EM TORNO DA QUESTÃO DA HUMILDADE

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

Música de Fundo: Silêncio (Bide e Mestre Marçal)
Fonte:
http://www.geocities.com/Vienna/Opera/9686/index.htm

 

O  JARDIM ...

 

INTRODUÇÃO

 

       Neste ensaio pretendo comentar e discutir (com toda a humildade e sabedor de que não sou digno para fazê-lo) o primeiro capítulo do livro Meus Últimos Dias - Diálogo com o Mestre (Como Vencer o Diabo e Obter a Iluminação) de Vicente Velado, FRC e Abade da Ordo Svmmvm Bonvm para o Terceiro Mundo. O livro foi dedicado pelo Autor aos Rosacruzes — que chamaram sobre si o sofrimento para aumentar a Luz da Humanidade — e ao dominicano Frei Rosário, eremita na Serra da Piedade. Como sou Rosacruz e como recebi um exemplar autografado de Meu Irmão Vicente Velado, penso que devo oferecer minha contribuição aos pensamentos divulgados nesta obra. Na realidade, pretendo, calmamente, examinar graficamente a obra inteira. Entrego-me a estas reflexões com imenso prazer.

 

SÓ  SERÁS  VERDADEIRAMENTE  ALGUMA  COISA  QUANDO  RECONHECERES  QUE,  DE  FATO,  NADA  ÉS.  (Diálogo entre Vicente Velado e o Mestre)

 

VIA  LÁCTEA

 

DISSE O MESTRE DE IOLANDA THEREZINHA MARCIER (MESTRE APIS) E DE VICENTE VELADO:

 

 

Mestre Apis (R+C) e +Vicente Velado (R+C)

Mestre Apis (R+C) e +Vicente Velado (R+C)

 

HUMILDE é aquele que ao carregar a sua cruz não reclama do seu peso nem suplica que a tirem de cima de si, mas pede forças para poder carregá-la.

 

HUMILDE é aquele que tendo carregado a sua cruz nela se deixa pregar sem desesperança.

 

HUMILDE é aqule que tendo sido pregado na cruz compreende que quem está crucuficado não pode se mexer.

 

HUMILDE é aquele que diz: Não estou aqui para fazer a minha vontade, mas, sim, a de Deus.

 

HUMILDE é aquele que atribui a Deus tudo que há de bom em si e atribui a si próprio tudo o que tiver de ruim.

 

HUMILDE é aquele que obedece.

 

HUMILDE é aquele que, ao prestar o serviço, se reconhece como o mais incompetente operário para realizá-lo, mas, assim mesmo, tenta dar o máximo de si para que a obra seja boa.

 

HUMILDE é aquele que ao ser insultado baixa os olhos e se cala.

 

HUMILDE é aquele que ao ser enaltecido diz que não é digno de enaltecimento.

 

HUMILDE é aquele que ao ser açoitado pelo infortúnio diz: Obrigado Senhor, obrigado por esta oportunidade de evoluir.

 

HUMILDE é aquele que reconhece, com toda a humildade, que não pode compreender a natureza de Deus, mas pode senti-la em todo o seu Amor e sua Luz. Este é o HUMILDE que, finalmente, conseguiu ser admitido no Primeiro Grau da Humildade.

 

 

 

 

COMENTÁRIOS DE UM INDIGNO

 

O  JARDIM ...

 

       Para não reclamar do peso da cruz nem suplicar que esta lhe seja tirada de cima dos ombros, o homem deverá ter compreendido que o único responsável pela própria cruz e pelo seu peso é ele próprio e mais ninguém. Não cai um único fio de cabelo da cabeça de um ente, sem que ele seja, de uma forma ou de outra, por isso responsável. São exatamente as ilusões da encarnação — ambições, desejos e paixões — que arrastam os seres para os infortúnios, para as dores e para a crucifixão. Quanto mais o ser humano quiser e desejar, mais sofrerá e mais dependerá desses sentimentos ilusórios de vacância ou de incompletude. O que vem do lado de fora só poderá satisfazer os sentidos exteriores – expressões do corpo astral. E, tudo aquilo que for conquistado desonestamente, pior, ou seja, mais duras serão as compensações que deverão ser feitas pelas usurpações ilícitas. Tudo que é obtido de modo indevido é ética e cosmicamente vedado, ainda que possam existir amparos legais para determinadas aquisições. Neste particular, não existe o diploma jurídico do direito adquirido. E, por mais que haja choro e lamentação, a cruz não será nem amenizada nem retirada dos ombros dos defraudadores. Paz e compreensão a eles. Paz e compreensão a todos nós.

 

O  JARDIM ...

 

     Quem se deixa pregar em uma cruz sem perder a esperança? Só aquele que compreendeu que para Nascer é preciso Morrer. Enquanto um ser for apegado à vida e aos bens materiais, morto está pensando que está vivo. Enquanto seus objetos de desejo forem seu objetivo de vida, a vida é morte em vida. É necessário que, simbolicamente, a maçã seja devorada e plenamente anabolizada. O que os homens entendem como vida, a Vida entende como não-Vida, não se dando conta, também, estes mesmos homens, de que morrem todos os dias ao dormir nascendo em um Plano que não têm consciência, nem se lembram do que aconteceu quando acordam. Em realidade, o ciclo diário é: morte (ou não-vida), nascimento e renascimento novamente para a não-vida ou morte inconsciente. Ou, de outra forma, e generalizando: adormecemos e morremos para a não-vida, nascendo em um outro Plano, que pode ser um reflexo da não-vida ou um reflexo da Vida Verdadeira; despertamos, morremos no Plano em que estávamos durante o sono e voltamos a nascer no Plano Terra, para morrermos ao pimeiro bocejo, ou para darmos seqüência às vivências que tivemos no âmbito do Plano-reflexo da Vida Verdadeira. Durante a vigília, nosso Eu Interior geralmente está dormindo; quando dormimos, nosso corpo físico descansa, mas nosso Ser Psíquico acorda para vibrar e atuar nas oitavas com as quais está harmonizado. Então, não creio que seja difícil imaginar que o Ser Interno de um indivíduo de índole cruel, não possa se manifestar nas mesmas faixas freqüênciais de zilhões de hertzs das quais participam aqueles outros seres de boa índole. Os próprios úteros em que foram gerados são distintos em suas tessituras. Isto significa que o inferno que produzirmos aqui será o mesmo inferno que viveremos do 'lado de lá'. O contrário é igual e absolutamente válido. Logo, simbolicamente, tanto o céu quanto o inferno somos nós que produzimos com nossos pensamentos, verbalizações e atitudes. Por isso, nossa crucificação somos nós que produzimos. Nossa cruz somos nós que construímos. Nossa crucificação é intransferível; somos nós que teremos que vivenciá-la. O cálice não poderá ser afastado. Teremos que beber os féis que produzirmos até a última gota. Mas, aquele que compreendeu estas coisas carregará a sua cruz e nela se deixa pregar sem desesperança, pois já iniciou sua peregrinação rumo ao cadinho da transmutação alquímica interior, para construir definitivamente seu Mestre Perpétuo.

 

O  JARDIM ...

 

       Quem está Crucificado não pode se mexer. Sim, não pode. Ninguém pode, pois toda crucificação é iniciática, e a Vida se manifesta por intermináveis ciclos iniciático-crucificadores. Há, contudo, dois tipos distintos de crucificação. A crucificação inconsciente e a crucificação consciente. A crucificação inconsciente é aquela pela qual passa a maioria dos seres humanos, ao se entregar à vanglória (vã-glória), à acídia e seus filhotes (desespero, pusilanimidade, torpor, rancor, malícia e divagação da mente) — como ensinou Tomás de Aquino — à avareza e sua filha predileta – a traição, à gula e à impertinência de assassinar os animais e comê-los, aos desregramentos com relação aos prazeres do sexo, à inveja etc. Já a crucificação consciente é aquela bendita crucificação à qual se entregam os Iniciados, pois compreenderam que a LLUZ só pode ser sentida no coração. Mas, para que isso possa acontecer, renunciaram à vida para poderem entrar na Vida. E, entrar na Vida implica em muitas coisas, como, por exemplo, renúncia à vida e comprometimento místico-transmutatório com o karma da Humanidade. De certa forma, a partir do momento em que o ser se torna autoconsciente o crucificamento não tem mais fim. Mudam as formas e os padrões crucificadores, mas não a crucificação em si, pois, o maior ato de sacrifício é a própria encarnação (em casos especiais personificação) consciente por Amor à Humanidade. Os que assim compreenderam não lamentam e não se movem.

 

O  JARDIM ...

 

HUMILDE é aquele que diz: Não estou aqui para fazer a minha vontade, mas, sim, a de Deus. Do Deus do seu Coração por ele projetado, e construído (pela renúncia à vida) com água, areia, brita e cimento colhidos em seu jardim cardáco, isto é, Prudência, Justiça, Fortaleza e Temperança amalgamadas com a Disposição Produtiva, a Sabedoria, a Prudência e a Reflexão Dialética Espontânea, conforme ensinou Aristóteles. Ainda que esteja consciente de tudo isso, o Crucificado-Iniciado sabe que muitas são as tentações, muitas são as quedas e muitas são as decepções. Mas, não desiste. Sabe que cair e levantar, ser tentado e resistir e ser ofendido e não reagir são parte de uma mesma e única experiência: a transmutação de seus demônios amimados em Mestre-Deus-Eterno em serviço perpétuo.

 

O  JARDIM ...

 

       Aquele que compreendeu que é o único responsável por suas mazelas e derrotas foi certamente admitido no Átrio do Templo da Divindade. Não pede nada para si, nem transfere responsabilidades. Não culpa nem recrimina ninguém. Não julga as fraquezas alheias, pois sabe que possui as mesmas fraquezas. Não acusa, pois sabe que ao acusador, mais do que o ônus da prova, cabe cosmicamente o ônus da acusação. E isto é gravíssimo. Sabe, enfim, que se um dedo aponta e acusa, três dedos avisam: os defeitos de teu irmão são teus também, enquanto teu irmão pecar tu também és pecador e teu irmão está em ti como tu estás nele.

 

O  JARDIM ...

 

HUMILDE é aquele que obedece. Sim. HUMILDE é aquele que obedece à Vontade e à Razão que descobriu como Leis Eternas em seu interior e com elas deu início à construção do único e verdadeiro Deus: o Deus-Mestre de seu Coração. Mas, afinal o que é esta construção? Simplesmente condescender com a Voz Insonora que fala em seu Coração. Simplesmente aceitar que não é onipotente. Simplesmente viver em harmonia com a Vida Verdadeira. Simplesmente entregar sua vida ao serviço cósmico. Simplesmente morrer para a vida e nascer para a Vida Eterna e Verdadeira. Simplesmente dominar os apelos astrais e transmutar seus demônios em Beleza, Bem e Amor Incondicional. Simplesmente projetar e construir diariamente (durante a vigília e dormindo) o Ser de Luz que viverá na Eternidade. O que está Selado com a Força e o Ideal da Paz Profunda e do Bem não será dissolvido. Esta é a obediência mínima que não é desobedecida nem renegada em nenhuma circunstância.

 

O  JARDIM ...

HUMILDE é aquele que ao prestar o serviço se reconhece como o mais incompetente operário para realizá-lo, mas assim mesmo tenta dar o máximo de si para que a obra seja boa. HUMILDE é aquele que reconheceu que em seu interior o que vibra é o Santo Espírito. Logo, ele sabe que não é nada sem o Divino concurso do Santo Espírito. Nada mais interessa a este Crucificado a não ser inspiração para poder aprender e servir. Este Crucificado repete, assim, a cada momento que é inspirado: Seja feita a Tua Vontade e não a minha. Que a minha vontade seja indivisível com a Vontade. Que a minha razão seja indivisível com a Razão. Que a obra que estou ajudando a construir seja a Obra que deva ser construída, não a obra que eu quero construir. Que meu Iniciador morra para sempre e meu Mestre viva para todo o sempre. Está Selado. Mas este Crucificado sabe e se reconhece como o mais incompetente operário.

 

O  JARDIM ...

 

       Quem ofende fica com a ofensa quando quem é ofendido não reage. Isto é evidente. Mas, ser ofendido em silêncio é muito pouco. Na verdade é pior do que revidar à ofensa recebida. O silêncio pode negro como a mais negra treva. Isso é um perigo. Assim, o Crucificado, quando lhe impingem mais um prego, pensa em silêncio: Mestres e Irmãos da Rosacruz Eterna e Invisível: permitam que eu seja um canal de LLUZ para esse Irmão que me fez sofrer. Determino, neste momento, que está iniciada a transmutação da ofensa que me foi feita em Amor, Reconciliação e Bem. E que eu possa auxiliar o Irmão que me ofendeu a compreender sua ignorância. Paz a todos os seres do Universo. Está Selado.

 

O  JARDIM ...

 

       Não. O Crucificado não vende sua alma. O Crucificado não aceita quaisquer elogios merecidos ou imerecidos, porque sabe que o que é presumidamente digno de elogios, não altera um pulso vibratório com qualquer enaltecimento, veraz ou inautêntico. O exaltamento não desassossega a personalidade do Iniciado, porque ele faz o que faz porque o que deve ser feito é feito e será feito. O elogio corrompe e enfraquece o homem que o recebe, porque, geralmente, é hipócrita e é feito por hipócritas. Só não enfraquece o Iniciado. O Iniciado é um Crucificado consciente. Assim, as trevas da lisonja não iluminam às avessas a sua obra — que é a Obra de seu Mestre Interior. Adulações, carícias e afagos foram há muito alquimizados em Tranqüilidade Interior, Serviço Desinteressado e Paz Profunda. O que vem de fora não o corrompe nem o estimula. A luz que ilumina sua vida é de outra natureza: é Luz da LLUZ.

 

O  JARDIM ...

 

           Obrigado Senhor, obrigado por esta oportunidade de evoluir. Como o Iniciado-Cruciifcado sabe que que TUDO É UM, sabe também que não há fim em sua peregrinação em direção ao Centro da LLUZ. Cada queda é abençoada. Cada infortúnio é abençoado. Cada cravo que é espetado em sua alma é abençoado. Cada decepção é abençoada. Cada traição é abençoada. Cada bofetada é abençoada. Cada perda é uma conquista e um aprendizado. Cada descaso é abençoado. Em suas orações sempre repete:  Obrigado Senhor, obrigado por esta oportunidade de evoluir.

 

O  JARDIM ...

 

       HUMILDE é aquele que reconhece, com toda a humildade, que não pode compreender a natureza de Deus, mas pode senti-la em todo o seu Amor e sua Luz. Este é o HUMILDE que, finalmente, conseguiu ser admitido no Primeiro Grau da Humildade. Sim, porque a plena realização de Deus é uma impossibilidade. Quando a construção desta compreensão começa conscientemente não tem mais fim e jamais será concluída. Este é, sim, o Primeiro Grau da Humildade que jamais será ultrapassado, porque a Humildade é uma, mas é crescente em compreensão na peregrinação assintótica do Iniciado-Crucificado Rosacruz rumo à Illuminação Crucificadora.

 

O  JARDIM ...

 

 

ÚLTIMAS PALAVRAS

 

       É muito difícil. É muito difícil — em determinadas situações, dificílimo, mesmo impossível, pelo menos para um micróbio como eu — cumprir o que o Mestre de Soror Iolanda e de Frater Vicente — meus Irmãos Rosacruzes — transmitiu, e o que estas reflexões propuseram.

     Compreendê-las, em si, já demanda um superlativo esforço intelectual, que, a bem da verdade, pouco adianta. Qualquer compreensão racional estará sempre eivada de equívocos de avaliação, ainda que não possamos prescindir destas mesmas avaliações e, particularmente, do processo dialético. Mas, é, tão-só e exclusivamente, no domínio do Coração, que estas coisas podem ser sentidas e — quem sabe! — compreendidas. Vivê-las concertadamente é outra coisa. A todo momento somos testados. No trabalho, em casa, em nossas relações interpessoais, enfim, a vida se incumbe de nos pôr à prova a cada momento. Se vergarmos ou sucumbirmos, não conheceremos a Vida. Se dormirmos ou não nos esforçarmos, nossos demônios continuarão a fazer a festa. Se desistirmos seremos reciclados e perderemos a grande oportunidade de nos tornarmos — conscientemente — a expressão manifesta do Cristo Cósmico. Peço, assim, para todos primeiro e depois para mim, força e determinação. Força e determinação para que possamos — todos nós — ultrapassar nossas limitações e alquimizar nossos leprosos. Está Determinado.

 

 

FIAT  PAX  IN  VIRTUTE   NOSTRA

 

 

 


Agnus Dei qui tollis peccata mundi, miserere nobis.

Agnus Dei qui tollis peccata mundi, miserere nobis.

Agnus Dei qui tollis peccata mundi, dona nobis Pacem et Lux.
 


Domine,  non  sum  dignus  ut  intres  sub  tectum  meum,  sed  tantum  dic  Verbo  et  sanabitur  anima  mea.
 

T R I S T E Z A

T R I S T E Z A
(Constança Lucas)

 

 

 

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

 

VELADO, Vicente. Da humildade. In: ____ Meus últimos dias: diálogos com o Mestre (como vencer o diabo e obter a iluminação). 4ª edição. Rio de Janeiro, Editora Artesão, 1997, cap. 1, p. 9-21.

 

FONTE DA TELA TRISTEZA

 

http://www.constancalucas.dialdata.com.br/tristeza.jpg