PARMENIDES

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

 

 

 

 

PARMENIDES1

Platão

Fragmentos

 

 

 

Parmenides

Parmenides

 

 

Advertência

 

 

Este texto de Platão é dificílimo (uma espécie de Verdade Cósmica revelada e inspirada a partir do Uno-em-si – um diálogo apresentado em forma de discussão entre Parmenides, o Pai da Lógica, e Sócrates jovem), e, à medida que vai sendo dialetizado, parece se tornar mais e mais contraditório, demandando um esforço intelectual quase sobre-humano para ser compreendido, ainda que eu tenha selecionado as partes mais fáceis de serem entendidas. Pior, como no caso, é lê-lo sob a forma de fragmentos [não-ordenados]. Logo, estes poucos fragmentos não são para ser lidos; é necessário, para compreendê-los, estabelecer um diálogo com o Eu Interno. De outra forma, ao final, para o desavisado/apressado, poderá surgir uma progressão geométrica de incoerências, tornando-se este estudo totalmente inútil. Seja como for, aqui e ali, interpolei algumas animações. Quem sabe, eu espero, ajudarão! Enfim, o melhor mesmo é ler o original platônico, para que possamos compreender, minimamente, que uma coisa só é real, ou seja, só pode se manifestar no Plano da Realidade, quando é logicamente possível. Mas, o que é a realidade e o que é logicamente possível? Eu tenho mais dúvidas sobre tudo do que certezas! Na verdade, uma das minhas poucas certezas é: Dio, Como Ti Amo.

 

 

 

 

Se os seres são múltiplos, por força terão de mostrar, a um só tempo, semelhanças e dissemelhanças, o que não é possível. Nem o semelhante pode ser dissemelhante, nem o dissemelhante pode ser semelhante. Se o dissemelhante não pode ser semelhante nem o semelhante dissemelhante, no mesmo passo não será possível existir o múltiplo, porque, se existisse, não poderia se eximir destes atributos impossíveis.

 

 

 

 

A grandeza em si mesma só poderá ser maior do que a pequenez em si mesma, como não poderá ser menor a pequenez em si mesma se não o for da própria grandeza em si.

 

Passar do repouso ao movimento ou se mover para depois ficar imobilizado não pode ocorrer sem mudança. E não há um determinado tempo que a mesma coisa possa estar em repouso e em movimento.

 

Já o instante parece significar algo assim como o ponto de mudança em direções opostas. Essa coisa de natureza inapreensível – o instante – se encontra situada entre o movimento e o repouso, sem estar em nenhum tempo, sendo que a transição converge da coisa em repouso para o movimento e da coisa em movimento para o repouso.

 

 

 

 

Com todas as mudanças, quando passam da existência para a morte ou da não-existência para o nascimento, encontram-se em um estado intermediário, entre certas formas de movimento e de repouso, de sorte que, nessa ocasião, nem são existentes nem são não-existentes, nem nascem nem morrem.

 

O que não existe não poderá estar no que existe.

 

O que não é, de jeito nenhum, poderá participar da existência.

 

O que não é não está nem parado nem em movimento.

 

Se não houvesse o Uno, só haveria multiplicidade... Sem o Uno, na verdade, nem sequer seria possível imaginar a pluralidade. Logo, se o Uno não existisse, todas as outras coisas nem poderiam ser concebidas como unidade e nem como pluralidade, nem como semelhantes nem como dissemelhantes. Nem poderiam ser tidas como idênticas ou diferentes; nem poderiam estar em contato nem poderiam separadas. Assim, se não existisse o Uno, nada existiria.

 

O Uno, por sua vez, não pode ser nem maior nem menor do que a grandeza e a pequenez, por não possuir nem grandeza nem pequenez. Não contendo nem grandeza nem pequenez, o Uno não poderá se ultrapassar nem ser ultrapassado por si mesmo; terá de ser co-extensivo consigo mesmo e, com tal, igual a si mesmo.

 

A existência foi repartida entre toda a pluralidade dos seres, sem faltar em nenhum – nem no maior nem no menor.

 

O Uno é igual a si mesmo e aos outros, como é maior e menor do que ele mesmo e os outros.

 

Se o Uno apresentasse dissemelhança com o Uno, o Uno não poderia ser o Uno. Logo, importa que o Uno seja semelhante a si mesmo.

 

O Uno, por conseguinte, está ligado a todas as partes do Ser, não podendo faltar nem nas menores nem nas maiores ou seja na que for.

 

Todas as coisas não poderão estar totalmente privadas do Uno, devendo, de certo modo, participar dele.

 

A parte não é parte nem da pluralidade nem de todas as suas partes, porém de uma certa idéia ou de uma certa unidade a que damos o nome de todo – unidade perfeita nascida desse todo. Disto, apenas, é que a parte é parte.

 

Tirante a própria unidade, nada mais pode ser unidade. Assim, o todo e as partes terão necessariamente de participar do Uno; aquele seria o todo do qual as partes seriam partes, e cada uma destas, por sua vez, uma parte do todo, parte una e individual desse todo... Deste modo, a conseqüência para as outras coisas que não o Uno, quando na companhia do Uno, parece ser a aquisição de algo novo que lhes confere limites em suas relações recíprocas; mas, por sua própria natureza, elas são ilimitadas.

 

Todas as coisas são, ao mesmo tempo semelhantes e dissemelhantes a elas mesmas e entre si.

 

Nem o ser está ausente do Uno, nem o Uno do ser; é uma dupla que ocorre sempre e em toda parte.

 

Cada parte, sem dúvida nenhuma, está no todo, não havendo uma única que esteja fora dele.

 

Tudo se relaciona com tudo da seguinte maneira: ou há identidade ou há diferença. Quando não há nem identidade nem diferença, terá de haver relação como da parte com o todo ou do todo com a parte.

 

O Todo é um.2 Mas, para que Uno3 seja um, não poderá ser um todo nem há de ter partes. E não sendo constituído de partes, não terá começo nem meio nem fim, pois tudo isso já seriam partes. Logo, o Uno é ilimitado, visto não ter começo nem fim. E também carece de forma, pois, se participasse da forma reta ou da circular, teria partes e seria múltiplo. Sendo o que é, não está em parte alguma; efetivamente, não poderá estar nem em outra coisa nem em si mesmo. Enfim, o que é Uno e sem partes de jeito nenhum poderá ter no seu contorno pontos de contato.

 

As coisas que não apresentam relação recíproca – nem de partes nem de todo nem de diferença – são idênticas entre si.

 

O que se dá com o Uno para ser diferente dos outros, e estes, por sua vez, para diferirem dele, leva o Uno a ser igual aos outros, e os outros iguais ao Uno.

 

Uma coisa é o envolvente e outra o envolvido, pois, como tudo, não poderá atuar ao mesmo tempo como agente e como paciente; nesta hipótese, o Uno deixaria de ser um para ser dois.

 

O Uno, por conseguinte, não está em parte alguma, nem em si mesmo nem no que quer que seja.

 

Não há maneira de o semelhante não ser semelhante ao semelhante. E assim, o semelhante participa com seu semelhante da mesma e única idéia.

 

 

A idéia, aqui, é triangular.

 

 

Dar excessiva importância à opinião dos homens é defeito da idade.

 

As idéias, que só são o que são por suas relações mútuas, têm sua essência própria somente em relação umas com as outras, não com relação ao que em nós são suas cópias ou como quer que sejam denominadas, e de cuja participação tiramos a designação certa de tudo o mais. Por outro lado, as coisas do nosso mundo que têm o mesmo nome que elas, só existem em relação umas com as outras, não com as idéias, sendo assim denominadas por elas mesmas, não por causa das idéias.

 

As realidades só são o que são para elas mesmas e com referência a elas mesmas, exatamente como se dá com as coisas do nosso mundo.

 

Se se encontra em Deus4 o domínio supremo e o conhecimento perfeito, nem esse domínio chegará nunca a nos dominar nem esse conhecimento a nos conhecer, ou seja, ao que for do nosso mundo; porém, da mesma forma que não dominamos os deuses com nosso domínio nem alcançamos nada das coisas divinas com nosso conhecimento, assim também, pelas mesmíssimas razões, os deuses não têm domínio sobre nós nem conhecem os negócios humanos, na qualidade de deuses.

 

Para cada coisa há um gênero à parte com existência independente...

 

A única maneira de assegurar que o existente existe e que o não-existente não existe é participar o existente da existência do ser existente e da não-existência do ser não-existente, para poder plenamente existir; como o não-existente terá, também, de participar da essência do não-ser implicada no ser não-existente, para ter completa não-existência.

 

Em tudo o que supusermos como existente ou não existente ou como determinado de qualquer modo, é preciso examinar as conseqüências resultantes. Primeiro, para o próprio objeto, e depois relativamente aos outros. Deve-se começar por um, depois vários e, por último, todos.

 

As multidões ignoram que a não ser com a exploração a fundo do terreno, em todos os sentidos, não é possível adquirir noções certas com respeito à verdade.5

 

O Uno não pode se deslocar nem atingir determinada meta de mudar de lugar nem girar no mesmo ponto sem se modificar. Logo, o Uno não é movido por nenhuma modalidade de movimento nem é possível que esteja em qualquer coisa.

 

Se o Uno fosse diferente de si mesmo, seria outro, com o que deixaria de ser um. Logo, o Uno não terá de ser idêntico a outra coisa nem diferente de si mesmo.

 

O Uno e o idêntico são de naturezas diferentes, pois quando uma coisa se torna idêntica a outra, não fica una. Se o Uno tiver de ser idêntico a si mesmo, não será uno consigo mesmo, e assim ele, sendo um, deixaria de ser um, o que é de todo um ponto impossível. Logo, não é possível ao Uno ser diferente de outra coisa ou idêntico a sim mesmo. Assim, o Uno não poderá ser nem diferente nem idêntico, tanto em relação consigo mesmo como com outra coisa.

 

Também não poderá se dar que o Uno fique diferente, pois, nesta hipótese, ele se tornaria mais do que um.

 

O Uno, portanto, não poderá ser semelhante nem dissemelhante nem com relação a si mesmo nem com qualquer outra coisa.

 

O Uno não poderá ser nem igual nem desigual a si mesmo ou a outra coisa, não sendo maior nem menor do que ele próprio ou do que seja o que for.

 

Também o Uno não poderá ser nem mais moço nem mais velho nem da mesma idade do que ele mesmo ou do que qualquer outra coisa, sendo, assim, absolutamente impossível que o Uno esteja no tempo.

 

O que se torna mais velho, só envelhece com relação a algo mais moço.

 

Faz parte da natureza do que avança tocar simultaneamente em duas coisas, o agora e depois, deixando o agora para trás e apossando-se do depois no próprio ato de tornar-se, entre o depois e o agora.

 

Se tudo o que devém não pode prescindir do agora, todas as vezes que é deixará de devir, para ser aquilo mesmo que se acha implícito no seu devir.

 

 

 

 

O agora sempre acompanha o Uno durante toda a sua existência, pois o Uno, sempre, é agora toda vez que é.

 

Se acrescentarmos quantidades iguais a quantidades desiguais – quer se trate do tempo ou do que quer que seja – a diferença daí resultante se conservará sempre igual à do começo.6

 

Mas, se a um tempo mais longo e a um mais curto ajuntarmos um tempo igual, daí por diante, o mais longo ultrapassará o mais curto de uma fração menor.7

 

Se uma coisa é diferente de outra, não pode vir a ficar diferente do que já é diferente dela. Do que é diferente, ela difere; do que ficou diferente, diferia; e do que vier a ficar diferente, diferirá. Mas, do que se torna diferente, poderá ter sido, nem é nem poderá vir a ser diferente; torna-se diferente, nada mais.

 

O que vai ficando mais velho do que ele mesmo, terá, fatalmente, de ir ficando mais moço com relação a si próprio. Mas, neste processo ele não poderá ficar nem mais tempo nem menos tempo do que ele mesmo; de forma que será sempre no mesmo espaço de tempo que ele pode se tornar ou ser ou ter sido ou vir a ser. Tudo o que se encontra no tempo e dele participa, tem consigo a mesma idade e é simultaneamente mais velho e mais moço do que ele próprio. Quanto ao Uno, ele nunca participou de semelhantes contingências. Logo, se o Uno não participa em absoluto de nenhum tempo, ele nunca foi no passado, nem era nem se tornou, como no presente nem é nem chega a ser nem se forma, e também não chegará a ser nem se formará nem será no futuro. Disto se conclui que o Uno não tem nome, não tem explicação, não pode ser conhecido, não pode ser percebido e nem pode avaliado.

 

O Uno era, é e será, como se tornou, como se torna e como se tornará.8

 

 

 

 

 

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Notas:

1. Parmênides de Eléia (cerca de 530 a.C. – 460 a.C.) nasceu em Eléia, hoje Vélia, Itália. Foi o fundador da Escola Eleática. Há uma tradição que afirma ter sido Parmênides o discípulo de Xenófanes de Cólofon mas não há certeza sobre o fato, já que uma tradição distinta afirma ter sido o filósofo pitagórico Amínias (ou Ameinias), quem despertou a vocação filosófica de Parmênides.

2. Na verdade, particularmente, cada um de nós, é um e é múltiplo. É um por ser parte irrefragável da, desde sempre, Unidade; é múltiplo por ser uma coleção de personalidades secundárias derivadas das múltiplas encarnações, que acabam por desembocar na última ou atual.

 

 

 

 

3. Se, a partir deste ponto, admitirmos que o Uno parmenidiano seja (confundido com) um deus qualquer, toda a dialética que se seguirá será inútil. Não esqueçamos de que todo e qualquer atributo por nós emprestado ao que quer que seja e a quem quer que seja deriva de nossa cultura e de nossa compreensão da coisa compreendida no exato momento do empréstimo à esta coisa. Por exemplo: se, em um tempo, apoiamos determinada coisa e depois a desapoiamos, é porque, no momento do apoio, estávamos harmonizados com a idéia que a coisa transmitia. A partir do instante em que nos modificamos, que nos elevamos, não podemos mais dar apoio a algo, seja lá o que for, que já não mais corresponda às nossas (novas) representações interiores. Só o medo e a ignorância podem acorrentar um ser-no-mundo no mesmo plano pensamental [des]estruturante, isto é, [des]criador de estruturas, formas, idéias, crenças, fideísmos, [ir]racionalidades etc.

 

 

4. Neste passo, é necessário presumir a existência de um deus omnitudo.

5. Verdade, que – seja como for ou do jeito que for – será sempre relativa.

6. 5 – 2 7 – 4 9 – 6 11 – 8 333 – 330 ...

7.

Tempo 1
(mais longo)
Tempo 2
(mais curto)
Acréscimos
iguais de tempo
2,000
1,000
2,000
2,500
1,500
0,500
1,667
3,000
2,000
0,500
1,500
3.500
2,500
0,500
1,400

 

8. Mudam apenas as coisas que se manifestam.

 

 

 

 

 

 

 

 

O Uno-em-si era, é

e perpetuamente será Uno.

O homem não era; é,

mas ainda continua aluno.

 

 

Há três coisas a fazer:

lançar fora a dissimulação;

recusar não-ser... e Ser;

ouvir a Voz do Coração.

 

 

A vida é um gênero de morte

– uma espécie de inconsciência

que nem sequer é recorte

ou sombra da Santa Ciência.

 

 

Há mais três coisas a fazer:

com galhardia, avançar;

com humildade, reconhecer;

com SOPhIa, Transmutar.

 

 

No Universo não há repouso.

Para Saber é preciso Buscar.

Refúgio? Esconderijo? Pouso?

Não! É preciso muito Ousar.

 

 

 

 

 

 

Música de fundo:

Dio Como Ti Amo
Composição e interpretação: Domenico Modugno

Fonte:

http://www.umnovoencontro
musical.com/italianas.htm