Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

 

O Espelho

 

 

Furibunda Importuna era uma mulher mal-humoradérrima que reclamava de tudo. Para ela, nada estava bom.

Um dia, como sói acontecer com todos nós, chegou seu dia.

Mal chegou ao lado de lá, logo encontrou uma figurinha rabugenta e difícil de aturar. Era uma encarquilhada mala-sem-alça: egoísta, pessimista, mal-humorada, criticastra, irascível, mal-agradecida, inconveniente, e que só se sentia bem e confortável quando estava a reclamar e a criticar tudo por tudo.

Furibunda, não a suportando mais, foi ao anjo do dia e implorou:

Seu anjo, por favor, livre-me da companhia daquela fulana-dos-anzóis-carapuça; eu já não a agüento mais tanta crítica e tanta impugnação.

O anjo, entre admirado e compadecido, respondeu:

Mas, minha cara Furibunda, não há ninguém ao seu lado. Aqui, o que existe é meio que um sistema de espelhamento. Ele faz com que cada um veja e conviva com o que fabricou para si mesmo, na Terra. Depende somente de você se libertar desse fantasma que engendrou. Agora, se você não se esforçar muito, isto poderá durar milênios!

 

 

 

 

 

Observação:

Este pequeno conto foi editado de um semelhante e de mesmo título, de autor desconhecido, enviado por Alexandre B. R. Freitas à Lista de Teosofia e Esoterismo.

Faça uma visita: http://www.levir.com.br

 

 

 

 

 

 

 

Fui vivendo e reclamando,

resmungando e desagradecendo,

aborrecendo e aporrinhando,

gerundiando e maldizendo.

 

 

Fui mesmo uma mala-sem-alça!

Quando cheguei do outro lado,

o esquálido Caronte1, em sua balsa,

me esperava todo entusiasmado.

 

 

Venha, madame; estou lhe esperando.

Mas venha bem mansinha, sem chiar;

você não perderá nada por esperar.

 

 

E lá fui eu, sacolejando e balseando,

diretinho para o meu inferno.

Não há quem escape do Caderno!

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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Nota:

1. O rio mitológico Aqueronte localiza-se no Épiro, região do noroeste da Grécia. O nome do rio pode ser traduzido como rio do infortúnio. Acreditava-se que fosse um afluente do rio Styx, este localizado no mundo dos mortos. Nele se encontra o esquálido Caronte, o balseiro que leva as almas recém-chegadas ao outro lado do rio, às portas do Hades (também conhecido como o Hospitaleiro, pois sempre há lugar para mais uma alminha desavisada no seu reino), onde o Cérbero (monstruoso cão tricéfalo – mais para 'Canis monstruosus' do que para Canis familiaris – que guarda a entrada do Hades) espera babando os impositivamente convidados. Vai nessa?

 

 

 

 

Fundo musical:

Man in the Mirror (Michael Jackson)

Fonte:

http://www.fortunecity.com/tinpan/pettruciani/35/

 

 

Não há quem escape do Caderno!