatum mundi?

Obstar a concessão de alforria?

Não ab-rogar a mais-valia?

Opiar-se com uma infértil rezaria?1

 

Sentar em um trono e não sair?

Sem mais aquela, não acudir?

Dar uma desculpinha para não ir?

Fingir não ver para não dividir?

 

Há mais; mas o peccatum homini

é acreditar na existência de pecado.

Nada o deixa mais estupidificado.

 

Ninguém pode absolver peccata homini2

Credulidade e inscícia, sim, existem.

 

 

 

Medo - Ignorância - Ódio

Fonte: http://shallowgate.blogspot.com/

 

 

 

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Notas:

1. A comparação da religião com o ópio (a religião é o ópio do povo) não é original em Karl Heinrich Marx (1818 – 1883), pois já havia aparecido, por exemplo, em escritos de Immanuel Kant (1724 – 1804), Johann Gottfried von Herder (1744 – 1803), Ludwig Andreas Feuerbach (1804 – 1872), Bruno Bauer (1809 – 1882), Moses Hess (1812 – 1875) e Christian Johann Heinrich Heine (1797 – 1856). Seu contexto imediato é o seguinte: É este o fundamento da crítica irreligiosa: o homem faz a religião; a religião não faz o homem. E a religião é, de fato, a autoconsciência e o sentimento de si do homem, que ou ainda não se conquistou ou voltou a se perder. Mas o homem não é um ser abstrato, acocorado fora do mundo. O homem é o mundo do homem, o Estado, a sociedade. Este Estado e esta sociedade produzem a religião, uma consciência invertida do mundo, porque eles são um mundo invertido. A religião é a teoria geral deste mundo, o seu resumo enciclopédico, a sua lógica em forma popular, o seu 'point d’honneur' espiritualista, o seu entusiasmo, a sua sanção moral, o seu complemento solene, a sua base geral de consolação e de justificação. É a realização fantasmal da essência humana porque a essência humana não possui verdadeira realidade. Por conseguinte, a luta contra a religião é indiretamente a luta contra aquele mundo cujo aroma espiritual é a religião. A miséria religiosa é, ao mesmo tempo, a expressão da miséria real e o protesto contra a miséria real. A religião é o suspiro da criatura oprimida, o âmago de um mundo sem coração e a alma de situações sem alma. É o ópio do povo. A abolição da religião, enquanto felicidade ilusória dos homens, é a exigência da sua felicidade real. O apelo para que eles deixem as ilusões, a respeito da sua situação, é o apelo para abandonarem uma situação que precisa de ilusões. A crítica da religião é, pois, em germe, a crítica do vale de lágrimas de que a religião é a auréola. A crítica colheu nas cadeias as flores imaginárias, não para que o homem suporte as cadeias sem fantasia ou sem consolação, mas para que lance fora as cadeias e colha a Flor Viva. [Maiúsculas e negrito meus]. A crítica da religião liberta o homem da ilusão, de modo que ele pense, atue e configure a sua realidade como homem que perdeu as ilusões e recuperou o entendimento, a fim de que ele gire à volta de si mesmo e, assim, à volta do seu verdadeiro Sol. [Negrito meu]. A religião é apenas o sol ilusório que gira à volta do homem enquanto ele não gira à volta de si mesmo. Por isto, a tarefa da História, depois que o além da verdade se desvaneceu, é estabelecer a verdade do aquém. A imediata tarefa da Filosofia, que está a serviço da História, é desmascarar a auto-alienação humana nas suas formas não-sagradas, agora que ela foi desmascarada na sua forma sagrada. A crítica do céu transforma-se, deste modo, em crítica da Terra, a crítica da religião em crítica do Direito, a crítica da Teologia em crítica da política. (Crítica da Filosofia do Direito, Karl Heinrich Marx). Marx tornou-se reconhecido como crítico sagaz da religião devido à sentença acima transcrita: A religião é o suspiro da criatura oprimida, o âmago de um mundo sem coração e a alma de situações sem alma. É o ópio do povo. Seja como for, é importante saber que Marx se ocupou muito pouco em criticar sistematicamente a atividade religiosa, pois ele sabia muito bem que era inútil, principalmente, penso eu, quando não é oferecida uma alternativa místico-racional que restaure a ordem interior por um processo de reconhecimento da harmonia perfeita existente em nosso Coração. Em suma: enquanto a ordem interior não for restaurada, a religião dominará o vácuo mental preenchido pela ignorância. Nesse quesito, então, Marx, basicamente, seguiu a opinião de Feuerbach, para quem a religião não expressa a vontade de nenhum Deus ou de outro ser metafísico: a religião é criada pela fabulação dos homens. Sem discordar um milímetro, vou modilhorar (modificar + melhorar) o final desta sentença de Feuerbach: de forma geral, as religiões sempre foram criadas pelas fabulações muito bem engendradas de homens sem-vergonha no focinho, para, sacanocraticamente, meterem a mão no bolso de homens que ainda não encontraram o Caminho. Meu irmão: se você descobrir, na História da Humanidade, um Magister Ascensus que tenha parido uma religião, eu lhe darei um doce. Enfim, devo dizer que aprecio e respeito muito o pensamento da Santo Agostinho de Hipona (Tagaste, 13 de novembro de 354 – Hipona, 28 de agosto de 430), mas, de forma alguma, concordo com esta recomendação de sua autoria: Roma locuta est, causa finita est. Roma falou, a causa está encerrada.

Nota editada das fontes:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Karl_Marx

http://www.lusosofia.net/textos/marx_karl_para
_a_critica_da_filosofia_do_direito_de_hegel.pdf

http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%93pio_do_povo

2. Nas liturgias católica e anglicana, o Agnus Dei é recitado ou cantado na parte da Santa Missa denominada de Rito da Paz, enquanto durar a fração do Pão. Esta oração foi introduzida na Santa Missa pelo Papa Sérgio II (687 – 701), e é baseada no Evangelho de João 1: 29.

Em latim:

Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, miserere nobis.
Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, miserere nobis.
Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, dona nobis pacem.

Em português:

Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo, tende piedade de nós.
Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo, tende piedade de nós.
Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo, dai-nos a paz.

Quanto à afirmação de que peccata existem e não existem – que pode, talvez, ter confundido o leitor – a explicação é muito simples: peccata existem para os que acreditam que existam; e peccata não existem para os que sabem que não existem. Tudo se resume ao último verso do soneto: Credulidade e inscícia, sim, existem. Enfim, cabe lembrar o que ensinou o Adepto Avançado e Místico-Magista Aleister Crowley (1875 – 1947), que proclamou: Do what thou wilt shall be the whole of the Law. Faze o que tu queres e será toda a Lei. Mas, carmicamente, e, portanto, inevitavelmente, ao fazermos o que queremos, somos responsáveis pelas conseqüências derivadas do que queremos e do que fazemos!

Certa vez escrevi um poema em que afirmei: Nesta existência, há muito pouca ebulição quando se escolhe a ponte da trivialidade. E comentei: Ebulição, bem entendido, sob o prisma da consciência, isto é, sob os aspectos morais e/ou espirituais. Seja como for, a ebulição geralmente começa quando o ser-no-mundo pressente que está chegando a hora – a hora do pega pra capar, a hora do acerto de contas, a hora do é o que é, a hora em que não há nem xixi minha nega nem vem cá meu bem! Quando se estuda, por exemplo, a vida de Francisco de Paula Cândido Xavier, popularmente mais conhecido por Chico Xavier (Pedro Leopoldo, 2 de abril de 1910 – Uberaba, 30 de junho de 2002), é doridamente impressionante constatar o quanto ele ebuliu e padeceu por sustentar até o fim suas razões/percepções interiores. Há uma máxima do Chico, absolutamente irretocável e irretorquível, que recordarei agora: Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim. Hoje, acrescentarei: o que temos na cabeça? Pedra? Bosta? Ou neurônios? Bolas! Só não muda quem não quer.

 

 

 

 

Canto gregoriano de fundo:

Agnus Dei
Interpretação: Coro dos Monges de la Abadía de Santo Domingo de Silos

 

Página da Internet consultada:

http://www.babelteam.com/7PecadosPT/