Fragmentos
Marxistas
A
grandeza relativa do elemento do preço, que representa apenas o valor
dos meios de produção consumidos ou a parte constante do capital,
está sempre na razão direta; a grandeza relativa do outro
elemento do preço, que representa a parte que paga o trabalho ou
a parte variável do capital, está, geralmente, na razão
inversa do progresso da acumulação.
Com
a crescente produtividade do trabalho, não apenas se eleva o volume
dos meios de produção por ele utilizados, mas, cai o valor
deles em comparação com seu volume.
Todos
os métodos de elevar a força produtiva social do trabalho,
são, ao mesmo tempo, métodos de elevar a produção
de mais-valia ou mais-produto, que, por sua vez, é o elemento constitutivo
da acumulação. São, por conseguinte, métodos
para produzir capital mediante capital ou métodos de sua acumulação
acelerada.
A
contínua retransformação de mais-valia em capital se
apresenta como grandeza crescente do capital que entra no processo de produção.
Este se torna, por sua vez, fundamento para uma escala ampliada de produção,
dos métodos que o acompanham para a elevação da força
produtiva do trabalho e produção acelerada de mais-valia.
Se, portanto, certo grau de acumulação de capital aparece
como condição do modo de produção especificamente
capitalista, este último ocasiona em reação uma acumulação
acelerada do capital. Com a acumulação do capital, se desenvolve,
portanto, o modo de produção especificamente capitalista,
e, com modo de produção especificamente capitalista, a acumulação
do capital. Esses dois fatores econômicos criam, de acordo com a relação
conjugada dos impulsos que eles se dão mutuamente, a mudança
na composição técnica do capital, pela qual a componente
variável se torna cada vez menor comparada à constante.
Toda
acumulação se torna meio de nova acumulação.
Ela amplia, com a massa multiplicada da riqueza, que funciona como capital,
sua concentração nas mãos de capitalistas individuais,
e, portanto, a base da produção em larga escala e dos métodos
de produção especificamente capitalistas.
Acumulação
—
Só havendo irracionalidade
eu poderei acumular.
—
Só havendo insensatez
eu poderei acumular.
—
Só havendo proletariado
eu poderei acumular.
—
Só havendo carência
eu poderei acumular.
—
Só havendo privação
eu poderei acumular.
—
Só havendo necessidade
eu poderei acumular.
—
Só havendo fome
eu poderei acumular.
—
Só havendo miséria
eu poderei acumular.
—
Só havendo penúria
eu poderei acumular.
—
Só havendo diferença
eu poderei acumular.
—
Só havendo desproporção
eu poderei acumular.
—
Só havendo deseqüidade
eu poderei acumular.
—
Só havendo ignorância
eu poderei acumular.
—
Só havendo analfabetismo
eu poderei acumular.
—
Só havendo inverno
eu poderei acumular.
—
Só havendo caverna
eu poderei acumular.
—
Só havendo abismo
eu poderei acumular.
—
Só havendo deserto
eu poderei acumular.
—
Só havendo cagaço
eu poderei acumular.
—
Só havendo relambóia
eu poderei acumular.
—
Só havendo escravidão
eu poderei acumular.
—
Só havendo submissão
eu poderei acumular.
—
Só havendo exploração
eu poderei acumular.
—
Só havendo mais-valia
eu poderei acumular.
—
Só havendo mais-trabalho
eu poderei acumular.
—
Só havendo Capitalismo
eu poderei acumular.
—
Só havendo união dos capitalistas
eu poderei acumular.
—
Só havendo desfraternidade
eu poderei acumular.
—
Só havendo separatividade
eu poderei acumular.
A
concorrência e o crédito são as duas mais poderosas
alavancas da centralização.
O
material humano está sempre pronto para ser explorado.
No
sistema de produção capitalista, efeitos acabam se tornando
causas, e as alternâncias de todo o processo, que reproduz continuamente
suas próprias condições, assumem a forma de periodicidades.
Com
capital do mesmo valor, o capitalista pode comprar mais forças de
trabalho ao deslocar progressivamente força de trabalho mais qualificada
por menos qualificada, madura por imatura, masculina por feminina e adulta
por adolescente ou infantil.
— Você
é um operário qualificado.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um menos qualificado.
— Você
é um operário muito vivo.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um meio morto.
— Você
é um operário muito expedito.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um meio pachorrento.
— Você
é um operário antigo e caro.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um + novo e + barato.
— Você
é um operário que mora longe.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um que more perto.
— Você
é um operário que tem família.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um sem família.
— Você
é um operário que teve um infarto.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um que tenha saúde.
— Você
é um operário masculino.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por uma operária feminina.
— Você
é um operário adulto.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um adolescente.
— Você
é um operário reivindicador.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um que não reivindique.
— Você
é um operário improdutivo.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um que seja produtivo.
— Você
é um operário sindicalizado.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um não-sindicalizado.
— Você
é um operário irreligioso.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um que seja religioso.
— Você
é um operário que gosta de sassaricar.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um que goste de ajoelhar e rezar.
— Você
é um operário negro.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um que seja branco.
— Você
é um operário homossexual.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um que seja heterossexual.
— Você
é um operário que obra pra todo pau.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um que seja pau pra toda a obra.
— Você
é um operário muito antipático.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um que seja simpático.
— Você
é um operário careca.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um que tenha cabelos.
— Você
é um operário muito operário.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um menos operário.
— Você
é um operário que me dá prejuízo.
Danou-se, meu chapa!
Vou trocá-lo por um que me dê lucro.
Normalmente,
o trabalhador rural é rebaixado para o mínimo do salário,
e está sempre com um pé no pântano do pauperismo.
O
pauperismo constitui o asilo para inválidos do exército ativo
de trabalhadores e o peso morto do exército industrial de reserva.
Quanto
maiores forem a riqueza social, o capital em funcionamento e o volume e
a energia de seu crescimento, portanto, também, a grandeza absoluta
do proletariado e a força produtiva de seu trabalho, tanto maior
será o exército industrial de reserva.
Quanto
maior for a camada lazarenta da classe trabalhadora e o exército
industrial de reserva, tanto maior será o pauperismo oficial. Essa
é a lei absoluta geral da acumulação capitalista.
A
população trabalhadora sempre cresce mais rapidamente do que
a necessidade de valorização do capital. [Daí,
entre outras causas, o desemprego e a miséria crescentes em todo
o Planeta. Por isto, e por diversos outros motivos – particularmente,
de ordem espiritual –
o controlo da natalidade
deve ser examinado com acuidade, relevância, importância e urgência,
o que, de forma alguma, significa interrupção prematura ou
se justifica por meio do aborto, seja seguro, seja inseguro, seja legal,
seja clandestino. O que não é possível nem racional
é um casal ter 8, 10, 12 filhos, principalmente, não tendo
meios nem condições de mantê-los e educá-los.
No mínimo, isto é, ao mesmo tempo, uma irresponsabilidade
e uma ilicitude, e o preço compensatório (kármico)
a ser pago por permitir encarnações a bangu, que acabarão
se tornando desamparadas, delinqüidas, deseducadas, abandonadas e desvalidas,
oportunamente, será mais do que altíssimo. Esse negócio
de frutificai, multiplicai-vos
e povoai abundantemente a Terra (Gênesis: IX,
7) não é mesmo bem assim. Bem, se um dia foi, hoje, não
é mais. Este breve comentário não foi duro, nem cruel
e não tem nada a ver com o Socialismo Utópico nem com as idéias
de Saint-Simon (1760 – 1825), Charles Fourier (1772
– 1837), Louis Blanc (1811
– 1882)
e Robert Owen (1771
– 1858);
simplesmente, foi verídico e é aceitável pela razão.]
—
Eu sou pobre, pobre,
pobre,
e minha única alegria é transar.
—
E sendo pobre,
muito pobre,
muitos filhos eu quero ter.
—
Para quem é
pobre, como eu,
filho é uma tábua de salvação.
—
É como caderneta
de poupança:
ajunta hoje, usufrutua amanhã.
—
E quando eu ficar
velhinho,
eles é que irão me sustentar.
—
Filho é
um bom investimento.
Ora, quem é pobre sabe disso.
—
Eu sou pobre, pobre,
pobre,
e quanto mais filhos melhor.
Dentro
do sistema capitalista, todos os métodos para a elevação
da força produtiva social do trabalho se aplicam à custa do
trabalhador individual. [
trabalhadores individuais = trabalhador coletivo.] Todos
os meios para o desenvolvimento da produção se convertem em
meios de dominação e exploração do produtor
e mutilam o trabalhador, transformando-o em um ser parcial, que o degradam
e o tornam um apêndice da máquina. Aniquilam, com o tormento
de seu trabalho, seu conteúdo, alienando as potências espirituais
do processo de trabalho, na mesma medida em que a ciência é
incorporada a este último como potência autônoma. Desfiguram
as condições dentro das quais ele trabalha, submetendo-o,
durante o processo de trabalho, ao mais mesquinho e odiento despotismo,
e transformam seu tempo de vida em tempo de trabalho, jogando sua mulher
e seus filhos sob a roda de Juggernaut do capital. [Juggernaut
é um termo usado na língua inglesa, especialmente nos Estados
Unidos, como sinônimo de uma força literal ou metafórica
impiedosamente destrutiva e imparável. Este uso se originou em meados
do século XIX, como uma referência alegórica ao carro
Ratha Yatra dos templos hindus, que, apocrifamente, tinham fama
de esmagar os devotos sob suas rodas. O sentido figurado desta palavra é
traduzível para o português brasileiro como rolo compressor.]
Mas, todos os métodos de produção da mais-valia são,
simultaneamente, métodos de acumulação, e toda expansão
da acumulação se torna, reciprocamente, meio de desenvolver
aqueles métodos. Segue portanto que, à medida que se acumula
capital, a situação do trabalhador, qualquer que seja seu
pagamento, alto ou baixo, tem de piorar. Finalmente, a lei que mantém
a superpopulação relativa ou exército industrial de
reserva, sempre em equilíbrio com o volume e a energia da acumulação,
prende o trabalhador mais firmemente ao capital do que as correntes de Hefesto
agrilhoaram Prometeu ao rochedo. Ela ocasiona uma acumulação
de miséria correspondente à acumulação de capital.
A acumulação da riqueza num pólo é, portanto,
no pólo
oposto e ao mesmo tempo, a acumulação da miséria,
do tormento de trabalho, da escravidão, da ignorância, da brutalização
e da degradação moral, isto é, do lado da classe trabalhadora,
aquela que produz seu próprio produto como capital. O compositor,
economista, matemático, monge camaldulense [da
Ordo Sancti Benedicti Camaldulensis]
e filósofo veneziano Giovanni
Maria Ortes (março de 1713 –
1790), um dos grandes escritores econômicos do século XVIII,
apreendeu o antagonismo da produção capitalista como lei natural
genérica da riqueza social, e registrou: O
bem econômico e o mal econômico, em uma ação,
sempre se mantêm em equilíbrio, e a abundância dos bens
para uns é sempre igual à penúria dos mesmos para outros.
A grande riqueza de alguns é sempre acompanhada de privação
absoluta do necessário para muitos outros. A riqueza de uma nação
corresponde à sua população, e sua miséria corresponde
à sua riqueza. A diligência de uns impõe a ociosidade
a outros. Os pobres e ociosos são fruto necessário dos ricos
e ativos.
—
Quem mandou você vir ao mundo
sem uma colher de ouro na boca?
—
Quem mandou você vir ao mundo
sem um salvo-conduto para a riqueza?
—
Quem mandou você vir ao mundo
a fórceps, sem fralda e sem chupeta?
—
Quem mandou você vir ao mundo
com uma vassoura de piaçaba na mão?
—
Quem mandou você vir ao mundo
com um grilhão enganchado na perna?
—
Quem mandou você vir ao mundo
sem esperança-expetação-possibilidade?
—
Quem mandou você vir ao mundo
sem padrinho e sem madrinha?
—
Quem mandou você vir ao mundo
em uma noite chuvosa de inverno?
—
Quem mandou você vir ao mundo
como um erro de segunda espécie?
—
Quem mandou você vir ao mundo
como um aborto não levado a efeito?
—
Quem mandou você vir ao mundo
com a vocação para ser humilhado?
—
Quem mandou você vir ao mundo
com a vocação para ser desrespeitado?
—
Quem mandou você vir ao mundo
com a vocação para ser desprezado?
—
Quem mandou você vir ao mundo
com a vocação para ser desvalorizado?
—
Quem mandou você vir ao mundo
com a vocação para ser escravizado?
—
Quem mandou você vir ao mundo
com a vocação para ser explorado?
—
Quem mandou você vir ao mundo
a trouxe-mouxe, sem eira nem beira?
—
Quem mandou você vir ao mundo
filho de ignorantes, boçais e bocós?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para servir de massa de manobra?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ser e viver como burro de carga?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ser e viver como burro-sem-rabo?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para realizar as tarefas mais servis?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para realizar as tarefas mais ignóbeis?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para exercer as tarefas mais maçantes?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para exercer as tarefas mais sórdidas?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para exercer as tarefas mais repugnantes?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para exercer as tarefas mais degradantes?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para fazer parte do bloco do zé-quitólis?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para servir de frango de macumba?
—
Quem mandou você vir ao mundo
apenas para guardar lugar na fila?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para nadar e acabar morrendo na praia?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ver e não ver e ouvir e não ouvir?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para só comer farofa com farofa?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para, ajoelhado, ficar pedindo por favor?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para não passar da cepa torta?
—
Quem mandou você vir ao mundo
labrosta e continuar analfabeto?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para produzir mais do que consome?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para produzir riqueza para os outros?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para trabalhar enquanto eu descanso?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para aumentar meu luxo e meu prazer?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ser a lenha da minha lareira?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ser a ventarola do meu calor?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ser uma das mós do meu moinho?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ser a bujarrona do meu iate?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ser o carvão do meu churrasco?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ser a torradinha do meu caviar?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ser a gasolina da minha limusine?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ser o estrume da minha horta?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para me propiciar 'dolce far niente'?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ser bucha da minha mais-valia?
—
Quem mandou você vir ao mundo
para ser engrenagem de mais-trabalho?
—
Quem mandou você vir ao mundo
esquecido e mal-aventurado por Deus?
—
Quem mandou você vir ao mundo
sem nenhuma chance de se alforriar?
—
Quanto a mim, só posso levar vantagem.
Enquanto você existir, não andarei a pé.
Henry
Fawcett (26 agosto de 1833 – 6 novembro de 1884):
Os ricos se tornam rapidamente mais ricos (the
rich grow rapidly richer), enquanto não há
nenhum acréscimo perceptível no conforto das classes trabalhadoras.
Os trabalhadores se tornam quase escravos dos comerciantes, dos quais são
devedores.
Que
são inúmeros os casos em que a deficiência alimentar
causa ou agrava doenças há de confirmá-lo qualquer
um que esteja familiarizado com a prática médica com indigentes
ou com pacientes dos hospitais, sejam eles internados ou morem fora. No
entanto, do ponto de vista sanitário, se acrescenta outra circunstância
decisiva: é preciso lembrar que a privação de alimentos
é suportada com muita relutância e que, em regra, dietas muito
deficientes só ocorrem quando outras privações as precederam.
Muito antes de a insuficiência alimentar ter passado a gravitar no
plano da higiene, muito antes de o fisiólogo pensar em contar os
grãos de nitrogênio e carbono, entre os quais oscila a vida
e a morte por inanição, a economia doméstica já
terá sido despojada de todo conforto material. O vestuário
e o aquecimento ter-se-ão tornado ainda mais escassos do que a comida.
Nenhuma proteção suficiente contra o rigor do inverno; redução
do espaço de moradia a um grau que gera enfermidades ou as agrava;
ausência quase total de utensílios domésticos ou de
móveis; a própria limpeza ter-se-á tornado custosa
ou difícil. Se, por dignidade pessoal, ainda se tenta mantê-la,
cada uma dessas tentativas representa suplícios adicionais de fome.
O lar há de ser onde o teto for mais barato; em áreas onde
a polícia sanitária dá menos fruto, é mais lamentável
o sistema de esgoto, menor o tráfego, máxima a imundície
pública, mais miserável ou pior o suprimento de água
e, em cidades, maior a falta de luz e de ar. Tais são os perigos
sanitários a que a pobreza inevitavelmente está sujeita, quando
essa pobreza inclui carência alimentar. Se a soma desses males constitui
perigo de terrível magnitude para a vida, a mera carência alimentar
já é, em si mesma, horrível. Essas são reflexões
penosas, especialmente quando se recorda que a pobreza que as motiva não
é a merecida pobreza da preguiça. É a pobreza de trabalhadores.
Sim, no que concerne aos trabalhadores urbanos, o trabalho mediante o qual
é comprado o escasso bocado de comida geralmente é prolongado
além de toda medida. E, ainda assim, só em sentido muito restrito
é que se pode dizer que esse trabalho permite a auto-subsistência.
E, em escala muito ampla, a auto-subsistência nominal só pode
ser o maior ou menor percurso na direção do pauperismo.
[Public
Health. Sixth Report etc. for 1863. Londres, 1864.] Quanto
mais rápida a acumulação capitalista, tanto mais miserável
a situação habitacional dos trabalhadores.
—
Isto
melhorou?
A Humanidade avançou?
O que mudou?
Houve mudanças efetivas?
A balança se equilibrou?
A solidariedade aumentou?
A fraternidade se dilatou?
A renda básica universal cresceu?
O desprendimento ancorou e se estabeleceu?
O altruísmo se ampliou?
A acumulação decresceu?
O sobretrabalho se reduziu?
A mais-valia diminuiu?
A escravização desapareceu?
—
.
A PanCOVIDmia pintou, tudo piorou
e pegou até sombra de múmia paralítica de surpresa.
Quem, com medo de virar jacaré-de-papo-amarelo,
cismou de não se vacinar, de repente, se ferrou.
Quem, com medo de desagradar o chefe,
resolveu dar uma de antivacinista, se ferrou também.
—
A pobreza extrema se agigantou.
A fome mundial se agigantou.
A desesperança se agigantou.
A deseqüidade se agigantou.
A informalidade se agigantou.
A desproteção social se agigantou.
O estado de mal-estar social se agigantou.
A taxa de desocupação se agigantou.
A cultura do privilégio se agigantou.
E a riqueza se agigantou.
Os ricos ficaram mais ricos.
Os super-ricos ficaram miliardários.
Os miliardários nem sabem mais o que têm.
A distorção da Democracia se avolumou.
A corrupção se espalhou como praga.
Até quem não era corrupto se arriscou um tiquinho.
As injustiças e as desigualdades se exacerbaram.
Os tiranocratas botaram as manguinhas de fora.
Uma nuvem negra sobre a Terra se formou,
e parece que estamos entregues à própria sorte.
E a tristeza mundial se multiplicou.
Quem era alegre ficou triste;
quem já era triste ficou mais triste.
A Grande Loja Negra festejou,
e no inferno é festa de arromba dia e noite.
95% da nossa Humanidade delirante –
pelo menos! –
não está percebendo o que está a acontecer,
e eu, sinceramente, já nem sei mais se são só
—
Mas,
por que aconteceu tudo isto?
Por que continua a acontecer tudo isto?
Porque permanecemos presos ao passado e à tradição.
Porque cremos em milagres e não fazemos o Dever de Casa.
Porque valorizamos o-que-não-é e desprezamos O-QUE-É.
Porque toldamos o Sol, e adoramos uma 'tintarella di luna'.
Porque a nossa Lanterna está sem Pilha.
Porque a nossa Caneta está sem Tinta.
Porque o nosso Foguete está sem Combustível.
Porque a Bússola do nosso Barco está quebrada.
Porque o Pneu do nosso Carro está furado e não temos Estepe.
Porque, quando Chove, não conseguimos nos Molhar.
Porque perduramos crucifixados na 'Cruz Comum',
e não superamos a samsárica 'Crise da Encarnação'.
—
ao invés de Peregrinar em Movimento Anti-horário.
Porque só pensamos em nós, e deixamos os outros pra lá.
Porque ainda somos superlativamente egoístas.
Porque ainda somos personalistas.
Porque ainda somos exclusivistas.
Porque ainda somos separacionistas.
Porque ainda somos isolacionistas.
Porque ainda somos barulhosos, desassossegados
e não ouvimos a Voz (Interna) do Silêncio.
Porque ainda somos covardes e ineptos,
e não queremos Mudançar.
Porque ainda amordaçamos o nosso Deus Interior,
e deixamos o nosso demônio interno dar as ordens.
Por que ainda preferimos ser magos negros,
e nos locupletar com a desgraça e a miséria dos outros.
Por que ainda somos mortos-vivos sem saber,
cegos, surdos, mudos e paralíticos sem perceber,
ignorantérrimos e alvarinhos sem compreender e sem ascender.
—
Todavia, isto poderá ser
alterado?
Sim, pode(rá), porém, só há um Caminho:
Lutando, diuturnamente, o Bom Combate.