Se for necessário, o ser-humano-aí-no-mundo derruba o eucalipto-gigante para fazer uma casa, e nunca sentirá a sua falta. [In: A Outra Margem do Caminho, entrevistas realizadas na Índia, na Califórnia e na Europa, de autoria de Jiddu Krishnamurti.]

 

 

 

 

 

 

— adê o eucalipto-gigante
que estava aqui?
— Eu o derrubei.
— E o derrubou por quê?
— Para fazer a minha casa.
— E você não sente falta?
— De quê?
— Ora, do eucalipto-gigante?
— Não. Eu não sinto falta de nada.
Eu adoro a minha casa!

 

 

— adê o conservacionismo
ao qual você sempre se consagrou?
— Eu o abandonei.
— E o abandonei por quê?
— Para me tornar um grileiro sem-vergonha.
— E você não sente falta?
— De quê?
— Ora, de ser conservacionista?
— — Não. Eu não sinto falta de nada.
Eu adoro ser terrulento!

 

 

Chico Mendes

 

 

— adê a fraternidade
que você sempre demonstrou?
— Eu a perdi.
— E a perdeu por quê?
— Porque me tornei xenofóbico.
— E você não sente falta?
— De quê?
— Ora, de ser fraterno?
— — Não. Eu não sinto falta de nada.
Eu adoro ser intolerante!

 

 

 

 

— adê a empatia
que você sempre manifestou?
— Eu a perdi.
— E a perdeu por quê?
— Porque me tornei LGBTQQICAPF2K+fóbico.
— E você não sente falta?
— De quê?
— Ora, de ser empático?
— — Não. Eu não sinto falta de nada.
Eu adoro ser preconceituoso!

 

 

 

 

— adê a misericórdia
que você sempre exteriorizou?
— Eu a perdi.
— E a perdeu por quê?
— Para poder ficar rico.
— E você não sente falta?
— De quê?
— Ora, de ser misericordioso?
— — Não. Eu não sinto falta de nada.
Eu adoro a mais-valia!

 

 

 

 

 

— adê a solidariedade
que você sempre cultivou?
— Eu a perdi.
— E a perdeu por quê?
— Porque me tornei membro da Ku Klux Klan.
— E você não sente falta?
— De quê?
— Ora, de ser solidário?
— — Não. Eu não sinto falta de nada.
Eu adoro a supremacia branca!

 

 

KKK

 

 

— adê a benquerença
que você sempre externou?
— Eu a perdi.
— E a perdeu por quê?
— Porque me tornei um neonazista.
— E você não sente falta?
— De quê?
— Ora, de ser benquerente?
— — Não. Eu não sinto falta de nada.
Eu adoro defender a raça pura ariana!

 

 

The Sound of Music (A Noviça Rebelde)
(Christopher Capitão Georg von Trapp Plummer
– furibundo – rasgando uma bandeira nazista)

 

 

— adê a dignidade
que você sempre apresentou?
— Eu a perdi.
— E a perdeu por quê?
— Para me tornar o maior dos canalhas.
— E você não sente falta?
— De quê?
— Ora, de ser honrado?
— — Não. Eu não sinto falta de nada.
Eu adoro ser filho-da-puta!

 

 

 

 

— adê o respeito ao meio ambiente
que você sempre expressou?
— Eu o perdi.
— E o perdeu por quê?
— Para me tornar um grande poluidor.
— E você não sente falta?
— De quê?
— Ora, de ser um ambientalista?
— — Não. Eu não sinto falta de nada.
Eu adoro ser devastador!

 

 

Aquecimento Global

 

 

— adê a grandeza interior
que você sempre teve?
— Eu a perdi.
— E a perdeu por quê?
— Porque me tornei um reacionário.
— E você não sente falta?
— De quê?
— Ora, da sua grandiosidade?
— — Não. Eu não sinto falta de nada.
Eu adoro ser antidemocrático!

 

 

 

 

— adê a obediência à quarentena
que você sempre agasalhou?
— Eu a perdi.
— E a perdeu por quê?
— Porque me tornei um adepto da cloroquina.
— E você não sente falta?
— De quê?
— Ora, da obediência à ?
— — Não. Eu não sinto falta de nada.
Eu adoro flexibilizar e sassaricar!

 

 

 

 

— adê a encarnação
que você recebeu?
— Eu a perdi.
— E a perdeu por quê?
— Porque me tornei um mago negro.
— E você não sente falta?
— De quê?
— Ora, desta sua reencarnação?
— — Não. Eu não sinto falta de nada.
Eu adoro magia negra!