Este
estudo tem por objetivo apresentar para reflexão alguns pensamentos
de Jan Van Ruysbroeck – chamado o Admirável e a Jóia
de Bruxelas – um místico que viveu uma vida gentil e amigável,
ensinando uma mensagem de grande dificuldade, precisamente porque era simples
e sem qualificação. Embora suspeito de heresia e de panteísmo,
Ruysbroeck entrou na mesma linha sagrada de heróis espirituais que
oferecem ajuda e esperança a todos os seres humanos. Seja como for,
Ruysbroeck admitia que Cristo
é nosso noivo e Ele nos convida a vir a Ele.
Breve
Biografia
Jan
van Ruysbroeck nasceu em 1293 ou 1294, próximo a Bruxelas, ordenando-se
padre em 1317. Avesso à degradação corrente no meio
eclesial, formou com dois companheiros uma comunidade longe de Bruxelas,
onde esperava se manter afastado das atividades sociais. Bem sucedido em
sua empreitada, contou com novos adeptos, acabando por regularizar seu modo
de vida adotando a Regra Agostiniana.
Sob
sua influência, a comunidade cresceu e se tornou ponto de peregrinação,
tendo sido visitada por Johannes Tauler e Gerard Groote, fundador da Fraternidade
da Vida Comum, congregação que teria influência sobre
Erasmus e Lutero, difundindo a chamada Devotio
Moderna (a Devoção Moderna antecipou e acompanhou
os movimentos de Reforma do século XVI – um Cristianismo simples,
generoso e tolerante, que não se afastava da ortodoxia), que encontrou
expressão maior em Tomás de Kempis, na Imitação
de Cristo.
Ruysbroeck
continuou sua obra escrita, no seio da comunidade, depois de já ter
escrito em Bruxelas seu famoso Bodas Espirituais. Escreveu vários
tratados espirituais em flamengo, que foram mais tarde traduzidos para o
latim por Laurentius Surius.
Em
suas obras seguiu sempre a idéia de uma divisão tripartite
da espécie humana e do caminho espiritual, também em três
estágios. O primeiro estágio, Vida
Ativa, correspondendo ao homem exterior, volta-se para atos
de virtude e boas obras. O segundo estágio, Vida
Interior, é mais devocional e voltado para amar a Deus
e para os movimentos da vida interior da graça. O terceiro estágio,
Vida Contemplativa,
dirige-se segundo o fluxo e os ritmos da Trindade.
Sorrindo,
Ruysbroeck
passou sem sofrimento
para a existência desencarnada, com a idade de 88 anos, em 2 de dezembro
de 1381.
Pensamentos
Ruysbroeckianos
Minhas
palavras podem ser estranhas, mas aqueles que amam entendem.
—
Sursum
Corda!
Você
será tão santo tanto quanto você desejar ser!
A boa vontade é o fundamento
de todas as virtudes.
O primeiro fruto que nasce da boa
vontade é a pobreza voluntária, que é o segundo degrau
na escada da vida daquele que ama. Aquele que é pobre espontaneamente
leva uma vida livre e desembaraçada da preocupação
por todas as coisas temporais que não lhe são necessárias.
'Non
potestis servire Deo et mammonæ.' Vós não podeis servir
a Deus e ao dinheiro.
O
Reino de Deus. O que é? O Reino de Deus é caridade e amor.
Tudo o que há é comum
a Deus e a todos aqueles que pertencem a família de Deus.
Aquele
que é avaro é estranhamente imprudente e insensato, pois troca
o céu pela Terra, ainda que seja certo que ele deva perdê-la
cedo. O avaro se precipita no Tártaro. Quem morre na avareza certamente
perecerá.
Aquele
que ama o ouro e é cúpido pelos bens da Terra não faz
senão se alimentar de um veneno mortal e beber na fonte da eterna
aflição. E quanto mais bebe, mais sua sede se torna ardente;
e quanto mais fica repleto de bens, mais ele os deseja. E ainda que ele
possua muitos bens, entretanto, ele não está contente: falta-lhe
tudo o que não está com ele; mas o que ele tem lhe parece
pouca coisa ou nada. E ele não é amado por ninguém,
pois, como ele está à mercê do mal da avareza, ele não
merece ser amado. O avaro se parece com os abraços de Satan. Pode-se
comparar, não sem razão, aos abraços do demônio.
Pois tudo de que se apodera, não quer mais largar, mas, retém
na medida, até o último suspiro, tudo o que puder adquirir,
até mesmo pela artimanha ou pela fraude. Então, queira ou
não, perde todas as coisas. E a dor eterna logo se apodera dele,
e isto é mais do que certo, como é semelhante ao inferno que,
qualquer que seja o nome dos condenados que ele recebe, não diz jamais:
é demasiado. E ainda que ele tenha tragado um grande número,
não se sente melhor por isso. Mas, tudo o que ele agarrou retém
fortemente, e sempre, com a goela escancarada, alcança novos hóspedes
para o Tártaro.
A
peste da avareza é a raiz de todos os vícios, de toda improbidade,
e de toda malícia.
Oh!,
Senhor! Ensina-me a fazer a Tua Vontade, pois Tu és o meu Deus.
'Gloria
in excelsis Deo, et in Terra pax hominibus bonæ voltuntatis.' Glória
a Deus nas alturas dos céus, e paz na Terra aos homens de boa vontade.
Enquanto
vivermos nas sombras, não poderemos ver o Sol, pois, como disse São
Paulo, enxergamos obscuramente através de um espelho. Mesmo assim,
a sombra é iluminada pelo Sol, de modo a percebermos a importância
de todas as virtudes e de todas as verdades, que são de valor inestimável
para nossa condição mortal. Mas, se havemos de nos tornar
unos com a luz do Sol, devemos seguir o amor e esquecer de nós mesmos
no sem-caminho, e, então, o Sol nos atrairá, com nossos olhos
cegos, para dentro de seu fulgor, onde possuiremos a unidade com Deus...
Em Sua benevolência, Ele quer ser todo nosso, para nos ensinar a viver
nas riquezas das virtudes. Em Seu toque interno, todos os nossos poderes
nos abandonam, e, assim, sentamos sob Sua sombra, e Seu fruto é doce
para nossos sentidos, pois o fruto de Deus é o Filho de Deus, a Quem
o Pai faz nascer em nosso espírito. Este Fruto é tão
infinitamente doce aos nossos sentidos que não podemos nem engoli-lo
e nem assimilá-lo, mas, antes, é Ele quem nos absorve em Si
mesmo e nos assimila em Si mesmo.
O
amor não pode ser inativo; sua vida é um incessante esforço
de saber, de sentir e de perceber os tesouros infindáveis escondidos
em suas profundezas. Este é o desejo insaciável do amor.
A
vida real deve ser vivida nos planos internos.
Os negócios progridem, o dinheiro
aflui, mas, as almas não são tocadas.
'Quicunque
fecerit Voluntatem Patris mei ille meus frater et soror et mater.' Quem
quer que faça a Vontade de meu Pai é meu irmão, minha
irmã e minha mãe.
Conservar-se-á
puro quem não sofrer mais por se deixar arrastar, por se deixar se
cativar e por se deixar acorrentar por ninguém, seja em virtude de
palavras, de atos, de presenças, de convites, de obsequiosidades,
de serviços, seja também sob os aspectos da santidade.
Faz-se
necessário odiar e desprezar nosso corpo, como sendo o inimigo capital
que deseja nos afastar de Deus, para nos arrastar para o pecado. E, também,
devemos amar e estimar nosso corpo e a vida sensitiva, pelo fato de ser
o instrumento pelo qual servimos a Deus.
Tendo provado a Carne e o Sangue,
tudo o que é do mundo parece ser insípido.
A
Vida Eterna jamais poderá ser atingida pela morte.
Para
muitas pessoas, o mosteiro é uma prisão e o mundo é
um paraíso. Eles não têm prazer em Deus ou na beatitude
eterna.
Aqueles
que seguem o caminho do amor são
os mais ricos dos viventes. São ousados, francos e destemidos; não
têm aflições nem preocupações, pois o
Espírito Santo carrega todos os seus fardos. Eles não procuram
aparências exteriores, nem desejam nada que o homem estima. Não
ostentam uma conduta especial, e
passariam por homens bons como quaisquer outros.
Um
homem interiorizado e espiritual se torna um homem expansivo para com todos.
Requisitos
para se tornar interiorizado: libertação do Coração
em relação às imagens, libertação espiritual
em relação aos desejos e desejar a união com Deus.
Deus
é um Espírito de Quem ninguém poderá fazer para
si mesmo uma imagem verdadeira.
Se
considerarmos somente nossa própria honra e não a de Deus,
nos enganaremos grandemente, pois nos falta a caridade.
A
caridade é a raiz e a fonte de todas as virtudes e de todas as santidades.
Devemos
nos resignar à livre potência de Deus sem consideração
de nenhuma recompensa.
A Vida Interior, cheia de graça
e caridade, deve estar exempta de toda simulação, dotada de
intenção reta e rica de todas as virtudes.
Na
Pureza, vivemos em Deus e Deus vive em nós. Na Pureza, a claridade
é eterna. Lá, tudo é um. Só há uma a
verdade e uma imagem no espelho da Eterna Sabedoria [ShOPhIa].
O
homem deve mergulhar naquela nudez-sem-imagens que é Deus. Esta é
a primeira condição e o fundamento de uma vida espiritual.
Requisitos
para se ver Deus: 1º) sentimento de que a base do mundo é um
abismo; 2º) desprover de fórmulas o exercício interior
[abolimento do pensamento
discursivo]; e 3º) o recolhimento deve ser uma fruição
divina. Isto significa morrer para si mesmo e para o mundo.
No
mais interno centro do próprio espírito, o homem encontra
revelada uma LLuz Eterna, e nesta LLuz ele sente a eterna demanda pela Divina
Unidade. O homem, então, sente ser ele mesmo um Eterno Fogo de Amor,
que deseja, acima de tudo, ser uno com Deus. Quanto mais ele atende a esta
demanda, mais a sente. E assim, é sentido que a Unidade interior
com Deus não é nada mais do que o Amor insondável.
Portanto, devemos todos alicerçar nossas vidas sobre o abismo insondável,
para que possamos mergulhar eternamente no Amor e nos precipitarmos na Profundeza
Insondável.
Tipos
de pecadores: o primeiro tipo consiste daqueles que são mundanos
e desprezam as boas obras; eles sofrem pela multiplicidade do coração.
O segundo tipo realiza boas obras e ama a justiça, embora condescenda
no erro voluntariamente. O terceiro grupo são os descrentes, os que
têm uma fé pequena ou errônea (a fé deve ser no
Divino e em sua própria natureza interna, e não nos dogmas).
O quarto tipo são desavergonhados e desprovidos de sensibilidade
moral. O quinto são externamente puros de modo que o mundo os julga
santos, mas seu motivo é errado, pois buscam um fim efêmero.
Nenhuma destas condições é predestinada ou inata, e
assim todos os pecadores podem resgatar sua dignidade humana e um sentido
de sagrado dentro de si mesmos.
A graça Divina é compaixão
ilimitada, e, assim, o medo do inferno surge só em decorrência
do amor-próprio. Este medo é justificado de um modo paradoxal
e invertido, pois é o próprio amor-próprio quem produz
o inferno. O servo fiel venceu este medo porque entregou tudo ao Divino,
e, desta forma, entregou a sua própria individualidade, demonstrando
o primeiro nível da genuína fé. Suas ações
são resultado do amor por Deus.
O
homem meditativo existe além da análise por padrões
mundanos, mas ele não esquece suas obrigações para
com a Humanidade. Fugir dos deveres para com a Humanidade, que podem todos
ser reunidos sob a rubrica do Amor Divino e traduzidos em serviço
altruísta, é iludir a si mesmo. O amigo secreto permanece
um fiel servidor.
Preservar
a imagem de si mesmos e da Deidade impede que se penetre na Nudez-sem-imagens.
Ao manter algum fragmento de individualidade, é impossível
passar para o Sem-caminho. E assim, os filhos ocultos de Deus – a
suprema possibilidade de conquista para o homem – transcendem todas
as imagens, incluindo qualquer imagem de si mesmo e do Divino.
Se
pudéssemos renunciar a nós mesmos e a todo o egoísmo
em nosso trabalho, deveríamos, com nosso espírito nu de imagens,
transcender todas as coisas, e, sem intermediários, ser conduzidos
pelo Espírito de Deus até a Nudez-sem-imagens. Quando transcendermos
a nós mesmos e nos tornarmos, em nossa ascensão para Deus,
tão simples quanto o amor nu das alturas possa nos tomar, onde o
amor abraça o amor, acima do exercício de qualquer virtude
– isto é, em nossa Origem, de Onde nascemos espiritualmente
– então, cessamos, e nós e toda nossa individualidade
morre em Deus. E, nesta morte, nos tornamos filhos ocultos de Deus, e descobrimos
uma nova vida em nosso interior: e esta é a Vida Eterna.
O
Brilho é tão grande que o amante contemplativo, sobre o chão
em que repousa, não vê nem sente nada exceto uma LLuz incompreensível.
E, apesar desta Nudez Simples – Nudez-sem-imagens – que engloba
todas as coisas, ele se descobre e sente a si mesmo como sendo esta mesma
LLuz, através da Qual ele vê e nada mais. Benditos os olhos
que vêem assim, pois eles possuem a Vida Eterna.
Podemos
encontrar Deus em cada trabalho feito, crescendo em Sua semelhança
e possuindo mais nobremente nossa unidade beatifica com Ele. Cada bom trabalho,
embora pequeno que seja, que é realizado em Deus com amor, justiça
e intenção pura, nos aporta uma maior semelhança a
Deus e vida eterna Nele. Uma intenção pura une os poderes
dispersos da alma na unidade do espírito e orienta o espírito
em direção a Deus. Uma intenção pura é
o princípio, o fim e o adorno de toda virtude. Uma intenção
pura oferece louvor, honra e toda virtude a Deus. Atravessa a si mesma,
os céus e todas as coisas, e descobre Deus na pureza de seu fundamento.
Esta intenção é pura quando guarda somente Deus e vê
todas as coisas em relação a Deus.
Pela
vida ativa e através da virtude, devemos viver na unidade de nossos
espíritos na graça e na semelhança a Deus, encontrando
Deus constantemente através da mediação da virtude
e oferecendo nossa vida e toda nossa obra em pureza de intenção
a Ele, para que possamos, a qualquer tempo e em todas nossas obras, nos
tornarmos Sua semelhança. Assim, no fundamento de nossa pura intenção,
transcendemos a nós mesmos e encontramos Deus sem intermediários,
e ficamos com Ele no fundamento da simplicidade. Lá, devemos possuir
a herança, que foi preservada para nós para toda a eternidade.
Da
obediência, vem a renúncia de nossa vontade própria
e das nossas próprias opiniões. Apenas aqueles que são
obedientes podem negar sua vontade própria em todas as coisas pela
vontade de outro, pois qualquer um pode fazer obras externas e, mesmo assim,
agarrar-se à vontade própria... Renunciando à nossa
vontade própria [fiat
voluntas mea]
na decisão do que deve ser feito e do que não deve ser feito
e tendo banido o orgulho, a humildade é aperfeiçoada ao grau
mais elevado. E Deus, assim, se torna o Mestre de todas as vontades pessoais,
que se tornam tão unidas à Vontade de Deus, que o homem não
pode querer ou desejar nada mais.
E,
à medida que os dons que o Cristo acorda são mais íntimos,
que a moção que exerce é mais sutil, nosso espírito
assume exercícios mais profundos e mais saborosos... E isto é
uma coisa que se renova sempre. Pois, Deus acorda dons sempre novos e nosso
espírito volta sempre à unidade interior, segundo a maneira
pela qual Deus o solicita e o cumula com seus dons; e, neste encontro, o
homem recebe dons novos que são sempre mais elevados. É assim
que se cresce sem cessar com vistas a atingir uma vida mais alta.
Ó
Deus, arquejo em meu desejo, mas não posso comungar com o Senhor.
Quanto mais eu como mais selvagem é a minha fome; quanto mais eu
bebo, mais violenta é a minha sede. Persigo o que foge de mim e enquanto
persigo, aumenta meu desejo.
Quando lerdes, cantardes ou rezardes,
prestai atenção ao sentido das palavras que pronunciardes
e às idéias que exprimem, porque estais executando um serviço
sob o Olhar Divino.
Se,
durante a recitação das Horas, fordes assaltados por pensamentos
ou imaginações estranhas, fazei de modo a vos recolherdes
novamente sem vos perturbardes, porque somos instáveis por natureza;
mas, com intenção e com amor, apressai-vos em tornar a Deus.
Ó Deus, deseje o íntimo
do meu espírito para que eu possa vê-Lo como o Senhor me vê,
e possa amá-Lo como o Senhor me ama.
Ame
o Amor que o ama duradouramente, pois quanto mais amá-Lo, mais Ele
o amará. E, quanto mais a alma se rende à atração
de Deus, mais ansiará por amá-Lo.
O
Homem Interior entra em si de maneira simples, acima de toda a atividade
e de todos os valores, a fim de se aplicar a um simples olhar no amor de
fruição. E, ali, encontra Deus, sem intermediários.
Não
poderemos contemplar Deus pelo próprio Deus, sem intermediários,
se não nos perdermos na indeterminação sem-caminho
e em uma obscuridade onde todos os contemplativos erram no prazer, sem nunca
mais se voltarem a encontrar a si mesmos, segundo a forma da criatura.
Aqui,
o espírito morre na beatitude da fruição e se dissolve
na Nudez Essencial, onde todos os nomes de Deus, todas as condições
e todas as imagens que se refletem no espelho da Verdade Divina mergulham
na Simplicidade-sem-nome da Essência, no sem-caminho, onde nenhum
raciocínio tem poder.
Nós
contemplamos intensamente aquilo que somos; e aquilo que contemplamos isto
mesmo somos. Assim, a nossa mente, a nossa vida e a nossa essência
são elevadas e unidas à própria verdade – que
é Deus. Nesta simples e intensa contemplação, somos
uma única vida e um único espírito com Deus. Esta é
a vida contemplativa.
Aquele
que é dotado de boa vontade, promete-se a Deus próprio, e
deseja ardentemente amá-Lo e servi-Lo, não somente nesta vida,
mas por toda a eternidade.
As
ordens mais altas (Querubins, Serafins e Tronos) não se unem em nossa
luta contra os nossos vícios, mas, moram conosco apenas quando, acima
de todo conflito, estamos em paz com Deus, em contemplação
e em perene amor.1
O
espírito possui Deus essencialmente na sua nua natureza, e Deus possui
o espírito. O espírito vive em Deus e Deus vive nele. Esta
unidade essencial reside em Deus; se ela faltasse, todas as criaturas seriam
reduzidas ao nada.2
A
segunda vinda de Cristo, nosso Esposo, tem lugar cada dia dentro dos homens
de bem; geralmente e muitas vezes, com graças e dons novos, em todos
aqueles que se aprestam a si mesmos por ela, cada um segundo seu poder.3
«Aí vem o esposo» (Evangelho de São
Mateus, XXV: 6). Cristo, o nosso esposo, pronuncia esta palavra. Em latim,
o termo «venit» contém, em si, dois tempos do verbo:
o passado e o presente, o que não impede de visar também o
futuro. É por isto que vamos considerar três vindas do nosso
esposo – Jesus Cristo. Quando
da primeira vinda, Ele se fez homem por causa do homem, por amor. A segunda
vinda tem lugar todos os dias, freqüentemente e em muitas ocasiões,
em todos os Corações que amam, acompanhada de novas graças
e de novas dádivas, consoante a capacidade de cada um. A terceira
vinda é aquela que terá lugar no Dia do Juízo ou na
hora da morte. O
motivo por que Deus criou os anjos e os homens foi a Sua bondade infinita
e a Sua nobreza, uma vez que Ele quis fazê-lo para que a beatitude
e a riqueza que Ele próprio é sejam reveladas às criaturas
dotadas de razão, e para que estas possam saboreá-Lo no tempo
e usufruí-Lo para lá do tempo, na eternidade. O
motivo por que Deus Se fez homem foi o seu amor imenso e o infortúnio
dos homens, pois eles estavam alterados pela queda do Pecado Original e
eram incapazes de se curar deste Pecado. Mas, o motivo por que Cristo realizou
todas as Suas obras na Terra, não apenas segundo a Sua Divindade
mas também segundo a Sua Humanidade, é quádruplo, a
saber: o Seu Amor Divino que não tem fim; o amor criado, ou caridade,
que possuía na Sua alma, graças à união com
o Verbo Eterno e graças à dádiva perfeita que Seu Pai
Lhe fez; o grande infortúnio em que se encontrava a natureza humana;
e, por fim, a honra de Seu Pai. Eis os motivos da vinda de Cristo, o nosso
esposo, e de todas as Suas obras.
A
última etapa da Via Mística equivale a um casamento da alma
com o Bem Amado.
A
medida de sua santidade é proporcional à bondade de sua vontade.
O
conhecimento de nós mesmos nos ensina de onde viemos, onde estamos
e para onde estamos indo. Nós viemos de Deus, estamos no exílio
e estamos conscientes deste estado de exílio.4
Aqueles
que seguem o Caminho do Amor são os mais ricos de todos os homens
vivos.
Deus cria um mundo novo em cada momento.
Encontramos
em Cristo, segundo a Sua Divindade, dois tipos de humildade. Primeira: Ele
quis se fazer homem. Segunda: Ele escolheu uma pobre donzela, e não
a filha de um rei, por sua mãe.
Cristo
se curvou em reverência e adoração diante do poder mais
alto do Pai. Operou todas as suas obras para louvor e para honra de seu
Pai, e nunca e em nada buscou sua própria glória, de acordo
com a Sua Humanidade.
Cristo,
nosso Esposo, sempre estava pronto para atender todas as necessidades interiores
e exteriores dos homens, como se ele fosse o servo de todo o mundo.