Introdução
Hachiko,
conhecido em japonês como chuken Hachiko – cão
fiel Hachiko, em tradução livre – foi um cão
da raça Akita,1
nascido em 10 de novembro de 1923, na cidade de Odate, na Prefeitura de
Akita. Ele é carinhosamente lembrado por sua lealdade a seu dono,
o professor Hidesaburo Ueno, que perdurou mesmo após a súbita
morte do professor.
Professor
Hidesaburo Ueno
Vida
Em
1924, Hachiko foi trazido a Tóquio pelo seu dono, Hidesaburo Ueno,
um professor do Departamento de Agricultura da Universidade de Tóquio.
O professor Ueno, que sempre foi um amante de cães, nomeou-o Hachi
(Hachiko é o diminutivo de Hachi) e o encheu de amor e carinho. Hachiko
acompanhava Ueno desde a porta de casa até a não distante
estação de trens de Shibuya (um dos 23 bairros de Tóquio,
no Japão, fundado em 15 de março de 1947), retornando para
encontrá-lo ao final do dia. A visão dos dois, que chegavam
na estação de manhã e voltavam para casa juntos à
noitinha, impressionava profundamente todos os transeuntes. A rotina continuou
até maio do ano seguinte, quando, em uma tarde, o professor não
retornou em seu usual trem, como de costume. A vida feliz de Hachiko, como
o animal de estimação do professor Ueno, foi interrompida
por um acontecimento muito triste, apenas um ano e quatro meses depois.
O professor Ueno sofrera um acidente vascular cerebral (AVC) na Universidade
de Tóquio naquele dia, nunca mais retornando à estação
onde sempre o esperara Hachiko.
Em
21 de maio de 1925, o professor Ueno sofreu um derrame súbito durante
uma reunião do corpo docente e morreu. A história diz que
na noite do velório, Hachiko, que estava no jardim, quebrou as portas
de vidro da casa e fez o seu caminho para a sala onde o corpo foi colocado,
e passou a noite deitado ao lado do professor morto, recusando-se a ceder.
Outro relato diz que, quando chegou a hora de colocar vários objetos
particularmente amados pelo falecido professor no caixão junto com
o corpo, Hachiko pulou dentro do caixão e tentou resistir a todas
as tentativas de removê-lo.
Mas,
é depois disto que a parte realmente emocionante da história
começa. Emocionante e triste, mas de uma lealdade pouco vista. Depois
que seu dono morreu, Hachiko foi enviado para viver com parentes do professor
Ueno, que moravam em Asakusa, no leste de Tóquio. Mas ele fugiu várias
vezes e voltou para a casa, em Shibuya, e quando um ano se passou e ele
ainda não havia se acostumado à sua nova casa, ele foi dado
ao ex-jardineiro do Professor Ueno, que conhecia Hachi desde que ele era
um filhote. Mas Hachiko fugiu daquela casa várias vezes também.
Ao
perceber que seu antigo dono e amigo já não morava na casa
em Shibuya, Hachiko ia todos os dias à estação de Shibuya,
da mesma forma como ele sempre fazia, esperando pacientemente que o professor
voltasse para casa. Todos os dias, com Sol ou com chuva, no verão
e no inverno, ele ia e procurava a figura do professor Ueno entre os passageiros,
saindo somente quando a fome o obrigava a partir. E ele fez isto dia após
dia, ano após ano, em meio aos apressados passageiros. Incansável
e lealmente, Hachiko esperava pelo retorno de seu dono e amigo... que nunca
mais voltou!
A
figura permanente do cão à espera de seu dono atraiu a atenção
de alguns transeuntes e trabalhadores da estação de Shibuya.
Muitos deles, freqüentadores da estação, já haviam
visto, no passado, Hachiko e o professor Ueno indo e vindo diariamente.
Percebendo que o cão esperava em vão a volta do professor,
ficaram tocados e, então, passaram a trazer petiscos e comida para
aliviar sua vigília.
Por
dez longos anos, continuamente, todos os dias, infatigavelmente e lealmente,
fizesse o tempo que fizesse, Hachiko, em reverente silêncio, aparecia
no final da tarde, precisamente no momento da chegada do trem na estação
e do desembarque dos passageiros, na esperança de se reencontrar
com seu dono. Aquilo era de partir o coração!
Hachiko,
finalmente, começou a ser percebido pelas pessoas na estação
de Shibuya. Naquele mesmo ano, um dos fiéis alunos de Ueno viu o
cachorro na estação e o seguiu até a residência
dos Kobayashi, onde conheceu a história da vida de Hachiko. Coincidentemente,
o aluno era um pesquisador da raça Akita, e logo após
seu encontro com Hachiko, publicou um censo de Akitas no Japão.
Na época, havia apenas trinta Akitas puros-sangues restantes
no País, incluindo Hachiko, da estação de Shibuya.
O antigo aluno do Professor Ueno retornou com freqüência para
visitar o cachorro, e durante muitos anos publicou diversos artigos sobre
a marcante lealdade de Hachiko.
Sua
história foi enviada para o Asahi Shinbun, um dos principais
jornais do País, que foi publicada em setembro de 1932. O escritor
tinha interesse em Hachiko, e prontamente enviou fotografias e detalhes
sobre ele para uma revista especializada em cães japoneses. Uma foto
de Hachiko havia também aparecido em uma enciclopédia sobre
cães, publicada no exterior. No entanto, quando um grande jornal
nacional resolveu publicar a história de Hachiko, todo o povo japonês
soube sobre ele, e o cão se tornou uma espécie de celebridade
– uma sensação nacional. Sua devoção à
memória de seu dono e amigo impressionou o povo japonês e se
tornou modelo de dedicação à memória da família.
Pais e professores usavam Hachiko como exemplo para educar crianças.
Em 21 de abril de 1934, uma estátua
de bronze de Hachiko, esculpida pelo renomado escultor Tern Ando, foi erguida
em frente ao portão de bilheteria da estação de Shibuya,
com um poema gravado em um cartaz intitulado Linhas Para um Cão
Leal. A cerimônia de inauguração foi uma grande
ocasião, com a participação do neto do professor Ueno
e uma multidão de pessoas. Pelo País afora, a fama de Hachi
se espalhou, e a raça Akita cresceu. Hachi foi convidado
várias vezes para aparecer como um convidado em mostras de cães.
Miniaturas e cartões postais dele também começaram
a ser feitos e comercializados.
Todavia,
mais tarde, a figura e a lenda de Hachiko foi distorcida e usada como símbolo
de lealdade ao Estado, aparecendo em propagandas que difundiam o fanatismo
nacionalista, que acabaram levando o Japão à Segunda Guerra
Sino-Japonesa,2 e, posteriormente,
também à Segunda Guerra Mundial.
Lamentavelmente, a primeira estátua
de Hachiko foi removida e derretida para que fossem fabricados armamentos
durante a Segunda Guerra Mundial, em abril de 1944. No entanto, posteriormente,
em 1948, uma réplica foi feita por Takeshi Ando, filho do escultor
original, e recolocada no mesmo lugar da anterior, em uma cerimônia
em 15 de agosto do mesmo ano. Esta é a estátua que está
ainda hoje na Estação de Shibuya, e é um ponto de encontro
extremamente famoso e popular.
Morte
A
fama repentina de Hachiko fez pouca diferença para a sua vida, pois
ele continuou a viver exatamente da mesma maneira como antes. Todo os dias,
sem falhar um, ele partia para a estação de Shibuya e lá,
debalde, esperava pelo Professor Ueno para voltar para casa.
Em
1929, Hachiko contraiu um caso grave de sarna, que quase o matou. Devido
aos anos passados nas ruas, ele estava magro e com feridas originárias
das brigas com outros cães. Uma de suas orelhas já não
se levantava mais, e ele já estava com uma aparência miserável,
não parecendo mais com a criatura orgulhosa e forte que havia sido
uma vez. Do jeito que estava, ele poderia tranqüilamente ter sido confundido
com qualquer cão mestiço.
Como
Hachiko envelheceu, tornou-se muito fraco e sofria de dirofilariose,3
um verme que ataca o coração. Na madrugada de 8 de março
de 1935, com 11 anos de idade, Hachiko deu seu último suspiro, em
uma rua lateral à estação de Shibuya. A duração
total de tempo que ele havia esperado, saudoso, seu dono, o professor Hidesaburo
Ueno, foi exatamente de nove anos e dez meses. A morte de Hachiko foi noticiada
nas primeiras páginas dos principais jornais japoneses, e muitas
pessoas ficaram inconsoláveis com a notícia. Um dia de luto
foi declarado.
Seus
ossos foram enterrados em um canto ao lado da sepultura do professor Ueno
(no Cemitério Aoyama, em Tóquio), para que ele –
finalmente! – se reencontrasse com o dono e amigo querido, a quem
se devotou por tantos anos. Sua pele foi preservada, e uma figura empalhada
de Hachiko pode ainda ser vista no Museu Nacional de Ciências.
Todo
dia 8 de março é realizada uma cerimônia solene na estação
de trem de Shibuya, em homenagem à história do cão
leal.
A
lealdade dos cães da raça Akita já era conhecida
pelo povo japonês há muito tempo. Em uma certa região
do Japão, incontáveis são as histórias de cães
desta raça que perderam suas vidas ao defenderem a vida de seus proprietários.
Onde
quer que estejam e para aonde quer que vão, têm sempre um dos
olhos voltados para aqueles que deles cuidam. Por causa deste zelo, o Akita
se tornou patrimônio nacional do povo japonês, tendo sido proibida
sua exportação. Se
algum proprietário não tiver condições financeiras
de manter seu Akita, o Governo Japonês assume sua guarda.
Devido
a todas suas qualidades, uma das províncias japonesas recebeu seu
nome – Akita-Ken.
O
Filme
Super-vale-a-pena
ver o enternecedor filme A Dog's Story (no Brasil, Sempre ao Seu
Lado), de 2009, com roteiro baseado na história de Hachiko, que acabei
de relatar. O filme é um remake do original japonês,
de 1987, Hachiko Monogatari. É dirigido por Lasse Hallström,
escrito por Stephen P. Lindsey e estrelado por Richard Gere, Joan Allen
e Sarah Roemer. Agora, se você resolver alugar o DVD, prepare-se para
chorar. E muito!