FILOSOFIA PORTUGUESA (III):

O PENSAMENTO PANTITEÍSTA DE
JOSÉ MARIA DA CUNHA SEIXAS

Rodolfo Domenico Pizzinga


Música de fundo: Emigrante
Fonte: http://www.bairrovilaolimpia.com.br


TRAÇOS BIOGRÁFICOS[1]

 

       José Maria da Cunha Seixas nasceu na Vila de Trevões, ao norte da Beira-Alta, Portugal, pertencente, hoje, ao Conselho de São João da Pesqueira, em 26 de março de 1836 e faleceu em Lisboa em 27 de maio de 1895, com a idade de 59 anos. Seu pai, que lhe emprestou o mesmo nome, e sua mãe D. Maria Antónia d’Azevedo e Cunha (natural da Cidade do Rio de Janeiro – Brasil) muito se esmeraram na educação dos filhos e, por haver na localidade em que moravam apenas um professor primário de limitados conhecimentos, mandavam vir às suas expensas professores de diversos locais de Portugal, tendo sido o primeiro deles o padre Caetano Esteves de Mattos.[2]

       Por serem muito religiosos, principalmente D. Maria Antónia, que era considerada proficiente em história sacra, a maioria dos mestres dos nove filhos do casal foi de padres ou de noviças de convento. Corria o segundo quartel do século XIX e assim eram os costumes da época e os hábitos locais. É de se presumir que a família dos Cunha Seixas propendesse para o conservantismo, já que - como pensa Eduardo Soveral - não há notícia de discórdias na estirpe do Filósofo. (No Anexo II apresenta-se o retrato de Seixas).

       Em 1850, com a idade de 14 anos, Cunha Seixas tomou ordens menores e, posteriormente, seus primeiros estudos superiores foram em teologia. Manuel António Ferreira-Deusdado – 1858-1918 – (Grande pedagogista e Filósofo do século XIX, antigo professor do Curso Superior de Letras e professor liceal, grande talento e nobilíssimo caráter), fiel amigo do Filósofo Trevoense e um de seus mais fidedignos biógrafos, atribuiu as tendências teístas do autor às circunstâncias anteriormente relatadas. Eduardo Abranches de Soveral, (1927-2003), meu amigo pessoal, fez, há poucos anos, uma análise profunda e competente da personalidade deste solitário Trevoense.[3]

       A severidade com que eram educados os filhos dos Cunha Seixas agravou-se com a morte do pai. A mãe, viúva aos 35 anos, tomou a si a educação dos filhos e, temendo perder o controle sobre eles, acabou por isolá-los das outras crianças. Isso trouxe óbvias conseqüências para a personalidade em formação do jovem Cunha Seixas. Ferreira-Deusdado, que o conheceu intimamente, assim o retratou: O José Maria da Cunha Seixas não foi nem poderia ser um político, porque lhe faltavam qualidades de adaptação; não poderia ser um dramaturgo, um romancista, porque na sua abstracção não tinha o geito da observação social. Era excentrico, ingenuo de mais; muitas cousas não as via, a sua boa-fé quasi infantil prejudicou-o muitas vezes e gravemente.
[4] (sic).

       Cunha Seixas, que foi o terceiro dos irmãos, apesar de desde pequeno insinuar que seria eclesiástico, acabou formando-se em Direito, em 27 de junho de 1864, na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (não sem antes se ter matriculado, em 1858, em teologia e filosofia), tendo sido aprovado Nemine Discrepante e condecorado com as Honras de Accessit, distinção já obtida nos 2º, 3º e 4º anos do aludido Curso. Tanto durante a época de estudante quanto depois de formado, colaborou na parte literária e política de diversos jornais, como o Viriato, de Viseu, o Comércio de Portugal, o Jornal de Lisboa, o Acadêmico de Coimbra, o Comércio de Lisboa, o Jornal do Comércio, a Gazeta de Portugal, o Diário Ilustrado, o Diário do Comércio, o Progresso, o Economista, o Distrito de Beja e tantos outros periódicos, notadamente de Lisboa, onde foi grande a variedade dos assuntos abordados pelo Filósofo.

       Foi professor de filosofia no Instituto de Ensino Livre de Lisboa, advogado em Lisboa e era sócio de diversas agremiações, destacando-se: Associação dos Jornalistas e Escritores Portugueses, Instituto de Coimbra, Sociedade de Geografia de Lisboa, Academia Montreal de Toulouse, Retiro Literário Português e Sociedade Econômica Matritense.

       Em 1878 decidiu concorrer ao provimento da cadeira História Universal e Pátria do Curso Superior de Letras, com uma Tese elaborada em bases espiritualistas. Na verdade este ensaio constituiu-se no gérmen do Sistema Pantiteísta. A narrativa do concurso está resumida no livro O Curso Superior de Letras (1858-1911) de Manuel Busquets de Aguilar.[5] Inscreveram-se no concurso, Alberto Augusto de Almeida Pimentel, Manuel de Arriaga Brun da Silveira, Zophimo José Consiglieri Pedroso Gomes da Silva e José Maria da Cunha Seixas. Alberto Pimentel desistiu e os outros três concorrentes foram aprovados, mas o escolhido foi Consiglieri Pedroso, positivista e ex-aluno da Escola.[6] Fatalmente, Joaquim Teófilo Fernandes Braga, presidente da banca examinadora e positivista confesso, não haveria de permitir que um espiritualista entrasse para o magistério superior do Curso Superior de Letras, para contraditar as idéias de Comte. A decisão, provavelmente, já havia sido tomada, antes mesmo de o concurso ser efetuado, e o espírito de corpo prevaleceu favorecendo Consiglieri Pedroso. Era a primeira vez que um diplomado pelo Curso Superior de Letras alcançava o magistério superior na própria Casa. Antes, Teófilo Braga tinha sido o primeiro doutor que, por concurso, entretanto sem ter conseguido unanimidade na votação em mérito relativo, havia entrado para o corpo docente do referido Curso.[7]

       Como observou meu saudoso mestre e amigo Eduardo Soveral, apresentar uma Tese a uma Escola e a uma Banca militantemente positivistas, cujo conteúdo frontalmente se opunha ao seu ideário, foi, ao mesmo tempo e paralelamente, um ato de coragem e de falta de sagacidade. Frontalidade e desassombro têm seu preço. E Cunha Seixas pagou caro essa ousadia filosófica. Na verdade pagou até a morte. A epidemia positivista que assolava Portugal não se restringiu apenas ao Filósofo Pantiteísta. Promoveu outras degolas senso lato e senso estrito. Qualquer representação metafísica estava destinada ao calabouço. E o que eram os Princípios Gerais de Filosofia da História? Nada menos do que uma filosofia espiritualista da história distribuída e bem estruturada por oito capítulos consecutivos muito bem escritos. O fato saliente é que Cunha Seixas percorreu o calvário de todo filósofo duro e puro (Vianna e Tarrozo inserem-se nessa linha): preconceito, esquecimento, exclusão, malquerença e incompreensão!

       Todavia, ao se comparar hoje a bibliografia e a contribuição filosófica de Cunha Seixas com a do candidato vencedor, constata-se, inegavelmente, o quanto perderam os estudantes portugueses e o próprio Curso Superior de Letras, com o afastamento do filósofo pantiteísta do convívio universitário. Se porventura Cunha Seixas tivesse sido aprovado, quiçá tivesse tido mais estímulo para escrever, e sua obra filosófica provavelmente seria mais rica, mais numerosa, mais divulgada e mais aceita. Certamente seria mais conhecida e mais estudada, porque haveria de ser discutida e aperfeiçoada no âmbito das academias. Derrotado no concurso, Cunha Seixas fez publicar a Galeria de Ciências Contemporâneas, onde criticou a estrutura do Curso Superior de Letras e apresentou uma nova proposta de ensino. É um livro excepcional que ainda hoje - como enfatizou Álvaro Ribeiro - merece ser lido com muito proveito.[8]

       Outro livro que merece e impõe particular referência é o intitulado Princípios Gerais de Filosofia, obra de 1072 páginas e publicado postumamente por Ferreira-Deusdado e por seu irmão Eduardo Augusto da Cunha Seixas. Ferreira-Deusdado fez publicar apenas a primeira parte do livro, enquanto o irmão de Cunha Seixas publicou-o integralmente. A publicação integral precedeu à parcial e, ao que parece, não sofreu mutilações nem modificações. Deusdado, na Notícia Biográfica do Autor, relata o que se segue:

     O presente livro que hoje vem a publico não é senão a primeira parte d’uma obra maior em que o auctor esgotou toda a sua vida.
     Tendo publicado volumes diversos, só a esta obra elle chamava o ‘seu livro’.
     Chegou a fazer imprimir essa obra inteira, faltando só o rosto e o indice; d’essa impressão fez brochar alguns pouquissimos exemplares que deu para serem lidos a especialistas intimos.
     Estando as folhas assim impressas na typographia, deu se ahi um desastre casual, que as inutilisou absolutamente a todas. Um d’esses exemplares brochados serviu de original e começou a reimprimir a obra em typo e formatos diversos.
     Achavam-se as folhas impressas d’esta primeira parte, não ainda feita a impressão do titulo, do prologo, nem do indice, quando o auctor foi colhido pela morte. Essas folhas incompletas, algumas truncadas, foram no seu espolio de inventario judicial vendidas como papel a peso para embrulhos e adquiridas já em segunda mão pelo Sr. Eduardo Augusto da Cunha Seixas, que zelosamente as fez juntar e completar para editar este livro.
[9] (sic).

       Exemplares deste livro, de capa azul e sem rosto, foram oferecidos pelo Sr. Eduardo Augusto da Cunha Seixas à Biblioteca Nacional de Lisboa, à Biblioteca da atual Academia das Ciências de Lisboa, à Biblioteca da Universidade de Coimbra, à Biblioteca Pública Municipal do Porto e provavelmente às bibliotecas de Viseu e do Funchal. Princípios Gerais de Filosofia apresentam, em mil e poucas páginas, uma síntese do pensamento de Cunha Seixas, que subordinou seus mais expressivos trabalhos a uma intenção sistemática por ele denominada Pantiteísmo, que pretendeu plasmar a idéia (já amplamente divulgada em obras anteriores como, por exemplo, O Pantiteísmo na Arte, Cânticos e Poesias) de que Deus em tudo está, mas é distincto, formulação que se opôs tanto ao Panenteísmo de Krause (tudo está em Deus)[10], quanto ao Panteísmo.

     Farei aqui um breve interrupção para citar um excerto do pensamento de Ferreira-Deusdado. Assim, talvez se possa entender a afinidade que tinha pelo Filósofo Pantiteista que hoje me propus a recordar:

     O devasso como o trabalhador, o criminoso como o filantropo, obedecem a certas regras constantes que não são no fundo senão a fórmula teórica das suas práticas. Este fato, singular na aparência, vem, segundo Herbart, de que a própria ação precede necessariamente a análise, a crítica da ação. A própria consciência moral não existe feita e pronta na alma da criança; mas desenvolve-se à medida que esta é chamada a obrar. Se pois quisermos exercer sobre as crianças uma influência moral, é preciso dirigir as suas ações antes de lhes ensinar máximas: é necessário, segundo Herbart, deixar-lhes o cuidado de formularem por si regras de proceder conforme aos hábitos virtuosos que lhes tivermos inculcado desde cedo (...) Mas para isso é preciso nós próprios querermos e obrarmos como verdadeiros legisladores, quer dizer, com uma perfeita uniformidade e uma perpétua constância. Assim a influência da educação juntar-se-á à da hereditariedade. Esta pode bastar para produzir o gênio; nunca porém bastará para produzir a verdadeira moralidade. (Apud BOTO, Carlota. Crianças à prova da escola: impasses da hereditariedade e a nova pedagogia em Portugal da fronteira entre os séculos XIX e XX. Rev. bras. Hist. [online]. 2001, vol.21, no.40 [citado 31 Agosto 2004], p.237-262. Disponível na World Wide Web:


<
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-01882001000100012&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 0102-0188.


       Com o ascendimento de Cunha Seixas vedado ao magistério universitário, seu Sistema acabou por não ter o indispensável apoio da Academia e, por isso, nem sequer alcançou o século XX. Nesse sentido, Pinharanda Gomes acuradamente escreveu: Sistema construído sem o apoio colegial, está condenado a uma história inactiva, porque não terá a possibilidade de sujeitar-se a um exercício de controvérsia, com um rigoroso apuramento das teses e da estrutura do sistema, no tempo e no movimento.[11] (sic)

       Entretanto, estudioso permanente e sem se deixar abater, sempre procurou mostrar aos portugueses o caminho da espiritualidade, do bem, da justiça e do que julgava ser a verdade. Realmente Cunha Seixas nunca almejou ser mais do que um filósofo coerente e amante de Deus. Terá havido em Portugal alguém que tenha amado Deus como (ou até mais do que) o Pensador Beirão? E por haver formulado que a Filosofia, de algum modo, deve estar relacionada com a Teologia, seu nome - como disse Álvaro Ribeiro - merece evidenciar-se e ficar gravado na história da filosofia portuguesa. Afirmou Ribeiro, ainda: No ‘pantiteísmo’ de Cunha Seixas, no ‘messianismo’ de Sampaio Bruno e no ‘criacionismo’ de Leonardo Coimbra encontram-se os elementos que permitem habilitar a filosofia portuguesa a exercer a missão que porventura lhe esteja destinada.[12]

       Finalizando esta sintética biografia do Autor Trevoense, acrescentam-se algumas características que, acredita-se, auxiliarão a compreender melhor seu perfil moral: considerou a abolição da pena de morte em Portugal uma alta conquista[13]; como teórico antiiberista defendeu de maneira altiva a independência de Portugal[14]; defendeu os direitos do homem por estarem estabelecidos na inviolabilidade de consciência[15]; festejou, em diversas oportunidades, a liberdade de imprensa[16]; sobre a liberdade concluiu: ...é ordem, é harmonia, é ventura, belleza, justiça e moralidade[17]; louvou a expulsão dos jesuítas e a anteposição às demasias da Igreja e da Cúria Romana determinadas pelo Marquês de Pombal[18]; aprovou todas as medidas tomadas pelo Marquês de Pombal no que tangeu à limitação dos poderes e prerrogativas dos tribunais inquisitoriais[19]; considerou a reforma do ensino na Universidade de Coimbra como ...um dos factos mais agigantados... da celebre administração pombalina[20]; aplaudiu o instituto do Beneplácito Régio, ou seja, ...o direito de [os estados] revisarem a legislação e as ordens pontificias e ecclesiásticas para só se dar execução e caracter de obrigatorio áquelle que, com quanto dentro da esphera espiritual, não estivesse em desaccordo com as prorogativas nacionaes, com os costumes da nação e com os direitos dos povos[21]; condenou com Paschoal José de Mello Freire o direito romano ...por contrario á razão e aos usos da nação..., como também o direito canônico ... por improprio, illegitimo e incompetente... [22] ambos vigentes no século XVIII; e pugnou pela paz perpétua requestando que acabe em santo amor toda a contenda.[23] (sic).

       Não se referindo a Cunha Seixas, mas certamente fazendo uma apreciação da situação intelectual que reinava em seu País, Ferreira-Deusdado diria certa feita: Um povo perde tristemente o seu valor quando esquece as suas tradições históricas, poéticas e religiosas e, pior do que perder o seu valor é perder a sua identidade. Cunha Seixas, acredito piamente, não perdeu jamais seu valor, e não esqueceu as tradições histórica, poética e religiosa de seu País. Por ter formulado um Sistema próprio, original, aí sim, queiramos ou não, marcou o Pensamento Português de forma indelével. O seu Pantiteísmo ainda será examinado com olhos menos preconceituosos. Nem que demore um milênio. Podemos discordar de suas idéias. Mas, sem lermos seus livros, poderemos discordar de quê? Eu li. Todos. Menos um que não encontrei em lugar nenhum: Elementos de Direito Público Constitucional Português para uso das Escolas Normais e dos Liceus.

SISTEMA PANTITEÍSTA

       José Maria da Cunha Seixas, contemporâneo de Silvestre Pinheiro Ferreira (1769-1846), Pedro Amorim Vianna (1822-1901), Antero de Quental (1842-1891), Oliveira Martins (1845-1894) e Domingos Tarrozo (1860-1933), ainda que educado adentro da Religião Católica, como se viu, insurgiu-se contra sua rígida ortodoxia, e estabeleceu um sistema filosófico (sintonizado em particular com o espiritualismo francês e com o Krausismo) ao qual denominou PANTITEÍSMO, que significa, etimologicamente, Deus em tudo. Segundo a Filosofia Pantiteísta, Deus em tudo está, mas não se confunde ou se identifica com o criado. A idéia seixina de Deus pode ser resumida da forma seguinte: Deus é a fonte de toda a verdade, de todo o bem, de toda a beleza, de toda a ordem e harmonia. Entretanto, para Cunha Seixas, a Trindade Cristã é um excêntrico dogma. No todo, Deus é um e sua manifestação trinitária revela-se como Ser (fonte de vida), Verbo (amor) e Lei (conciliação).

       Assim, eliminar a idéia de Deus equivale a eliminar a verdade, equivalendo, outrossim, a destruir a causa do mundo e o princípio ativo do Universo. Deus é o começo e o fim de tudo. Nas lucubrações de Cunha Seixas pode-se sentir uma idéia permanente: antes de Deus, Deus; depois de Deus, Deus. Deus sempre, incriado. Transcendência. Dessa forma - e o próprio Cunha Seixas assim o confessa no Prólogo dos Princípios Gerais de Filosofia - seu intuito primacial foi reformular o espiritualismo decadente que vigia no século XIX, tentativa magistral de conjugação do método experimental com uma especulação teórico-ontológica, bem como propor uma nova síntese filosófica para as ciências (entre outras, matemática, física, química e mecânica). Assim, estimulado por um incomensurável amor a Deus, duas metas se impôs: ascensionar (pelo bem) a si e à humanidade, e extirpar o materialismo e outras formas de espiritualismo que se contrapunham ao Pantiteísmo. Esta tarefa, evidentemente, haveria de falhar. Falhou.

       Para dar consistência ao seu sistema, o Trevoense estabeleceu três leis (universais) psicológicas do conhecimento. A vida do pensamento, explicou, tem seu ponto de partida na intuição, que a reflexão, pelo processo de abstração, termina por aperfeiçoar. A intuição, entretanto, constitui-se em mera afirmação espontânea, e a reflexão, por outro lado, não consiste na ciência. Na elaboração psicológica há um terceiro termo - a síntese. O primeiro termo, segundo Cunha Seixas, é objetivo e indica a totalidade existente; é simples e espontâneo. Corresponde ao processo de intuição de um ser qualquer. O segundo termo é múltiplo, subjetivo, lento, e na maioria das vezes, imperfeito. Compreende o número de relações desse ser. O terceiro termo é a síntese ou reunião de todos os elementos. Nesse estágio, o mesmo ser aparece ordenado e pode ser perfeito, se no segundo estágio a intuição for bem elaborada pelo entendimento. É a ordem ou harmonia na pluralidade. Cunha Seixas resumiu seu pensamento da seguinte forma:
O primeiro [termo] é a totalidade ... e que podemos designar pela palavra - ser; o segundo é a maneira de ser, abrangendo as relações dessa natureza, podendo estas ser designadas pela palavra - manifestação; o terceiro é a ordem na multiplicidade, e esta ordem é portanto - harmonia.[24]

Considerando estas três leis universais, seu formulador propôs que, ao se estudar um objeto, a trajetória seja seqüencial. O quadro abaixo, resumidamente, demonstra o pensamento seixino[25]:

 

1ª LEI
SER
2ª LEI
MANIFESTAÇÃO
3ª LEI
HARMONIA
Nada existe que não seja possível.
O ser manifesta-se o mesmo e evolutivamente, isto é, sob os princípios da permanência e da evolução.
Uma unidade universal domina todo o criado.
O que é inteiramente indeterminado é o mais genérico.
O mundo realiza a harmonia condicional.
Existe uma lei de indeterminação
/determinação.
O mundo aspira à harmonia incondicional.

O possível deve passar ao ato.
Tudo tende para o Asoluto
A substância deve passar às maneiras de ser e não se concebe sem elas, isto é, sem relações.
Acima de todas leis está o Absoluto

Quadro 1: Lei Pantiteísta


       Sinteticamente, Cunha Seixas propôs:

       1ª Lei: os elementos primordiais, vale dizer, a unidade do ser, indicando a virtualidade das coisas;

       2ª Lei: as suas maneiras de ser, isto é, as suas relações e manifestação, apontando sua atividade e suas antinomias; e

       3ª Lei: a classe a que pertence na ordem universal, ou seja, a síntese. Acima destas leis está o Absoluto.

       O ponto de partida da ontognosiologia seixina é a idéia de ser - o Sinal de Verdade - e seu Sistema, como acuradamente percebeu António Braz Teixeira na obra O Pensamento Filosófico-Jurídico Português, traduz-se num pluralismo monadológico, num dinamismo triádico, que tem como momentos essenciais, o ‘ser’, a ‘manifestação’ e a ‘harmonia’, e numa teleologia do bem, que se projeta no plano antropológico e se garante e fundamenta num pensamento de Absoluto.[26]

       Em última análise o pensamento de Cunha Seixas pode ser sumariado da forma abaixo[27]:

 

LEIS


ELEMENTOS


 

O Ser

Possibilidade
Unidade
Identidade
Substância

Relações ou Manifestações

Causa
Relação
Tempo
Espaço
Grandeza

Harmonia

Finalidade
Ordem

Quadro 2: Síntese do Pensamento Seixino




TEODICÉIA PANTITEÍSTA


       Teodicéia é a parte da Filosofia que estuda a existência e a natureza de Deus, procurando, inclusive, apresentar provas da Sua existência. Segundo Cunha Seixas, as meditações sobre o Absoluto (como idéia a priori ou como manifestação) ainda costumam ser classificadas em físicas, morais ou metafísicas. Um estudo mais acurado redu-las a reflexões de ordem exclusivamente metafísica. Entretanto, o Especulativo Trevoense entendeu que as ditas provas da existência de Deus são apenas exercícios de meditação filosófica, já que a existência de Deus - como princípio - é de evidência indemonstrável. A evidência impõe-se; não se demonstra. Assim: Deus é o ser uno, sem dúvida, o ser puro, acima de todo o múltiplo, distinto de tudo o mais, independente e absoluto... é o ser perfeitíssimo, infinito, fonte de todo o bem, pai de todos os seres, criador e ordenador dos mundos, providente e sábio. Deus é, pois, o ser determinadíssimo como ser infinitamente perfeito.[28]

       Admitindo, contudo, que a teologia católica estabeleceu diversos elementos filosófico-teológicos para a explicação do dogma trinitário (qualificando de perfeitas as teorias de Santo Agostinho e de Santo Tomás), contrapôs que a filosofia não pode atingir três pessoas em Deus, porque a alçada da filosofia é simplesmente a razão. Mas, utilizando as leis ontológicas anteriormente referidas, Cunha Seixas, entre outros, reconhece os seguintes atributos de Deus[29], apresentados no Quadro 3, abaixo:

 

LEIS
SER
MANIFESTAÇÃO
HARMONIA
A
T
R
I
B
U
T
O
S

Necessidade

Absoluto

Ser Perfeito

Verdade

Liberdade

Infinito

Verbo

Leis

Conservação

Ordem

Amor

Espírito

Quadro 3: Atributos de Deus


       No quadro acima cada atributo de cada ordem combina-se com mais dois. Por exemplo: necessidade, liberdade (e criação) e conservação (do Universo). E Cunha Seixas justificou: Como Deus é o princípio de toda a ciência, é de toda a razão que, sendo fonte das leis universais, saídas da sua própria essência, as reflita triplamente. As leis ontológicas são pois como vindas de Deus o seu próprio reflexo.[30]

       Paralelamente, Cunha Seixas ensinou que a teodicéia inclui uma parte prática, da qual surgem as instituições religiosas. Para ilustrar esta idéia, apresenta-se um parágrafo da lavra do autor com um esquema geral explicativo:

     A nossa teoria das idéias é uma verdadeira filosofia da religião: se as idéias nascem dos sentidos, não há possibilidade de religião; se nascem da razão humana, e nada há em nós senão humano, teremos a mesma conclusão. Se as idéias estão em Deus, e se nós nada vemos senão pelo divino, suprime-se a nossa atividade e só fica o infinito, surgindo logicamente o panteísmo. Se as idéias ‘são’ em Deus e ‘estão’ em nós, o homem tem realidade e avista outra realidade suprema. Este último sistema, que é o que seguimos, é pois essencialmente religioso e harmônico.
     A filosofia da religião não se funda somente na teodicéia, mas também nos fatos históricos e tem íntimas relações com a filosofia das religiões.
[31]


       Resumo esquemático de uma Filosofia da Religião de base Pantiteísta proposta por José Maria da Cunha Seixas, na qual se observa a presença do ternário:


PRIMEIRA LEI: SER

SUJEITO: O Homem
OBJETO: Deus

SEGUNDA LEI: MANIFESTAÇÃO

       Permanência das bases da religião no espírito do homem, do sentimento religioso e das necessidades espirituais para o elevarem a Deus em uma vida superior moral. Concepções da humanidade acerca de Deus contemplado já como Deus-todo, já como espírito e amor. Evolução segundo as séries do viver humanitário.

TERCEIRA LEI: HARMONIA

União de todos os elementos pela verdade.

 

*  *  *



       Depois de se estudar a obra (quase) completa de José Maria da Cunha Seixas, pode-se sem receio de cometer qualquer equívoco, mas, ao contrário, subscrever as reflexões de Aquiles Côrtes Guimarães, que percebeu o sentido de originalidade no pensamento do Trevoense. O próprio Pantiteísmo foi um superlativo esforço do Filósofo no sentido de tentar salvar, ou até mesmo resgatar, o espiritualismo católico, já que, desde jovem, demonstrou uma preocupação especulativa permanente no que concerne ao tema do Absoluto, ainda que negando a existência da Santíssima Trindade e outras categorias da teologia católica.[32] Absolutamente consciente e convicto de suas reflexões, o Trevoense não se afastou, ao longo da vida, um único milímetro de sua metafísica especulativa, permanecendo fiel ao Sistema Pantiteísta por ele engendrado até o dia de sua morte. Já Antero de Quental, aos trinta e três anos, resignadamente, ultimou sua conversão ao Catolicismo e, palavras suas, tornou-se completamente católico. Leonardo repetiu o gesto. A ninguém é permitido censurá-los ou criticá-los.

       Assim, no Pantiteísmo, o Absoluto paira sempre acima das idéias racionais, vitalizando-as e animando-as com uma Luz que nelas irradia. Nada há acima de Deus, contendo exclusivamente em Si a própria razão de ser. Nesse sentido, contrapõe-se ao condicional e ao relativo, não sofre nem exceções nem limitações no seu conjunto, que é sempre unitário e o mesmo. Para Cunha Seixas, o Ser Perfeito é incondicional, porque toda a condição envolve o contingente... não [sendo] sujeito a perder a existência.[33] Por isso, Infinito e Absoluto são condições equivalentes sem nenhuma contradição. Então, para Cunha Seixas, pode-se estabelecer a seguinte dupla igualdade:

 

ABSOLUTO  =  INFINITO  =  DEUS



       Essas elucubrações levaram a que o Trevoense deixasse escrito em Princípios Gerais de Filosofia que o Ser Infinito é sempre afirmado no pensamento, pois não se pode pensar senão sob


     ... as unidades do ser, da substância, da causa, da relação, da grandeza, do espaço em coisas corporais, do fim das coisas e da ordem. Ora, nós pensando assim, no múltiplo e no contingente, sob essas unidades, estamos, portanto, a afirmar a razão de todas as Unidades, isto é, o ser pleno, a substância infinita, a causa suprema, o incondicional, a grandeza ilimitada e sem medida possível, a sabedoria universal e a harmonia absoluta. Assim todo o homem que pensa, é em Deus que pensa.[34]


       Portanto, ainda que as idéias racionais exibam-se como fundamentos de verdade, e sejam independentes, soberanas e se mostrem a priori, há que se procurar sua fonte em um Ser Supremo e Ordenador Comum. As idéias racionais (ou categorias) são unidades geradoras de todas as coisas criadas e se apresentam como elementos das coisas e dos modelos de todos os seres; é necessário, contudo, reconhecer-se o Gerador Comum. Ainda que tornem possível todo o conhecimento e dêem fundamento à toda ciência, cada uma delas recebe Luz de grau superior - a Ordem Suprema - porque no Sistema Pantiteísta, apesar de estarem impressas na razão do homem, há permanentemente correspondência com o Infinito. No Sistema de Seixas, todas as categorias fundem-se em uma idéia geral, em uma causa única, em um princípio comum, que é o Ser Pleno, Perfeito, Onipotente, Necessário, Imutável, Uno, Eterno, Onipresente, Infinito e Incriado. No Sistema Seixino a Idéia de Deus é a fonte de todas as realidades, não sendo, portanto, mera criação do espírito. Por tudo isso, o Absoluto é o que é. Nega momentos, limites, restrições, mudanças, exterioridades e interioridades. Em Deus tudo é uno, sendo trino o modo como é dado ao homem conhecê-Lo. Nesse sentido, para José Maria da Cunha Seixas, a única forma legítima de se pensar em Deus é como um SER UNO que se MANIFESTA como fonte de toda a HARMONIA. A Quadro 4 resume definitivamente o pensamento do ilustre Trevoense[35]:

 

IDÉIAS ONTOLÓGICAS
ORDEM RACIONAL MÉDIA
ORDEM RACIONAL SUPREMA
SER
O Ser por Excelência
O Ser Infinito
SUBSTÂNCIA
A Substância Infinita
CAUSA
A Causa Última
O Poder Absoluto
RELAÇÃO
O Absoluto ou Incondicional
A Perfeição Suprema
TEMPO
A Eternidade
ESPAÇO
A Imensidade
GRANDEZA
A Grandeza de Deus
A Ubiqüidade de Deus
FINALIDADE
A Sabedoria Infinita
A Lei Eterna
ORDEM
A Harmonia Suprema
Verdade, Bem, e Belo
Todas as Perfeições

Quadro 4: Correspondência Entre as Idéias Ontológicas
(Ordem Racional Média e Ordem Racional Suprema)

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

       Conclusivamente, aplaude-se o pensamento de José Marinho ao reconhecer o esforço meritório de José Maria da Cunha Seixas - inclusivamente se consagrando como o primeiro filósofo português - em intentar conciliar imanência e transcendência, não conferindo ao homem predicados que ultrapassassem sua condição de ser criado por Deus, não atribuindo ao Absoluto o que Ele em Sua Exclusiva, Perpétua e Suma Perfeição não necessita.

       É consenso geral, hoje, no Brasil e em Portugal, que Cunha Seixas, representou um instante especial da especulação filosófica espiritualista portuguesa do século XIX, como também concordam todos que o Sistema Pantiteísa resultou de um esforço incansável, no sentido de libertar o homem de todos os grilhões que o vinham torturando em decorrência da laicização do movimento católico.

 

DADOS SOBRE O AUTOR


Mestre em Educação, UFRJ, 1980. Doutor em Filosofia, UGF, 1988. Professor Adjunto IV (aposentado) do CEFET-RJ. Consultor em Administração Escolar. Presidente do Comitê Editorial da Revista Tecnologia & Cultura do CEFET-RJ. Professor de Metodologia da Ciência e da Pesquisa Científica e Coordenador Acadêmico do Instituto de Desenvolvimento Humano - IDHGE.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
(COMENTÁRIOS SUPLEMENTARES)


1. Conforme minha Tese de Doutorado A Doutrina Pantiteísta Segundo José Maria da Cunha Seixas, defendida e aprovada em 12 de julho de 1988, na Univesidade Gama Filho, RJ.
2. Cf. Noticia Biographica do Auctor por Manuel António Ferreira-Deusdado, In: Principios Geraes de Philosophia, por José Maria da Cunha Seixas, p. XXXI.
3. Op. cit., p. XXXIII.
4. Op. cit., p. XXXIII. Na nota q, p. 73, da obra A Filosofia Tomista em Portugal, Ferreira-Deusdado referiu-se a Cunha Seixas como ... pensador profundo e original... e também como... homem brilhantemente dotado...
5. pp. 182 a 194.
6. Manuel Busquets de Aguilar na sua dissertação para doutoramento, na seção de ciências históricas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, O Curso Superior de Letras (1858-1911), p. 192, escreveu: Na votação em mérito literário foram todos os candidatos aprovados por unanimidade; na votação de preferência, foi aprovado por unanimidade Consiglieri Pedroso. Na obra Pensamento Português, p. 32, Pinharanda Gomes curiosamente informa: Quanto ao propósito de entrar no quadro de professores do Curso Superior de Letras, é sabido como [Cunha Seixas] foi preterido, a favor do positivista Consiglieri Pedroso, discípulo e protegido de Teófilo Braga. Análogo fenômeno se repetiu com Manuel António Ferreira-Deusdado que, tendo concorrido ao lugar de professor do Colégio Militar, se viu preterido a favor de Teixeira Bastos, igualmente discípulo e amigo de Teófilo Braga. Não obstante, Deusdado obtivera superior classificação. O Positivismo não admitia opositores.
7. As dissertações foram defendidas em 16 de janeiro de 1879 e em 17 de janeiro do mesmo ano, portanto vinte e quatro horas após ter sido divulgado o resultado, Cunha Seixas redigiu um enérgico protesto contra a decisão da Banca Examinadora, da qual era Presidente Teófilo Braga, que foi acusado de parcialidade, por tratar com facciosismo o candidato, por este ...defender os principios mais elevados do espiritualismo em contrario aos systemas positivistas e materialistas adoptados pelo dito Professor [referia-se a Teófilo Braga] em suas obras e prelecções. Cf. Manuel Busquets de Aguilar, op. cit., pp. 192-94. Perderam Portugal e o Mundo com esta falcatrua.
8. Cf. Cunha Seixas e a Filosofia Portuguesa, p. 237.
9. In: Principios Geraes de Philosophia, p. XXXIV. Este autor, para elaborar sua Tese de Doutorado, teve que ir a Portugal (Universidade de Coimbra) para garimpar documentos e obras de Cunha Seixas não existentes no Brasil. Surpresa! Ao receber para consulta o monumental Princípios Gerais de Filosofia, percebeu, estupefato, que o livro jamais fora examinado. A obra havia sido editada à moda antiga (ou seja, com as páginas dobradas quatro a quatro) e permanecia intocada um século depois de haver sido impressa!!! Fui, nesse sentido, o primeiro a consultar (com todo cuidado) a Obra de Cunha Seixas, pelo menos em Coimbra.
10. O Pantitheismo na Arte, Canticos e Poesias, José Maria da Cunha Seixas , p. 257.
11. Cunha Seixas, p. 12.
12. Cf. Cunha Seixas e a Filosofia Portuguesa, p. 240.
13. Estudos de Litteratura e de Philosphia Segundo o Systema Pantitheista, pp. 12 e 125.
14. Estreias, pp. 85 a 103. No Anexo III apresenta-se o frontispício desta obra.
15. Estudos de Litteratura..., p. 13; Lucubrações Historicas, p. 167 e O Pantitheismo na Arte..., p. 181.
16. Op. cit., p. 127.
17. Estreias, p. 67.
18. Lucubrações Históricas, p. 148.
19. Op. cit., cap. IV.
20. Op. cit., p. 171.
21. Op. cit., pp. 187 a 188.
22. Op. cit., pp. 179 a 180.
23. O Pantitheismo na Arte..., p. 179.
24. Princípios Gerais de Filosofia da História, p. 74.
25. Princípios Gerais de Filosofia, pp. 217-18.
26. O Pensamento Filosófico-Jurídico Português, António Braz Teixeira, p. 83. Consultar o Anexo I deste trabalho.
27. Princípios Gerais de Filosofia, p. 219.
28. Galeria de Ciências Contemporâneas, José Maria Cunha Seixas, p. 224.
29. Ibid., p. 226.
30. Ibid., p. 227.
31. Ibid., pp. 227e 228.
32. Cs. minha Tese de Doutorado referida na nota 108 e o trabalho A Filosofia Portuguesa na Fase Áurea do Ecletismo Brasileiro de Aquiles Côrtes Guimarães, In: Ciências Humanas, Rio de janeiro, 5 (16): 9-14, jan./mar. 1981.
33. Ibid., p. 106.
34. Ibid., p. 110.
35. Ibid., p. 139.

 

BIBLIOGRAFIA


AGUILAR, Manuel Busquets. O Curso Superior de Letras (1858-1911): (dissertação para doutoramento, na secção de ciências históricas, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa). Lisboa: Ofics. Grafs. da Cadeia Penitenciária de Lisboa, 1939, 425 p.
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______. Principios elementares de direito civil portuguez para uso dos Lyceus. Lisboa: Typographia Mattos Moreira, 1885, 143 p.
______. Principios geraes de philosophia (precedida de um esboço historico da philosophia em Portugal no seculo XIX e de uma noticia biographica do auctor por Ferreira-Deusdado). Lisboa: Imprensa Lucas, 1897, 186 p.
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______. Tratado de philosophia elementar para uso dos Lyceus. Lisboa: A. Ferreira Machado & Ca Editores, 1887, 672 p. v. 1 (psychologia).
______. Uma digressão pela litteratura ou exposição das obras do Exmo. José Elias Soares Romeo Junior. Lisboa: Typographia Nova Minerva, 1881, 15 p.
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KRAUSE, Karl Christian Friedrich e SANZ del RIO, Julián. O ideal da humanidade para a vida. Tradução de J. A. Freitas. Buenos Ayres: Eduardo Perié, Editor, 1884, 295 p.
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SITES CONSULTADOS

http://www.geocities.com/Athens/Troy/4285/ensino23.html

http://home.utad.pt/investigacao/origins/bacal.html

http://www.ensayistas.org/


 

ANEXO I

J. M. CUNHA SEIXAS

Autor: António Braz Teixeira

Fonte: http://www.instituto-camoes.pt/cvc/filosofia/rep4.html
Acesso em 20/12/2003


       Filósofo português (Trevões, 1836 - Lisboa, 1895), criador de um sistema filosófico que denominou Pantiteísmo e que se apresenta como uma pessoal e original dissidência do Krausismo, tal como este era entendido por J. M. Rodrigues de Brito, cujo magistério filosófico viria a marcar, de forma decisiva, o percurso especulativo dos dois mais importantes pensadores da geração portuguesa que se afirmou a partir de 1865.

       Ao designar por pantiteísmo o sistema filosófico que desenvolveu e expôs ao longo da sua obra especulativa (A Fénix ou a Imortalidade da Alma Humana, 1870; Princípios Gerais de Filosofia da História, 1878; Galeria das Ciências Contemporâneas, 1879; Ensaios de Crítica Filosófica, 1883; Estudos de Filosofia e Literatura, 1884; Lucubrações Históricas, 1885; Elementos de Moral, 1886; Princípios Gerais de Filosofia, 1898), Cunha Seixas procurou tornar claro que a respectiva matriz era a intuição primordial de que Deus está em tudo, como centro de todas as coisas e nelas manifestado.

       Para o pensamento pantiteísta, o ponto de partida do conhecimento era duplo: subjectivamente, seria o pensamento, enquanto, objectivamente, se encontraria na idéia de ser. Na verdade, sendo sempre o conhecimento um acto do espírito que pensa, o respectivo ponto de partida não poderia ser o sentimento nem a vontade, que são apenas excitantes ou motores do conhecimento, mas o pensamento. Por outro lado, porque o conhecimento não pode deixar de partir de algo que seja imediato, possível, certo e intuitivamente evidente que lhe dê um mínimo de garantia, e porque tais atributos só se encontram nas idéias e leis da razão e nos axiomas que decorrem delas, todo o conhecimento se funda, necessariamente, na crença no próprio espírito.

       Como todo o pensamento e todo o juízo se reportam ou envolvem sempre a idéia de ser, ela será o ponto de partida objectivo do conhecimento.

       De acordo com a filosofia pantiteísta, o conhecimento exprime-se num juízo, na afirmação, ainda que implícita, de uma relação, a qual obedece a três leis, a da substância, a da manifestação e a da harmonia, e em cujo processo cabe distinguir três momentos. No primeiro, imperam as idéias experimentais, particulares e contingentes, referidas a um objecto da natureza, enquanto, no segundo, dominam as idéias reflexivas, de carácter geral e abstracto, e, no terceiro, tudo se processa já no plano das idéias racionais ou ontológicas, inatas ao próprio espírito, universais, absolutas, necessárias e invariáveis.

       É a circunstância de as idéias desta terceira espécie serem tanto leis do espírito como elementos dos seres, havendo, por isso, correspondência ou equivalência entre as categorias da razão e as categorias do ser, que torna possível o conhecimento e faz que a ontologia seja, a um tempo, ciência do ser nas suas determinações mais gerais e ciência das idéias-elementos na sua maior extensão e profundidade, com abstracção de qualquer ente individual.

       Esta dupla natureza das idéias racionais explica que seja também por meio de um processo trágico de ser, manifestação e harmonia, que a ordem ontológica se desenvolve e se concretiza e a finalidade de cada ser se coordena, dinamicamente, com a dos demais seres, contribuindo todos e cada um deles para a realização dos mais altos destinos do universo. Cada ente é, assim, algo individualizado, dotado de finalidade própria, constituindo um infinito relativo que, no seu movimento próprio, se manifesta, relacionando-se com todos os outros do mesmo género e, através deles, com a ordem mais global do ser.

       A idéia de ordem, associada à idéia dos seres como infinitos relativos, conduz o nosso espírito à noção de um Ser Perfeito e Absoluto, que tenha em si o seu próprio fim e que, na sua unidade e simplicidade, seja causa e ordenador dos restantes seres. Dado que, no entanto, o finito não pode existir sem a sua causa geradora e como o infinito é também a eternidade e a imensidade, Deus está em tudo, conferindo a todos os infinitos relativos a sua realidade e subsistência, sendo, porém, deles perfeitamente distinto, pois o eterno e imenso não pode confundir-se com o transitório e o limitado. Daí que, apesar de nos movermos, sermos e vivermos em Deus, participando da sua realidade, com Ele não nos confundamos nunca.

       Sendo, embora, abscôndito na sua natureza e, como tal, inacessível a toda a explicação ou demonstração, Deus manifesta-se no universo e patenteia-se intuitivamente à razão, como inteligência suprema, lugar e fonte de verdade e de vida e sede do infinito e do absoluto. Deste modo, Deus não é inteiramente incognoscível, sabendo nós Dele, através da Sua manifestação, que é absoluto, omnipotente e perfeito, imutável e uno, infinito, eterno, omnisciente e omnipresente, sendo seus atributos supernos a verdade, a bondade e a beleza. (sic).

 

 

ANEXO II

RETRATO DE JOSÉ MARIA DA CUNHA SEIXAS

Fonte: Diario Illustrado, n° 4128, Lisboa, Portugal, 27/10/1884

 

Cunha Seixas

 

 


ANEXO III

FRONTISPÍCIO DA PRIMEIRA OBRA DE CUNHA SEIXAS.

Fonte: Sala Dr. Joaquim de Carvalho, Faculdade de Letras,
Coimbra, Portugal, 1987

 

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