Este
texto é a 13ª parte de um resumo, em forma de fragmentos (às
vezes, comentados, às vezes, seguidos de uma animação
explicativa) de um estudo que fiz da obra Isis
Unveiled: A Master-Key to the Mysteries of Ancient and Modern Science and
Theology (em português, Ísis sem Véu:
Uma Chave-Mestra para os Mistérios da Antiga e Moderna Ciência
e Teologia) publicado em 1877. É um livro de filosofia esotérica,
e é a primeira grande obra de Helena Petrovna Blavatsky – um
texto-chave no movimento teosófico e um marco na história
do esoterismo ocidental. Como este será um trabalho muito extenso,
para não ficar cansativo para o leitor, cada parte conterá
apenas 30 fragmentos.
Fragmentos
Efetivamente,
se, por um lado, o Conhecimento dos Poderes Ocultos da Natureza abre a percepção
espiritual do homem, alarga suas faculdades intelectuais e o leva infalivelmente
a uma veneração mais profunda do Criador, por outro lado,
a ignorância, a estreiteza dogmática e o medo infantil de contemplar
o fundo das coisas levam invariavelmente ao fetichismo e à superstição.
O
sânscrito é a língua sagrada ou dos Mistérios,
aquela que, mesmo em nosso próprio século, é utilizada
pelos faquires hindus e pelos Brâmanes Iniciados em suas evocações
mágicas. Esta língua tem sido empregada, desde tempos imemoriais,
e ainda o é pelos Iniciados de todos os países. Todo aquele
que viu um faquir ou um lama recitando seus mantras e suas conjurações
sabe que eles jamais pronunciam as palavras de modo audível, quando
se dispõem a realizar algum fenômeno. Seus lábios se
movem, e ninguém jamais ouvirá a terrível fórmula
pronunciada, exceto no interior dos templos, e mesmo aí em cauteloso
sussurro.
Pobreza,
Castidade e Obediência são professadas pelos cristãos,
mas, praticadas apenas pelos budistas e por alguns hindus.
Nenhuma
religião teve uma história tão sangrenta quanto o Cristianismo.
Os filósofos despojados, os neoplatônicos e os gnósticos
foram anatematizados diariamente pela Igreja em todo o mundo, durante longos
séculos. E o próprio clero cristão utilizou a feitiçaria
durante séculos.
Todos
os chamados 'milagres' são produzidos pelo Poder que é inerente
a todo ser-humano-aí-no-mundo, se ele souber como desenvolvê-lo.
A
prática do exorcismo para afugentar diabos, 'à imitação
de Cristo' –
que, a propósito, nunca utilizou o exorcismo –
levou o clero a se dedicar abertamente à Magia
Sagrada em contraposição à Magia Negra, um crime de
que foram acusados todos aqueles que não eram padres nem monges.
O conhecimento oculto, compilado pela Igreja Romana sobre os antes férteis
campos da Teurgia, foi por ela guardado diligentemente para seu próprio
uso, mandando para o suplício apenas aqueles praticantes que 'invadiram'
os terrenos da Scientia Scientiarum [Ciência
das Ciências] e aqueles cujos pecados não podiam
ser ocultados pelos hábitos dos frades.
No
breve espaço de catorze anos, Tomás de Torquemada, o confessor
da Rainha Isabel, queimou cerca de dez mil pessoas e sentenciou à
tortura outras oitenta mil.1
O
clero, que sempre acreditou na existência do diabo, conseguiu fazer
com que muitos acreditassem nele.
No
passado, a verdadeira origem das acusações diárias
e das condenações à morte por bruxaria estão
habilmente atribuídas a inimizades pessoais e políticas e,
sobretudo, ao ódio dos católicos aos protestantes. Entre
as milhares de pessoas que pereceram na fogueira, na Alemanha, durante a
primeira metade do século XVII, por feitiçaria, o crime de
muitas delas foi a sua ligação à religião do
monge agostiniano e professor de teologia germânico Martin Luther
(Eisleben, 10 de novembro de 1483 — Eisleben, 18 de fevereiro de 1546).
Naquela época, tendência
à Reforma era um crime muito mais sério do que o de feitiçaria.
A
maioria das visões beatíficas e divinas da 'Golden Legend'
e aquelas que se encontram nas biografias mais completas dos "santos"
mais importantes, da mesma maneira que a maioria das visões dos nossos
videntes masculinos e femininos perseguidos, foram produzidas por "espíritos"
ignorantes e não-desenvolvidos, que têm a mania de personificar
grandes figuras históricas.
—
Eu vi um Santo,
e não é que acreditei?
Mas, não era Santo
em o que acreditei.
—
Eu vi um diabo,
e não é que acreditei?
Mas, não era diabo
em o que acreditei.
—
Então, vi a mim,
e, aí, sim, acreditei.
E era mesmo eu, sim,
e não me enganei.
Os
chamados, acreditados e aterrorizantes demônios, ao invés de
serem entidades independentes e artificiosas, que se dedicam a fazer perder
as [personalidades-]alma
dos seres-humanos-aí-no-mundo, são, em sua maioria,
elementais dos cabalistas, isto é, criaturas sem intelecto próprio,
mas, reflexos fiéis da vontade de quem os evoca, controla e guia.
São
Domingos de Gusmão (Caleruega, Reino de Castela, 24 de junho de 1170
– Bolonha,
6 de agosto de 1221), fundador da célebre Ordem que leva o seu nome
[Ordem dos Pregadores, também
conhecida por Ordem de São Domingos ou Ordem Dominicana],
é um dos santos mais poderosos do calendário católico.
Sua Ordem foi a primeira a receber uma confirmação solene
do Papa, e ele é bastante conhecido na História como assistente
e conselheiro do infame Simon de Montfort, o general papal, a quem ajudou
a massacrar os infelizes albigenses, em Toulouse e nas suas imediações.
Conta-se que esse santo e a Igreja depois dele pretenderam ter recebido
da Virgem, 'in propria persona', um rosário, cujas virtudes produziam
milagres tão estupendos, que os apóstolos, e mesmo Jesus,
seriam relegados à sombra. Um homem, diz seu biógrafo, um
pecador inveterado, foi suficientemente corajoso para duvidar das virtudes
do rosário dominicano, e, por esta blasfêmia sem igual, foi
punido incontinente com sua possessão por 15.000 diabos. Ao ver o
grande sofrimento do demoníaco torturado, São Domingos esqueceu
o insulto, e exigiu uma explicação dos diabos. Eis o colóquio
mantido entre o 'exorcista bendito' e os demônios:
Pergunta
de
São Domingos: — Como tomastes posse deste homem e
quantos sois vós?
Resposta dos diabos: —
Entramos nele porque falou desrespeitosamente
do rosário. Somos 15.000.
Pergunta de São Domingos: —
Por que 15.000 entraram nele?
Resposta dos diabos: — Porque
há quinze décadas no rosário do qual ele zombou...
Pergunta de São Domingos: — É verdade tudo
o que eu disse sobre as virtudes do rosário?
Resposta dos diabos: — Sim!
Sim! (lançando chamas pelas narinas do endemoninhado). Que vós,
cristãos, saibais que Domingos nunca disse uma única palavra
a respeito do rosário que não seja verdadeira; e que saibais,
além disso, que, se não acreditardes nele, grandes calamidades
se abaterão sobre vós.
Pergunta de São Domingos: — Quem é o homem
que o diabo mais odeia no mundo?
Resposta dos diabos: — (Em
coro) Vós sois esse homem. (Seguem-se cumprimentos loquazes).
Pergunta de São Domingos: — A que classe de cristãos
pertence o maior número de condenados?
Resposta dos diabos: — No
inferno, temos comerciantes, agiotas, banqueiros fraudulentos, merceeiros
de especiarias, judeus, farmacêuticos etc.
Pergunta de São Domingos: — Há padres ou monges
no inferno?
Resposta dos diabos: — Há
um grande número de padres, mas, não há monges, com
exceção de aqueles que transgrediram a Regra de sua Ordem.
Pergunta de São Domingos: — Há dominicanos?
Resposta dos diabos: — Ai!
Ai! Não os temos ainda, mas, esperamos um grande número
deles, quando tiverem esfriado a sua devoção.
O
elemento sexual é tão marcante no Cristianismo quanto em qualquer
uma das religiões ditas pagãs.
O
Cristianismo é puro paganismo, e o Catolicismo, com a sua adoração
de fetiches, é pior e mais pernicioso do que o Hinduísmo no
seu aspecto mais idólatra.
O
cúmulo da desfaçatez aconteceu em 1534, quando uma carta foi
recebida da 'Mediadora' [Maria,
Mãe de Jesus], uma carta que mais se parece
a um relatório de um político a um confrade. Foi escrita em
excelente latim e encontrada na Catedral de Messina, com a imagem a que
ela alude. Atestada pelo bispo, pelo vigário-geral, pelo Secretário
e pelos seis cônegos da Catedral de Messina, que assinaram os seus
nomes na atestação e a confirmaram sob juramento, eis o seu
conteúdo:
Segundo
o escritor, ocultista e mago cerimonialista francês Éliphas
Lévi (8 de fevereiro de 1810 –
31 de maio de 1875), o Sinal da Cruz Cabalístico
e Iniciático era feito assim: o Iniciado, levando a mão à
fronte, dizia: A Ti pertencem.
Levando a mão ao peito,
dizia: O Reino.
Levando
a mão a ombro esquerdo,
dizia: A Justiça.
Levando
a mão ao ombro direito,
dizia: E
o Perdão. Então, ele juntava as mãos,
e acrescentava: Através
dos ciclos geradores: Tibi sunt MaLKhUT [Reino]
et GeBURaH [Justiça]
et CheSeD [Misericórdia],
per Æonas.
Não
há nenhuma dúvida de que o Apóstolo Paulo foi, parcialmente
pelo menos, se não totalmente, Iniciado nos Mistérios Teúrgicos.
Paulo declarou: De acordo
com a Graça de Deus que me foi dada, como sábio arquiteto
lancei o fundamento. Quando Paulo se diz ser um arquiteto,
ele está usando uma palavra eminentemente cabalística, teúrgica
e maçônica, e que nenhum dos outros apóstolos utilizou.
Assim, ele se declarou um Adepto, que tinha o direito de Iniciar outros.
Jesus
era um Iniciado nos Mistérios dos essênios pitagóricos,
dos magos caldaicos e dos padres egípcios, e a Doutrina ensinada
por Ele era apenas uma porção da Doutrina Secreta ensinada
pelos hierofantes pagãos aos poucos Adeptos selecionados e admitidos
aos Áditos Sagrados.
A
prerrogativa da razão não é um direito inato apenas
dos tempos modernos. Só odiamos aquilo que tememos.
—
Tanto medo!
Oh!, quanto pavor
desse feio tentador!
Não me tente!
Sou fraquinho!
E estou aqui sozinho!
Os
Mistérios são tão velhos quanto o mundo, e aquele que
for bastante versado nas mitologias esotéricas de várias nações
poderá fazê-Los remontar até os dias do período
pré-védico da Índia.
Para
qualquer um que pretenda receber a Iniciação, dele são
exigidas a virtude mais estrita e a pureza mais absoluta. Ninguém
que não tenha praticado, durante toda a sua vida, as Dez Virtudes
que o Divino Manu exige como um dever, pode ser Iniciado nos Mistérios
do Concílio, dizem os livros hindus de Iniciação.
Essas virtudes são: a resignação, o hábito de
fazer o bem em vez do mal, a temperança, a probidade, a pureza, a
castidade, o domínio dos sentidos físicos, o conhecimento
das Escrituras Sagradas e da [personalidade-]alma
ou Espírito Superior, a veracidade e a paciência.
Subjacente
a todas as religiões populares da Antigüidade, havia a mesma
Antiga Doutrina-Sabedoria, una e idêntica, professada e praticada
pelos Iniciados de todos os países. As provas desta identidade de
doutrina fundamental nas religiões antigas se encontram na persistência
de um Sistema de Iniciação, nas castas sacerdotais secretas,
que guardavam as Palavras Místicas de Poder, e em uma exibição
pública de um controle fenomenal sobre as forças naturais,
prova evidente de uma associação com Seres Supra-humanos.
Após a Iniciação, o neófito era levado por um
ancião a um lugar isolado e, ali, ouvia, ao pé do ouvido,
do o Grande Segredo. O Supremo Pontífice e Hierofante –
o Brahmâtma –
ainda é acessível àqueles que
conhecem, embora, talvez, seja conhecido por outro nome,
e que as ramificações da sua influência se estendem
por todo o mundo.
Só
um preconceito perverso poderá levar uma pessoa a dizer que sob o
significado externo dos ritos praticados e das provas de katharsis ou purificação
não exista uma significação mais profunda e espiritual.
Seja como for, é certamente absurdo julgar os antigos segundo o nosso
ponto de vista sobre a adequação e a virtude.
Os
homens mais sábios e melhores do mundo pagão,
disse William Warburton (24 de dezembro de 1698 –
7 de junho de 1779), são
unânimes em dizer que os Mistérios foram instituídos
puros e se propunham aos fins mais nobres pelos meios mais louváveis.
Embora pessoas
de ambos os sexos e de todas as classes pudessem participar desses Ritos
Célebres, poucas foram aquelas que atingiam a Iniciação
Final e Mais Elevada.
A
Gradação dos Mistérios foi-nos dada pelo filósofo
neoplatônico Proclus Lycæus (412 –
485), no quarto livro da sua Teologia de Platão:
O Rito Perfectivo (Teletê)
precede a Iniciação (Muêsis) e a Iniciação
– o Apocalipse Final –
(Epopteia). O
platônico eclético Teon de Esmirna (70 –
135), na sua Matemática, dividiu os Ritos dos Mistérios
em cinco partes: A primeira consiste na purificação
prévia, pois, os Mistérios não são transmitidos
a todos que Os querem receber, mas, há algumas pessoas que são
impedidas pela voz do arauto. Assim, é necessário que aqueles
que não desejam ser excluídos dos Mistérios, sejam,
primeiramente, aprimorados por certas purificações, às
quais se seguem os Ritos Sagrados: a recepção dos Ritos Sagrados
sucede a Purificação. A terceira parte é denominada
Epopteia ou Recepção. A quarta, que é o fim e o objetivo
da Revelação, consiste em enfaixar a cabeça e cingi-la
com as coroas, após o que ele (o
Iniciando) se torna um Portador do Archote, um Hierofante
dos Mistérios ou está apto para exercer outra função
qualquer no Ofício Sacerdotal. Mas, a quinta, que é o resultado
de todas as anteriores, é a Amizade e a Comunhão Interior
com Deus. E
este era o último e o mais solene dos Mistérios. Esta Amizade
e Comunhão Interior com Deus foi negada
por autores cristãos, que afirmaram que só os santos cristãos
foram e eram capazes de desfrutá-Las. Já os céticos
materialistas escarneceram destas duas idéias.
A
mesma Lei que vigorava nos Mistérios Eleusinos, antes da nossa era,
ainda é observada, hoje, na Índia.
Os
Pitris são os espíritos ou, antes, as
[personalidades-]alma dos desencarnados, e eles
se comunicarão livremente apenas com aqueles cuja atmosfera for pura
como as suas e a cujas kalâsas
(invocações) piedosas eles possam responder sem risco de colocar
em perigo a sua pureza celestial. Quando a [personalidade-]alma
do invocador alcançou o sâyujya
ou identidade perfeita de essência com a Alma Universal, quando a
matéria for finalmente conquistada, então, o Adepto poderá
entrar livremente em comunhão, todos os dias e todas as horas, com
aqueles que, embora aliviados de suas formas corpóreas, ainda estão
progredindo, por meio de uma série infindável de transformações
inerentes, na aproximação gradual do Paramâtman
ou a Grande Alma Universal.
Diz
Manu: O Mestre Soberano,
que existe por si mesmo, divide o seu corpo em duas metades, masculina e
feminina, e da união desses dois princípios nasceu Virâj
–
o Filho.2
Quando
Plotino (cerca de 204/5 –
270) observou que quando
a [personalidade-]alma
desceu para a geração (da sua condição
semidivina), ela participou
do mal e foi levada para muito longe, em um estado oposto à sua pureza
e integridade primitivas, para ser completamente imersa em algo que nada
mais é do que uma queda em um lamaçal, ele
apenas repetiu os ensinamentos de Gautama Buddha.
Negar
que há no ser-humano-aí-no-mundo certos Poderes Arcanos que
ele poderá desenvolver, pelo estudo psicológico, até
o grau mais elevado, se tornar um Hierofante, e, então, transmiti-Los
a outros sob as mesmas condições de disciplina terrena é
acusar de falsidade e de loucura os melhores, os mais puros e os mais sábios
seres-humanos-aí-no-mundo
da Antigüidade e da Idade Média.
Continua...