A VELHA SENHORA

 

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

 

A VELHA SENHORA

 

 

 

 

 

Verão; Rua do Rosário; centro do Rio de Janeiro. O final de dia estava tórrido e já ia tarde. O médico, suando em bicas, entrou em um bar e pediu uma água mineral bem gelada e sem gás. Aparentando ter uns noventa e tantos anos, ao seu lado, estava empoleirada em um bunda de fora uma encarquilhada e simpática senhora fumando um tremendo charutão e tomando o último gole de um chope. Quando a água mineral chegou, a encarquilhada alegremente solicitou ao garçom:

 

Ei, Lourival, desce outro estupidamente gelado. Na pressão.

 

Parabéns; vejo que a senhora tem uma excelente saúde comentou o médico.

 

A macróbia, orgulhosa, respondeu: — Bota excelente nisso, meu chapa; estou inteiraça. Fumo dois charutinhos e dois maços de Derby por dia; bebo de dez a quinze chopes e mais ou menos uns cinco traçados todos os dias; adoro um churrasco, uma feijoada, um sarapatel e um sarrabulho, mas, frutas, verduras e legumes nem pensar; sexta, sábado e domingo vou dançar, fumo uns baseados e dou umas cafungadas; e, como não sou de ferro, dou uma transadinha todas as madrugas. Se eu não arrumar companhia, namoro comigo mesma, porque não durmo antes de o Sol raiar. Sou noctívaga e vou morrer noctívaga.

 

Impressionado com a disposição da, talvez, quase centenária senhora, delicadamente, o médico observou: — Estou comovido, porque, na sua idade, isso não é lá muito comum.

 

Meio passada, a encarquilhada extemporânea disparou: — Qual é? Comovido? Tá pensando o quê? Meu nome é Soledad, vendo violetas e farei trinta e três anos amanhã!

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fundo musical:

La Violetera
Compositores: Jose Padilla Sanchez & Eduardo Montesinos Lopes

Fonte:

http://www.charles50tao.com.br/instrumental.htm