Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

Eye of God
(Animação Pictórica)
(Foto da NASA – Telescópio Hubble)

 

 

 

 

Formulação
do Objetivo do Estudo

 

 

 

Uma coisa é a idéia de Deus; outra é a necessidade da idéia de Deus e do próprio Deus. O propósito deste trabalho é sucintamente discutir estas duas vertentes carcerário-cinerárias que aprisionam a vontade e retardam a ascensionabilidade da existência humana.

 

 

 

 

Compreendendo
a Importância do Estudo

 

 

 

Uma coisa é certa: para se ter a necessidade da idéia de Deus e do próprio Deus, de uma forma ou de outra, é preciso que se tenha engendrado uma idéia qualquer de Deus, que outra coisa não é do que atribuir ao Deus de nossa concepção comportamentos e pensamentos característicos do ser humano, particularmente de nossa cultura pessoal. Uma é dependente da outra e a segunda (necessidade) não sobrevive sem a primeira (idéia). A idéia de Deus é, por assim dizer, o afluente que alimenta a necessidade de Deus, necessidade que engorda à medida que a segurança se transforma em insegurança, que o bem-estar se transforma em mal-estar e que a mocidade se transforma em caducidade. E quando a coisa fica preta, não é raro que alguns troquem um Deus por outro, pois trocar de religião é meio que trocar de Deus. Mas isto, de certo modo, é bom e educativo, porque, como disse Maha em um encontro insólito com Raymond Bernard (1923 – 2006), é bom que o homem reaja com 'por quês?' diante de certos fenômenos ou diante dos acontecimentos que não se integram no quadro que sua compreensão edificou para seu próprio uso. Um por quê judiciosamente colocado pode abrir o caminho para o conhecimento transcendente... O fato é que só se troca de religião – e conseqüentemente de Deus quando as respostas para os 'por quês?' ou não são dadas com o devido concertamento ou o desconcerto das respostas não mais satisfaz a imprescindibilidade de conhecimento. Isto, óbvio, dá na mesma como na mesma dá, e a pessoa, insatisfeita, como acabei de afirmar, acaba por trocar de religião. Não é raro, também, que se desencante, e passe a não ter religião alguma, sem, com isto, necessariamente, se tornar um ateu. Enfim, nada é mais difícil para o ser humano do que se libertar de uma imposta idéia de Deus e de sua conseqüente necessidade.

 

 

 

 

Primeira Vertente:
A Idéia de Deus

 

 

 

Religiões

 

 

 

Esta muito rápida meditação metafísico-filosófica, inicialmente, pode ser didaticamente dividida em duas metades: os que acreditam na existência de Deus, e os que não acreditam na existência de Deus. A partir desta divisão, examinarei apenas a primeira, ou seja, a idéia de Deus dos que crêem na existência de um Deus. Isto porque há uma terceira possibilidade: os (poucos) que sabem que a idéia de Deus ou mesmo a existência de qualquer Deus (que não seja um ente egregórico fabricado por mentes afínicas) é uma impossibilidade cósmica.

 

Ora, sabidamente, a idéia de Deus de um sique não é a mesma de um católico, e a idéia de Deus de um muçulmano não é compatível com a de um judeu. Uma igualdade matemática simples representativa deste conceito é: m + n religiões = n + m deuses. O que é certo é que, de maneira geral, todos admitem determinados atributos muito semelhantes (mas sempre antropomórficos, isto é, descritos ou concebidos sob forma humana ou com atributos humanos) para as diversas concepções de Deus. Os mais comuns são: incriabilidade, indestrutibilidade, eternidade, onissapiência, onipotência, ubiqüidade, benevolência, simplicidade, diligência, sobrenaturalidade, providencialidade e, por ser indestrutível e eterno, ipso facto, Deus apresenta e manifesta existência necessária ad æternum.

 

Seja como for, os estudiosos de todas as teologias atribuem a Deus duas qualificações básicas: Deus-causa e Deus-bem. Ao conceito de Deus-causa está atrelada a idéia de criação e, como conseqüência, o princípio de que a natura naturata1 – o Universo e as coisas criadas por Deus – só é possível pela vontade onipotente e pela interveniência consentida (direta ou indireta) de Deus. Já a vertente Deus-bem garante tudo o que há de excelente no mundo, particularmente na Terra. Mas, admitindo que isto seja assim, como separar Deus-causa de Deus-bem, se o bem deriva da própria causa ou dela é parte inseparável? Esta coisa é meio que semelhante a dizer que Deus é isto, que Deus é aquilo et cetera e tal. Ora, se Deus é onipotente, é isto, é aquilo e é tudo mais (ou tudo menos) que se queira antropomorficamente imaginar.

 

Enfim, sob o aspecto Deus-causa ou Deus-causalidade, três aspectos podem ser examinados: a) Deus como criador do mundo; b) Deus como criador da ordem do mundo; e c) Deus como natureza do mundo. Para um religioso Deus é tudo isto ao mesmo tempo. Ele cria, ordena e tem uma intrínseca e substancial (ou essencial) relação como o mundo, de modo que esta relação mesma implica em que o mundo seja entendido como o prolongamento da vida incognoscível de Deus. E assim, para não avançar demais, de especulação pseudometafísica em especulação pseudometafísica, sem base experiencial, meramente teorética, o ente vai mastigando e fermentando [des]raciocínios abstratos, sem uma realização interior que confirme ou que dê sustentação a todas esses pseudoestudos teóricos baseados predominantemente em exercícios incoerentes de uma desrazão retrogressiva. Envelhece, fica decrépito, adoenta, mas não deixa de genuflectir jamais! Depois morre sem ter conhecido sua própria Luz Interior! Isto tudo é mesmo uma grande lástima. Maha, em outro diálogo com Raymond Bernard, disse algo mais ou menos assim; ... o homem ainda não se despojou das vestes despedaçadas de suas concepções passadas e vive mentalmente em um ciclo morto, enquanto que o ciclo seguinte já está estabelecido. Então, que se faça a Luz! Que se faça a Santa LLuz!

 

 

 

 

Segunda Vertente:
A Necessidade da Idéia de Deus

 

 

 

 

A necessidade da idéia de Deus é outra coisa. De uma forma geral, os que acreditam na existência de Deus, acreditam basicamente por necessidade (mórbida) de acreditar. Acreditam por necessidade interior inexplicável de acreditar. A grande questão é o que gera, movimenta e sustém esta ininteligível necessidade. Sinceramente? Não sei, mas que há uma dose considerável de morbidade, isto há. Todavia, só posso teorizar, e isto com base, primeiro, em minha própria vida, pois fui educado na fé católica e quase acabei padre2, e, segundo, alicerçado nas observações que faço das pessoas. Logo, o que se seguirá poderá estar completamente equivocado. Mas, vou arriscar.

 

Em primeiro lugar, ninguém nasce acreditando em Deus. A crença em Deus – em qualquer Deus – é, normalmente, uma exigência ou uma injunção familiar. Se o ente nascer em uma família muçulmana, seu Deus será Allah; se nascer em uma família judia, será injungido a crer em YHWH (às vezes chamado ADoNaY ou ainda HaSheM). Rapidamente, é interessante refletir sobre a palavra AMeN, já que, cabalisticamente, equivale a 91 (1 + 40 + 50), e é igual à soma de YHVH e ADoNaY, que equivalem, respectivamente, a 26 (10 + 5 + 6 + 5) e 65 (1 + 4 + 50 + 10). E, para não ir longe demais, se o ente nascer em uma família católica, será educado para acreditar na Trindade de Deus enquanto Pai, Filho e Espírito Santo, na divindade de Jesus e na salvação através da fé em Jesus, o Cristo. Praticamente, basta crer nestas três coisas que o céu está mais ou menos garantido. Há, claro, outras exigências, mas a base é esta. Em duas palavras: fideísmo acachapante.

 

Em segundo lugar, é transmitida e imposta à personalidade em formação do ente a categoria do medo, e este medo se fundamenta na existência de um inferno abrasador com um sem-número de demônios enxofrentos que o atormentarão, per omnia sæcula saeculorum, se para lá for encaminhado depois da morte. Então, o medo horrorífico de ir para o inferno, o medo da condenação eterna e o medo de jamais poder desfrutar da presença de Deus fazem com que, de maneira quase universal, este mesmo ente não consiga se desvincular da idéia de Deus que lhe inculcaram desde o berço. Ficar sem Deus é mais ou menos como saltar de um avião sem pára-quedas.

 

Em terceiro lugar, depois de incorporada uma idéia de Deus qualquer à personalidade, esta idéia acaba se tornado uma necessidade psicológica e antropomórfica inamovível ou quase inamovível, pois, por exemplo, mesmo que um dia o ente venha a ser iniciado em uma fraternidade mística, levará décadas para que ele se livre da bagulhada que enfiaram em sua cabeça. Esta necessidade quase irredutível de crer e de continuar a crer deriva de diversos fatores, mas, talvez, o principal seja a incapacidade temerosa de o ente mergulhar em seu interior, em seu Coração Universal, e ali, progressiva e transmutativamente, começar a perceber que ele é realmente uma Estrela com Luz própria. Não é que ele maisqueira a ignorância; ele desconhece sua própria Luz interior. Não é que ele prefira uma presumida proteção transcendental; ele precisa. Não é que ele não deseje se livrar de suas antropomorfizações (Deus-incriado, Deus-indestrutível, Deus-eterno, Deus-onissapiente, Deus-onipotente, Deus-ubíquo, Deus-benevolente, Deus-singelo, Deus-diligente, Deus-sobrenatural, Deus-providencial, Deus-pai, Deus-filho, Deus-espírito, Deus-et cetera); ele não consegue. Não é que ele não mereça a Iniciação Psíquica da Compreensão/Libertação; ele não sabe como obtê-la. No fundo, isto cheira a conspiração. E é mesmo uma conspiração; conspiração articulada pela Oitava Esfera et reliqua e da qual muito poucos (mas não tão poucos assim) conseguem se alforriar. Mas... Um dia... Quem sabe...

 

E, indo tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.
3

 

E assim, para encerrar estas rápidas reflexões, fica a pergunta: há solução? Sim, há solução para tudo. Quem não tremeu na base quando chegou a hora de namorar para valer pela primeira vez? Ora, este não é o caso, mas tentar se tornar seu próprio Mestre-Deus pode assustar um pouco. Mas se você quiser dar início a esta Obra, é mais ou menos simples. Basta começar a desconstruir (desfazer para reconstruir) tudo aquilo que você acha absurdidade, excentricidade, inverossimilidade, supersticiosidade, infantilidade e por aí vai, mas que até agora, seja lá pelo motivo que for, você foi empilhando em sua consciência e deixando criar teias de aranha e abolorecer. Meta sinceridade nisto! Depois, e pode ser hoje mesmo, tente ouvir sua Voz Interior. Faça uma pergunta qualquer ao seu Eu Interior, mas não espere qualquer resposta. Converse um pouquinho com Ele. Encare com galhardia seus temores e angústias. Só vocês dois – você e seu Mestre-Deus interior. Em seguida, apenas relaxe, e repito, não espere qualquer resposta. Não crie de antemão esta expectativa. A resposta poderá não vir no momento em que você perguntar; poderá não vir no dia seguinte. Poderá levar um mês, um ano, sei lá. No começo, parece que tudo se transformou mesmo no Big One; mas com paciência e perseverança... Um dia – Oh!, Bendito Dia! – esta Santa Voz falará: a Santa Voz do Deus do seu Coração! Isto é tão certo quanto setenta e dois mais setenta e dois são cento e quarenta e quatro, tão certo quanto o petróleo que um dia vai acabar e tão certo como todos os deuses criados pelo homem acabarão se dissolvendo na eternidade do tempo... Que é tempo e que não é tempo. Adiar? Por quê? Isto não é regime de emagrecimento para começar só na segunda-feira. É agora. É já.

 

 

 

O Big One da
Mudança Interior

 

 

 

 

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Nota:

1. A substância e os atributos constituem a natura naturans. Da natura naturans (Deus) procede o mundo das coisas, isto é, os modos. Eles são modificações dos atributos, e Barouch de Spinoza (1632 – 1677) denominou-os de natura naturata – o Universo e a(s) coisa(s) criada(s).

2. Já contei esta passagem da minha vida, mas, rapidamente, recordo que só não me tornei padre porque fui expulso do Seminário. Eu era traquinas demais para ser padre, e me foi dito que eu não possuía vocação suficiente para a vida sacerdotal. Ainda bem, porque espiritualidade – e isto eu sempre tive – nada tem a ver com escrúpulo religioso!

3. Eros e Psique, Fernando Pessoa.

 

Bibliografia:

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. 2ª edição. Tradução de Alfredo Bosi. São Paulo: Editora Mestre Jou, 1982.

 

Páginas da Internet e Websites consultados:

http://www.mundodosfilosofos.com.br/spinoza.htm

http://classroomclipart.com/

http://pt.wikipedia.org/wiki/Deus

http://pt.wikipedia.org/wiki/Religi%C3%A3o

http://ceticismoeciencia.com/religiao/

 

Fundo musical:

Seven Years in Tibet

Fonte:

http://www.geocities.com/
Area51/Realm/6070/page16.html