A
INJUSTIÇA DA PRISÃO DE UM
LAVRADOR E DE UM AUXILIAR DE SERVIÇOS
EM CONTRAPOSIÇÃO À
LIBERDADE DOS ENGRAVATADOS
Rodolfo Domenico Pizzinga
Música
de fundo: Asa Branca - Luiz Gonzaga
Fonte: http://www.musicasmaq.com.br/
Balança:
Esta é uma das cenas do Julgamento do morto
presente na câmara funerária de Tothmea. Simbolicamente,
o coração (que para os antigos egípcios representava
a essência do ser humano) era pesado com uma pena, símbolo
de MAAT (personificação da Verdade, da Perfeita
justiça e da Ordem Universais).
Tribunal
de Osíris: O Deus Osíris, na companhia de Ísis
e Néftis,
aguarda o resultado da Balança da Justiça.
INTRODUÇÃO
O que é JUSTIÇA?
Unicuique suum. Em Da Natureza dos Deuses, Cícero
(106-43 a.C.) deixou gravada esta máxima — A
cada um o seu. Juan Luis Vives (1492-1540) em Concórdia
e Discórdia III afirmou: A Justiça é
o vínculo das sociedades humanas; as leis emanadas da Justiça
são a alma do povo. Já Juan Donoso Cortez
(1809-1853), no seu Ideário, alcançou: A
Justiça é imutável como Deus; as leis, perecíveis
e instáveis como o homem.
A verdade, porém, é
que, no mundo, todas as formas de tirania, de despotismo e de injustiça
começam invariavelmente por pequenos gestos e por coisas, às
vezes, consideradas insignificantes. Um pão furtado pode, por
exemplo, desencadear em um policial psicopata uma fúria avassaladora
de fazer justiça a qualquer preço. Uma melancia afanada
pode suscitar um processo judicial, onerando, em todos os sentidos,
uma Justiça para lá de sobrecarregada. Ortega y Gasset
(1883-1955) estava certo: Um exagero é sempre a exageração
de algo que não é. Quem conhece o que é
justo e não o pratica, não é humano. E aquele desajustado
que extrapola a obrigação de cumprir o dever, um perigo
real para a sociedade. E quem, em nome da Justiça, tortura, esfola
e mata, está mais para besta. Fico a pensar o que se passa nos
bestuntos de Bush, de Sharon et caterva, para fazerem o que
estão fazendo pelo mundo afora. Fico a pensar mais: aonde querem
chegar os representantes do terrorismo mundial com tanto sangue, tantos
cadáveres e tanto ódio. É como disse Martin Luther
King Jr. (1909-1968): A injustiça em qualquer lugar
é uma ameaça à Justiça em todo lugar.
O terrorismo lá, já já poderá espocar aqui
e acolá. Não é o que estamos todos a assistir?
Por outro lado, é obviamente
justo cometer uma pequena injustiça para que seja feita uma grande
Justiça. Isto aprendi com Shakespeare (1564-1616) em o Mercador
de Veneza, Ato IV. Não prender um faminto por furtar um
pequeno pedaço de pão, ou até um pão inteiro,
teria sido um ato ilegal justíssimo. Mas, quando não há
caridade e misericórdia no coração, a bicharada
das trevas domina, dá as cartas e impõe atitudes inconcebíveis
e, muitas vezes, incontroláveis. Não consigo tirar da
cabeça o little boy e o
fat man. Será que eles
estão pensando em repetir a matança? Será que alguma
cabeça-de-ovo do Pentágono já andou propondo uma
solução nuclear para... Então, penso que recordar
seja útil...
Enola
Gay
Little
Boy
Bocks
Car
Tripulação do B-29 Bocks Car em Tinian Island - 1945
Fat
Man
The
B-29 Memorial
Hiroshima
Hiroshima
Hiroshima
Hiroshima
Nagazaki
Nagazaki
Acordando
do nightmare. Há, entretanto, as questões da
conscienciosa aplicação da Justiça e do conceito
de moralidade! Isso me faz lembrar minha saudosa mãe, portuense
de nascimento mas brasileira de coração. Uma feita ela
estava a me ensinar sobre o que era justo e o que era injusto, e me
saiu mais ou menos com essa: — Se, um dia, você
estiver desempregado e desesperado, pode ‘roubar’ de um
rico o que estiver precisando. Mas só ‘roube’ aquilo
de que precisar. Não fará falta a ele e Deus não
julgará mal você por esse pecadilho. Mas ai de você,
meu filho, se ‘roubar’ a agulha de uma costureira que dela
precise para sobreviver. Isso será um pecado mortal.
Bem, até hoje, não precisei cometer nenhum ‘pecadilho’!
Nenhum? E daí?
A obra Les Misérables
de Victor Hugo (1802-1885) é um famigerado exemplo do despotismo
patológico e arbitrário que prevalecia em alguns corações
do século XVIII. De lá para cá, sob esse aspecto,
as coisas não mudaram muito. Em um certo sentido, pioraram sensivelmente.
Depois de ser condenado à prisão por ter roubado UM
PÃO para alimentar sua família, Jean Valjean
consegue escapar e passa a ser implacavelmente perseguido por um crudelíssimo
policial — Javert — que fora seu guarda na prisão
e que fará de tudo para encarcerá-lo novamente. Após
cumprir 19 absurdos e intermináveis anos de prisão com
trabalhos forçados por ter roubado UM ÚNICO PÃO,
caso típico de furto famélico, Jean Valjean é filialmente
acolhido por um caridoso bispo que o alimenta e lhe dá abrigo.
Mas, na alma de Valjean só havia horror e rancor. Seu coração
havia se transformado em pedra. Nas sombras da noite acaba por agredir
violentamente seu protetor e benfeitor e rouba tudo que pode de sua
casa. Mas Valjean é preso. E, com ele é encontrada toda
a prataria do religioso. Quando é levado à presença
do bispo, este surpreendentemente, conta aos policiais uma história
singular: afirma que havia dado a Jean as peças de prata, e ainda
pergunta qual o motivo de ele ter esquecido os castiçais, que
eram muito mais valiosos. Este gesto extremamente nobre do consagrado
bispo devolve a dignidade que aquele homem amargurado havia perdido.
Sua vida muda em um relampejo e se torna um exemplo de honradez e de
solidariedade. Enfim, como disse Victor Hugo, haverá
sempre infelizes mas é possível deixar de haver miseráveis.
Sim, é possível. É desejável.
É imperativo. Mas, precisamos todos, sob outro aspecto, aprender
a dominar nosso corpo astral, pai de nossos desejos abjetos, nossas
paixões obscuras e nossas cobiças imoderadas. Pois,
todas as nossas misérias verdadeiras são íntimas
e causadas por nós mesmos. Acreditamos erradamente que elas vêm
de fora, mas formamo-las dentro de nós, de nossa própria
substância. (Anatole France, 1844-1924).
Há quem possa não
concordar. Eu respeito. Mas, para mim, pães e melancias são
a mesmíssima coisa. O que não é a mesma coisa são
pães, melancias e bombas. Já silêncio conivente
e adesão interesseira são filhos do mesmo útero.
Aniquilamento, cobiça, tirania e opressão também.
A quem estiver lendo este documento peço um minuto de silêncio
e uma breve oração pelo Tibet, pela Palestina, pelo Afeganistão
e pelo Iraque. Pelo mundo que sofre e chora de dor, miséria e
esquecimento.
SURSUM CORDA!
FURTO DE DUAS MELANCIAS
NÃO PODE SER
MOTIVO DE PRISÃO
A prisão em flagrante,
na Cidade de Palmas (Estado de Tocantins), de dois homens acusados do
furto de duas melancias, NÃO FOI HOMOLOGADA
pelo Juiz Rafael Gonçalves de Paula, da 3ª Vara Criminal
da Comarca da Capital.
Os irmãos S. R. H.
e H. R. H. tinham sido detidos pela autoridade policial, depois que
o proprietário de uma chácara deu, por telefone, a informação
de que estava sendo furtado. Levados os ladrões à Delegacia
de Polícia — um lavrador e um auxiliar de serviços-gerais
— foram indiciados, sendo lavrado o auto de prisão em flagrante,
com o encaminhamento de ambos ao presídio local.
Informado o Juízo,
o Ministério Público apresentou Parecer pela homologação
do flagrante e pela manutenção, presos, dos acusados durante
a instrução processual. Para conceder a imediata liberdade
aos dois irmãos, o Magistrado diz que teria uma série
de fundamentos. Entre estes, os ensinamentos de Jesus, o Princípio
da Insignificância ou Bagatela, a injustiça da prisão
em contraposição à liberdade dos engravatados que
sonegam milhões dos cofres públicos etc. Mas, logo asseverou
que não usaria fundamento nenhum, simplesmente mandando soltar
os indiciados – e quem quiser que escolhesse o motivo.
Eis a íntegra da Decisão
— Proc. nº 124/03.
A INJUSTIÇA DA PRISÃO DE UM LAVRADOR E DE UM AUXILIAR
DE SERVIÇOS EM CONTRA-POSIÇÃO À LIBERDADE
DOS ENGRAVATADOS
Trata-se de auto de prisão
em flagrante de S. R. H. e de H. R. H. [nomes omitidos pelo Espaço
Vital], que foram detidos em virtude do suposto furto de duas melancias.
Instado a se manifestar, o Sr. Promotor de Justiça opinou pela
manutenção dos indiciados na prisão.
Para conceder a liberdade
aos indiciados, eu poderia invocar inúmeros fundamentos: os Ensinamentos
de Jesus Cristo, de Buda e de Ghandi; o Direito Natural; o Princípio
da Insignificância ou Bagatela; o Princípio da Intervenção
Mínima; os Princípios do chamado Direito Alternativo;
o furto famélico; a injustiça da prisão de um lavrador
e de um auxiliar de serviços gerais em contraposição
à liberdade dos engravatados que sonegam milhões dos cofres
públicos; o risco de se colocar os indiciados na Universidade
do Crime (o sistema penitenciário nacional)...
Poderia sustentar que duas
melancias não enriquecem nem empobrecem ninguém.
Poderia aproveitar para fazer
um discurso contra a situação econômica brasileira,
que mantém 95% da população sobrevivendo com o
mínimo necessário.
Poderia brandir minha ira
contra os neoliberais, o consenso de Washington, a cartilha demagógica
da esquerda, a utopia do Socialismo, a colonização européia.
Poderia dizer que George Bush
joga bilhões de dólares em bombas na cabeça dos
iraquianos, enquanto bilhões de seres humanos passam fome pela
Terra. E aí, cadê a Justiça neste mundo?
Poderia, mesmo, admitir minha
mediocridade por não saber argumentar diante de tamanha obviedade.
Tantas são as possibilidades
que ousarei agir em total desprezo às normas técnicas:
não vou apontar nenhum desses fundamentos como razão de
decidir. Simplesmente mandarei soltar os indiciados. Quem quiser que
escolha o motivo.
Expeçam-se os alvarás.
Intimem-se.
Rafael Gonçalves de Paula, Juiz de Direito.
UMA
PALAVRINHA FINAL
Está de parabéns
o Exmº Sr. Juiz de Direito Dr. Rafael Gonçalves de Paula.
Se, hipoteticamente, tivesse sido Sua Exª o Juiz do caso Jean Valjean,
indubitavelmente aquele miserável faminto não penaria
quase 20 anos naquela prisão fedorenta por ter furtado (furto
famélico) UM SIMPLES PÃO. Imagine
se fosse uma melancia, que é muito maior! Ou uma jaca, que é
mais pesada! Em sua sentença, Sua Exª utilizou — e
utilizou muito bem — uma variante inusitada e bela de IMPERATIVO
CATEGÓRICO (inventada agora por mim): o Imperativo Justíssimo-bom-senso-caridoso-fraterno-amoroso-paulino.
Isso foi uma MARAVILHA e uma lição de
vida para todos nós. Melancias? Água vermelha? Ora bolas...
Se fossem de ouro! Cravejadas de brilhantes... Mas, quem porventura
possuísse uma enorme melancia de ouro cravejada de brilhantes,
é porque furtou (e provavelmente roubou) muito. Então...
Entretanto, por outro lado
— admito que Sua Exª está consciente disso também
— George Bush é apenas um fantoche. Representa, e representa
mal, muito mal (mas para seus tutores muito bem), um papel que eu não
desejo ao pior inimigo que não tenho e jamais terei. Tanto ele
como os que interesseira e covardemente o apóiam haverão
de passar. Passarão. Falcões e falconetes, de vez em quando,
quebram a asa. Piu! Seus belos
dias de Casa Branca estão no fim. Ele ainda não sabe,
mas estão. Desejo a ele, nos dias que lhe restam, que se arrependa
de seus erros e que compreenda as insanidades que se permitiu praticar
e que ordenou que fossem praticadas. Quando se for, estou convicto,
fará seu mea-culpa. Magna culpa. Se, por algum
motivo misterioso, o Senhor Bush vier a tomar conhecimento deste livro
digital, com amor no coração, recomendo que leia e medite
sobre a VOZ DO SILÊNCIO, de Helena P.
Blavatsky.
Será que o pedreiro-livre
Harry Truman se arrependeu? Entre os preconceitos e distorções
de caráter que agasalhava, o fragmento da carta enviada em 1911
para Elizabeth (Bess) Virginia Wallace, sua futura esposa, é
constrangedor: Eu penso que um homem é tão
bom quanto outro, desde que ele não seja um negro ou um chinês.
Hiroshima e Nagazaki ficavam no Japão! Continuam lá. Esses
são alguns dos líderes (líderes?) que nos governam.
Eu não preciso deles. Nunca precisei. E você, meu irmão?
Vem
vamos embora que esperar não é saber,
Quem sabe faz a hora não espera acontecer... |
POR FALAR EM MELANCIAS...
Em uma feira do Rio de Janeiro,
um feirante estava a vender melancias. Vendeu ao primeiro freguês
metade das melancias que tinha mais meia melancia. Ao segundo vendeu
metade das melancias que restavam da primeira venda mais meia melancia.
Finalmente, chegou o último freguês a quem o feirante vendeu
metade das melancias que ainda tinha, mais meia melancia. Voltou para
casa sem melancias. Ao chegar à feira, quantas melancias tinha
o feirante? Solução: A chave da equação
está na última venda, na qual o feirante vendeu metade
do que tinha + ½ melancia, e ficou sem nada. Depreende-se que
esta metade também é igual a ½. Assim, antes da
última venda, tinha 1 melancia. Pelo final chega-se ao começo.
O feirante, ao chegar, tinha sete melancias.
DADOS
SOBRE O AUTOR
Mestre em Educação,
UFRJ, 1980. Doutor em Filosofia, UGF, 1988. Professor Adjunto IV (aposentado)
do CEFET-RJ. Consultor em Administração Escolar. Presidente
do Comitê Editorial da Revista Tecnologia & Cultura do CEFET-RJ.
Professor de Metodologia da Ciência e da Pesquisa Científica
e Coordenador Acadêmico do Instituto de Desenvolvimento Humano
- IDHGE.
SITES CONSULTADOS
EM 16/4/2004
http://www.amorc.org.br
http://www.maat-order.org
http://svmmvmbonvm.org
http://www.ac-orleans-tours.fr
http://www.nps.gov/amme/wwii_museum
http://www.kilroywashere.org
http://www.usd230.k12.ks.us
http://blog.zbroj.info/obr/fatman.jpg
http://tdhc.vip.sina.com/b-29_e.jpg
http://www.cccoe.k12.ca.us
http://www.cineramaadventure.com
http://gawain.membrane.com
http://users.iglide.net/gday/Independence.jpg
http://www.photologatentado.blogger.com.br
http://enigma.weblog.com.pt/arquivo/cat__com_numeros.html
http://www.amorc.org.br/museu/Tumba.htm
http://www.emocoesemagia.hpg.ig.com.br/viagem.htm
http://curiouslee.typepad.com/photos/nasm_dulles/p1190118.html
http://home.att.net/~sallyann4/sergeants.html
http://www.ettnet.se/~stefan-a/hiroshima/atomswe1.htm
http://www.webpanache.com/lapaix/le_plutonium_%C3%A0_nagazaki.htm