ACOSTUMADO

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

Dedicatória

 

Dedico este poema-estudo
à minha muito querida
companheira, cúmplice e esposa
Blanca Maria Cella.

 

 

 

 

A Canção de Jetsun Milarepa

 

 

Jetsun Milarepa

Jetsun Milarepa

 

 

esde que a Graça do meu Senhor entrou em minha mente, minha mente jamais se perdeu em distrações.

 

costumado, como estou, a contemplar longamente o Amor e a Piedade, esqueci-me das diferenças entre mim e os outros.

 

costumado, como estou, a meditar longamente sobre o meu Guru como uma auréola sobre minha cabeça, esqueci-me de tudo o que governa pela força e pelo prestígio.

 

costumado, como estou, a meditar longamente sobre os meus Deuses Guardiões como inseparáveis de mim mesmo, esqueci-me da forma carnal inferior.

 

costumado, como estou, a meditar longamente sobre as Seletas Verdades Sussurradas, esqueci-me de tudo o que é dito nos livros escritos e impressos.

 

costumado, como estou, ao estudo da Ciência Elementar, perdi o conhecimento da ignorância enganosa.

 

costumado, como estou, a contemplar os Três Corpos como inerentes a mim, esqueci-me de pensar na esperança e no medo.

 

costumado, como estou, a meditar sobre esta vida e a vida futura como uma só, esqueci-me do medo do nascimento e da morte.

 

costumado, como estou, a estudar longamente, por mim mesmo, minhas próprias experiências, esqueci-me da necessidade de buscar as opiniões dos amigos e dos irmãos.

 

costumado, como estou, longamente a aplicar cada nova experiência ao meu próprio crescimento espiritual, esqueci-me de todos os credos e dogmas.

 

costumado, como estou, a meditar longamente sobre o Incriado, o Indestrutível e o Permanente, esqueci-me de todas as definições deste ou daquele objetivo particular.

 

costumado, como estou, a meditar longamente sobre todos os fenômenos visíveis como o Dhârmâkâya, esqueci-me de todas as meditações feitas pela mente.

 

costumado, como estou, por muito tempo a manter minha mente no estado incriado de Liberdade, esqueci-me dos costumes convencionais e artificiais.

 

costumado, como estou, por muito tempo à humildade, de corpo e de mente, esqueci-me do orgulho e das soberbas maneiras do poderoso.

 

costumado, como estou, a olhar longamente o meu corpo carnal como o meu eremitério, esqueci-me do ócio e do conforto dos retiros nos mosteiros.

 

costumado, como estou, por muito tempo a conhecer o sentido do Inexprimível, esqueci-me do modo de traçar as raízes dos verbos e a origem das palavras e das frases…

 

ossas tu, ó sábio, esboçar estas coisas em livros comuns.

 

Fontes:

http://www.kagyumonlam.org/
english/History/Milarepa_1.html

http://dharmalog.com/

http://www.gnosisonline.org/mestres-da-
senda/milarepa-o-santo-tibetano-do-nirvana/

 

Observação:

Jetsum Milarepa (1052 – 1135, aproximadamente) foi um dos mais famosos iogues e poetas tibetanos, um discípulo do Mestre Marpa Lotsawa e uma figura proeminente na História da Escola Kagyu – uma das quatro escolas do Budismo Tibetano, fundada pelo Mahasiddha indiano Tili Sherab Zangpo "Tilopa" (988 – 1069), o qual recebeu os ensinamentos diretamente do Buddha Vajradhara, em sua forma Sâmbhogâkâya.

 

 

 

 

 

 

 

costumado, como estou,

a ver tantas guerras com-fratricidas,1a

incutir: Si vis pacem, para pacem.1b

 

costumado, como estou,

a ver tantos encontros e desencontros,

a melhor forma de conformizar.

 

costumado, como estou,

a ver tantas andorinhas fazendo inverno,

esparramar a alegria do verão.

 

costumado, como estou,

a ver os descalabros dos desejos,

ensinar a ouvir a Voz do Silêncio.

 

costumado, como estou,

a ver as mentiras dos falaciosos,

importantizar a veridicidade.

 

costumado, como estou,

a ver tantas desarmonias e falências,

meritocratizar a harmonia planetária.

 

costumado, como estou,

a ver tantos desmandos e subornos,

lutar pela justiça e pela probidade.

 

costumado, como estou,

a ver tantos tsunamis e furacões,

exortar o companheirismo pela Terra.

 

costumado, como estou,

a ver tanta afronta aos biossistemas,

relembrar: hoje, a Terra é o nosso lar.

 

costumado, como estou,

a ver tantas hipoteticidades absurdas,

 

costumado, como estou,

a ver tanta crendice desconexa,

estimular o raciocínio dialético.2

 

costumado, como estou,

a ver tanta inscícia subjugante,

esclarecer uma dúvida obscurante.

 

costumado, como estou,

a ver tanto desamor e egoísmo,

dar exemplos de solidariedade fraterna.

 

costumado, como estou,

a ver tantas tricas e futricas,

mostrar a incivilidade da maledicência.

 

costumado, como estou,

a ver tantas obrigações descumpridas,

advertir para a vaziez da falácia.

 

costumado, como estou,

a ver tantos cramulhanos desfaçados,

dicar: AUM MANI PADME HUM.

 

 

AUM MANI PADME HUM

 

 

costumado, como estou,

a ver tanta, tanta desproteção,

assegurar: a Palavra3 está no Coração.

 

costumado, como estou,

a ver tanto medo e desespero,

exercitar a Lei da Assunção.4

 

az Profunda aos Corações!

 

 

 

Lei da Assunção

 

 

 

______

Notas:

1a e 1b. Compatrício é aquele que é originário da mesma terra que outro (coestaduano, compatriota, concidadão, conterrâneo, patrício etc.). Fratricida é aquele que mata o próprio irmão ou a irmã, e, por extensão, aquele que é responsável, direta ou indiretamente, pela morte de um indivíduo ou indivíduos, sejam compatrícios ou não. Então, o neologismo malfeito com-fratricida indica aquele maldito que mata (ou manda matar) um compatrício ou um estrangeiro. Si vis pacem, para pacem (se queres paz, prepara-te para a paz) contradita o provérbio latino si vis pacem, para bellum (se queres paz, prepara-te para a guerra), conforme está exposto no Tratado Sobre a Arte Militar, de Publius Flavius Vegetius Renatus (que viveu em Constantinopla do final do século IV ao início do século V d.C., e era próximo do Imperador de Roma): Igitur qui desiderat pacem, praeparet bellum. Quem desejar a paz, que se prepare para a guerra. Enfim, Immanuel Kant – que no século XVIII escreveu a obra Pela Paz Perpétua (proposta de constituição republicana fundamentada em três princípios: liberdade dos membros de uma sociedade enquanto homens, dependência enquanto súditos e igualdade enquanto cidadãos) e Albert Einstein consagraram parte ponderável de suas vidas aos temas pacifistas. Ralph Maxwell Lewis, por sua vez, devotou grande parte de sua fecunda vida a orientar rosacruzes de todo o mundo a alcançar e a compreender o exato sentido da saudação Paz Profunda. Nos últimos anos de sua existência terrena, produziu o Credo da Paz. E, em 20 de março de 2001, os Deputados do Conselho Supremo da Fraternidade Rosacruz, no Manifesto Positio Fraternitatis Rosæ Crucis, manifestaram o pensamento de que ... as leis humanas devem ser o reflexo das Leis Divinas. Esta é a condição absoluta para que o ser humano seja feliz. Esta afirmação é absolutamente tolerante e irredutivelmente independente, ainda que não vinculada ou dependente de nenhuma teologia afirmada ou religião estabelecida. Já Thomas Hobbes entendeu que alcançar a paz se constitui na primeira Lei da Natureza. E, neste sentido, para ele, a paz se afirma tão-só na cessação do estado de guerra ou de qualquer conflito entre os homens. Alfred North Whitehead tinha compreensão mais metafísica, e depreendeu que a paz é a harmonia das harmonias que aplaca a turbulência destrutiva e completa a civilização. Contudo, uma das mais famosas definições de paz foi oferecida por Cícero (Philippica, 2: 113): Pax est tranquilla libertas. Paz é liberdade tranqüila. Mas, será a paz apenas tranquilla libertas? Será a paz a liberdade sem preocupação? Eu prefiro Santo Agostinho: Pax est tranquillitas ordinis. A paz é a tranqüilidade da ordem. Todavia, nada disto poderá acontecer, se, primeiro, não tivermos paz em nossos Corações, e paz, neste sentido, começa pela ausência (inexistência) de desejos, cobiças e paixões.

2. Dialética é um método de diálogo cujo foco é a contraposição/contradição de idéias que levam a outras idéias, e que, desde os tempos antigos, tem sido um tema central nas Filosofias Ocidental e Oriental. A tradução literal de dialética significa: caminho entre as idéias. Aos poucos, passou a ser a arte de, no diálogo, demonstrar uma tese por meio de uma argumentação capaz de definir e distinguir claramente os conceitos envolvidos na discussão. A Dialética também é conhecida como a arte da palavra. Aristóteles considerava Zenão de Eléia (aprox. 490 – 430 a.C.) o fundador da Dialética. Outros consideraram Sócrates (469 – 399 a.C.). Um dos métodos dialéticos mais conhecidos foi o desenvolvido pelo filósofo alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770 – 1831). A Filosofia descreve a realidade e a reflete, portanto, a Dialética busca não interpretar, mas, refletir acerca da realidade. A Dialética é a história das contradições. Em alemão, aufheben significa supressão e, ao mesmo tempo, manutenção da coisa suprimida. O reprimido ou o negado permanecem dentro da totalidade. Esta contradição não é apenas do pensamento, mas, da realidade. Então, tudo está em processo de constante devir (vir-a-ser), o que, na atualidade, reflete o modo de pensar as contradições da realidade, ou seja, o modo de compreender a realidade como essencialmente contraditória e em permanente transformação. Enfim, o método dialético nos incita a revermos o passado, à luz do que está acontecendo no presente. Ele questiona o presente em nome do futuro, isto é, o que está sendo em nome do que ainda não é, mas, que poderá vir-a-ser. Em termos místicos, a seqüência da humana experiência, resumidamente, é mais ou menos assim: inconsciência –› autoconsciência –› Divindade (Período de Vulcano).

 

Dialética = Tese –› Antítese –› Síntese

 

3. Palavra Verbum Dimissum et Inenarrabile.

4. Já expliquei isto, mas, acho necessário e conveniente repetir. Assuncionar = praticar a Lei da Assunção. Quem quiser auxiliar o outro poderá, se souber, praticar o Grande Segredo: a permuta não-recíproca, provisória, místico-psíquica de si pelo outro, por exemplo, semeando idéias construtivas e modificadoras de comportamentos. Esta é uma das aplicações práticas da Lei da Assunção, que poderá ser empregada, mas, jamais de forma autoritária ou determinativa, sempre consiliária e iluminativa, e fundamentalmente respeitando a liberdade e o livre-arbítrio do outro. O Princípio (ou Lei) da Assunção pode ser usado com qualquer símbolo para solucionar problemas e estimular discernimentos interiores intuitivos criativos. Mas, a Lei da Assunção só se efetivará em um Coração puro e adimplente. Enfim, o fato é que, como está na letra da música Do Re Mi (The Sound of Music), once you have these notes in your heads, you can sing a million different tunes by mixing them up. Depois de alguém meter essas notas na cuca, poderá cantar um milhão de músicas diferentes, misturando-as. Então, na maioria das vezes, não cantamos a música, só por não sabermos as notas! Portanto, duas coisas precisam ser feitas: aprender as notas e, devagar e com cuidado, ensinar a quem não sabe. Sei lá, mas, talvez, a maior caridade misericordiosa de todas seja mesmo ensinar a quem não sabe, desde que a pessoa queira, peça e esteja pronta para receber a instrução. Por outro lado, por exemplo, não se pode ensinar Química a quem não saiba, pelo menos, os símbolos químicos dos elementos, que os identificam graficamente, como, por exemplo, carbono - C, cálcio - Ca, cádmio - Cd, nitrogênio - N, sódio (natrium) - Na, ouro (aurum) - Au, prata (argentum) - Ag etc. Portanto, ensinar, sim, sempre; forçar, não, jamais.

 

Música de fundo:

Love Is a Many-Splendored Thing
Composição: Paul Francis Webster (letra) & Sammy Fain (música)
Interpretação:
Frank Sinatra

Fonte:

http://mp3skull.com/mp3/love_is_a_many_frank_sinatra.html

 

Páginas da Internet consultadas:

http://stuntgranny.com/2008/10/
06/the-art-of-wrestling-ecw-update-iii/

http://pt.wikipedia.org/wiki/Dial%C3%
A9tica#M.C3.A9todo_dial.C3.A9tico

http://www.dharma-haven.org/
tibetan/digital-wheels.htm

http://pt.wikipedia.org/wiki/
Publius_Flavius_Vegetius_Renatus

http://www.wanderinghappy.com/

http://pt.wikipedia.org/wiki/Kagyu

http://pt.wikipedia.org/wiki/Jets%C3%BCn_Milarepa

 

Direitos autorais:

As animações, as fotografias digitais e as mídias digitais que reproduzo (por empréstimo) neste texto têm exclusivamente a finalidade de ilustrar e embelezar o trabalho. Neste sentido, os direitos de copyright são exclusivos de seus autores. Entretanto, como nem sempre sei a quem me dirigir para pedir autorização para utilizá-las, se você encontrar algo aqui postado que lhe pertença e desejar que seja removido, por favor, entre em contato e me avise, que retirarei do ar imediatamente.