Rodolfo
Domenico Pizzinga
Devaneios...
Afirmações... Sentimentos...
Palavras...
Frases... Discursos... Idéias...
Temos
que ter muito cuidado com nossos pensamentos,
com
nossas atitudes e até com as inofensivas onomatopéias.
desentendimento,
sofrimento e inclusive morte.
Mas,
quem aprendeu a ouvir e a consultar seu Tira-Dúvidas1
sabe
que não causará qualquer minimização à
uma coorte.2
Falar
do que não se sabe pensando que se sabe
é
uma tremenda e imprudente irresponsabilidade.
Age
assim todo aquele que é movido pela vaidade.
Singularmente, na Via do Misticismo,
fala quem não sabe.
E,
nessa Esfera, nada é mais perigoso do que a coisificação,
pois
o que parece ser, geralmente, é nada mais do que ilusão.
_________
Assim
ouvi. Em certa ocasião o Abençoado estava em Savatthi no Bosque
de Jeta, no Parque de Anathapindika. Então, ao amanhecer, o Abençoado
se vestiu, e tomando a tigela e o manto externo, foi para Savatthi para
esmolar alimentos. Naquela ocasião um fogo estava ardendo e uma oferenda
estava sendo preparada na casa do brâmane Aggikabharadvaja. Então
o Abençoado, enquanto esmolava alimentos, chegou à casa do
brâmane. O brâmane, vendo que o Abençoado vindo à
distância, disse o seguinte:
—
Fique aí. Você careca fique aí. Monge desprezível.
Fique aí pária.
Depois
que ele assim
falou, o Abençoado disse para o brâmane:
—
Brâmane, você sabe o que é um pária e quais
são as condições que fazem um pária? —
perguntou o Abençoado.
—
Não, de fato, Venerável Gotama, eu não sei o que
é um pária e quais são as condições que
fazem um pária. Seria bom se o Venerável Gotama me explicasse
o 'Dhamma' de modo que eu possa saber o que é um pária e quais
são as condições que fazem um pária.[2]
—
Então ouça e preste muita atenção àquilo
que eu vou dizer.
—
Sim, venerável senhor — respondeu o brâmane.
1. Todo
aquele que tem raiva, que abriga a raiva e que reluta em falar bem dos outros
(desacredita da bondade dos outros) tem as idéias pervertidas
e é enganador – saiba que ele é um pária.
2. Todo
aquele que neste mundo mata seres vivos que nasceram uma vez ou que nasceram
duas vezes[3] e que não tem compaixão
pelos seres vivos – saiba que ele é um pária.
3. Todo
aquele que destrói e sitia vilarejos e aldeias e ganha notoriedade
como opressor – saiba que ele é um pária.
4. Quer
seja em um vilarejo ou em uma floresta, todo aquele que rouba aquilo que
pertence a outrem e que toma aquilo que não lhe foi dado –
saiba que ele é um pária.
5. Todo
aquele que, tendo tomado um empréstimo, foge quando é cobrado,
dizendo: ‘Eu não lhe devo nada’ – saiba que ele
é um pária.
6. Todo
aquele que, cobiçando algo, mata uma pessoa e agarra aquilo que a
pessoa tem – saiba que ele é um pária.
7. Todo
aquele que em seu próprio benefício ou em benefício
de outros ou para obter riqueza mente quando é questionado como testemunha
– saiba que ele é um pária.
8. Todo
aquele que por meio da força ou com consentimento se envolve em encontros
amorosos com esposas de parentes ou amigos – saiba que ele é
um pária.
9. Todo
aquele que sendo próspero não sustenta sua mãe ou seu
pai que estão velhos – saiba que ele é um pária.
10.
Todo aquele que ataca e ofende com linguagem grosseira a mãe,
o pai, o irmão, a irmã, a sogra ou o sogro – saiba que
ele é um pária.
11.
Todo aquele que quando lhe é solicitado um bom conselho fala
o que é prejudicial e emprega linguagem evasiva – saiba que
ele é um pária.
12.
Todo aquele que tendo cometido uma ação ruim deseja que
outros não tomem conhecimento daquilo é um hipócrita
– saiba que ele é um pária.
13.
Todo aquele que tendo sido convidado para a casa de outrem e compartindo
de boa comida não retribui – saiba que ele é um pária.
14.
Todo aquele que engana dizendo mentiras a um brâmane ou a um contemplativo
ou a qualquer outro mendicante – saiba que ele é um pária.
15.
Todo aquele que quando um brâmane ou um contemplativo aparece
na hora do almoço o provoca com linguagem grosseira e não
lhe oferece esmolas – saiba que ele é um pária.
16.
Todo aquele que neste mundo, envolto na ignorância, faz previsões
enganosas visando obter algum ganho – saiba que ele é um pária.
17.
Todo aquele que, corrompido pelo orgulho, exalta a si mesmo e humilha
os outros – saiba que ele é um pária.
18.
Todo aquele que se entrega à raiva, que é mesquinho e tem
desejos vis, que é egoísta e enganador, que é desavergonhado
e destemido (em cometer o mal) – saiba que ele é um
pária.
19.
Todo aquele que insulta o Buda ou os seus discípulos, sejam contemplativos
ou chefes de família – saiba que ele é um pária.
20.
Todo aquele que não sendo um 'Arahant'[4] pretende
sê-lo, é o maior patife em todo o Universo . Ele é o
mais baixo dos párias.
Não
é devido ao nascimento que alguém é um pária;
não é devido ao nascimento que alguém é um brâmane.
Através das ações alguém se torna um pária;
através das ações alguém se torna um brâmane.
Agora,
ouça este exemplo (o fato que através do nascimento alguém
não é um pária): havia o filho de um pária,
Sopaka, que era conhecido como Matanga. Esse Matanga alcançou a fama
mais elevada e tão difícil de ser obtida. Muitos eram os guerreiros
('khatiyas') e brâmanes que vinham servi-lo. Destruindo as paixões
mundanas, ele entrou no Nobre Caminho e alcançou o Reino de Brahma.
O seu nascimento como um pária não o impediu de renascer no
Reino de Brahma.
Aqueles brâmanes que conhecem os Vedas e que nasceram em uma família
que recita os Vedas, se eles se habituarem às ações
ruins, eles não somente sofrem com a desgraça nesta vida,
mas na seguinte nascerão em um estado pleno de sofrimento. A casta
não impede a desgraça ou o nascimento miserável.
Quando
o Buda acabou de dizer isso, o Brâmane Aggikabharadvaja disse para
o Abençoado:
—
Magnífico Mestre Gotama! Magnífico Mestre Gotama! Mestre
Gotama esclareceu o 'Dhamma' de várias formas, como se tivesse
colocado em pé o que estava de cabeça para baixo, revelasse
o que estava escondido, mostrasse o caminho para alguém que estivesse
perdido ou segurasse uma lâmpada no escuro para aqueles que possuem
visão pudessem ver as formas. Nós buscamos refúgio
no Mestre Gotama, no 'Dhamma' e na 'Sangha dos bhikkhus'. Que o Mestre
Gotama se recorde de mim como o discípulo leigo que nele buscou
refúgio para o resto da vida.
_____
[1].
Pária é um indiano não pertencente a qualquer casta,
considerado impuro e desprezível pela tradição cultural
hinduísta. Entre os párias, em sua maioria descendentes de
tribos indianas autóctones e insubmissas ao domínio ariano,
também se incluem os bastardos (pais estrangeiros ou pertencentes
a castas diferentes), os filhos de meretrizes e os que cometeram graves
infrações contra preceitos sociais ou religiosos. Enfim, um
pária é um indivíduo privado de todos os direitos religiosos
ou sociais, quer pelo seu nascimento, quer pela sua exclusão da sociedade
bramânica.
[2].
Os termos abusivos empregados pelo brâmane e as palavras respeitosas
que seguem carecem uma explicação. O brâmane havia acabado
de preparar a sua oferenda a Brahma, o seu Deus, quando ele viu o Buda.
Para o brâmane ver um contemplativo, ou samana, era um sinal
de má sorte. Por conseguinte ele explodiu com raiva. O Buda, no entanto,
se manteve sereno e lhe dirigiu a palavra com calma e numa cadência
gentil. O brâmane ao que parece se envergonhou e arrependendo-se da
sua tolice, se dirigiu ao Buda com cortesia.
[3].
Dvijam, pássaros. Nascidos duas vezes é uma referência
aos pássaros, visto que eles primeiro nascem como um ovo e depois
nascem do ovo.
[4].
Esta é a fase mais alta de realização espiritual que
um discípulo nobre alcança através da erradicação
completa de todas as corrupções, inclusive as cinco mais altas
cadeias, que são: ligação para os reino de forma (ruparaga),
ligação para imateriais ou disformes mundos de existência
(aruparaga), vaidade (mana), inquietude (uddhacca),
e ignorância ou ilusão (avijja). Um Arahant,
ou Merecedor, parece ter realizado o que precisa ser realizado: sendo perfeito,
o Arahant [em sânscrito Arhat] não tem nenhuma
necessidade adicional para praticar por sua própria causa. Embora
continuando a servir seres das mesmas categoria, ensinando e dando a eles
conselho, o Arahant não acumula nenhum kamma novo,
não trabalhando por seu próprio bem, mas somente para o bem
dos outros. Estando livre de todos os tipos de corrupções,
o Arahant vive em perfeita tranqüilidade e equanimidade, não
sendo dado nem atraído para emoções negativas como
luxúria, cobiça, ciúme, raiva e agressão. O
Arahant se torna um com Buddha em pureza de coração,
em sabedoria e em compaixão. Esta é a última realização,
o elevado desenvolvimento espiritual onde qualquer indivíduo poderá
lutar para chegar. É o mesmo estado que Buddha atingiu em seu esclarecimento.
Fonte:
http://orbita.starmedia.com/
~rodrigodaniel4/otimo/principal/bud01-28.html
Não
é devido ao nascimento que alguém é um pária;
não é devido ao nascimento que alguém é
um brâmane. Através das ações alguém
se torna um pária; através das ações alguém
se torna um brâmane.