Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

Na revista Lucifer Luciferax, 5ª edição, 2.009, uma publicação da Pan-Dæmon-Aeônica Aperiódica e em uma Página do Website Ateus.net está disponibilizado um artigo interessante sobre a questão do livre-arbítrio, que reproduzo abaixo, para, em seguida, à luz do meu livre-arbítrio, poder brevemente discuti-lo.

 

 

 

Porque Não Tenho Livre-Arbítrio

Autor: Nikolas Lloyd

Tradução: André Díspore Cancian

 

 

 

 

 

 

Não tenho livre-arbítrio, e isto é ótimo.

 

É meu cérebro que controla meu comportamento. Ele é, como toda matéria, constituído inteiramente de elementos químicos. Ele é extraordinariamente complexo, com muitos componentes, todos interconectados em um padrão confuso e ainda pouco compreendido. Não obstante quão complicado algo seja, permanece o fato de que em um dado momento, este algo estará em um dado estado de organização. Os elementos químicos estão ligados em combinações particulares, e a energia e a matéria estão movendo-se em direções particulares.

 

Algum estímulo chega a mim vindo do ambiente. Este é captado pelos meus sentidos e o sinal é enviado ao meu cérebro. O sinal interage com meu cérebro, alterando seu estado físico e químico, tendo como resultado alguma reação de minha parte. Meu corpo, então, segue as instruções dadas pelo cérebro a respeito do que fazer. Houve algum livre-arbítrio nisso? Não, nenhum.

 

Alguém conta uma piada. Ouço-a. As vibrações sonoras da piada chegam ao meu cérebro através de meus ouvidos e são traduzidas em atividade eletroquímica. As regiões do meu cérebro responsáveis pela linguagem reconhecem o significado das palavras. A piada, que diz 'estas mulheres, como as concebo, são-me aprazíveis', baseia-se na compreensão da ambigüidade do som cacofônico destas palavras, que podem significar 'como as considero' ou 'como-as com sebo'. Percebendo que a ambigüidade sonora é jocosa, sou capaz de entender a piada. Meu cérebro registra a hilaridade da piada, e então rio. Mas não decido rir conscientemente. O estímulo da piada teve como resposta meu riso.

 

Poucos minutos depois, ouço a mesma pessoa contar a mesma piada a outrem. Desta vez, não rio; não rio porque já ouvi esta piada anteriormente. Meu cérebro foi quimicamente alterado na primeira vez em que a ouvi, e agora o som da piada está interagindo com um cérebro que já não é mais o mesmo.

 

Apesar disso, às vezes tenho a sensação de que realmente tomo decisões. Estou numa loja tentado a comprar um par de óculos de sol, mas não consigo decidir se realmente valem o preço que preciso pagar por eles. Fico ruminando e remoendo sobre a decisão, e então deixo a loja sem comprá-los. Volto para casa pensando o tempo todo se fiz a coisa certa. Ainda assim, não há livre-arbítrio envolvido, mas apenas a ilusão de um.

 

Era certo que não iria comprá-los. Meu cérebro estava em um estado químico particular quando a oportunidade de comprar os óculos chegou, e dada a combinação particular de circunstâncias – o humor em que estava, a iluminação da loja, o conhecimento de meu estado financeiro – era certo que decidiria contra o investimento. Minha mente consciente, entretanto, não sabia qual seria a decisão final, e aquilo que senti conscientemente foi apenas a agonia da decisão. Tais decisões difíceis são muito raras.

 

Algumas pessoas revoltam-se contra a conclusão de que não temos livre-arbítrio. Alegam que isso é deprimente, por algum motivo. Nunca me explicaram, apesar de eu ter perguntado muitas vezes, por que deveria me sentir deprimido ao descobrir que não tenho livre-arbítrio. A idéia de que não temos livre-arbítrio é uma conclusão lógica que pode ser inferida a partir do simples fato de que o cérebro é feito de matéria, e que este interage com o mundo através dos sentidos.

 

Vejo o mundo em que vivo como um lugar grande e complexo. Conseqüentemente – apesar de este possuir um certo e confortante grau de previsibilidade – nunca saberei ao certo qual será o próximo estímulo que irei experimentar. Ademais, não tenho acesso a tudo que meu cérebro está fazendo; deste modo, mesmo se pudesse prever os acontecimentos, ainda não poderia prever qual seria minha reação a eles. A vida é uma interessante experiência tridimensional, com visões, sons, cheiros, sabores e sentimentos. Por que deveria reclamar por não ter livre-arbítrio se possuo a perfeita ilusão de tê-lo, e o mundo é tão encantador? De que modo ter livre-arbítrio poderia me tornar mais feliz?

 

As pessoas falam sobre quão maravilhoso é o fato de termos evoluído um livre-arbítrio. Algumas consideram o livre-arbítrio algo tão estupendo que as convence de que um deus deve ter criado os seres humanos, e que o livre-arbítrio é alguma mágica especial que os homens possuem. Na verdade, não evoluímos um livre-arbítrio absolutamente; em vez disso, evoluímos a consciência e a ilusão de um livre-arbítrio. Freqüentemente, para nós, de fato parece que poderíamos ter decidido agir de um modo diferente do qual agimos.

 

Então por que evoluímos a ilusão de um livre-arbítrio? Parcialmente, isso está relacionado ao fenômeno da consciência, mas também ao auto-engano. Se conseguir enganar a mim mesmo, pensando que sou uma boa pessoa, então terei muito mais êxito em enganar os outros e fazê-los pensar o mesmo. Na realidade, no fundo, todos os nossos instintos atuam em função da auto-satisfação. Apenas sou uma boa pessoa porque, em longo prazo, sê-lo me é conveniente. Se me convencer profundamente de que sou uma pessoa boa, então não irei ceder à tentação de ser mau em troca de uma vantagem de curto prazo. Serei uma pessoa boa de modo consistente, e os benefícios da bondade são muito maiores àqueles que agem assim. A ilusão do livre-arbítrio faz sentir que estou escolhendo ser bom, e, se estou escolhendo ser bom, tendo a escolha de ser mau, então devo ser realmente uma pessoa boa, certo?

 

Pessoas que fossem hipnotizadas para gritar 'Golaço!' com toda a força todas as vezes que alguém falasse a palavra 'Chute' darão motivos totalmente espúrios se forem questionadas sobre o motivo de terem gritado. Elas fazem o que fazem apesar de não saberem o porquê. A ilusão do livre-arbítrio nos protege de nossos verdadeiros motivos. A Psicologia evolutiva é em grande parte o estudo de nossos motivos subconscientes. Aqueles que a estudam constatam repetidamente que nossos motivos simplesmente acontecem de coincidir com a estratégia que maximizaria o número de genes que poderão ser repassados. Homens não escolhem pensar que mulheres de vinte anos são mais atraentes do que as de oitenta anos – simplesmente pensam assim. E simplesmente acontece que homens que pensam assim podem transmitir mais genes, pois mulheres de oitenta anos não podem engravidar. Isso não é coincidência. Similarmente, pessoas que foram enganadas por irmãos têm muito mais chances de conceder perdão do que aquelas que foram enganadas por indivíduos sem parentesco. O perdoador potencial compartilha genes com seus irmãos, e, por isto, há um interesse genético compartilhado. A pessoa que foi enganada pode sentir que tem a opção de não perdoar seu irmão, mas perdoar seu amigo, contudo, não tem. A ilusão do livre-arbítrio evita que o indivíduo perceba a verdade e assim aja mais eficientemente em função de seus genes. Se o indivíduo soubesse a verdade, poderia começar a agir contrariamente aos interesses de seus genes. Talvez algumas pessoas no passado tenham feito isso, mas provavelmente não se tornaram nossos ancestrais (mas, ainda assim, não tinham livre-arbítrio).

 

Bem, então não tenho livre-arbítrio. Posso sentar-me e aproveitar esta viagem de montanha-russa que é a vida. Nem mesmo sei o que farei daqui a pouco. Interessante, não?

 

 

 

 


 

Texto original em:

http://www.lloydianaspects.co.uk/
evolve/freewill.html

Tradução em Ateus.net:

http://ateus.net/artigos/psicologia/
por_que_nao_tenho_livre_arbitrio.php

 

 

 

 

 

 

 

 

Ainda que o livre-arbítrio tenha sido criticado por Baruch de Spinoza (1632 – 1677) e por Karl Heinrich Marx (1818 – 1883), eu tenho certeza de que tenho livre-arbítrio, e isto é muito ótimo. Aquele que compreendeu a Lei de Thelema fará coro comigo.1

 

Em um verbete da Wikipédia (a enciclopédia livre) está exposto: A existência do livre-arbítrio tem sido uma questão central na História da Filosofia e na História da Ciência. O conceito de livre-arbítrio tem implicações religiosas, morais, psicológicas e científicas. Por exemplo, no domínio religioso o livre-arbítrio pode implicar que uma divindade onipotente não imponha seu poder sobre a vontade e as escolhas individuais. Em Ética, o livre-arbítrio pode implicar que os indivíduos possam ser considerados moralmente responsáveis pelas suas ações. Em Psicologia, ele implica que a mente controla certas ações do corpo. [E no campo da Ciência e da Política, não foi nada mais nada menos do que o livre-arbítrio que pariu o Little Boy e o Fat Man que destruíram, respectivamente, Hiroshima e Nagazaki.] Há várias visões sobre a existência da 'liberdade metafísica', isto é, se as pessoas têm o poder de escolher entre alternativas genuínas. Determinismo é a doutrina que afirma serem todos os acontecimentos, inclusive vontades e escolhas humanas, causados por acontecimentos anteriores, ou seja, o homem é fruto direto do meio, logo, destituído de liberdade de decidir e de influir nos fenômenos em que toma parte. O Determinismo rejeita a idéia que os homens têm algum livre-arbítrio. Em oposição ao Determinismo, encontramos o Libertarianismo [cujas raízes remontam ao Jusnaturalismo racional, ao Liberalismo clássico e aos founding fathers americanos], posição que defende que os indivíduos têm livre-arbítrio pleno e, por isto, rejeita o Determinismo. Indeterminismo é uma forma de Libertarianismo que defende a visão que as pessoas têm livre-arbítrio, e que ações apoiadas no livre-arbítrio são efeitos sem causas. Mas há os que crêem e defendem que, ao invés de a volição ser um efeito sem causa, o livre-arbítrio e a ação do agente sempre produzem o evento. Compatibilismo é a visão que o livre-arbítrio emerge mesmo em um Universo sem incerteza metafísica. Compatibilistas podem definir o livre-arbítrio como emergindo de uma causa interior, por exemplo os pensamentos, as crenças e os desejos. Seria, resumidamente, o livre-arbítrio que respeita as ações ou pressões (internas e externas). A filosofia que aceita tanto o Determinismo quanto a liberdade de escolhas é chamada de 'Soft Determinism' [ou Determinismo moderado ou mitigado], expressão cunhada por William James (1842 – 1910) para designar o que hoje chamamos de livre-arbítrio compatibilista. E Incompatibilismo é a visão que não há maneira de reconciliar a crença em um Universo determinístico com um livre-arbítrio verdadeiro.

 

Isto dito, discutirei, agora, breve e suavemente, sem grandes complicações, o texto de Nikolas Lloyd. Em primeiro lugar, repito: eu tenho certeza de que tenho livre-arbítrio, e isto é ótimo. Não me desespero com os reveses da vida, não faço sofrer, nem vivo para sofrer.2

 

Em segundo lugar, o erro crasso da argumentação inicial de Nikolas Lloyd é: é meu cérebro que controla meu comportamento. Tagarelar e argumentar infundadamente são, ao mesmo tempo, coisas fáceis e irresponsáveis; o busílis é elaborar correta e cocertadamente um pensamento! Ora, como entendem os Rosacruzes, o cérebro é apenas um órgão físico para que a mente possa funcionar; nada mais, nada menos, do que isto. No entanto, a mente pode produzir um sem-fim de manifestações sem o uso ou a participação do cérebro. Logo, há uma nítida distinção entre cérebro e mente, ainda que, fora do domínio Iniciático, não haja consenso sobre a natureza da mente. Os dualistas defendem a tese da distinção entre mente e corpo. Os monistas defendem a tese da identidade entre mente e corpo. Os epifenomenalistas defendem a idéia de que as atividades mentais são meros subprodutos dos processos neurais e não possuem influência causal sobre o curso dos fenômenos físicos ou mentais. E há os 'despreocupacionistas', como eu, que, admitindo compreender como a coisa toda funciona, não dão a menor bola para esses conceitos, pois adotaram um modo de pensar e de proceder efetivamente categórico. A regrinha é simples: fazer o bem não importa a quem. Como está registrado no final do parágrafo anterior, como eu, os 'despreocupacionistas' não se desesperam com os reveses da vida, não fazem sofrer, nem vivem para sofrer. Agora, acrescento: auxiliam, no que podem, mas sem alterar as necessárias experiências educativo-retributivas, a minimizar o padecimento dos outros.

 

Voltando ao entendimento Rosacruz, insisto, o místico estabelece importante distinção entre cérebro e mente. O cérebro, como explica o Manual Rosacruz da AMORC, é o órgão físico para uma parte do funcionamento concertado da mente, do mesmo modo que os pulmões são órgãos específicos de funcionamento da respiração. Assim, óbvio, a mente não poderá, relativamente, funcionar via pulmões, como a respiração não poderá se dar no cérebro. E, que eu saiba, ninguém faz xixi pelo dedão do pé esquerdo nem faz cocô pelo dedão da mão direita, apesar de haver certas anomalias embriogenéticas (também chamadas de defeitos de nascimento), como, por exemplo, o coração estar localizado do lado direito do tórax. Mas, há anomalias geneticamente mais graves relativas a defeitos de nascimento, como, por exemplo, lábios leporinos, anencefalia e septo ventricular, todas derivadas do consumo de água clorada por gestantes, segundo estudo realizado pela Universidade de Birmingham, na Grã-Bretanha. Os mecanismos biológicos que fazem os derivados do cloro causar defeitos nos bebês ainda são desconhecidos, explicou Jouni Jaakkola, principal autor do estudo. E acrescentou: No entanto, nossas descobertas não apenas reforçam a teoria de que a água clorada pode causar defeitos de nascimento, mas sugere que a exposição aos derivados do cloro pode ser responsável por defeitos comuns e específicos. A pesquisa sobre o impacto da exposição ao cloro na gravidez está publicada na edição de junho da revista científica Journal of Environmental Health.

 

 

Pulmões

 

 

A mente se manifesta através do cérebro, de maneira considerável, porém, não exclusivamente através deste órgão. É possível à mente funcionar de muitas maneiras, após a remoção do cérebro. Isto já foi demonstrado à saciedade em malditas vivissecções torturantes de animais. Seja como for, a mente está dividida em dois campos básicos de atividade: o campo subconsciente e o campo objetivo. O objetivo, por seu turno, está associado com aspectos subjetivos, como, por exemplo, a memória, a imaginação, a emoção, o sentimento e o pensamento. Geralmente, a subjetividade é entendida como sendo a realidade psíquica, emocional e cognitiva do ser humano, passível de se manifestar simultaneamente nos âmbitos individual e coletivo, e comprometida com a apropriação intelectual dos objetos externos, ou seja, é o espaço íntimo do indivíduo (mundo interno) com o qual ele se relaciona com o mundo social (mundo externo), resultando tanto em marcas singulares na formação do indivíduo quanto na construção de crenças e de valores compartilhados na dimensão cultural, que vão, a pouco e pouco, constituir a experiência histórica e coletiva dos grupos e das populações. O que isto teve, tem ou poderá ter a ver com um presumido livre-arbítrio do telencéfalo do bucéfalo?

 

 

 

 

Seguindo e argumentando. Como adverte o Manual Rosacruz, embora seja comum falar do campo subconsciente e do campo objetivo como duas mentes, isto não é correto em sentido amplo, pois a nota fundamental que rege e regula o Cósmico, em tudo e para tudo, é o Princípio de Unidade. Mas o que efetivamente temos que compreender é que, em princípio, a mente do homem é imortal porque é parte da personalidade-Alma e, desde sempre, parte inseparável da Alma Universal. Já o cérebro, como todos os outros órgãos físicos, é 'degenerável', 'mortável' e 'poeirável'. E assim, mente e cérebro confirmam a Vulgata, Números, XXIV, 11: cada qual reverterá ad locum suum. O cérebro reverterá ao pó; a mente reverterá ao cósmico. Logo, a mente e a personalidade continuarão a existir após a morte, e retêm, como parte de seus atributos, o completo armazém da memória. O cérebro virará pó. O que isto teve, tem ou poderá ter a ver com um presumido livre-arbítrio do telencéfalo do bucéfalo?

 

Quem sabe o significado do que é projeção sabe que em todo trabalho psíquico o corpo psíquico utiliza o funcionamento subconsciente da mente como sua consciência essencial, estando a mente subconsciente, nesta circunstância, em grande atividade, enquanto o cérebro continua 'telencefalando' na dele. Mas, francamente, o que isto teve, tem ou poderá ter a ver com um presumido livre-arbítrio do telencéfalo do bucéfalo?

 

Então, concedendo e admitindo que o ente não tenha livre-arbítrio, quem tem? Porventura será o cérebro, como parece crer e querer que tenha Nikolas Lloyd? Será o cérebro que registra a hilaridade de uma piada e faz o ente rir? Se a mente consciente não sabe qual decisão tomar, se compra ou se não compra óculos de sol, se vai passear em Nova Iorque ou no Iraque, se assoa o nariz ou se tira a cagaita e come, quem determinará a decisão a ser tomada? Serão as reações bioquímicas e biofísicas do cérebro?

 

 

 

 

 

 

O cérebro ou telencéfalo (que juntamente com o diencéfalo constitui o prosencéfalo), em tudo o que acima foi exposto, fica exatamente no mesmo lugar, bem quietinho e comportadinho, é absolutamente limitado em poder, e, mais do que evidente, não tem qualquer livre-arbítrio e não determina nada. Nós, sim, como extensões da Consciência Cósmica, somos responsáveis por tudo, determinamos tudo, escolhemos tudo, e retribuímos tudo na exatíssima medida de nossas opções. Imagine só um cérebro com livre-arbítrio ou impedindo que o livre-arbítrio humano se manifeste! Estaríamos todos abrumados y mal pagados.

 

O cérebro é exatamente o oposto do que pensam Nikolas Lloyd e os deterministas, que insistem que tudo no Universo – até mesmo a vontade humana está submetido a leis necessárias e imutáveis, de tal forma que o comportamento humano está totalmente predeterminado pela Natureza, e o sentimento de liberdade não passa de uma ilusão subjetiva, ainda que, de maneira geral, tudo no Universo, de acordo com cada Plano ou Dimensão, esteja mesmo submetido a leis necessárias e imutáveis.

 

O cérebro, em realidade, pode relativamente pouco; a mente pode relativamente (quase) tudo. Como o próprio autor do texto que estou discutindo reconhece, o cérebro é, como toda matéria, constituído inteiramente de elementos químicos. Bolas! Eu não quero discutir nem argumentar mais nada. Cansei; e acho que estou cansando o leitor! Mas, caramba! Desde quando os elementos químicos têm livre-arbítrio? Como químico, jamais vi uma reação química possível se recusar a acontecer. Quem decide se ela irá ou não ocorrer é o químico, e não os átomos, moléculas, cationtes ou aniontes que dela eventualmente poderão participar. Todavia, qualquer um que adicione, em um tubo de ensaio, por exemplo, uma solução de cloreto de bário a uma solução de sulfato, verá, imediatamente, acontecer a precipitação do sulfato de bário.

 

Ba++  +  [SO4]=  —›  BaSO4

 

Definitivamente, o homem não é um joão-teimoso, não é um joão-redondo, não é um joão-ninguém, não é um joão-bucéfalo, não é um joão-bestalhão, e, muito menos é um joão-sem-livre-arbítrio. É, sim, um ser em peregrinação expectando se transmutar em um deus. Homo est naturaliter liber, et, in posse, est deus. O homem é livre por natureza, e, em potência, é um deus.3

 

Enfim, acho que o autor – ainda que em boa intenção, mas em alguma proporção – escorregou e confundiu livre-arbítrio com reflexo condicionado4, pois não há exagero (determinista e condicionador) maior do que afirmar que o homem é fruto direto do meio, logo, destituído de liberdade de decidir e de influir nos fenômenos em que toma parte. Contudo, sem o reflexo condicionado não há uma verdadeira adaptação ao meio, e, nós, humanos, também nos comportamos, em grande medida, com base em reflexos condicionados.

 

Por último, penso que a vida não seja nem uma montanha-russa nem um liqüidificador de alta rotação; poderá até ser, se o indivíduo tiver vocação para joão-cagalhão-boiador, como esse inocente (in)útil aí embaixo, que sob e desce e vai para direita e para a esquerda ao sabor do movimento das ondas. Cada um de nós é uma estrela e gira em torno de si mesmo, criando uma órbita particular, como diz Johann Heyss no texto Thelema e a Verdadeira Vontade. Assim, o desenvolvimento espiritual só pode se dar quando o indivíduo descobre o seu próprio caminho, o qual será necessariamente único e indivisível – o que revela a fragilidade dos sistemas religiosos em geral, que procuram unificar os seres humanos através de regras de conduta blasfemas e artificiais, que ferem a individualidade e a divindade do Homem.

 

 


João-cagalhão-boiador

 

 

 

 

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Notas:

1. A Palavra da Lei é Thelema (). O estabelecimento da Lei de Thelema, segundo Aleister Crowley (1875 – 1947), é a única forma de preservar a liberdade individual e de assegurar o futuro compreensivo da Humanidade. Do what thou wilt shall be the whole of the Law. Faze o que tu queres e será toda a Lei.

2. Originalmente, este pensamento é de Lucius Annæus Seneca (4 a.C. – 65 d.C.), que, exatamente, é assim: Considero covarde aquele que morre por medo de sofrer e idiota aquele que vive para sofrer. Citei Seneca, mas, em parte, não concordo com ele, pois aquele que morre por medo de sofrer não é tanto um covarde; talvez, sem fazer qualquer juízo de valor, se possa pensar em incompetência para viver e para suportar os padecimentos retributivos-educativos que a vida (e a Vida) oferece amorosamente a todos nós. Agora, quem vive para sofrer e para se supliciar, infelizmente, é mesmo, mais ou menos, um pobre idiota.

3. Originalmente, este pensamento aparece na Summa Theologiæ, de S. Tomás de Aquino: Homo est naturaliter liber. O homem é livre por natureza. Et, in posse, est deus (e, em potência, é um deus) é por minha conta.

4. A idéia básica do condicionamento clássico consiste em que algumas respostas comportamentais são reflexos incondicionados, ou seja, são inatas em vez de aprendidas, enquanto que outras são reflexos condicionados, aprendidos através do emparelhamento com situações agradáveis ou aversivas, simultâneas ou imediatamente posteriores. Através da repetição consistente desses emparelhamentos é possível criar ou remover respostas fisiológicas e psicológicas em seres humanos e animais. Essa descoberta abriu caminho para o desenvolvimento da Psicologia Comportamental e mostrou ter ampla aplicação prática, inclusive no tratamento de fobias e nos anúncios publicitários. Tudo isto se deve ao fisiólogo russo Ivan Petrovich Pavlov (1849 – 1936), que a partir de suas descobertas sobre os processos digestivos de animais, entraria para a história por sua pesquisa no papel do condicionamento na Psicologia do Comportamento (reflexo condicionado).

 

Bibliografia:

LEWIS, H. Spencer (supervisão). Manual rosacruz. 6ª edição. Coordenação de Maria A. Moura. Biblioteca Rosacruz. Volume especial. Rio de Janeiro: Editora Renes, s. d.

 

Páginas da Internet consultadas:

http://www.rizoma.net/
interna.php?id=130&secao=ocultura

http://www.newstin.com.pt/pt/inicio

http://en.wikipedia.org/wiki/Enzyme

http://pt.wikipedia.org/wiki/Reflexo_condicionado

http://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%A9rebro

http://pt.wikipedia.org/wiki/Subjetividade

http://pt.wikipedia.org/wiki/Mente

http://pt.wikipedia.org/wiki/Livre-arb%C3%ADtrio

 

Fundo musical:

You Are My Destiny
Compositor e intérprete: Paul Anka