MENSAGEM A GARCIA

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

 

 

 

 

Mensagem a Garcia

por
Elbert Green Hubbard (1856 – 1915)

 

 

 

Elbert Green Hubbard

Elbert Green Hubbard

 

 

 

m toda esta história cubana, um homem se destaca no horizonte de minha memória, como Marte no periélio1. Quando irrompeu a guerra entre a Espanha e os Estados Unidos, o que importava a estes era se comunicar com chefe dos insurretos, Garcia, que se encontrava em alguma fortaleza no interior da selva cubano, mas sem que se pudesse dizer exatamente onde. Era impossível um entendimento com ele pelo correio ou pelo telégrafo. No entanto, o Presidente dos Estados Unidos precisava de sua colaboração o mais rapidamente possível. O que fazer? Alguém lembrou:

 

Há um homem chamado Rowan; e se alguma pessoa é capaz de encontrar Garcia, há de ser Rowan.

 

Rowan foi trazido à presença do Presidente William McKinley Jr.2, que lhe confiou uma carta com a incumbência de entregá-la a Garcia. De como este homem, Rowan, tomou a carta, meteu-a invólucro impermeável, amarrou-a ao peito e, após quatro dias, saltou de um barco sem sequer uma cobertura, alta noite, nas costas de Cuba, de como se embrenhou no sertão para depois de três semanas surgir do outro lado da Ilha, tendo atravessado a pé um país hostil, e entregue a carta a Garcia, são coisas que não vêm ao caso narrar aqui em pormenores.

 

O ponto que quero ressaltar é este: o presidente McKinley deu a Rowan uma carta para ser entregue a Garcia. Rowan tomou a carta e nem sequer perguntou onde ele está?

 

Salve! Viva! Eis aí um homem cujo busto merecia ser fundido em bronze e sua estátua colocada em cada escola. Não é somente de sabedoria livresca que a juventude precisa, nem somente de instrução sobre isto ou aquilo. Precisa, sim, de um endurecimento das vértebras, para poder se mostrar altiva no exercício de um cargo; para atuar com diligência, para dar conta do recado; para, em suma, levar uma mensagem a Garcia.

 

O general Garcia já não é deste mundo, mas há outros Garcias. A nenhum homem que se tenha empenhado em levar avante uma grande empresa, em que a ajuda de muitos se torna necessária, tem sido poupado de momentos de verdadeiro desespero ante a imbecilidade de um grande número de homens, ante a inabilidade ou falta de disposição de concentrar a mente em uma determinada coisa e fazê-la.

 

A regra geral tem sido: assistência irregular, desatenção tola, indiferença irritante e trabalho mal feito.

 

Ninguém pode ser verdadeiramente bem sucedido, salvo se lançar mão de todos os meios ao seu alcance para fazer com que outros homens o auxiliem, a não ser que Deus Onipotente, na sua grande misericórdia, faça um milagre, enviando-lhe como auxiliar um anjo de luz.

 

Leitor amigo, tu mesmo podes tirar a prova. Estás sentado no teu escritório, rodeado de empregados. Pois bem, chama um deles e pede-lhe:

 

Queira ter a bondade de consultar a enciclopédia e fazer uma descrição resumida de Correggio.3

 

Dar-se-á o caso, provavelmente, de o empregado dizer calmamente 'sim senhor', e de executar o que lhe pediste? Nada disto! Olhar-te-á admirado, para fazer uma ou algumas das seguintes perguntas:

 

— Quem é ele?

 

— Que enciclopédia?

 

— Onde é que está a enciclopédia?

 

Por acaso, eu fui contratado para fazer isso?

 

— E se Carlos o fizesse?

 

— Já morreu?

 

— Precisa disso com urgência?

 

— Não quer que traga o livro para que o senhor mesmo procure?

 

— Para que quer saber disso?

 

E aposto dez contra um que, depois de teres respondido a tais perguntas, explicando a maneira de procurar os dados pedidos e a razão por que deles precisas, teu empregado irá pedir a um companheiro que o ajude a encontrar Correggio, e depois voltará para te dizer que tal homem não existe. Evidentemente, pode ser que eu perca a aposta, mas segundo a regra e a conduta geral, aposto na alternativa certa.

 

Ora, se fores prudente, não te darás ao trabalho de explicar que Correggio se escreve com C e não com K, mas te limitarás a dizer calmamente, esboçando o melhor sorriso:

 

Não faz mal; não te incomodes. E, dito isto, levantar-te-ás e procurarás tu mesmo.

 

Esta dificuldade de atuar independente, esta incapacidade moral, esta fraqueza de vontade, esta falta de disposição de solicitamente se pôr em campo e agir, são as causas que impedem o advento do Socialismo puro. Se os homens não tomam iniciativa de agir em seu próprio proveito, o que farão se o resultado de seu esforço redundar em benefício de todos? Por enquanto, parece que os homens ainda precisam ser dirigidos.

 

O que mantém muito empregado no seu posto e o faz trabalhar é o medo de, se não o fizer, ser despedido no fim do mês. Anuncia precisar de um taquígrafo, e nove entre dez candidatos à vaga não saberão ortografar nem pontuar, e – o que é mais grave – pensam não ser necessário sabê-lo.

 

Poderá uma pessoa destas entregar uma carta para Garcia?

 

Vê aquele guarda-livros — dizia-me o chefe de uma grande fábrica.

 

Sim. O que há com ele?

 

É um excelente guarda-livros. Contudo, se o mandasse dar um recado, talvez se desobrigasse da incumbência a contento, mas também poderia ser que, no caminho, entrasse em duas ou três casas de bebidas, e que, quando chegasse ao seu destino, já não se recordasse sequer da tarefa que lhe fora dada. Será possível confiar-se a tal homem uma carta para ser entregue a Garcia?

 

Ultimamente, temos ouvido expressões sentimentais demonstrando simpatia para com os pobres que lutam de Sol a Sol, para com os infelizes desempregados à cata de um trabalho honesto, e tudo isto, quase sempre, entremeado de muita palavra dura para com os homens que estão no poder. Nada se diz do patrão que envelhece antes do tempo, em um esforço inútil para induzir eternos desgostosos e descontentes a trabalhar conscienciosamente. Nada se diz de sua longa e paciente procura de pessoal, que, no entanto, muitas vezes nada mais faz do que 'matar o tempo', logo que ele volta as costas. Não há empregador que não esteja despedindo pessoas que se mostram incapazes de zelar pelos interesses da empresa, a fim de substituí-las por outras mais aptas. Este processo de seleção por eliminação está se operando incessantemente com a única diferença que, quando os tempos são maus e o trabalho escasseia, a seleção se faz mais escrupulosamente, pondo-se fora, para sempre, os incompetentes e os inaproveitáveis. É a lei da sobrevivência do mais capacitado. Cada patrão, no interesse comum, trata de manter somente os melhores; exatamente aqueles que possam levar uma mensagem a Garcia.

 

Conheço um homem de aptidões realmente brilhantes, mas sem a fibra necessária para dirigir um negócio próprio, e que ainda se torna completamente nulo para qualquer outra pessoa devido à suspeita que constantemente abriga, de que seu patrão o esteja oprimindo ou que tencione oprimi-lo. Sem poder mandar, não tolera que alguém o mande. Se lhe fosse confiada uma mensagem a Garcia, retrucaria, provavelmente: — Leve-a você mesmo.

 

Hoje, este homem perambula errante pelas ruas em busca de trabalho, em estado de quase miséria. No entanto, ninguém que o conhece se aventura a lhe dar trabalho, porque é a personificação do descontentamento e do espírito de discórdia. Não aceitando qualquer conselho ou advertência, a única coisa capaz de nele produzir efeito seria um bom pontapé dado com a ponta de uma bota de número 44, de sola grossa e de bico largo.

 

Sei, não resta dúvida, que um indivíduo moralmente aleijado como este, não é menos digno de compaixão; vertamos também uma lágrima pelos homens que se esforçam por levar avante uma grande empresa, cujas horas de trabalho não estão limitadas pelo som do apito e cujos cabelos ficam muito cedo embranquecidos na incessante luta em que estão empenhados contra a indiferença desdenhosa, contra a imbecilidade crassa e contra a ingratidão atroz, justamente daqueles que sem seu espírito empreendedor, poderiam andar famintos e sem lar.

 

Dar-se-á o caso de eu ter pintado a situação em cores demasiado carregadas? Pode ser que sim. Mas quando todo mundo se prende a divagações, quero lançar uma palavra de simpatia ao homem que dá êxito a um empreendimento, ao homem que, a despeito de uma porção de empecilhos, sabe dirigir e coordenar os esforços de outros, e que, após o triunfo, talvez verifique que nada ganhou. Nada, salvo a sua simples subsistência.

 

Também eu carreguei marmitas e trabalhei como jardineiro, como também já fui patrão. Sei, portanto, que alguma coisa se pode dizer de ambos os lados. Não há excelência na pobreza em si mesma; farrapos não servem de recomendação. Nem todos o patrões são gananciosos e tiranos da mesma forma que nem todos os pobres são virtuosos.

 

Todas as minhas simpatias pertencem ao homem que trabalha conscientemente, quer o patrão esteja, quer não. E ao homem que, ao lhe ser confiada uma carta para Garcia, tranqüilamente toma a missiva, sem fazer perguntas idiotas, sem a intenção oculta de jogá-la na primeira sarjeta que encontrar ou praticar qualquer outro gesto que não seja entregá-la ao destinatário. Este homem nunca fica 'encostado', nem tem que se declarar em greve para forçar um aumento de ordenado. A civilização busca ansiosa, insistentemente, homens nestas condições. Tudo que tal homem pedir conceder-se-á. Precisa-se dele em cada cidade, em cada vila, em cada lugarejo, em cada escritório, em cada oficina, em cada loja, fábrica ou venda.

 

O grito do mundo inteiro, praticamente, se resume nisto: precisa-se, com urgência, de homens capazes de levar uma mensagem a Garcia.

 

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Notas:

1. Periélio é o ponto da órbita de um planeta, em seu movimento de translação, mais próximo do Sol.

2. William McKinley Jr. (Niles, 29 de janeiro de 1843 – Buffalo, 14 de setembro de 1901) foi um advogado e político estadunidense. Foi o vigésimo quinto Presidente dos Estados Unidos da América, de 1897 até 1901, quando foi assassinado pelo jovem anarquista Leon Czolgosz.

3. Correggio é como era conhecido o pintor italiano Antonio Allegri (1489 – 1534). Foi um pintor da Renascença italiana, contemporâneo de Leonardo e Rafael, com obras nos principais museus de todo o mundo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Versejando sobre o óbvio...

 

 

 

Temos a solidária obrigação

de sempre fazer o possível e o melhor.

Não fazer ou fazer o pior

imporão, inevitavelmente, uma retribuição.

 

 

O fedorentérrimo deixapralá

não deixa de ser uma retardadora doença

– uma espécie de malquerença –

que mantém o ente pregado no lado de cá.

 

 

Não haverá libertação

enquanto prevalecerem egoísmo e ganância,

e sempre que houver misantropia e intolerância.

 

 

Não haverá ascensão

enquanto prevalecerem divisão e insulamento,

e sempre que houver voracidade e empilhamento.

 

 

 

 

 

 

 

Páginas da Internet consultadas:

http://pt.wikipedia.org/wiki/
Ant%C3%B4nio_de_Correggio

http://www.eco.eti.br/Ulbra/Garcia.pdf

 

Música de fundo:

Balada Triste
Compositores: Dalton Vogeler e Esdras Silva
Intérprete: Agostinho dos Santos

Fonte:

http://www.charles50tao.com.br/
diversas_nacionais_I.htm