KÓSMOS

 

 

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

 

Como seria possível o Eterno Um

deixar de ser Um para ser dois?1

Passaria, então, o Eterno Um

a ser a soma daqueles dois?

 

Seria o Eterno Um teleológico?

Haveria no Eterno Um finalidade?

Seria tudo isso alógico2 ou ilógico?

Ou seria uma solércia da realidade?

 

O Um e o Kósmos não tiveram estréia.

Equivoca-se toda e qualquer teodicéia

que insista em ensinar o contrário.

 

Em verdade, qualquer representação

ou é uma ilusão ou é uma superstição.

O devir no vir-a-ser é o corolário.3

 

 

 

 

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Notas:

1. Dois ou 'zilhões' é a mesma coisa.

2. Alógico no sentido de que não necessita de demonstração por ser tido como evidente, certo e verdadeiro.

3. Vir-a-ser... vir-a-ser... vir-a-ser... vir-a-ser... vir-a-ser... vir-a-ser... vir-a-ser... Resumo: ininterrupção do eterno processo no inexistente binômio tempo-espaço. Logo, céu e inferno (imobilidades impossíveis) não podem existir como ponto final de nada (pois não pode existir sequer ponto final para nada), admitindo-se que o que caracteriza o Eterno Um (que é e existe necessariamente) e o Kósmos (que é e existe necessariamente) é a necessária mudança, que tem por substrato o necessário movimento, no imperscrutável necessário vir-a-ser (mais concertadamente, o vir-a-ser é o próprio é ou agora). Precisamos, como decorrência libertadora, compreender que o pecado representa apenas uma violação daquilo que foi concebido pelo homem como bem, como certo ou como direito, ou seja, pecar representa o mal. Ora, esse mal não pode afetar o Eterno Um e tampouco o Kósmos, que são o que sempre foram, sem começo nem fim e inalteráveis pelas ações humanas. O mal que alguém pratique é praticado primeiro contra si. E o Svmmvm Bonvm, inerente ao Eterno Um e ao Kósmos, jamais poderá ser integralmente conhecido e inteiramente realizado, inclusive por ser ideal. A última realidade é que o homem necessita de parâmetros para poder existir; recolhe esses parâmetros em sua própria experiência de vida (objetiva, subjetiva e subconsciente); e, fatal e finalmente, transfere esses parâmetros para a(s) divindade(s) que presume que exista(m). Definir o Eterno Um e o Kósmos segundo os padrões humanos significa esperar de ambos respostas humanas para os anseios e as aflições humanas. Enfim, como conclusão destas lucubrações, de duas uma: ou somos todos religiosos (cada um à sua maneira) ou somos todos ateus (cada um à sua maneira). Mas, um exame acuradamente dialético dessa matéria havera de concluir que somos mesmo todos misticamente ateus. Paradoxo? Não. Ateísmo Místico que em nada se aproxima ou converge nem para o Panteísmo nem para o Solipsismo. [Doutrina segundo a qual a única realidade no mundo é o eu. Segundo Temístocles Linhares em sua Introdução ao Mundo do Romance, o solipsismo é a atitude que consiste em sustentar que o eu individual de que se tem consciência, com as suas modificações [e interpretações] subjetivas, é que forma toda a realidade.]