LEONARDO BOFF
(Pensamentos Libertadores)

 

 

 

Leonardo Boff

 

 

 

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

Objetivo do Estudo

 

 

 

Para nossa reflexão, este estudo apresenta uma coletânea de pensamentos de Leonardo Boff, doutor em Filosofia e Teologia pela Universidade de Munique, Alemanha.

 

Como aperitivo, reflita sobre esta declaração de Boff: Pode a fé cristã, que está no povo, ser mais do que mera resignação e unicamente resistência, e se fazer uma inspiração para a indignação e para a libertação? Nós cremos que a segunda possibilidade é a mais adequada e verdadeira, pois está na herança de Jesus, que não aceitou o mundo como estava e teve uma atuação libertadora.

 

Bem, é preciso um certo cuidado com o sentido das palavras. Na citação acima, quero crer, a palavra indignação não agasalha o seu significado comum de sentimento de cólera ou de desprezo destrutor. Antes e principalmente, no mínimo, indignação quer traduzir uma percepcionalidade sociopolítica das coisas, catalítica de uma luta (no campo das idéias) por mudanças efetivas e fraternas. É assim que, a meu juízo, pode ser resumida a canseira do indignado Leonardo Boff.

 

 

 

 

Breve Biografia de Leonardo Boff

 

 

 

Leonardo Boff, pseudônimo de Genézio Darci Boff (Concórdia, 14 de dezembro de 1938), é um teólogo brasileiro, escritor e professor universitário, expoente da Teologia da Libertação no Brasil. Foi membro da Ordem dos Frades Menores, mais conhecidos como Franciscanos. É respeitado pela sua história de defesa pelas causas sociais. Atualmente debate também questões ambientais.

 

Sua produção literária e teológica é superior a sessenta livros, entre eles o best-seller A Águia e a Galinha. A maioria de suas obras foi publicada no exterior.

 

Sobre a sua visão sobre A Teologia, afirmou em entrevista ao jornal O Tempo: Todas as diferentes fases de minha Teologia correspondem a crises intelectuais pelas quais passei. Assim entrou na minha vida a Teologia da Libertação. Eu voltei da Europa em fevereiro de 1970. Em julho, fui pregar retiro a padres e freiras que trabalhavam no coração da floresta amazônica. Comecei minhas palestras, quatro por dia, apresentando os vários temas teológicos dentro do marco teórico da Teologia Progressista Européia. Falava do Jesus da história e do Cristo da fé, da relação entre fé e secularização, como entender a Igreja dentro do mundo moderno da tecnociência etc. Mas eu percebi nos olhos dos ouvintes que as palavras não chegavam a eles. Até que alguém perguntou: — Como vou anunciar a ressurreição de Cristo a indígenas que estão sendo exterminados por seringueiros? Como falar da mensagem cristã aos ribeirinhos que estão sendo afetados pelos metais pesados dos garimpos que matam os peixes e tiram o sustento deles? Como viver a fé cristã em um mundo de pobres e miseráveis, como nós do Brasil e da América Latina? Dei-me conta, então, de que devia mudar de Teologia; partir das questões deles. Partir das opressões para chegar à libertação. Foi assim que, ao voltar a Petrópolis e ao retomar às aulas em agosto, lecionei a doutrina sobre Cristo numa perspectiva de libertação. Daí nasceu, no final do ano, o livro 'Jesus Cristo Libertador'. E nascia aqui entre nós a Teologia da Libertação. E tive que me esconder por dez dias porque os órgãos de repressão me buscavam, pois a palavra 'libertação' era oficialmente proibida.

 

Enfim, só quem viveu os anos de chumbo da [in]gloriosa e última ditadura brasileira pode compreender o sentido exato do que possa significar essa coisa doentia do oficialmente proibido. Por exemplo: para eu ler Nossa Luta em Sierra Maestra, de Ernesto "Che" Guevara de la Serna (14 de junho de 1928 – 9 de outubro de 1967), fi-lo escondido, e não pude contar para ninguém. Não porque qui-lo, mas porque se eu saísse comentando a três por dois que havia lido a obra, seria bem provável que eu fosse em cana. No mínimo, seria acusado de ser Citrullus lanatus: verde por fora, vermelho por dentro. Aí, até explicar que a obra-prima do Mestre Picasso não tem nada a ver com o mestre-de-obras que tem aquele instrumento de aço, o Crocodylus niloticus já havia virado bolsa da senhora Suzanne Thabet Mubarak, esposa do simpático senhor Muhammad Hosni Said Mubarak.

 

 

 

 

Leonardo Boff
(Pensamentos Libertadores)

 

 

 

Quando alguém teme a verdade passa a controlar e a reprimir.

 

Todo ponto de vista é a vista de um ponto.

 

Às vezes, o ponto nem sequer é visto!

 

Nenhum ser humano é uma ilha... Por isso, não perguntem por quem os sinos dobram.1 Eles dobram por cada um, por cada uma, por toda a Humanidade. Se grandes são as trevas que se abatem sobre nossos espíritos, maiores ainda são as nossas ânsias por luz. As tragédias nos dão a dimensão da inumanidade de que somos capazes. Mas também deixam vir à tona o verdadeiramente humano que habita em nós, para além das diferenças de raça, de ideologia e de religião. E este humano em nós faz com que, juntos, choremos, juntos nos enxuguemos as lágrimas, juntos oremos, juntos busquemos a justiça, juntos construamos a paz e juntos renunciemos à vingança.

 

A chave do místico é procurar ver o que está por trás de cada coisa, o que a constitui e sustenta. Não ficar preso ao superficial, mas fazer de tudo um símbolo, um sinal, um sacramento, uma imagem.

 

Para quem tem a 'experiência de Deus, o mundo é uma grande mensagem'.

 

A crise representa purificação e oportunidade de crescimento. Não precisamos recorrer à palavra chinesa de crise para saber esta significação. Basta recordar o sânscrito, matriz de nossa língua. Em sânscrito, crise vem de 'kir' ou 'kri' que significa purificar e limpar. De 'kri', vêm crisol, recipiente químico com o qual limpamos ouro das gangas, e acrisolar, que quer dizer depurar. Então, a crise representa um processo crítico, de depuração do cerne: só o verdadeiro e substancial fica; o acidental e agregado desaparecem. A partir do cerne se constrói uma outra ordem.

 

A Igreja Católica, como hierarquia, é a única sociedade que é monossexual. É só feita homens – e de homens celibatários. Então, eles são reféns desse lugar social, lugar de gênero.

 

O Papa Bento XVI é uma pessoa que não tem nada de inquisidora; é extremamente afável, gentil e absolutamente tranqüilo.

 

Em grego, 'krisis', crise, significa a decisão tomada por um juiz ou por um médico. O juiz pesa e sopesa os prós e os contras e o médico conjuga os vários sintomas; então, ambos tomam a decisão pelo tipo de sentença ou pelo tipo de doença. Este processo decisório é chamado crise. O Evangelho de São João usa 30 vezes a palavra crise no sentido de decisão. Jesus comparece como a crise do mundo, pois obriga as pessoas a se decidirem.

 

O povo de Porto Alegre se faz guardião da Humanidade mínima. Afirma a possibilidade real de vivermos juntos como humanos, e nos mostra como devemos passar de uma consciência de nação e de classe a uma consciência de espécie.

 

Hoje, nos encontramos em uma fase nova na Humanidade. Todos estamos regressando à Casa Comum, à Terra: os povos, as sociedades, as culturas e as religiões. Todos trocamos experiências e valores. Todos nos enriquecemos e nos completamos mutuamente.

 

Vamos rir, chorar e aprender. Aprender especialmente como casar Céu e Terra, vale dizer, como combinar o cotidiano com o surpreendente, a imanência opaca dos dias com a transcendência radiosa do espírito, a vida na plena liberdade com a morte simbolizada como um unir-se com os ancestrais, a felicidade discreta neste mundo com a grande promessa na eternidade. E, ao final, teremos descoberto mil razões para viver mais e melhor, todos juntos, como uma grande família, na mesma Aldeia Comum, generosa e bela – o planeta Terra.

 

Captar Deus é tê-Lo em todas as dimensões da vida, não apenas em situações privilegiadas, como quando se comunga ou se reza. Ter a experiência de Deus sempre andando na rua, respirando o ar poluído, alegrando-se, tomando cerveja, procurando entender um texto que se esteja estudando. Deus vem misturado com tudo isto; e qualquer situação é suficientemente boa para captá-Lo e dizer: — Ele anda conosco.

 

Eu creio que o ser humano é dominado por um Fogo Interior. Aquilo que os místicos chamam de 'o nascimento de Deus na alma humana'. E este Fogo se dá nas dobras do cotidiano. Não só no arrebatamento místico, na contemplação, mas a vida é generosa e toda a existência humana é animada por este Fogo e a tarefa, talvez, do pensador é remover as cinzas, desentulhar as memórias sepultadas lá dentro, para que cada um descubra este Fogo, que, às vezes, é um vulcão que explode dentro de cada pessoa humana.

 

Os mortos são apenas invisíveis, mas não ausentes.2

 

Todos os movimentos místicos, espirituais e esotéricos dão testemunho de que nós não temos só uma cultura material, do trabalho, da transformação do mundo. Mas, estão se fazendo exigências do mundo interior do ser humano, da sua dimensão espiritual, que, possivelmente, apontem para um novo paradigma civilizacional, isto é, uma civilização centrada não só na materialidade, que, afinal, precisamos dela para atender as demandas humanas. Mas, também, há outras demandas, talvez mais profundas, que representam a sede de infinito do ser humano, a sua dimensão espiritual, o outro lado da existência. E é exatamente isto que se nota de uma forma, quase exaltada, em todas as partes...

 

 

Sede e fome...

 

 

O sonho de Jesus tem muitas expressões. Eu vejo que o leque das confissões cristãs – desde a Igreja ortodoxa, todas as Igrejas da Reforma [Protestante], e mesmo as pentecostais, hoje são expressões de tentativas de redizer este sonho, esta promessa, que é a mensagem de Jesus, a sua vida, enfim, este mistério. Agora, a expressão dominante dentro do lado romano-católico é a expressão hierárquica, clerical, formada pelos bispos, pelo clero, ao lado da dimensão dos leigos. Então, eu vejo que esta expressão da Igreja é a expressão mais enraizada, mais ocidental. E, em uma perspectiva global, há o risco de que este ocidente se transforme em um acidente, que este Cristianismo não consiga acertar o passo com o processo histórico maior, que vai na direção de uma sociedade mundial do diálogo das culturas. Então, para romper este cerco, creio que devemos voltar às origens, no sentido de recuperar o Arquétipo Cristão, e deixar que as culturas o assimilem, o digam, e a partir das matrizes dele reemerjam…

 

Mais por misericórdia e humanidade pelo portador do poder papal, eu proponho um mandato limitado para o Papa.

 

O Cristianismo católico é quase machista, celibatário… Eu acho que o poder na Igreja, como ele está organizado, é extremamente centralizado. Primeiro, só na parte masculina da Igreja; depois, só na parte daqueles que recebem o sacramento da ordem…

 

São homens que dizem que Cristo decidiu…

 

Há duas Economias: a dos bens materiais e a dos bens espirituais. Elas seguem lógicas diferentes. Na Economia dos bens materiais, quanto mais você dá bens, roupas, casas, terras e dinheiro, menos você tem. Se alguém dá sem prudência e esbanja perdulariamente, acaba na pobreza. Na Economia dos bens espirituais, ao contrário, quanto mais se dá, mais se recebe, quanto mais entregamos, mais temos. Quer dizer: quanto mais se dá amor, dedicação e acolhida (bens espirituais), mais se ganha como pessoa e mais se sobe no conceito dos outros. Os bens espirituais são como o amor: ao se dividirem, se multiplicam. Ou como o fogo: ao se espalharem, aumentam.

 

Quando Jesus fala dos doze, há todo um contexto da Teologia Judaica do tempo, que os doze significam. As doze tribos de Israel, que representam os doze signos do zodíaco daquele tempo, significam a Humanidade. Então, quando Jesus chama os doze, não é um mais um mais um até doze. Quer dizer, o povo que se reúne, a comunidade que se reúne.3

 

12 é 3 vezes 4 – o número da Perfeita Totalidade.

 

A concepção subjetivista – que é cada um sozinho, cada um tem o seu poder, cada um é um pequeno Papa não faz o menor sentido. O sentido é colegial, messiânico, que é sempre coletivo…

 

Um herege vivo vale mais do que um santo morto.

 

Eu acho que a fé tem uma dimensão familiar, tem uma dimensão mística, tem uma dimensão artístico-cultural e tem uma dimensão política. Isto é inegável porque ela está na sociedade civil, está no Estado. O que fez a Teologia da Libertação? Foi dar uma ênfase libertadora, que é inerente a essa fé, à sua dimensão política. Normalmente, a dimensão política da fé era cooptada pelas forças dominantes do velho pacto colonial Igreja-Estado: as classes dominantes e as Igrejas institucionalizadas que compunham a ordem. Então, revolucionar não é fazer política, não é fazer política de esquerda; é fazer a política com os pobres. Por isto se diz: 'Essa é a política'. Não. A Igreja sempre fez política. Só que era uma política de centro, de direita. Era um dos fatores, eu diria até de uma forma simbólica, era o azeite na maquinaria social da ordem estabelecida, que, quando analisada, era uma desordem.

 

A Igreja não é só hierarquia, como o Brasil não é só o exército. Não são só generais. A Igreja não é um exército; é um povo de Deus. É povo…

 

A arrogância institucional mantém a perspectiva clerical, celibatária, que não estava na mente de Jesus, porque Ele não escolheu celibatários. Escolheu pessoas casadas, desde que o primeiro Papa, São Pedro, era casado. E ele curou a sogra dele…

 

Se Jesus casou ou não se casou, ninguém sabe.4

 

Devemos celebrar a vida, não o rito.

 

Não podemos reduzir o Cristianismo à sua dimensão hierárquica; o Cristianismo é muito mais complexo. A expressão comunitária é mais viva hoje. Então, eu não deixei a Igreja como comunidade, eu deixei uma função da Igreja, aquela função hierárquica do padre, que é um conceito canônico, que celebra na Igreja paroquial e aquela coisa toda. Mas eu não deixei de ser fiel, não deixei de ser teólogo, e, lá nas comunidades que me pedem para eu coordenar a celebração, é a comunidade que celebra; eu apenas coordeno esta celebração, participo dela.

 

São Francisco5 foi o maior profeta contraditório da Igreja-instituição daquele tempo. A gente disse: — 'Não! Não à Igreja dos monarcas, não à Igreja do Papa-príncipe, como era no século III'. Era a Igreja da rua, Igreja dos caminhos, Igreja da pobreza. São Francisco não assumiu aquele projeto de Igreja; reinventou um projeto de uma Igreja de base, popular, onde celebrava no meio do povo, dos pobres… Se isto é uma ruptura, São Francisco a fez.

 

O Evangelho é Liberdade. São Paulo diz: — 'Irmãos e irmãs: vocês foram chamados à Liberdade; não se deixam escravizar.' E esta Liberdade é que para mim é a grande herança que Jesus trouxe. No sangue; não na palavra.

 

Fidel Castro e a política oficial se deram conta que o Cristianismo – especialmente o de vertente libertária interessado na justiça não é de forma alguma inimigo do Socialismo.

 

Talvez seja bom esclarecer o que é a Igreja. Normalmente, pela mídia, Igreja é os bispos e os padres, o Papa e pronto. Agora, um conceito mais complexo de Igreja: a Igreja é a comunidade dos que crêem, dos que se organizam. Em Cuba, eles têm a sua hierarquia; mas é o povo, são os teólogos, é a vida religiosa, é o movimento dos sem-terra, é a pastoral dos índios, dos negros, das crianças de rua, é a Teologia da Libertação, toda essa complexidade de vida, forma a Igreja concreta... Eu não digo que a Igreja ou é só carisma ou é só poder; a Igreja é carisma e é poder. Mas, na forma como ela se organizou, o poder engoliu o carisma, de tal forma que a grande parte dos cristãos está à margem disso – os negros, as mulheres, as religiosas, e há a densificação nesse lado mais piramidal da Igreja. Então, a minha luta é dizer que é possível a Igreja ser diferente, mais comunhonal, mais participativa; não como discurso teórico da Teologia, mas como experiência prática, nas comunidades de base, no nível continental, na África, na Ásia... O Cristianismo de comunidade…

 

Eu acho que o futuro religioso do Brasil não será católico; será ecumênico. Terá matriz cristã, será feito um grande sincretismo, que está em curso. Eu acho extraordinário o sincretismo porque mostra a vitalidade do arquétipo cristão, que não está fossilizado no seu lado hierárquico, no seu lado ocidental romano. Ele está ligado às raízes espirituais do povo brasileiro, que são místicas, que são pluriculturais. Eu acho que vai surgir uma outra religiosidade…

 

Eu vejo que o Cristianismo oficial – seja de vertente presbiteriana, metodista ou romano-católica – se fossiliza lentamente. Ela não renova o discurso; não renova os ritos.

 

O corpo não é um cadáver; o corpo é vivo. E esta é a realidade que nós temos. O corpo é habitado pelo Sopro, e o Sopro é o Espírito – que é o Espírito do Universo, o Espírito Cósmico, o Espírito da pessoa humana. Os evangélicos têm agilizado isso lhe dando uma aura religiosa. Eu acredito que o futuro do Cristianismo passa pela vertente carismática, pela vertente do Espírito Santo, que, em certos casos, ganha formas patológicas, no meu modo de ver. A Igreja Universal do Reino de Deus, por exemplo, é uma forma patológica desta dimensão porque fala mais ao bolso das pessoas…

 

Uma coisa é a Igreja e todo o discurso que se faz montado e bem estratégico; outra é a comunidade que a freqüenta, aquele povo que vai lá carregado de fé, de mística. O que eu tenho é um grande respeito por eles, pois eles nos dão duras lições que nós, católicos, devemos aprender, que é, por exemplo, redescobrir o caminho da subjetividade, do profundo do ser humano... Então, pouco importa, tanto faz se é Edir Macedo, se é o Papa, se são outros... Quem está alimentando hoje o Fogo Interior? Quem permite ao ser humano fazer uma viagem de uma águia e não ficar como uma galinha ciscando no chão? Quem, por muitas fontes, está sendo o conduto para permitir ao ser humano descobrir sua transcendência?

 

Se, por um lado, fazemos a crítica à religião pentecostal, que manipula as consciências, por outro lado, devemos perceber a sua grande função antropológica de salvar aqueles que não têm nome, que são destituídos, considerados mão-de-obra, nem mais ingressando no mercado, no exército de reserva, mas os descartáveis da sociedade. Mas, eles não são isso; são pessoas humanas. E, politicamente, são importantes porque eles decidem eleições, decidem que um Collor ganhe e não um Lula. Porque eles votam. Então, a religião encontrou um conduto de falar a eles. Para mim, é um desafio para as Igrejas históricas redescobrir uma linguagem de chegar a eles…

 

Edir Macedo e todo o grupo dele fazem o discurso da prosperidade. Se a gente analisar melhor, não é bem assim. Ele faz o discurso que você tem direito a ter prosperidade. É um direito seu ter casa, ter saúde, ter comida, ter o mínimo para ser humano, porque é um direito que Deus quer para os seus filhos e filhas. A sociedade nega. E aí vem a estratégia do Edir Macedo. A estratégia de conseguir isso mediante um milagre. Quer dizer, Deus vai intervir. Inclusive há um programa chamado Primeiro Mundo, que eu digo: — 'É uma receita ao Presidente da República'. Não precisa fazer as políticas mundiais, via MERCOSUL (Mercado Comum do Sul), para chegar ao Primeiro Mundo; basta confiar em Deus. Ele te introduz no Primeiro Mundo… Lógico. Aqui não é mística; é mistificação. Quer dizer, queima as etapas, tira fora as mediações, que é a crítica que nós fazemos a esse tipo de 'carismatismo', que faz de Deus um 'tapa-buraco'. Deus está ali, mas não como um 'tapa-buraco'.

 

Eu acho que, primeiro, tem que ser discutido o fenômeno que ocorre entre duas pessoas do mesmo sexo, ou mesmo nos heterossexuais, que é a experiência do amor humano. Em toda essa discussão ninguém fala do amor. Todo mundo fala do homossexualismo; ninguém fala da experiência do amor, que é a coisa mais misteriosa do ser humano, à qual devemos ter o máximo respeito e acolher as pessoas, e que essas pessoas queiram ter continuidade nessa experiência. Que ela pode ser defendida, para que eles tenham uma infra-estrutura de legalidade, sobre os eventuais bens, e aquilo que eles constroem juntos, eu acho que é do direito deles. Então, eu não quero julgar sobre o juízo, fazer um juízo moral sobre os homossexuais. Apenas quero dizer que são pessoas humanas, que dão testemunho que é possível um amor entre eles e que a sociedade deve se confrontar sobre isso.

 

Eu acho que há uma dimensão de pecado, sim, que é a obstinação; não querer crescer, não querer ouvir o outro, não escutar os apelos profundos da sua interioridade. Não ouvir a Palavra o suficiente que ecoa mil ecos, que é a Palavra do Mistério do Divino. Então, pecar é o quê? Pecar é não querer crescer. É querer se fossilizar, se assentar em uma posição. E nós somos chamados a nos transformar continuamente, a crescer, a interagir, dia-a-dia, fazendo isso como um processo constante de nossa personalidade. E temos a outra tendência: de nos sentarmos, de nos fecharmos, de celebrarmos nossos louros… Para mim, eu acho que esta atitude é pecado.

 

Há mil formas de a pessoa perder o seu centro, de perder o seu caminho do meio. Pecado é sempre a queda e a perda deste caminho do meio.

 

Eu não me reporto à autoridade nenhuma; eu me reporto tão-somente a Deus.

 

O fundo de todas as encíclicas termina sempre em um discurso moral. Nunca é um discurso que pudesse, analiticamente, analisar o Capitalismo, o Socialismo, e aí as medidas políticas. Então, na parte moral, ninguém é contra, é fácil. Por isto, têm pouca aplicabilidade às questões sociais. Por quê? Porque é tão-só discurso moral. Nós queremos o discurso da mediação, que ajude os caminhos políticos de superar a pobreza. Porque é fácil condenar a pobreza. Nós queremos, sim, superar historicamente a pobreza…

 

O maior milagre é a vida, é uma borboleta estar voando. O problema é que nós reservamos o milagre a algo extraordinário, que é quase mágico. Eu digo não. O Universo é uma feira de milagres. E eu não me canso de admirar. E seria trágico para nós, aqui, se tivéssemos expulso esta borboleta ou matado a ela porque ele poderia estragar o nosso programa. Não, ela foi convidada. Ela é o Espírito que está aqui, que paira entre todos nós. Ela pertence ao nosso círculo hermético. Isto é o grande milagre!

 

Queremos uma justiça social que combine com a justiça ecológica. Uma não existe sem a outra.

 

Nem pobreza, nem riqueza; mas justiça. Justiça que é participação, que é dignidade das pessoas humanas. Por isto, nos 'Atos dos Apóstolos', quando se diz que os cristãos distribuíam tudo entre eles, aí se diz, pelo louvor da comunidade, 'que não havia pobres entre eles'. Porque todo mundo tinha o suficiente. Então, o nosso projeto não é riqueza nem é sacralizar a pobreza. É justiça, onde todos possam participar dos bens criados pelo trabalho, pela cultura e pela técnica humana.

 

Eu considero, por exemplo, a política neoliberal como um grande pecado social, porque ela supõe uma Humanidade menor do que a realmente existente, um Brasil menor. E funciona para 80 milhões de brasileiros. E para uma Humanidade calculada em 2,5 bilhões, ela funciona. Agora, nós somos 5,6 bilhões no mundo e 150 milhões de brasileiros, que não são só marginalizados; são excluídos, não contam. Na planificação de saúde, de escola, de moradia, eles não entram; são zeros econômicos. Então, esta lógica, que é férrea do sistema, toma até o empresário de boa vontade, ético, mas que está coagido por esta lógica. E se ele não faz isso, ele é expelido do mercado; ele vai à falência. Então, eu acho que é essa mecânica que nos leva a questionar: qual é a centralidade que este sistema tem com a vida humana, com as carências humanas ou com as carências do mercado? Qual é a lógica e a ética desta produção de bens materiais? Eles se destinam a quê? Ao lucro ou atender a vida, não só a vida humana, mas das plantas, das árvores e dos animais. Eu acho que esta questão tem que ser pensada em termos, não só éticos, mas em termos políticos, como gestar políticas que geram vida, mas para todo mundo, que preservem este Planeta, que está ameaçado. Porque nós criamos a máquina de morte que pode destruir tudo. Então, não podemos mais ser ingênuos. Temos que assumir posições políticas fundamentais, se queremos garantir um futuro para o Planeta e as condições para o ser humano poder continuar a se desenvolver.

 

Não basta ter só políticas de estabilidade porque você congela a miséria.

 

Compreender não consiste em elencar dados. Mas em ver o nexo entre eles e em detectar a estrutura invisível que os suporta. Esta não aparece. Recolhe-se em um nível mais profundo. Revela-se através dos fatos. Descer até aí através dos dados e subir novamente para compreender os dados: eis o processo de todo o verdadeiro conhecimento. Em ciência e também em teologia.

 

Onde há amor aí há ato de deus, porque Deus é amor.

 

Eu acho que nós estamos em um processo. E onde há aprendizado, há erros; e a gente aprende com os erros. Mas também há acertos. Eu acho que a linha fundamental nós acertamos. Pode ter pedras, a estrada sobe e desce, pode ter viés. Mas da direção eu estou profundamente convencido. Não é só a direção para o Brasil; eu acho que é uma direção para a Humanidade. Se nós queremos coletivamente sobreviver, nós temos que socializar os nossos bens, a nossa cultura, o nosso dinheiro, a Natureza; senão nós vamos destruir tudo isso. Ou nós paramos agora ou no ano de 2034 a Terra toda não será mais sustentável. Vamos ao encontro de catástrofes fantásticas. Então, onde os políticos têm esta consciência? Quando eles fazem um apelo às pessoas religiosas, à religião, à veneração, ao respeito, à sacralidade, ao respeito à Natureza, às alteridades. Temos que alimentar esse fogo porque só quando temos essa veneração, essa sacralidade, nós respeitamos e não manipulamos, não entramos na lógica destrutiva, mas na lógica da sinergética de proteger, de incluir e, aí, de salvaguardar. E, neste sentido, eu acho que nós estamos do lado certo.

 

A Ecologia Ambiental se preocupa com o meio ambiente – para que não sofra excessiva desfiguração – com a qualidade de vida e com a preservação das espécies em extinção. Ela vê a Natureza fora do ser humano e da sociedade. Procura tecnologias novas, menos poluentes, privilegiando soluções técnicas. Ela é importante porque procura corrigir os excessos da voracidade do projeto industrialista mundial, que implica sempre custos ecológicos altos. Se não cuidarmos do Planeta como um todo, poderemos submetê-lo a graves riscos de destruição de partes da biosfera e, no seu termo, inviabilizar a própria vida no Planeta.

 

A Ecologia Social não quer apenas o meio ambiente. Quer o ambiente inteiro. Insere o ser humano e a sociedade dentro da Natureza. Preocupa-se não apenas com o embelezamento da cidade, com melhores avenidas, com praças ou praias mais atrativas. Mas prioriza o saneamento básico, uma boa rede escolar e um serviço de saúde decente. A injustiça social significa uma violência contra o ser mais complexo e singular da criação que é o ser humano, homem e mulher. Ele é parte e parcela da Natureza. A Ecologia Social propugna por um desenvolvimento sustentável. É aquele em que se atende às carências básicas dos seres humanos, hoje, sem sacrificar o capital natural da Terra, e considera também as necessidades das gerações futuras que têm direito à sua satisfação e de herdarem uma Terra habitável com relações humanas minimamente justas.

 

No imaginário dos pais fundadores da sociedade moderna, o desenvolvimento se movia dentro de dois infinitos: o infinito dos recursos naturais e o infinito do desenvolvimento rumo ao futuro. Esta pressuposição se revelou ilusória. Os recursos não são infinitos. A maioria está se acabando, principalmente a água potável e os combustíveis fósseis. E o tipo de desenvolvimento linear e crescente para o futuro não é universalizável. Não é, portanto, infinito. Se as famílias chinesas quisessem ter os automóveis que as famílias americanas têm, a China viraria um imenso estacionamento. Não haveria combustível suficiente e ninguém se moveria.

 

A Ecologia Mental – chamada também de Ecologia Profunda – sustenta que as causas do 'deficit' da Terra não se encontram apenas no tipo de sociedade que atualmente temos. Mas, também, no tipo de mentalidade que vigora, cujas raízes alcançam épocas anteriores à nossa história moderna, incluindo a profundidade da vida psíquica humana consciente e inconsciente, pessoal e arquetípica.

 

Há, em nós, instintos de violência, de vontade de dominação, arquétipos sombrios que nos afastam da benevolência em relação à vida e à Natureza. Aí, dentro da mente humana, se iniciam os mecanismos que nos levam a uma guerra contra a Terra. Eles se expressam por uma categoria: a nossa cultura antropocêntrica. O antropocentrismo considera o ser humano rei/rainha do Universo. Pensa que os demais seres só têm sentido quando ordenados ao ser humano; eles estão aí disponíveis ao seu bel-prazer. Esta estrutura quebra com a lei mais universal do Universo: a solidariedade cósmica. Todos os seres são interdependentes e vivem dentro de uma teia intrincadíssima de relações. Todos são [igualmente] importantes.

 

A Ecologia Integral parte de uma nova visão da Terra. É a visão inaugurada pelos astronautas a partir dos anos 60 quando se lançaram os primeiros foguetes tripulados. Eles viram a Terra de fora da Terra. De lá, de sua nave espacial ou da Lua, como testemunharam vários deles, a Terra aparece como um resplandecente planeta azul e branco, que cabe na palma da mão e que pode ser escondido pelo polegar humano. Daquela perspectiva, Terra e seres humanos emergem como uma única entidade. O ser humano é a própria Terra enquanto sente, pensa, ama, chora e venera. A Terra emerge como o terceiro planeta de um Sol, que é apenas um entre 100 bilhões de outros de nossa galáxia, que, por sua vez, é uma entre 100 bilhões de outras do Universo, Universo que, possivelmente, é apenas um entre outros milhões paralelos e diversos do nosso. E tudo caminhou com tal calibragem, que permitiu a nossa existência aqui e agora. Caso contrário, não estaríamos aqui. Os cosmólogos, vindos da Astrofísica, da Física Quântica, da Biologia Molecular, em uma palavra, das ciências da Terra, nos advertem que o Universo inteiro se encontra em cosmogênese. Isto significa: ele está em gênese, se constituindo e nascendo, formando um sistema aberto, sempre capaz de novas aquisições e de novas expressões. Portanto, ninguém está pronto. Por isto, temos que ter paciência com o processo global, uns com os outros e também conosco mesmo, pois nós, humanos, estamos igualmente em processo de antropogênese, de constituição e de nascimento.

 

 

Cosmogonia?

 

 

As grandes crises comportam grandes decisões. Há decisões que significam vida ou morte para certas sociedades, para uma instituição ou para uma pessoa. A situação atual é a de um doente ao qual o médico diz: ou você controla suas altas taxas de colesterol e sua pressão ou vai enfrentar o pior. Você escolhe. A Humanidade, como um todo, está com febre e doente e deve decidir: ou continuar com seu ritmo alucinado de produção e consumo, sempre garantindo a subida do PIB nacional e mundial, ritmo altamente hostil à vida, ou enfrentar dentro de pouco as reações do sistema-Terra, que já deu sinais claros de estresse global. Não tememos um cataclismo nuclear, não impossível mas improvável, o que significaria o fim da espécie humana. Receamos, isto sim, como muitos cientistas advertem, por uma mudança repentina, abrupta e dramática do clima que, rapidamente, dizimaria muitíssimas espécies e colocaria sob grande risco a nossa civilização.

 

Não basta a responsabilidade social; ela deve ser sócio-ambiental. É urgente que o Parlamento vote uma lei de responsabilidade sócio-ambiental imposta a todos os gestores da coisa pública. Só assim evitaremos tragédias e mortes.

 

Só controlaremos a Natureza na medida em que lhe obedecermos e soubermos escutar suas mensagens e ler seus sinais. Caso contrário, teremos que contar com tragédias fatais inevitáveis.

 

Todo ser é completo por si.

 

 

Escanifre Desconjuntado

 

O que se opõe ao descuido e ao descaso é o cuidado. Cuidar é mais do que um ato; é uma atitude. Portanto, abrange mais do que um momento de atenção. Representa uma atitude de ocupação, de preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro.

 

Nada resiste ao bem e ao amor.

 

Para aqueles com estômago elitista, lugar de peão é na fábrica: produzindo, alimentando a bomba do Capitalismo!

 

Se não buscarmos o impossível, acabaremos por não realizar o possível.

 

O mal não está para ser compreendido, mas para ser combatido.6

 

Toda mudança de paradigma civilizatório é precedida por uma revolução na Cosmologia (visão do Universo e da vida). O mundo atual surgiu com a extraordinária revolução que Copérnico e Galileo Galilei introduziram ao comprovarem que a Terra não era um centro estável, mas que girava ao redor do Sol. Isto gerou enorme crise nas mentes e na Igreja, pois parecia que tudo perdia valor. Mas, lentamente, impôs-se a nova Cosmologia, que fundamentalmente perdura até hoje nas escolas, nos negócios e na leitura do curso geral das coisas. Manteve-se, porém, o antropocentrismo – a idéia de que o ser humano continua sendo o centro de tudo e as coisas são destinadas ao seu bel-prazer.

 

Nunca guardei mágoas; guardo decepções.

 

Uma frente avançada das ciências, hoje, é constituída pelo estudo do cérebro e de suas múltiplas inteligências. Alcançaram-se resultados relevantes, também para a religião e para a espiritualidade. Enfatizam-se três tipos de inteligência. A primeira é a inteligência intelectual, o famoso QI (Quociente de Inteligência), ao qual se deu tanta importância em todo o século XX. É a inteligência analítica pela qual elaboramos conceitos e fazemos ciência. Com ela organizamos o mundo e solucionamos problemas objetivos. A segunda é a inteligência emocional, popularizada especialmente pelo psicólogo e neurocientista de Harvard David Goleman, com seu conhecido livro A Inteligência Emocional (QE = Quociente Emocional). Empiricamente, ele mostrou o que era convicção de toda uma tradição de pensadores, desde Platão, passando por Santo Agostinho e culminando em Freud: a estrutura de base do ser humano não é razão ('logos') mas é emoção ('pathos'). Somos, primariamente, seres de paixão, de empatia e de compaixão, e só em seguida, de razão. Quando combinamos QI com QE conseguimos nos mobilizar a nós e a outros. A terceira é a inteligência espiritual. A prova empírica de sua existência deriva de pesquisas muito recentes, dos últimos dez anos, feitas por neurólogos, neuropsicólogos, neurolingüistas e técnicos em magnetoencefalografia (que estuda os campos magnéticos e elétricos do cérebro). Segundo esses cientistas, existe em nós, cientificamente verificável, um outro tipo de inteligência, pela qual não só captamos fatos, idéias e emoções, mas percebemos os contextos maiores de nossa vida, totalidades significativas, e nos faz sentir inseridos no Todo. Ela nos torna sensíveis a valores, a questões ligadas a Deus e à transcendência. É chamada de inteligência espiritual (QEs = Quociente Espiritual), porque é próprio da espiritualidade captar totalidades e se orientar por visões transcendentais. Sua base empírica reside na biologia dos neurônios. Verificou-se cientificamente que a experiência unificadora se origina de oscilações neurais a 40 Hz, especialmente localizada nos lobos temporais. Desencadeia-se, então, uma experiência de exaltação e de intensa alegria como se estivéssemos diante de uma Presença viva. Ou inversamente, sempre que se abordam temas religiosos, Deus ou valores que concernem ao sentido profundo das coisas, não superficialmente mas em um envolvimento sincero, produz-se igual excitação de 40 Hz. Por esta razão, neurobiólogos como Persinger, Ramachandran e a física quântica Danah Zohar batizaram esta região dos lobos temporais de 'Ponto Deus'. Se assim é, podemos dizer em termos do processo evolucionário: o universo evoluiu, em bilhões de anos, até produzir no cérebro o instrumento que capacita o ser humano perceber a Presença de Deus, que sempre esteve lá, embora não perceptível conscientemente. A existência desse 'Ponto Deus' representa uma vantagem evolutiva de nossa espécie humana. Ela constitui uma referência de sentido para a nossa vida. A espiritualidade pertence ao humano e não é monopólio das religiões. Antes, as religiões são uma das expressões deste 'Ponto Deus'.

 

Jesus batizou esta casa [o Planeta Terra] como o Reino de Deus. Não a chamou de Igreja ou de religião.

 

Quando vou a Roma, sempre presto homenagem a Giordano Bruno.7

 

Sou um cristão indignado, mas piedoso... O último amigo que enterrei, a pedido dele próprio, foi Darcy Ribeiro.8

 

O celibato atrapalha muito mais a vida de um sacerdote do que o casamento. O matrimônio faz o padre se tornar mais sensível aos problemas dos outros, porque os vive na própria pele. Ao celibatário é imposto um modo de ser que o torna distante do mundo real. Isto só se presta a uma Igreja que não quer dividir poder com ninguém; nem com a mulher, nem com os filhos, nem com a família.

 

 

O clérigo, segurando o chapéu para não voar: — Oh!
A dama de vermelho: — Oh!, é o cacete! Pô, vê se casa.

 

Toda teologia séria, hoje, diz que não há objeção à ordenação de mulheres. A objeção é ideológica. O patriarcalismo da hierarquia católica quer uma sociedade de homens para manter privilégios injustamente acumulados ao longo da História.

 

Considero uma irresponsabilidade e uma inimizade com a vida o veto da Igreja Católica ao uso de preservativos. Mas não me surpreendo. Em fóruns internacionais, o Vaticano sempre vota questões relacionadas à família e à sexualidade ao lado das piores companhias: os xiitas, os fundamentalistas e os reacionários.

 

Se, neste mundo, não pudermos contar com mais ninguém, poderemos, pelo menos, contar com Deus. A religião é o refúgio dos condenados à impotência social. Mas a religião não é tão-somente o ópio do povo. Ela se torna um fator de libertação quando o fiel percebe que Deus não quer nem a fome nem a miséria.

 

As religiões fazem guerras. As espiritualidades trazem a paz. Vejo uma única saída para a paz religiosa: que as religiões se auto-superem. Na espiritualidade, todas as religiões se encontram em harmonia. Quando tentam se expressar nos códigos culturais, surgem, então, as guerras religiosas.

 

Não tenho qualquer esperança de ver a paz vigorar no Oriente Médio. Lá estão as três religiões mais belicosas da História da Humanidade: o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo. Enquanto estas religiões não se derem conta de que todos na Terra são o povo escolhido de Deus, a guerra continuará. Até o Juízo Final.

 

Saúdo a expansão dos evangélicos no Brasil porque sou a favor de todo tipo de diversidade. Diversidade é sinal de riqueza. Quanto mais animais, plantas, pássaros e culturas, melhor. E ainda há gente que tem o mau gosto de pensar que todo mundo deveria ser romano-católico.

 

O Movimento de Renovação Carismática significa um novo paradigma religioso. É um movimento no qual a experiência possui mais centralidade do que doutrina. A espontaneidade prevalece sobre a rigidez. Dentro da Igreja, os carismáticos representam a quebra do monopólio que padres e bispos tinham sobre a palavra e os ritos. Nesse sentido, é bom. Por outro lado, pelo fato de se assentar mais sobre a emoção, o movimento se presta facilmente a entrar no mercado do entretenimento para multidões. É o caso, por exemplo, dos padres midiáticos com seus shows-missas. Devido à lógica da mídia, eles apenas conseguem apresentar um Cristianismo anêmico e superficial, feito de alegria e de parcos apelos à justiça e à transformação social. Vira um entusiasmo de bobo alegre.

 

Depois que Deus se fez homem no judeu Jesus,9 descobrimos que somos também Deus por participação.10 A maioria dos cristãos não tem consciência disso. E a Igreja quase nunca prega essa verdade.11

 

Será que percebes que o olho pode conter a beleza do mundo inteiro? Perder a vista significa ser privado da beleza do Universo e é o mesmo que encerrar um homem em uma sepultura.

 

Morrer é fechar os olhos para ver melhor.

 

Alegremo-nos! Não pode haver tristeza quando nasce a Vida!

 

 

 

 

 

 

Para Leonardo

 

 

 

Leonardo! Leonardo!

Compreendo sua dor.

Meu Irmão Leonardo!

Não deixe botar a Cor.

 

Meu Irmão Leonardo!

Não! Não se entristeça.

Leonardo! Leonardo!

Não! Jamais esmoreça.

 

Leonardo! Leonardo!

Nem crentes nem ateus.

Meu Irmão Leonardo!

 

Meu Irmão Leonardo!

É assim? Tudo é Bem.

Leonardo! Leonardo!

Não é? É Bem também.

 

Leonardo! Leonardo!

Persista na Caminhada.

Meu Irmão Leonardo!

 

Meu Irmão Leonardo!

Não há Origem nem Fim.

Leonardo! Leonardo!

 

 

 

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Notas:

1. Por Quem os Sinos Dobram (em inglês: For Whom the Bell Tolls) é um romance de 1940 do escritor americano Ernest Hemingway (Oak Park, 21 de julho 1899 – Ketchum, 2 de julho 1961). O livro narra a história de Robert Jordan, um jovem norte-americano das Brigadas Internacionais. Professor de Espanhol que se tornou conhecedor do uso de explosivos, Jordan recebe a missão de explodir uma ponte por ocasião de um ataque simultâneo à cidade de Segóvia. Hemingway usa como referência sua experiência pessoal como participante voluntário da Guerra Civil Espanhola ao lado dos republicanos e faz uma análise ácida, com críticas à atuação extremamente violenta das tropas de ambos os lados: a direita, auxiliada pelo Governo fascista italiano e nazista alemão, e a esquerda, auxiliada pelas brigadas internacionais e pela União Soviética. Critica também a burocratização e o panorama de privilégios rapidamente instaurado no lado da República. Acima de tudo, o livro trata, no entanto, da condição humana. O título é referência a um poema, e invoca o absurdo da guerra, mormente a guerra civil, travada entre irmãos. Quando morre um homem, morremos todos, pois somos parte da Humanidade. Em várias passagens do texto, os personagens estranham e se estranham desempenhando os papéis bizarros que se viram forçados a assumir durante a guerra, e fraquejam ao ver nos inimigos seres humanos que poderiam estar de qualquer dos lados da guerra. Em 1943, um filme homônimo foi feito, tendo nos papéis principais os astros da época, Gary Cooper (Helena, 7 de maio de 1901 – Los Angeles, 13 de maio de 1961) e Ingrid Bergman (Estocolmo, 29 de agosto de 1915 – Londres, 29 de agosto de 1982), com uma cena famosa na qual o casal usa um mesmo saco de dormir.

2. Esta sentença é semelhante à do escritor francês Victor Hugo (26 de fevereiro de 1802 – 22 de maio de 1885) em discurso no sepultamento da noiva de seu segundo filho: Les morts sont invisible, mais pas absent. Os mortos são invisíveis, mas não estão ausentes.

3. Duas coisas não podemos esquecer: primeiro, o Alfabeto Hebraico está subdividido em três grupos de três, sete e doze Letras de valores funcionalmente distintos (Um está acima de três, três estão acima de sete, sete acima de doze, e todos estão ligados); segundo, o trabalho místico programado por Jesus se baseou em três círculos concêntricos: 12 (4 x 3) Apóstolos, 72 (6 x 12) Adeptos e 360 (72 x 5) Postulantes, correspondentes às doze constelações, aos setenta e dois semidecanos do Zodíaco e aos trezentos e sessenta graus do círculo eclíptico. Entretanto, estes três números admitem outras correlações, como, por exemplo, o alfabeto hebraico (doze letras simples), a sagrada palavra YHVH (IEVE ou IHOH) [10 + 15 + 21 + 26] e o Grande Ciclo de Precessão Equinocial (18 x 60 x 24 = 25.920 anos), número de anos das grandes eras precessionais ao final do qual as constelações completam seu passeio zodiacal. O Grande Ciclo de Precessão Equinocial também pode ser obtido multiplicando-se 180 por 122, ou seja: 180 x 144 = 25.920. Assim, cada signo manifesta-se por 2.160 anos, ou seja, 25.920 ÷ 12 = 2.160.

4. E, se Jesus foi casado, isto muda o quê? Talvez, mude no sentido de que algumas de Suas Obras e algumas de Suas Realizações só poderiam ser efetivadas se fosse Casado. Já expliquei em outros textos que o Casamento dos Adeptos não é um casamento comum, ordinário; é um Casamento Iniciático, Místico e Alquímico.

5. Giovanni di Pietro di Bernardone, mais conhecido como São Francisco de Assis (Assis, 5 de julho 1182 – 3 de outubro de 1226), foi um frade católico da Itália. Depois de uma juventude irrequieta e mundana, voltou-se para uma vida religiosa de completa pobreza, fundando a ordem mendicante dos Frades Menores, mais conhecidos como Franciscanos, que renovaram o Catolicismo de seu tempo. Com o hábito da pregação itinerante, quando os religiosos de seu tempo estavam mais ligados aos mosteiros rurais, e com sua crença de que o Evangelho devia ser seguido à risca, imitando-se a vida de Cristo, desenvolveu uma profunda identificação com os problemas de seus semelhantes e com a Humanidade do próprio Cristo. Sua atitude foi original também quando afirmou a bondade e a maravilha da Criação, quando se dedicou aos mais pobres dos pobres, e quando amou todas as criaturas chamando-as de irmãos. Alguns estudiosos afirmam que sua visão positiva da Natureza e do homem, que impregnou a imaginação de toda a sociedade de sua época, foi uma das forças primeiras que levaram à formação da Filosofia da Renascença. O escritor, poeta e político italiano Dante Alighieri (Florença, 1º de junho de 1265 – Ravenna, 13 ou 14 de setembro de 1321) disse que São Francisco foi uma luz que brilhou sobre o mundo, e, para muitos, desde Jesus, ele foi a maior figura do Cristianismo. Mas, a despeito do enorme prestígio de que ele desfruta até os dias de hoje nos círculos cristãos, que fez sua vida e mensagem serem envoltas em copioso folclore e darem origem a inumeráveis representações na arte, a pesquisa acadêmica moderna sugere que ainda há muito por elucidar quanto aos aspectos políticos de sua atuação, e que devem ser mais exploradas as conexões desses aspectos com o seu misticismo pessoal. Sua vida é reconstruída a partir de biografias escritas pouco após sua morte e, segundo alguns críticos, essas fontes primitivas ainda estão à espera de edições críticas mais profundas e completas, pois apresentariam contradições factuais e seriam inclinadas a fazer uma apologia de seu caráter e obras, e assim, deveriam ser analisadas sob uma óptica mais científica e mais isenta de apreciações emocionais do que tem ocorrido até agora, a fim de que sua verdadeira estatura como figura histórica e social, e não apenas religiosa, se esclareça. De qualquer forma, sua posição como um dos grandes santos da Cristandade se firmou quando ele ainda era vivo, e permanece inabalada. Foi canonizado pela Igreja Católica menos de dois anos após falecer, em 1228, e por seu apreço à Natureza é mundialmente conhecido como o santo patrono dos animais e do meio ambiente.

6. Acho que isto não é bem assim. Quando não compreendemos, seja lá o que for, poderemos, desavisadamente, como inocentes úteis ou coisa pior, nos tornar instrumentos deste seja lá o que for! No limite, poderemos até confundir nosso Deus Interior com o nosso Demônio Interior, e nos tornarmos instrumentos obedientes da Grande Loja Negra (como muitos por aí que nem sequer têm consciência disso)! Aí, vai ser mesmo um fudevu de caçarolê da melhor qualidade! Portanto, devemos, sim, empenhar todos os nossos esforços para compreender tudo: seja o bem, seja o mal, seja lá o que for, seja o que for, lá.

7. Giordano Bruno (Nola, 1548 – Roma, Campo de Fiori, 17 de fevereiro de 1600) foi um teólogo, filósofo, escritor e frade dominicano italiano, condenado à morte na fogueira, pela Inquisição romana (Congregação da Sacra, Romana e Universal Inquisição do Santo Ofício), por heresia. Em 8 de fevereiro de 1600, obrigado a escutar ajoelhado a sentença de condenação à morte, lança aos seus juízes a histórica frase: Maiori forsan cum timore sententiam in me fertis quam ego accipiam. (Talvez sintam maior temor ao pronunciar esta sentença do que eu ao ouvi-la). Bruno orreu na fogueira com uma tábua e pregos na língua, para parar de 'blasfemar'. Mesmo assim, dizem que Bruno ficou gorgolejando.

8. Darcy Ribeiro (Montes Claros, 26 de outubro de 1922 – Brasília, 17 de fevereiro de 1997) foi um antropólogo, escritor e político brasileiro conhecido por seu foco em relação aos índios e à educação no País.

9. Aqui há um equívoco. Jesus não era propriamente judeu; era essênio. Os essênios tiveram existência desde mais ou menos o ano 150 a.C. até o ano 70 d.C.

10. A admitir que isto seja assim, melhor seria usar o vocábulo co-participação.

11. Ora, não prega e não ensina porque não interessa. Como haveria de se sentir um papa e como haveria de se um cardeal como co-participantes de Deus ao lado de uns quantos zé-quitólis e de outros tantos joões-ninguém, sem sem eira nem beira, sem sem jeira nem chaleira? Pobres e fodidos são bons, mas de longe. A pompa in vitam et in mortis da Civitas Vaticana – uma monarquia absoluta eletivo-teocrática – mostra isto muito bem.

 

Páginas da Internet consultadas:

http://www.otempo.com.br/
otempo/noticias/?IdNoticia=98388

http://bestanimations.com/
nature/flora/roses/roses2.html

http://pt.wikipedia.org/wiki/Darcy_Ribeiro

http://aminhabusca.blogspot.com/2007/09/
entrevista-de-leonardo-boff-revista.html

http://pt.wikipedia.org/wiki/
Giordano_Bruno

http://pensador.uol.com.br/
frases_de_leonardo_boff/

http://www.frasesfamosas.com.br/
de/leonardo-boff.html

http://www.leonardoboff.com/
site/lboff.htm

http://www.rodaviva.fapesp.br/materia/
94/entrevistados/leonardo_boff_1997.htm

http://pt.wikipedia.org/wiki/
Por_Quem_os_Sinos_Dobram

http://pt.wikiquote.org/wiki/Leonardo_Boff

 

 

Música de fundo:

Love and Marriage
Compositores: James Van Heusen & Sammy Cahn
Intérprete: Frank Sinatra