O
feminismo
é uma categoria conceitual coletivista, isto é, um sofisma,
pois pretende encerrar dentro de um conceito genérico homogêneo
uma vasta coletividade de individualidades heterogêneas, nas quais
as diferenças e disparidades são, pelo menos, tão importantes
(seguramente mais) do que o denominador comum clitórico e ovárico.
Um
público comprometido com a leitura é crítico, rebelde,
inquieto, pouco manipulável e não crê em lemas que alguns
fazem passar por idéias.
A
liberdade e a Democracia são o verdadeiro caminho do progresso, da
verdadeira civilização, que acredito que seja o papel de um
escritor defender.
Condenados
a uma existência que nunca está à altura de seus sonhos,
os seres humanos tiveram que inventar um subterfúgio para escapar
de seu confinamento dentro dos limites do possível: a ficção.
Ela lhes permite viver mais e melhor, ser outros sem deixar de ser o que
já são, deslocar-se no espaço e no tempo sem sair de
seu lugar nem de sua hora e viver as mais ousadas aventuras do corpo, da
mente e das paixões, sem perder o juízo ou trair o Coração.
Escreve-se
para preencher as lacunas, como uma retaliação contra a realidade,
contra as probabilidades.
Os
intelectuais de esquerda, vítimas do raquitismo do pensamento, procuram
desqualificar os adversários pela excomunhão: um liberal é
um monstro. Mágica maneira de matar o interlocutor. As formas stalinistas
continuam a imperar no debate intelectual, mesmo em países cultos
como a Itália. A Democracia representa a fiscalização
do poder, a luta contra a corrupção, a liberdade, a alternância
e o conflito negociado no quadro institucional.
Nicarágua
(1990): A Teologia da Libertação identifica o pecado
com as estruturas sociais injustas do Capitalismo, e, em sua versão
mais extremista, proclama que o Marxismo é a única solução
para o mundo. A Nicarágua se converteu no paraíso de católicos
socialistas, de teólogos radicais, de profetas apocalípticos
e de curas marxista-leninistas provenientes do mundo inteiro. O Governo
Sandinista, que tem em seu Governo quatro sacerdotes revolucionários,
promove a Igreja Popular, acreditando que ela dotará a Revolução
de um nimbo cristão, sem limitar seu radicalismo. Quando se fala
de disputa entre a 'Igreja Popular' e a hierarquia católica, quase
sempre se pensa que a primeira represente as massas humildes de fiéis
com seus pastores, e que a segunda represente uma falange de bispos teratológicos
e um punhado de ultramontanos e entreguistas cegos e surdos aos ventos da
História. Mas, na realidade, a 'Igreja Popular' é pouco popular
porque os sacerdotes e laicos que a conformam possuem rigor, refinamento
intelectual e trabalhos sociopolíticos, que estão fora do
alcance do católico comum e, sobretudo, dos pobres. Além disso,
os esforços para denunciar o papel histórico da Igreja a serviço
dos poderes dominantes e para revestir a luta de classes e o anti-imperialismo
de simbologia evangélica têm eco apenas nos setores intelectuais
e militantes da classe média, já convencidos de antemão.
Ademais, o grosso dos católicos nicaragüenses, como os do resto
da América Latina, não professa essa religião reflexiva,
intelectualizada e crítica proposta pela 'Igreja Popular', senão
a fé intuitiva, disciplinada, ritual, defendida pela hierarquia católica.
Hoje,
na América Latina, temos muito menos ditaduras; temos governos de
direita e de esquerda que são democráticos. A corrente autoritária
e antidemocrática de países como Cuba e Venezuela estão
de saída. Governos de esquerda, como o do Brasil e o do Chile, na
época da 'concertação', e como o Governo uruguaio são
Governos de esquerda que respeitam a Democracia e que, inclusive, no campo
econômico, promovem políticas liberais. Acho que isto é
um grande progresso. Temos, também, Governos de direita democráticos
no Chile, na Colômbia e no Peru. O que não é um progresso
é que ainda tenhamos Cuba e a Venezuela. Cada vez há menos
apoio, menos respaldo popular, como se viu nas eleições venezuelanas.
Apesar
da universalidade da América Latina, uma de suas obsessões
recorrentes tem sido definir sua identidade. Na minha opinião, esta
é uma empreitada inútil, perigosa e impossível, porque
identidade é algo possuído por indivíduos e não
por coletividades, pelo menos desde que elas tenham transcendido as condições
tribais. Somente nas comunidades mais primitivas, nas quais o indivíduo
existe apenas como parte da tribo, é que a idéia de uma identidade
coletiva tem alguma 'raison d’être' [razão
de ser].
Mas, como em outras partes do mundo, essa mania por determinar uma especificidade
metafísica ou histórico-social para uma aglomeração
tem causado o fluir de oceanos de tinta latino-americana, gerando diatribes
ferozes assim como polêmicas intermináveis.
A
riqueza da América Latina está em ser várias coisas
simultaneamente – tantas, na verdade, que é um microcosmo no
qual todas as raças e culturas do mundo coexistem. Cinco séculos
após a chegada dos europeus a suas praias, serras e florestas, os
latino-americanos de descendência espanhola, portuguesa, italiana,
alemã, africana, chinesa ou japonesa são tão 'nativos'
ao continente quanto aqueles cujos ancestrais foram os antigos astecas,
toltecas, maias, quechuas, aimarás ou caraíbas. E a marca
que os africanos deixaram no continente, no qual vivem por cinco séculos,
é onipresente: nas pessoas, na língua, na música, na
comida e até em certas formas de se praticar a religião. Seria
um exagero dizer que alguma tradição, cultura ou raça
deixou de contribuir para o vértice fosforescente de misturas e alianças
diluídas em todas as ordens da vida latino-americana. Esta aglomeração
é o nosso maior patrimônio: ser um continente que não
possui uma só identidade porque contém todas as identidades.
E, graças aos seus criadores, continua se transformando a cada dia.
Estou
esperançoso. A ditadura castrista está dando seus últimos
bocejos. Dura enquanto Fidel durar.
Sempre participei da política
como intelectual interessado no confronto das idéias. Entretanto,
nunca me imaginei assumindo cargos; definitivamente não era minha
vocação. Mas resolvi participar do jogo político em
um momento muito particular do Peru, em que havia uma situação
econômica crítica, um processo hiperinflacionário que
destruía os salários, um populismo que fazia com que o País
fosse olhado com desconfiança pela comunidade internacional, quando
os níveis de vida despencavam... E havia a violência social
desencadeada pelo terrorismo, com o Sendero Luminoso, o Tupac Amaru e outras
organizações radicais. Enfim, senti que nossa débil
Democracia poderia desaparecer; por isto resolvi me candidatar à
Presidência do Peru. Além disso, eu realmente acreditava haver
um clima favorável para as reformas liberais e democráticas
que me dispunha a fazer. Foi uma experiência instrutiva e ingrata,
também, pela grande violência que a acompanhou... O saldo foi
reconhecer que sou completamente incompetente como político profissional.
Vou
continuar escrevendo sobre as coisas que mais me estimulam. Vou continuar
defendendo as idéias que tenho: a defesa da liberdade, da Democracia,
da opção liberal e as críticas a todas as formas de
autoritarismo.
A
Literatura não é algo que nos faça felizes, mas nos
ajuda a nos defendermos da infelicidade.
A
Literatura não deve se afastar da vida. Gostaria que a minha obra
fosse como uma esponja que absorvesse tudo o que acontece no seu tempo.
Não conheço grande Literatura que tenha sido indiferente à
política.
Lembro-me de um discurso do Henry
Kissinger (secretário de Estado americano entre 1973 e 1977), que
não é um tonto, pouco antes da queda do Muro de Berlim (1989).
Ele disse: 'Senhoras e senhores, tenhamos claro que o Comunismo está
aqui para ficar'. Mas ele desapareceu, e não porque foi derrotado
pelo Ocidente, mas por uma putrefação interna, por uma incapacidade
de organizar uma Economia produtiva, porque o sistema de controle do pensamento
e da vida o foi asfixiando.
Na
América do Sul, hoje, só temos uma semiditadura, a de Hugo
Chávez, que foi derrotada nas últimas eleições
e tem um fracasso econômico enorme. Dificilmente o regime vai sobreviver
muito tempo.
Comentário
sobre uma viagem a um país africano, que durou 15 dias:
Foi a experiência mais desoladora, triste e deprimente de minha vida.
Vi um médico congolês que me disse: — 'O problema número
um deste País são os estupros. Aqui, há muitos anos,
não se estupra por prazer sexual; o estupro é uma arma para
humilhar o adversário. Não há, aqui, um povoado em
que haja uma só mulher que não tenha sido estuprada'. Ele
me disse isso e começou a chorar de modo atroz. A culpa maior, a
responsabilidade principal de que o País tenha chegado a essa situação
de espanto foi a colonização belga, o que os belgas fizeram
ali.
É
preciso estimular a leitura nas novas gerações,
sobretudo convencer os jovens de que a Literatura não é só
conhecimento, que a Literatura não é só uma forma de
adquirir determinados conceitos e idéias, mas um prazer extraordinário.
O
gozo que a boa Literatura produz é incomparável; a Literatura
é fundamental se nós quisermos ter um futuro de liberdade.
O
teatro e suas imagens são, estou certo, um gênero privilegiado
para representar o labirinto inquietante de anjos, demônios e maravilhas
que é a morada de nossos desejos.
Mesmo
o homem mais elementar pode momentaneamente romper as barras do cárcere
em que está confinado seu corpo.
Tentam
controlar o que é a vida literária porque vêem na vida
literária sempre a semente de um perigo para o poder. E é
verdade: a boa Literatura, ao despertar o espírito crítico,
cria cidadãos que podem ser mais dificilmente manipulados do que
uma sociedade sem Literatura e sem bons livros. Promover a Literatura não
é só promover uma forma de gozo, uma forma de luxo, mas é
promover também a liberdade, a Democracia, o pluralismo, a coexistência
na diversidade. Espero
que a Literatura sobreviva à tecnologia; depende de nós. É
preciso promover a Literatura nos programas educativos. Minha esperança
é que as novas tecnologias não impliquem em uma banalização
do conteúdo do livro. Acho que existe o risco de que a tecnologia
empobreça a Literatura. Que ela continue sendo o que tem sido, está
em nossas mãos.
No
embrião de todos os romances, bule uma inconformidade, late um desejo.
Só
um idiota pode ser totalmente feliz.
A
incerteza é uma margarida cujas pétalas nunca acabam de desfolhar.
A privatização deve
ser um instrumento para disseminar a propriedade privada entre aqueles que
não têm acesso à propriedade.
As reformas liberais não podem
separar a liberdade econômica da liberdade política, e
só podem ser realizadas na Democracia, com o consentimento eleitoral
da população e respeitando a liberdade de imprensa, os direitos
humanos e a independência do Poder Judiciário, senão
o progresso ficará manco, coxo, capenga.
O
problema social é um problema complexo, mas, para ser solucionado,
o ponto básico é a criação de riqueza.
Até agora, a América Latina tem criado pobreza!
A
liberdade é indivisível; não pode ser dividida em liberdade
política e liberdade econômica.
Sou
um apátrida. Sou uma pessoa que sempre detestou o nacionalismo, que
me parece ser uma das aberrações humanas que mais sangue fizeram
correr. O nacionalismo é um patriotismo imposto a partir do poder
e a partir do preconceito, da convenção social. O nacionalismo
é um sentimento absolutamente negativo.
O
que mais em um intelectual e um político é a mesma coisa.
Mas em um um intelectual parece mais grave, que é a duplicidade.
É dissociar as palavras dos atos, dizer uma coisa e agir de maneira
totalmente diferente.
A
maior parte dos países pratica o protecionismo e é verdade
que o protecionismo é uma expressão do nacionalismo, mas isto
não justifica nem o protecionismo nem o nacionalismo.
Não
há país em que não haja preconceitos raciais. Os preconceitos
raciais são universais. Os países mais democráticos
têm preconceitos raciais, mas isto não justifica o preconceito
racial, que é uma aberração e precisa ser
combatida.
O
protecionismo, a proteção, os controles,
o não ter que competir, o estar protegido, torna os capitalistas
medíocres e, além disto, os corrompe.
O
nacionalismo é uma perversão não somente do ponto de
vista cultural, mas, sobretudo, do ponto de vista econômico. A prova
disto é que os países que praticam menos o protecionismo
são os que estão em situação
econômica melhor, são os que se desenvolveram mais rapidamente,
são aqueles que alcançaram melhores níveis de vida
para a sua população e são os que estão na vanguarda
do desenvolvimento. O desenvolvimento
é incompatível com o nacionalismo. O nacionalismo,
hoje em dia, sobretudo neste mundo interdependente de mercados mundiais,
condena um país àquilo que Popper1
denominou de 'retorno a tribo'. O 'retorno
a tribo', certamente, é compatível com o nacionalismo,
mas significa pobreza, atraso e injustiça.
A
irrealidade não me diverte; a irrealidade me entedia.
A
política deve ter um sentido moral, se quisermos realmente superar
nosso atraso e o nosso subdesenvolvimento.
Eu
creio que a realidade é um caos. A realidade é essa miríade
infinita de planos, de perspectivas, que está constantemente se transformando
pela ação recíproca de todos; algo que não pode
ser totalmente organizado por nenhum esquema de conhecimento.
Julgo
que a felicidade é mais uma conseqüência do que uma causa.
As frustrações, os fracassos, o sofrimento e a dor são,
muitas vezes, o ponto de partida de uma aventura literária.
A
utopia é um sonho impossível; a sua busca está condenada
ao fracasso. Mas, nesta busca realiza-se uma obra, uma existência.
A
busca de uma sociedade perfeita é uma só, ainda que as circunstâncias
envolventes variem muito. Por outro lado, a formação de uma
personalidade em torno dos seus ideais é também um fenômeno
antigo e contemporâneo.
Não sou partidário
das utopias políticas. Penso que, no campo político, é
melhor o realismo. Isto é, aceitar as possibilidades reais e não
fixar objetivos impossíveis. De resto, os seres humanos são
distintos e o que faz uns felizes não contenta outros. Só
através da violência se pode impor uma idéia única
de felicidade. Todas as utopias sociais levaram a apocalipses, quando se
materializaram. Um exemplo disto foi a Inquisição. Foi criada
em nome de uma sociedade perfeita em que fosse abolido o sacrilégio,
a heresia, em última instância, o pecado. O resultado foram
as torturas, a censura, os autos-de-fé, as fogueiras. O século
XX também está cheio de intenções utópicas,
como o Nazismo ou o Comunismo. Não foi a prática utópica
e messiânica que fez avançar a sociedade, mas essa coisa realista
que é a Democracia. Mas acredito que a utopia é benéfica
para a Humanidade, nas Artes, na Literatura, no plano da vida individual.