Só
quando tiveres suprimido a religião católica é que
tu, por assim dizer, terás direito à República; pois
na religião católica tens a tua república no céu.
Por isto, não precisas de uma aqui. Pelo contrário, aqui deves
ser escravo, para que o céu não seja supérfluo.
O
Protestantismo já não se preocupa, como o Catolicismo, com
o que Deus é em si mesmo, mas apenas com o que Ele é para
o homem; por isto, já não tem, como aquele, nenhuma tendência
especulativa ou contemplativa. Já não é Teologia –
é essencialmente só cristologia, isto é, antropologia
religiosa.
A
elaboração, a resolução racional ou teorética
do Deus, que para a religião é transcendente e inobjetivo,
é a Filosofia especulativa.
A
essência da Filosofia especulativa nada mais é do que a essência
de Deus racionalizada, realizada e atualizada. A Filosofia especulativa
é a Teologia verdadeira, conseqüente, racional.
Deus
enquanto Deus – como ser espiritual ou abstrato, isto é, não-humano,
não-sensível, acessível e objetivo só para a
razão ou para a inteligência – nada mais é do
que a essência da própria razão; mas esta é representada
pela Teologia comum ou pelo Teísmo mediante a imaginação
como um ser autônomo, diferente, distinto da razão. É,
pois, uma necessidade interna, sagrada, que com a razão se identifique,
finalmente, a essência da razão distinta da razão. Portanto,
que se reconheça, realize e atualize o Ser Divino como a essência
da razão. Nesta necessidade se funda o grande significado histórico
da Filosofia especulativa.
A
opinião, segundo Platão, tem apenas como objeto as coisas
inconsistentes, e, por isto, é ela própria o saber mutável
e variável — precisamente apenas opinião.
A
prova de que o Ser Divino é a essência da razão ou da
inteligência reside em que as determinações ou propriedades
de Deus – tanto quanto naturalmente estas são racionais ou
espirituais – não são determinações da
sensibilidade ou da imaginação, mas propriedades da razão.
Deus
é o ser infinito, o ser sem quaisquer limitações. Mas
se Deus não tem fronteiras ou limites, também a razão
não tem quaisquer fronteiras ou limites.
A
razão que pensa Deus como um ser ilimitado pensa em Deus apenas a
sua própria ilimitação.
A
necessidade do Ser Primeiro e Supremo funda-se no pressuposto de que só
o intelecto é o ser supremo e primeiro, o ser necessário e
verdadeiro.
No
Ser Necessário, a razão prova e ostenta apenas a sua própria
necessidade e a sua própria realidade.
O
que são as verdades racionais, imutáveis, universais, incondicionais,
sempre e em toda a parte válidas, a não ser expressões
da essência da razão?
O
que no Teísmo é objeto, na Filosofia especulativa é
sujeito. O que além é essência unicamente pensada e
representada da razão, aqui é a essência pensante da
própria razão.
Deus
é objeto do homem e só do homem, não dos animais. Mas
o que um ser é só se conhece a partir do seu objeto. E o objeto
a que necessariamente se refere um ser nada mais é do que a sua essência
revelada... Deus é apenas um objeto do homem. Os animais e as estrelas
glorificam Deus só na interpretação do homem. É,
pois, inerente à essência do próprio Deus não
ser objeto para qualquer outro ser fora do homem, isto é: Deus é
um objeto especificamente humano, um segredo do homem.
Aquele
para quem o Ser Supremo é objeto é ele próprio o Ser
Supremo. Quanto mais para os animais o homem for objeto, tanto mais eles
se elevam, tanto mais se aproximam do homem. Um animal para o qual o objeto
fosse o homem enquanto homem – o ser humano autêntico –
já não seria nenhum animal, mas o próprio homem. Só
seres de igual valor são objeto uns para os outros e, decerto, tais
como são em si. A consciência do Teísmo apreende também
certamente a identidade do Ser Divino e do ser humano; mas, porque ele,
situando embora a essência de Deus no espírito, o representa
ao mesmo tempo como um ser sensível e que existe fora do homem, também
esta identidade é para ele objeto só como identidade sensível,
como semelhança ou parentesco. Parentesco exprime o mesmo que identidade;
mas a ele está simultaneamente associada a representação
sensível de que os seres aparentados são dois seres independentes,
isto é, sensíveis e exteriores um ao outro na sua existência.
A Teologia ordinária faz do
ponto de vista do homem o ponto de vista de Deus. Pelo contrário,
a Teologia especulativa faz do ponto de vista de Deus o ponto de vista do
homem, ou antes, do pensador.
Na
Teologia ordinária, Deus é uma contradição consigo
mesmo; deve ser um ser não-humano, um ser supra-humano; mas, efetivamente,
é um ser humano segundo todas as suas determinações.
Na Teologia ou Filosofia especulativa, pelo contrário, Deus é
uma contradição com o homem: deve ser a essência do
homem – pelo menos, da razão – e, no entanto, é,
na verdade, um ser não-humano, um ser supra-humano, ou seja, abstrato.
Na Teologia ordinária, o Deus supra-humano é somente uma flor
de retórica edificante, uma representação, um brinquedo
da fantasia. Na Filosofia especulativa, pelo contrário, é
verdade e coisa terrivelmente séria.
Com
efeito, o que é o entendimento, o que é a essência de
Deus em geral? Nada mais do que o entendimento e a essência do homem
separado das determinações que, sejam elas reais ou imaginárias,
constituem, em um momento dado, os limites do homem.
A que se reduz, pois, a diferença
entre o pensar divino e o pensar metafísico? Apenas a uma diferença
de imaginação, à diferença entre o pensar apenas
representado e o pensar real.
Na Teologia especulativa, o mundo
e a Natureza existem depois de Deus, só segundo a ordem, segundo
a importância: o acidente pressupõe a substância, a natureza
pressupõe a lógica; segundo o conceito, mas não segundo
a existência sensível, portanto não segundo o tempo.
A
representação humana de Deus é a representação
que um indivíduo humano para si faz do seu gênero, de que Deus,
enquanto totalidade de todas as realidades ou perfeições,
nada mais é do que a totalidade sinoticamente compendiada para uso
do indivíduo limitado, das propriedades do gênero repartidas
entre os homens e que se realizam no decurso da história mundial.
O
que o homem isolado não sabe nem pode sabem-no e conseguem-no os
homens em conjunto. Assim, o saber divino, que conhece ao mesmo tempo todas
as singularidades, tem a sua realidade no saber da espécie.
O
tempo da representação é o tempo vazio, portanto, nada
entre o ponto inicial e o ponto final do nosso cálculo. Mas o tempo
da vida real é o tempo cheio, onde montanhas de dificuldades de toda
a espécie separam o agora do instante seguinte.
A
Teologia distingue em Deus propriedades ativas e propriedades passivas,
mas a Filosofia transforma também as propriedades passivas em ativas
– transforma todo o ser de Deus em atividade, mas em atividade humana.
Não
ser nada e não amar nada, é a mesma coisa.
Quanto
mais cresce nosso conhecimento dos bons livros, tanto mais diminui o círculo
de homens cuja companhia achamos desagradável.
Meu
único desejo é transformar os amigos de Deus em amigos dos
homens, os crentes em pensadores, os devotos da oração em
devotos do trabalho, os candidatos da vida futura em alunos do mundo, os
cristãos que, pela fé, são 'metade animal, metade anjo'
em pessoas – pessoas que formem uma unidade.
A
Filosofia nada pressupõe. Isto quer simplesmente dizer: abstrai de
todos os objetos imediatos, isto é, fornecidos pelos sentidos, distintos
do pensamento, em suma, de tudo aquilo de que se pode abstrair sem cessar
de pensar, e faz deste ato de abstração de toda a objetalidade
o seu próprio começo. Mas que outra coisa é, então,
o Ser Absoluto senão o Ser a que nada se pressupõe, a que
nenhuma coisa é dada e necessária fora Dele, o Ser abstraído
de todos os objetos, de todas as coisas sensíveis Dele distintas
e inseparáveis, portanto o Ser que o homem pode tomar como objeto
só mediante a abstração destas mesmas coisas? Se queres
chegar a Deus, deves libertar-te a ti mesmo de tudo aquilo de que Deus é
livre, e, por isso, só te libertarás realmente quando para
ti O representas. Se, pois, pensas em Deus como em um Ser sem a pressuposição
de qualquer outro ser ou objeto, então pensas em ti mesmo sem a pressuposição
de um objeto exterior; a propriedade que transferes para Deus é uma
propriedade do teu pensamento. Só que, no homem, é agir o
que em Deus é ser ou o que, como tal, é representado.
O
que separa o Teísmo do Panteísmo é apenas a imaginação
– a representação de Deus como ser pessoal.
Todas as determinações
de Deus – e Deus é necessariamente determinado, pois, de outro
modo, é nada, e não será objeto de uma representação
– são determinações da realidade, ou da natureza,
ou do homem, ou dos dois conjuntamente.
Onde existe a vontade deve também
existir o entendimento: aquilo que se quer é apenas mister do entendimento.
Sem entendimento, não há objeto algum.
Como
haveria de se separar em Deus o entendimento da essência e a essência
da realidade ou da existência? Se as coisas estão no entendimento
de Deus, como poderiam elas ser exteriores à Sua Essência?
E se são conseqüências do Seu entendimento, por que não
hão de ser conseqüências da sua Essência? E se,
em Deus, a Sua Essência é imediatamente idêntica à
Sua Realidade Efetiva, se a Existência de Deus não se pode
separar do conceito de Deus, como haveria então de se separar o conceito
da coisa e a coisa real no conceito que Deus tem das coisas? Por conseguinte,
como admitir em Deus esta distinção que unicamente constitui
a natureza do entendimento finito e não divino, a distinção
entre a coisa na representação e a coisa fora da representação?
Se nenhumas coisas tivermos exteriores ao entendimento de Deus, também
depressa nenhumas coisas teremos exteriores à sua essência
e, por fim, também nenhumas exteriores à existência
de Deus – todas as coisas existem em Deus e, claro, de fato e na realidade,
não apenas na representação; pois, onde elas existem
só na representação – tanto de Deus como do homem
– por conseguinte, onde existem tão-só no modo ideal
ou, antes, imaginário em Deus. Existem ao mesmo tempo fora da representação;
fora de Deus. Se fora de Deus não tivermos mais coisas nem mundo,
também não temos nenhum Deus exterior ao mundo. Também
não temos um ser apenas ideal, representado, mas um ser real. Temos
então, em suma, o Espinosismo ou o Panteísmo.
Um
homem pensa de maneira diferente em um palácio e em uma cabana.
A
primeira e maior lei deve ser o amor do homem pelo homem. Homo homini est
Deus [Deus
homo est]
– esta é a máxima suprema; este é o ponto de
viragem da História do mundo.
O
que ontem ainda era religião hoje já não
é, tal e qual hoje é o Ateísmo – que amanhã
será religião.
As
coisas materiais só podem ser deduzidas de Deus se o próprio
Deus se determinar como um ser materialista. Só assim é que
Deus, de uma causa puramente representada e imaginada, se transforma na
causa efetiva do mundo. Quem não se envergonha de fazer sapatos também
não se envergonha de ser e de se chamar sapateiro.
Quem
faz da matéria um atributo de Deus declara que a matéria é
um ser divino.
O
que é acessível ao Coração também não
é nenhum segredo para o entendimento.
A
Humanidade, nos tempos modernos, perdeu os órgãos para o mundo
supra-sensível e os seus mistérios unicamente porque, com
a fé neles, também para eles perdeu o sentido; porque a sua
tendência essencial é uma tendência anticristã,
antiteológica, isto é, uma tendência antropológica,
cósmica, realista, materialista.
Deus
nada mais é do que o arquétipo e o ideal do homem: ser como
e o que Deus é, eis o que o homem deve ser, eis o que o homem quer
ser ou, pelo menos, espera vir a ser um dia. Mas, o caráter, a verdade
e a religião só existem onde a teoria não é
negada pela prática, nem a práxis pela teoria.
Se
Deus é a negação de todo o finito, então, o
finito é também, logicamente, a negação de Deus.
A
elevação da matéria a uma essencialidade divina é
imediatamente e ao mesmo tempo a elevação da razão
a uma essencialidade divina.
Se
não existisse matéria alguma, a razão não teria
nenhum estímulo e material para pensar – não teria conteúdo
algum. Não é possível eliminar a matéria, sem
eliminar a razão; não se pode reconhecer a matéria
sem reconhecer a razão.
Se
não creio em Deus e não penso em geral nenhum Deus, não
possuo Deus algum. Ele existe para mim apenas por meio de mim, para a razão
unicamente através da razão. O 'a priori', o ser primeiro,
não é, pois, o ser pensado, mas o ser pensante; não
é o objeto, mas o sujeito.
O
Ateísmo é o Panteísmo invertido.
A
Teologia cinde e aliena o homem para, a seguir, de novo com ele identificar
a sua essência alienada... A Teologia é a fé nos fantasmas.
Abstrair
significa pôr a essência da Natureza fora da Natureza, a essência
do homem fora do homem, a essência do pensamento fora do ato de pensar.
O
monoteísmo cristão não tem em si qualquer princípio
de cultura artística e científica. Só o politeísmo
– o chamado culto dos ídolos – é a fonte da arte
e da ciência. Os Gregos elevaram-se à plenitude da arte plástica
unicamente porque viram na forma humana, de um modo incondicional e sem
hesitação, a forma suprema, a forma da Divindade.
A
arte só pode representar o verdadeiro, o inequívoco.
A fé no além é
uma fé absolutamente apoética... A fé no além
transforma toda a dor em aparência e em inverdade.
A
Ilusão da Fé
A
Metafísica (ou a Lógica) é apenas uma ciência
real e imanente, se ela não estiver separada do chamado espírito
subjetivo.
A
filosofia que deduz o finito do infinito, o determinado do indeterminado,
nunca chega a uma verdadeira posição do finito e do determinado.
Deduzir o finito do infinito é determinar e negar o infinito e o
indeterminado; é admitir que, sem determinação, ou
seja, sem finidade, o infinito nada é. É confessar que o finito
se põe como a realidade do infinito. Mas como a quimera negativa
do Absoluto permanece como fundamento, a finitude posta é sempre
de novo suprimida. O finito é a negação do infinito
e, por seu turno, o infinito é a negação do finito.
A Filosofia do Absoluto é uma contradição.
A verdade do finito é expressa
pela filosofia absoluta só de um modo indireto e invertido. Se, pois,
o infinito só existe, só tem verdade e realidade quando determinado,
isto é, quando não se põe como infinito, mas como finito,
então o finito é efetivamente o infinito.
A
tarefa da verdadeira Filosofia não é reconhecer o infinito
como o finito, mas o finito como o não-finito, como o infinito; ou
não é transpor o finito para o infinito, mas o infinito para
o finito.
O
começo da Filosofia não é Deus, não é
o Absoluto, nem o ser como predicado do Absoluto ou da Idéia. O começo
da Filosofia é o finito, o determinado, o real. O Infinito não
pode ser pensado se sem o finito.
O primeiro não é o
indeterminado, mas o determinado, pois a qualidade determinada nada mais
é do que a qualidade real. A qualidade real precede a qualidade pensada.
A
especulação ou Filosofia Verdadeira nada mais é do
que a empiria verdadeira e universal.
A
honestidade e a probidade são úteis em todas as coisas –
também na Filosofia. Mas a Filosofia só é honesta e
sincera quando confessa a finitude da sua infinidade especulativa. Quando
confessa, por exemplo, que o segredo da Natureza em Deus nada mais é
do que o segredo da natureza humana, que a noite que ela põe em Deus,
para daí tirar a Luz da Consciência, é unicamente o
seu próprio sentimento obscuro, instintivo, da realidade e indispensabilidade
da matéria.
A
Filosofia é o conhecimento do que é. Pensar e conhecer as
coisas e os seres como são – eis a lei suprema, a mais elevada
tarefa da Filosofia... A veracidade, a simplicidade e a exatidão
são as características formais da Filosofia real.
O
espaço e o tempo são as formas de existência de todo
o ser. Só a existência no espaço e no tempo é
existência. A negação do espaço e do tempo é
sempre apenas a negação dos seus limites, não do seu
ser. Uma sensação intemporal, uma vontade intemporal, um pensamento
intemporal, um ser intemporal são quimeras. Quem não tem tempo
algum também não tem, em geral, tempo nem impulso para querer
e para pensar. A negação do espaço e do tempo na Metafísica,
na essência das coisas, tem as mais funestas conseqüências
práticas. Só quem em toda a parte se encontra no ponto de
vista do tempo e do espaço possui igualmente na vida tato e entendimento
prático. O espaço e o tempo são os primeiros critérios
da práxis. Um povo que exclui o tempo da sua Metafísica e
diviniza a existência eterna, isto é, abstrata, isolada do
tempo, exclui também conseqüentemente o tempo da sua política
e diviniza o princípio da estabilidade, contrário ao direito,
à razão, à história.
O
espaço e o tempo são as formas de revelação
do Infinito Real.1
O
Espaço-tempo Relativo
Onde
não existe nenhum limite, nenhum tempo, nenhuma aflição,
também não existe nenhuma qualidade, nenhuma energia, nenhum
espírito, nenhuma chama, nenhum amor. Só o ser indigente é
o ser necessário. A existência sem necessidades é uma
existência supérflua. O que é em geral isento de necessidades
também não tem qualquer necessidade da existência. Quer
ele seja, ou não, é tudo um – um para si mesmo, um para
os outros. Um ser sem indigência é um ser sem fundamento.
Só merece existir o que pode sofrer. Só o ser doloroso é
um ser divino. Um ser sem afecção é um ser sem ser.
Um ser sem afecção nada mais é do que um ser sem sensibilidade,
sem matéria. (Grifo
meu).
O
Filósofo deve introduzir no texto da Filosofia aquilo que no homem
não filosofa, aquilo que, pelo contrário, é contra
a Filosofia, que se opõe ao pensamento abstrato, portanto, aquilo
que em Hegel se reduz a simples nota. Só assim a Filosofia se tornará
a força universal, sem antagonismos, irrefutável e irresistível.
A Filosofia não deve, pois, começar por si, mas pela sua antítese,
pela não-filosofia. Esta essência distinta do pensamento, afilosófica,
absolutamente antiescolástica em nós, é o princípio
do Sensualismo.
O
Coração faz revoluções, a cabeça reformas;
a cabeça põe as coisas em posição, o Coração
põe-nas em movimento. Mas só onde existe movimento, efervescência,
paixão, sangue, sensibilidade, reside também o Espírito.
O
Coração é justamente, no homem, o princípio
puramente antiteológico, o princípio descrente, ateu, no sentido
da Teologia. Pois crê somente em si mesmo, crê apenas na realidade
irrecusável, divina, absoluta, da sua própria essência.
Mas a cabeça, que não compreende o Coração –
porque a sua função consiste em separar, em distinguir o sujeito
e o objeto – transforma a essência própria do Coração
em uma essência distinta do Coração, objetiva e exterior.
O Coração tem, decerto, necessidade de um outro ser, mas apenas
de um ser que lhe seja semelhante e não diferente do Coração,
e que também não o contradiga. A Teologia nega a verdade do
Coração, a verdade da paixão religiosa. A paixão
religiosa, o Coração, diz, por exemplo: — Deus sofre.
A Teologia, pelo contrário, afirma: — Deus não sofre.
Ou seja, o Coração nega a distinção entre Deus
e o homem;2
a Teologia afirma-a.
O
Antropoteísmo3
é o Coração elevado a entendimento; exprime na cabeça
apenas de maneira racional o que o Coração diz a seu modo...
O Antropoteísmo é a religião autoconsciente –
a religião que a si mesma se compreende.
A
essência do ser enquanto ser é a essência da Natureza.
A gênese temporal estende-se apenas às formas; não é
essência da Natureza... A Natureza é a essência que não
se distingue da existência; o homem é a essência que
se distingue da existência. A essência não-distinta é
o fundamento da essência que distingue. A Natureza é, pois,
o fundamento do homem.
Tudo
aquilo que parece ser divino nada mais é do que simplesmente humano.
Primeiramente
o homem cria Deus, sem saber e sem querer, conforme a sua imagem.
Como
o homem pensar, como for intencionado, assim é o seu Deus: quanto
valor tem o homem, tanto valor e não mais tem o seu Deus. A consciência
de Deus é a consciência que o homem tem de si mesmo, o conhecimento
de Deus o conhecimento que o homem tem de si mesmo. Pelo Deus conheces o
homem e, vice-versa, pelo homem conheces o seu Deus; ambos são a
mesma coisa.
A
base de toda a religião é a dependência.
O
homem [religioso,
fideísta]
projeta todas as suas qualidades positivas em uma pessoa divina, fazendo
dela uma realidade subsistente, diante da qual se sente como um nada.
Toda
a especulação sobre o Direito, a vontade, a liberdade, a personalidade
sem o homem, fora ou acima do homem, é uma especulação
sem unidade, sem necessidade, sem substância, sem fundamento, sem
realidade. O homem é a existência da liberdade, a existência
da personalidade, a existência do Direito. Só o homem é
o fundamento e o solo do Eu de Fichte, o fundamento e o solo da mônada
leibniziana, o fundamento e o solo do Absoluto.
Uma
doutrina é apenas uma hipótese enquanto não se encontrar
a sua base natural. Isto vale, sobretudo, para a doutrina da liberdade.
O
Catolicismo4
exprimiu a verdade unicamente em contradição com a verdade.
A verdade sem contradição, pura, liberta de todas as falsificações
é uma nova verdade — uma ação nova e autônoma
da Humanidade.
O
Catolicismo estabeleceu como meta a realização dos desejos
irrealizáveis do homem e exatamente por isso deixou de lado os desejos
atingíveis do homem; ele arrancou do homem a vida temporária
através da promessa da vida eterna, arrancou-o da confiança
em suas próprias forças através da confiança
na ajuda de Deus, arrancou-o da fé em uma vida melhor na Terra e
do esforço para consegui-la através da fé em uma vida
melhor no céu.
O
segredo da própria religião – a religião em si
– não é nada mais do que a verdade e a divindade da
natureza humana.
A
religião é o sonho da mente humana. Mas, mesmo em sonhos,
não nos encontramos no vazio ou no céu, mas na Terra, no reino
da realidade...
A
época atual prefere o símbolo à coisa significada,
a cópia ao original, a fantasia à realidade, a aparência
à essência. Por estes dias, só a ilusão é
sagrada.5
O
Cristianismo, de fato, há muito desapareceu não só
da razão, mas também da vida da Humanidade. Hoje, não
é nada mais do que uma idéia fixa.
É
tão claro como o Sol e tão evidente como o dia que Deus não
existe e que não pode haver nenhum Deus.
A
fé é essencialmente intolerante... Essencialmente porque necessariamente
a fé está ligada à ilusão, e a ilusão
também é causa de Deus.
A
razão é uma e universal.
A
verdadeira religião, a verdadeira humildade, é não
estar preocupado com a salvação individual.
Deus
é vida, amor, consciência, Espírito, Natureza, tempo,
espaço, tudo... Você existe no amor de Deus como um ser consciente.
Você existe na consciência de Deus como um ser pensante. Você
existe no Espírito de Deus como um ser vivo. Você existe na
própria Vida Infinita.
A
verdadeira relação entre pensamento e ser é apenas
esta: o ser é o sujeito, o pensamento e o predicado. O pensamento
provém do ser, mas não o ser do pensamento. O ser existe a
partir de si e por si – o ser é só dado pelo ser. O
ser tem o seu fundamento em si mesmo, porque só o ser é sentido,
razão, necessidade, verdade. Em uma palavra: o ser é tudo
em todas as coisas. O ser é, porque o não-ser é não-ser,
isto é, nada, não-sentido.
—
Vem cá! Eu te ajeito direitinho!
Enfim...
Sem
parar, sovelar os deuses
Querer
uma salvação individual
Crer
em galardão e punição
Negociar
para se safar do calor
Não
fazer apenas por medo
Ciliciar-se
para fazer penitência
Persignar-se
a três por dois
Caridar
para satisfazer a Deus
Um
sólio de baloiço no céu?
Não
sei lá mais o quê porque...
........................................
Tudo
depende nós e só de nós!
Mas,
ficar nisso aí
– entra dia sai dia,
entra noite sai noite –
não adianta lhufas!