A
generosidade oficial para com as instituições financeiras
continua sem limite. Ao serem divulgados os resultados dos bancos, no ano
passado, quando a Nação inteira sofreu os duros efeitos da
recessão, viu-se que atingiram índices jamais vistos, chegando
a mais de 500%, em certos casos. Pois exatamente agora, o impagável
Governo do reeleito, invocando ‘relevância e urgência’,
editou mais uma medida provisória oficializando o anatocismo,1
que o velho Código Comercial – o código de 1850 –
já vedava de maneira exemplar, e que a nossa tradição
jurídica condenou ao longo de gerações. Aliás,
na linha da Lei de Usura, de 1933, é a jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal, cristalizada na Súmula 121, segundo a qual ‘é
vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada’.
Sabe o leitor a fundamentação da medida ‘urgente e relevante’?
É que a cobrança de juros sobre juros vinha sendo praticada
pelos bancos. Em vez de condenar o abuso, pressurosamente, o Governo homologou
o abuso mediante medida provisória. É um escárnio.
A medida apareceu na 17ª edição da MP nº 1.963;
na calada da noite foi gerada.
Para
resolver os problemas do País, eu conversaria até com o demônio.
No
que tange à instrumentalidade eleitoral, por exemplo, é quase
inacreditável o aperfeiçoamento, mas no momento em que o Chefe
do Estado se despe da faixa presidencial e assume a chefia real e formal
da campanha de um candidato e em cerimônia oficial insulta o candidato,
por sinal, da oposição, chamando-o de mentiroso, ele se despe
da magistratura presidencial, inerente à Presidência, e ingressa
no mundo da ilicitude, que, para um Presidente, é a mais grave das
infrações às suas indisponíveis responsabilidades.
A
reeleição é um insulto à Nação,
aos 150 anos de Brasil independente e a todos os homens públicos
que passaram por este País... A releição, no Brasil,
é uma deformação do Presidencialismo.
O
país errado é o nosso País, um país
sem leis, onde as solenes garantias constitucionais do domicílio,
da privacidade, da propriedade, da liberdade de empreender e trabalhar,
estão sendo reduzidos a nada, mercê do egoísmo, da covardia
e do oportunismo.
O
abuso tolerado e festejado vai tirando do homem comum a confiança
na justiça.
Quando
se afronta a Justiça, abre-se a porta do império da lei da
selva e é o fim dos fins. É a deterioração de
tudo que possa significar ordem e segurança, direito e liberdade.
Sou
Deputado libertador. O PL, ao qual sempre estive filiado, desde estudante,
foi extinto por um ato de império. O mandato que, por seu intermédio,
me outorgou o povo riograndense, não desapareceu, como não
desapareceram os compromissos políticos assumidos com o povo riograndense
por intermédio do PL. A eles, e exclusivamente a eles, permaneço
fiel. O mandato de que sou titular, conferido por intermédio do PL,
pessoa jurídica de direito público, decorre de ato jurídico
perfeito e resulta de coisa julgada – decisão irreformável
da Justiça Eleitoral. Tanto o ato jurídico perfeito quanto
a coisa julgada são intocáveis pela
Constituição.2
É
preciso não esquecer que a violência é doença
contagiosa, e com a publicidade que o Governo dispõe ele pode incendiar
o País... Para começar um incêndio, basta um fósforo;
para extingui-lo, pode custar o incalculável.
No
Estado Novo3
houve de tudo, a começar pela destruição dos valores
democráticos e pelo endeusamento do ditador, à semelhança
do que se fizera nos países totalitários da Europa.
Outro
fenômeno que se tem externado com algum desembaraço é
a violência como meio de reivindicação. A violência,
empregada no exercício de direitos, não só caracteriza
abuso do Direito, como configura perigosa maneira de proceder. Nunca deu
bom resultado. De mais a mais, legitima a reação, que, por
vezes, pode ter efeitos lamentáveis. O exercício do Direito
exclui a violência. Nunca será impróprio repetir a advertência
de Ruy Barbosa: 'A autocracia tem uma só cabeça, que se remove
de um só golpe. A oligarquia, muitas, mas notórias e sujeitas,
mais dias, menos dias, à expiação fatal. A anarquia,
milhares e ou milhões, anônimas, inumeráveis, irresponsáveis.
Das formas do cativeiro humano é a mais truculenta e a mais irremediável'.
Já
vivi alguns anos e testemunhei muitas coisas pouco exemplares, mas nunca
vi o Presidente da República ser censurado pela Justiça Eleitoral
por infração à lei e, indiferente ou desdenhoso, repetir
a falta uma, duas, três vezes. Em uma delas chancelou, dizendo que
mandaria a multa para os ouvintes. É de se convir que o Presidente
nada ganha com essas vulgaridades, e muito se afasta das regras do decoro
que a liturgia do cargo lhe impõe. Volto a dizer que lei alguma permite
ao Presidente proceder, no trato com um dos ramos do Judiciário,
com essa licenciosidade de contraventor contumaz... Faz mais de século,
Rui Barbosa notou que 'as idéias políticas germinam e frutificam
em utilidades, como as sementes no solo, ou produzem nas sociedades fenômenos
fatais, como os venenos nos organismos vivos'. E não se esqueça
o Presidente de que os maus exemplos são ainda piores, porque são
mais fáceis de ser repetidos.
Há
muita gente que entra em cio quando se fala em reforma agrária.
Os
presidentes militares tomaram decisões repugnantes, restando à
ARENA o privilégio de se conformar com elas. Ao 'maior partido do
Ocidente', como foi cognominado, cabia chancelar o que o Executivo todo-poderoso
fazia majestaticamente. Não sei o porquê; talvez pelo papel
que se lhe reservava, o 'maior partido do Ocidente' trocou de nome duas
vezes, se não estou enganado, parece que levado pela necessidade
de se desvincular dos seus tempos de gloriosa... servidão.
O
imprevisto é sempre possível.
Yvette
Guilbert (1894)
Caricatura original de
Henri de Toulouse-Lautrec (1864 – 1901)
Em
nosso País existe o Dia da Árvore, o Dia do Livro e não
sei quantos outros mais, mas sei que está faltando um: o Dia da Agiotagem.
A
sociedade parece que está se acostumando às
coisas mais absurdas, mais perniciosas, mais condenáveis, mais sem
precedentes...
Há
uma certa lassidão, a indignação popular dura como
as rosas...
A
existência da oposição é tão importante
quanto a existência do Governo.
Sempre
entendi que o ministro da Justiça não deve ser parte da campanha,
mais do que qualquer outro não podendo ser, ao mesmo tempo, autoridade
e ator, pois a ele compete a adoção de medidas que se fazem
necessárias no período eleitoral.
Avalio
o desgaste das instituições oficiais, com a troca pública
de acusações entre a Polícia Federal e a ABIN,4
com apreensão e tristeza. Com apreensão, pois não posso
entender como dois serviços públicos importantes entram em
litígio. E com tristeza, porque qualquer que seja o resultado não
será bom. Acho que não é possível que um órgão,
como a Polícia Federal, e outro, como a ABIN, entrem nesse bate-boca
pelos jornais.
Se um órgão do Governo
recorre a processos ilícitos, onde estamos?
Sou
favorável a que o mandato seja partidário porque ninguém
pode ser candidato sem partido. O partido é um ser. Um ser necessário
ao candidato.
O
específico do contemporâneo é que agora a droga veio
dar dimensão industrial ao vício e aos viciados, zomba da
sociedade, dos jovens, dos estudantes, dos professores, das autoridades
de alta hierarquia, da liberdade e da vida das pessoas. É uma ilha
dentro do Estado. Tem moral, leis, polícia e até justiça
próprias. Nisto pode ser resumido o flagelo. Antes que me esqueça,
se são exatas as informações que possuo, o 'crack'
mata mais e em menos tempo que outras drogas.
Se
há dogmas em matéria jurídica esse é um deles.
A lei penal só retroage quando benéfica ao acusado ou mesmo
condenado. Daí sua irrevogabilidade. Os efeitos da Lei da Anistia
se fizeram sentir quando a Lei entrou em vigor. O próprio delito
é apagado. A revogação da Lei
da Anistia ou que outro nome venha
a ter importaria em restabelecer em 2010 o que deixou de existir em 1979.
Seria, no mínimo, uma lei retroativa, pela qual voltaria a ser crime
o que deixara de sê-lo no século passado. A anistia pode ser
mais ou menos justa, mas não é a justiça seu caráter
marcante. É a paz. No arco-íris social, com suas contradições,
esta me parece ser a nota dominante. Não estou dizendo novidade.
Regulação da imprensa?
O que é isto, hein? Quem vai praticar esta arte de regular o exercício
da imprensa? Será que o período da censura à imprensa
não foi o bastante para ensinar algumas pessoas? Eu acho que foi
demais.
É na falta de consistência
partidária que residem os grandes problemas políticos do País,
que dão origem a casos como o do Mensalão e promovem o condenável
toma-lá-dá-cá.
Estou
preocupado com coisas que não aconteciam e que passaram a acontecer
no Brasil. Fui parlamentar durante 24 anos. Como deputado federal e senador,
eu peguei o período mais duro do regime autoritário. Não
posso dizer que aquele tempo fosse um mar de rosas, mas não havia
coisas como o Mensalão.
O
Brasil está mudando. A sociedade vai mudando. É bom que o
Judiciário reflita isso. O Ministro Joaquim Barbosa5
é um exemplo de que a sociedade está mudando
e é bom que o Judiciário viva esse momento. Mas é preciso
fazer um alerta: não se governa com processo-crime. Processo-crime
é para cuidar da delinqüência. Não é meio
de Governo.
Nós
não podemos imaginar uma Democracia sustentada no Judiciário
para corrigir as coisas. Não pode ser só Judiciário,
Judiciário, Judiciário. O Judiciário julga, não
governa. É preciso distinguir as coisas. Ainda hoje vi no jornal
que, se houver uma medida provisória restabelecendo a CPMF, o Judiciário
vai ter que se manifestar. Não pode haver espaço sequer para
se cogitar uma coisa dessas.
O
problema é da sociedade brasileira. O Congresso não pode ser
melhor do que a sociedade. O Congresso é o retrato da sociedade.
A sociedade brasileira vem sofrendo uma erosão de valores muito grande.
Vou citar um exemplo. Em uma universidade, há um problema qualquer,
uma greve. Então, os estudantes resolvem invadir e tomar conta da
sede da reitoria. A reitoria entra com uma ação na Justiça.
O juiz determina a reintegração de posse. Os estudantes não
cumprem. Simplesmente, comunicam que não vão cumprir. E a
coisa fica por isso mesmo. Os estudantes não saem. A determinação
do juiz não vinga, e pronto. Isto é um sinal claro de deterioração
da sociedade. De falta de respeito às regras mais elementares. E
olha que eu não escolhi o morro como exemplo. Eu escolhi uma universidade.
Isto é um fenômeno grave.
Investimento
em educação resolve em parte, mas não resolve tudo.
Entramos, infelizmente, em uma fase em que vale tudo. Não há
mais critérios. Os critérios são objeto de menosprezo.
Voltando, então, à questão da Câmara e do Senado;
eles não estão lá por acaso. Foram eleitos.
Há países que passaram
por descrédito semelhante e se recuperaram, mas uma reação
dessas não é feita de uma hora para a outra. A França,
nas décadas de 30 e 40, era um país com todas as qualidades,
mas era uma deterioração política muito grande. Aí
capitulou diante do Nazismo e viveu a fase colaboracionista. Foi um período
trágico. E foi preciso pagar com sangue aquela vergonha. Quatro anos
depois, em 1944, De Gaulle, no desfile triunfal pela avenida Champs Elysées,
caminhou em meio à multidão como um libertador da França
e se tornou uma figura histórica tão intensa como Joana d'Arc
fora na França medieval.
Sobre
a eleição
do general-de-exército Emílio Garrastazu Medici e do almirante-de-esquadra
Augusto Rademaker para a Presidência e vice-presidência da República
Federativa do Brasil: Eleger, do latim 'eligere',
quer dizer escolher, separar, estremar, nomear, preferir, selecionar, designar.
E, no caso, não se trata de eleger, porque a eleição
já foi feita. O que mais se poderia dizer seria aprovar, ratificar,
homologar.
Todo
mundo fala de reforma
política e ninguém sabe
o que é. Gostaria de saber qual é essa reforma. É como
a tributária, de que todo mundo fala, mas também ninguém
sabe qual é. Essa é a realidade. A situação
a que chegamos e não poderíamos ter chegado. Não se
brinca com certas coisas na Democracia. Depois, levam-se vinte anos para
corrigir.
Uma das causas da nossa Democracia
é o desaparecimento dos partidos. O processo que levou à ditadura
militar e depois à redemocratização foi cruel com a
vida partidária brasileira. Neste processo, os partidos foram extintos
duas vezes em um período de apenas vinte anos. Nós nunca tivemos
uma vida partidária forte; nunca tivemos partidos grandes e fortes.
Sempre houve resistência e preconceito contra os partidos. Quantas
vezes eu ouvi: 'Não, não se vota em partido, vota-se em nome,
em pessoas'. E isto é um erro grave.
A
lei pode muito, mas não pode tudo.
Um
Partido é um complemento do cidadão. Mas um Partido
sem cidadãos não existe. O que acontece é que qualquer
sujeito, sem qualquer expressão, faz qualquer Partido.
E os Partidos se tornaram meramente símbolos, títulos. Hoje,
são não sei quantos partidos há, mas você não
é capaz de dizer o nome dos líderes na Câmara. Ninguém
é capaz. Nem dentro da Câmara eles sabem. Porque esses Partidos
não têm existência real.
É
preciso haver identidade partidária. Veja bem, o Presidente Lula
teve na primeira eleição cerca de 60% dos votos. Na segunda
eleição, um pouco menos. Eu pergunto: quantos deputados elegeu
o partido do Presidente da República? Na primeira eleição,
não chegou a 100, numa Câmara com 513 parlamentares. Na segunda
eleição, ainda foi menos. Pode funcionar um sistema em que
acontece isso? Aí é que está. Essa realidade ninguém
parece capaz de ver.
Em qualquer lugar do mundo, governa
quem tem maioria. Quem não tem maioria, não tem como governar.
Aqui no Brasil, não. Porque se escolhe o presidente em voto direto,
como se fosse uma coisa maravilhosa e definitiva, mas ele não tem
maioria na Câmara e no Senado. Pode governar? Não pode governar.
Aí faz essa mercancia, esse mercado aberto e despudorado.
Eu
entendo que o mandato parlamentar não é exclusivamente do
partido nem exclusivamente do candidato. Há uma dupla titularidade.
Há dois sujeitos. É um condomínio. Ninguém pode
ser candidato sem partido. É uma condição de elegibilidade.
Mas, uma vez eleito, o parlamentar também tem seus direitos e suas
prerrogativas.
Acho
que a Polícia Federal tem um campo de atuação muito
amplo. Mas ela não é absoluta. Está sujeita à
norma legal. Uma investigação policial, às vezes, pode
partir de elementos que são impressionantes. E depois, com a investigação,
vai revelar que eles não eram tão impressionantes como pareciam.
Por isto, a autoridade tem que ter cuidado. É uma coisa fácil
de dizer, mas não é fácil de fazer.
Acho
um abuso algemar qualquer pessoa. Pessoas que não são capazes
de correr três passos. O que é isso? Não se respeita
ninguém. O acusado não merece respeito? O acusado não
é criminoso antes de ser condenado. É preciso haver critério.
Claro, há determinadas pessoas que são de notória periculosidade.
Aí, a polícia tem a faculdade de tomar essas precauções.
Mas há outros que não têm uma ficha criminal assim.
Para que isso? É um excesso que não contribui para nada.
Se
o poder facilmente leva ao abuso, o poder absoluto tende ao abuso também
absoluto, segundo o conceito famoso.
Nos
regimes democráticos não existe governante irresponsável.
Não há Democracia representativa sem eleição.
Mas a eleição – ainda que isenta, periódica e
lisamente apurada –
não esgota a realidade democrática, pois, além
de mediata ou imediatamente resultante de sufrágio popular, as autoridades
designadas para exercitar o Governo devem responder pelo uso que dele fizerem.
Um Governo irresponsável, embora originário de eleição
popular, pode ser tudo, menos um Governo democrático.
A
melhor maneira de errar é fazer previsões.
Os
juízes erram ao permitir que a quebra de sigilo seja a regra. O uso
do poder é um convite ao excesso.
Quando
alguém se arroga o direito de afrontar a lei em nome de opiniões
pessoais, políticas ou filosóficas, abre o ensejo a que seus
direitos fundamentais sejam igualmente violados.
O
território nacional foi coberto, em grande parte, por florestas,
e, hoje, em grande parte, está devastado. Este é um dado da
realidade. Nós temos devastado esta admirável e impagável
riqueza nacional [os recursos naturais, as áreas verdes, florestas
etc.]. É um mal que vem de longe, que veio com a colonização.
O excesso de riqueza nos levou a ser perdulários.
Eu
sou criador, mas entre o boi e a árvore, eu distingo: aqui é
boi e ali é árvore.
Se
eu, amanhã, exercendo uma autoridade legal, me deparasse com uma
situação em que o meu dever é prender alguém,
eu não hesitaria, mas prenderia com a finalidade de chegar ao resultado
mais útil com o menor dano. Uma coisa é prender uma pessoa
condenada com uma pena a cumprir, onde não há uma necessidade
de discrição. Agora, quando se trata de suposição
de um crime, a conduta há de ser diferente, há de se levar
em conta o que a Constituição estabeleceu, há de se
levar em conta o patrimônio da Humanidade. O que estou notando agora
é que está se perdendo o apreço por essas garantias.
Por maiores que sejam os indícios,
a pessoa que não é condenada deve ser considerada inocente.
A presunção de inocência é uma norma de validade
universal, salvo, naturalmente, naqueles países que ainda vegetam
em tiranias.
Há
um velho princípio segundo o qual o uso do poder é um convite
ao excesso. Uma pessoa bem-intencionada que está fazendo uma investigação
e encontra tropeços aqui e ali é tentada a transcender este
óbice. É perigoso, sobretudo quando se dá secretamente.
Vai acontecendo sem que ninguém saiba, salvo quem pratica ou quem
sofre. Sabe-se como começa e não se sabe como termina, até
porque pode estar em curso uma investigação comprometida.
Crise
é vida; o que está em crise está vivo.
De todos os males do autoritarismo,
nenhum é superior à destruição do conceito de
legalidade. Cumprir a lei se tornou quase uma coisa inimaginável,
e isto não se apaga de uma hora para outra. Uma coisa que também
foi desaparecendo – em todas as entidades, em todas as Casas, em todos
os Poderes –
foram as referências não-escritas. No mundo
parlamentar, no mundo partidário, por exemplo, as Casas Legislativas
tinham cardeais. Tinham a mesma investidura dos demais, mas a palavra deles
era melhor acolhida; todo mundo sabia que não iriam dizer uma coisa
que não fosse para o bem da Instituição. Estas referências
não existem mais. Isto é visível em todos os setores.
Faltam líderes.
Tudo
está a indicar que o Senado é o juiz exclusivo do momento
em que convém exercer a competência, a ele, e só a ele,
atribuída, de suspender lei ou decreto declarado inconstitucional
por decisão definitiva do STF. No exercício dessa competência,
cabe-lhe proceder com equilíbrio e isenção, sobretudo
com prudência, como convém à tarefa delicada e relevante,
assim para os indivíduos como para a ordem jurídica.
A
tolerância ou a complacência ou a leniência com fanatismo
armado dificilmente leva à segura paz, e, paradoxalmente, tem gerado
a guerra.
Uma
coisa é o Senado e outra é o eventual presidente do Senado
de ontem, de hoje e de amanhã. É preciso distinguir o Senado
da atual presidência. Quando deixei o Senado, em 31 de janeiro de
1983, comparando com hoje, houve uma transformação muito grande
no mundo e nele próprio. Não sei dizer quantos funcionários
tinha o Senado naquela época em que fui senador. Agora, dizem que
há dez mil servidores. Faço a seguinte observação:
ninguém governa uma Casa com dez mil funcionários.
Os
problemas não se geram por geração espontânea.6
A
vida partidária foi desmantelada no regime autoritário (1964
- 1985). A dualidade (Arena contra PMDB) de partidos era uma contribuição
brasileira ao século XX, era o que se dizia na época. Depois
se abriu a mais absoluta liberdade para a criação de partidos.
Bastava passar por um tabelionato e registrar um suposto programa. O Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) o registrava provisoriamente. Isto terminou com
a vida parlamentar e o funcionamento de muitos partidos. Se perguntarem
os nomes dos presidentes dos partidos, duvido que alguém saiba. Aquilo
que eles faziam antigamente, na medida de suas forças e de suas características,
deixou de haver. Então, foi se criando uma estrutura substitutiva
que mudou completamente o funcionamento do Congresso.
Os partidos existem na medida em
que eles atendem aos requisitos do Código Eleitoral e segundo a Justiça
Eleitoral. O Presidente da República é a autoridade nacional
de maior hierarquia. Não pode tudo. Não pode se partidarizar.
É uma autoridade que deve servir à Nação.
A expressão consagrada para
o Presidente
da República é 'Primeiro
Magistrado da Nação'. Não pode liderar facção.
Se
Deus limitou a inteligência, por que não limitou também
a burrice?
Durante
a ditadura, quando era perigoso, eu cumpri o meu dever.
Epílogo
do primeiro discurso de Paulo
Brossard no
Senado: Fui eleito por oito anos.
No entanto, o meu mandato de oito anos pode durar oito meses. Ou oito semanas.
Ou oito dias. Ou oito horas. Agora, enquanto eu estiver aqui, não
hei de pedir a ninguém licença para dizer o que entenda é
do meu dever fazer.
Paulo
Brossard