EPICURO DE SAMOS
(Pensamentos)

 

 

 

Epicuro de Samos

 

 

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

Introdução e Objetivo do Texto

 

 

Este despretensioso texto oferece para reflexão alguns pensamentos de Epicuro de Samos. A finalidade da Filosofia de Epicuro não era teórica, mas, ao contrário, eminentemente prática. Buscava, sobretudo, encontrar o sossego necessário para uma vida feliz e aprazível, na qual os temores perante o destino, os deuses ou a morte estavam definitivamente eliminados. Para isto, fundamentava-se em uma teoria do conhecimento empirista, em uma física atomista e na ética.

 

 

 

Breve Biografia de Epicuro

 

 

 

Epicuro de Samos (341 a.C., Samos – 271 ou 270 a.C., Atenas) foi um filósofo grego do período helenístico. Seu pensamento foi muito difundido, e numerosos centros epicuristas se desenvolveram na Jônia, no Egito e, a partir do século I, em Roma, onde o poeta e filósofo latino Titus Lucretius Carus, que viveu no século I a.C., foi seu maior divulgador.

 

Para Epicuro, o propósito da Filosofia era atingir a felicidade, estado caracterizado pela aponia – ausência de dor (física) – e pela ataraxia – imperturbabilidade da alma.

 

Segundo Epicuro, para atingir a certeza é necessário confiar naquilo que foi recebido passivamente na sensação pura, e, por conseqüência, nas idéias gerais que se formam no Espírito (como resultado dos dados sensíveis recebidos pela faculdade sensitiva).

 

A Doutrina de Epicuro entende que o sumo bem reside no prazer, e, por isto, foi uma doutrina muitas vezes confundida com o hedonismo. O prazer de que fala Epicuro é o prazer do sábio, entendido como quietude da mente e domínio sobre as emoções, e, portanto, sobre si mesmo. É o prazer da justa-medida e não dos excessos.

 

Curiosamente, muito curiosamente mesmo, na Divina Commedia, do escritor, poeta e político italiano Dante Alighieri (Florença, 1º de junho de 1265 – Ravenna, 13 ou 14 de setembro de 1321), Epicuro é colocado no Inferno, como se tivesse sido um herege e um hedonista sem-vergonha (que não foi). Dante devia estar bêbado ou sei-lá-o-quê quando o colocou de castigo na 6º Prisão, junto com seus seguidores, na cidade de Dite. No Inferno dantiano, a pena dos hereges é o enterramento em túmulos ardentes e abertos, tendo os membros queimados pela areia escaldante. Valha-me São Agapito; tudo, menos calor!

 

 

 

 

 

 

 

Pensamentos Epicuristas

 

 

 

A necessidade é um mal, mas não há necessidade alguma de viver com necessidade.

 

As enfermidades duradouras proporcionam à carne mais prazer do que dor.

 

Nada é suficiente para quem o suficiente é pouco.

 

Não tema deus. Não se preocupe com a morte. O que é bom é fácil de ter, e o que é terrível é fácil agüentar.

 

A vida do justo é pouco perturbada por inquietações; já a do injusto é cheia das maiores inquietações.

 

Em primeiro lugar, considerando a divindade como um ente imortal e bem-aventurado, como sugere a percepção comum de divindade, não atribuas a ela nada que seja incompatível com a sua imortalidade nem inadequado à sua bem-aventurança; pensa a respeito dela tudo que for capaz de conservar em ti a felicidade e a imortalidade.

 

Acostuma-te à idéia de que, para nós, a morte não é nada, visto que todo bem e todo mal residem nas sensações, e a morte é justamente a privação das sensações. A consciência clara de que a morte não significa nada para nós proporciona a fruição da vida efêmera, sem querer acrescentar-lhe tempo infinito e eliminando o desejo de imortalidade.

 

Não existe nada de terrível na vida para quem está perfeitamente convencido de que não há nada de terrível em deixar de viver.

 

O sábio, porém, nem desdenha viver nem teme deixar de viver; para ele, viver não é um fardo, e não-viver não é um mal.

 

Nunca devemos nos esquecer de que o futuro não é nem totalmente nosso nem totalmente não-nosso, para não sermos obrigados a esperá-lo como se estivesse por vir com toda a certeza, nem nos desesperarmos como se não estivesse por vir jamais.

 

Habituar-se às coisas simples, a um modo de vida não luxuoso, portanto, não só é conveniente para a saúde, como ainda proporciona ao homem os meios para enfrentar corajosamente as adversidades da vida. Nos períodos em que conseguimos levar uma existência rica, predispõe o nosso ânimo para melhor aproveitá-la, e nos prepara para enfrentar sem temor as vicissitudes da sorte.

 

Quando, então, dizemos que o fim último é o prazer, não nos referimos aos prazeres dos intemperantes ou aos que consistem no gozo dos sentidos, como acreditam certas pessoas que ignoram o nosso pensamento, ou não concordam com ele, ou o interpretam erroneamente, mas ao prazer que é ausência de sofrimentos físicos e de perturbações da alma. Não são, pois, bebidas nem banquetes contínuos, nem a posse de mulheres e rapazes, nem o sabor dos peixes ou das outras iguarias de uma mesa farta que tornam doce uma vida, mas um exame cuidadoso que investigue as causas de toda escolha e de toda rejeição e que remova as opiniões falsas em virtude das quais uma imensa perturbação toma conta dos espíritos.

 

 

 

 

De todas estas coisas, a prudência é o princípio e o supremo bem, razão pela qual ela é mais preciosa do que a própria Filosofia. É dela que se originaram todas as demais virtudes; é ela que nos ensina que não existe vida feliz sem prudência, beleza e justiça, e que não existe prudência, beleza e justiça sem felicidade.

 

As virtudes estão intimamente ligadas à felicidade, e a felicidade é inseparável delas.

 

O prazer é o princípio e o fim de uma vida feliz.

 

A morte é uma quimera, porque enquanto eu existo, não existe a morte, e quando existe a morte, eu já não existo.

 

A morte, temida como o mais horrível dos males, não é, na realidade, nada, pois enquanto nós somos, a morte não é, e quando esta chega, nós não somos.

 

A morte nada é para nós, pois aquilo que já foi dissolvido não possui mais sentimentos. Aquilo, porém, que não possui mais sentimentos, não nos importa.

 

Faz tudo como se estivesses a ser contemplado.

 

O apogeu do prazer será alcançado quando todas as dores forem eliminadas. Pois, onde entrou o prazer não existem, enquanto ele reinar, nem dores nem padecimentos, ou até ambos.

 

Se aquilo que ocasiona prazer aos libertos eliminasse os receios do Espírito, dos fenômenos da Natureza, da morte e das dores, e se ainda ensinasse o conhecimento da limitação das ânsias, nada teríamos a desaprovar nestas pessoas.

 

A riqueza exigida pela Natureza é limitada e facilmente arranjada; aquela, pelo contrário, que ambicionamos possuir em um tolo desejo chega ao infinito.

 

A segurança, perante os homens, pode ser fortificada, até um certo grau, pelo poder e pela riqueza; aquela, porém, que é conferida pela vida na tranqüilidade e no retiro da massa dos homens é certamente mais genuína.

 

Verdade é que o homem sensato não evita o prazer, e quando, finalmente, as circunstâncias o obrigam a deixar a vida, ele não se comporta como se esta ainda lhe devesse algo para a suprema existência.

 

A faculdade de granjear amizades é, de longe, a mais eminente entre todas aquelas que contribuem para a sabedoria da felicidade.

 

O mesmo conhecimento a que devemos o consolo de que nenhum terror é eterno ou que dure muito tempo, também nos deixa compreender que durante o terror, de duração limitada, a verdadeira segurança nos é proporcionada pela amizade.

 

Dentre os desejos, alguns são dependentes da Natureza e necessários; outros são dependentes da Natureza, porém não são necessários; outros, ainda, nem são dependentes da Natureza nem necessários, mas oriundos de uma vã ilusão.

 

Injustiça, por si só, não é um mal. O verdadeiro mal reside no receio desconfiado de que o ato possa vir a ser escondido do juiz competente.

 

Nascemos uma única vez; uma segunda vez não nos é dada, e não nasceremos mais por toda a eternidade.1

 

Se não podemos ver-nos, trocar idéias, nem estar em companhia um do outro, o sentimento do amor evaporar-se-á em pouco tempo.

 

Toda amizade, por mais desejável que seja por si mesma, é, no fim das contas, construída sobre o proveito próprio.

 

Ávidos pelos bens distantes, não devemos desprezar os bens próximos; lembremo-nos de que estes últimos também, outrora, foram ansiosamente desejados.

 

Quem exige ajuda constante e, do mesmo modo, quem nunca a presta, não é amigo. O primeiro quer comprar o nosso esforço com o seu afeto; o segundo nos rouba, para todo o futuro, a esperança consoladora.

 

Soube que a apetência da tua carne te impele exageradamente às relações sexuais. Segue-a, conforme o teu desejo, mas trata de não infringires as leis, não ofenderes a decência, não magoares algum amigo teu, não abalares a tua saúde e não desperdiçares a tua fortuna. É difícil, porém, não ficar emaranhado em uma destas dificuldades. O gozo do amor não traz proveito; devemos até ficar contentes se não for prejudicial.

 

Cada um sai da vida do mesmo modo como se tivesse acabado de nascer.2

 

Devemos indagar, por ocasião de todos os desejos: o que há de acontecer quando o meu apetite for satisfeito, e o que acontecerá se ele não o for?

 

Nada faças na vida algo que te cause medo se teu vizinho vier a sabê-lo.3

 

É sem valor pedir aos deuses aquilo que nós mesmos podemos realizar.

 

Não provamos nosso sentimento ao amigo compartilhando as suas lamentações, mas, sim, com a nossa ajuda ativa.

 

O fruto mais saboroso da auto-suficiência é a liberdade.


Pelo medo de ter de se contentar com pouco, a maioria dos homens se deixa levar a atos que aumentam mais ainda este medo.

 

Muitos que alcançaram a riqueza não conseguiram um remédio contra seus males; apenas os trocaram por males ainda piores.

 

As leis existem para os sábios, não para que não pratiquem injustiças, mas para que não as sofram.

 

Aquele que inspira medo aos outros não está, ele próprio, livre deste medo.

 

 

 

 

Se queres a verdadeira liberdade, deves fazer-te servo da Filosofia.

 

Ou Deus quer abolir o mal e não pode, ou pode e não quer, ou não pode e não quer, ou quer e pode. Se quer e não pode é impotente, o que não pode ser em Deus. Se pode e não quer é perverso, o que igualmente é contrário a Deus. Se não pode e não quer é impotente e perverso; portanto, não pode ser Deus. Se quer e pode – o que só convém a Deus – de onde provém a existência do mal e por que Deus não o elimina?

 

A justiça é a vingança do homem em sociedade, como a vingança é a justiça do homem em estado selvagem.

 

Não podemos viver felizes se não formos justos, sensatos e bons; e não podemos ser justos, sensatos e bons sem sermos felizes.

 

Das coisas que a sabedoria proporciona para tornar a vida inteiramente feliz, a maior de todas é uma amizade.

 

Na discussão, o vencido obtém maior proveito, pois aprende o que ainda não sabia.

 

Não há o que temer na morte. Pode-se alcançar a felicidade e suportar a dor.

 

Nenhum prazer é em si um mal, porém certas coisas capazes de engendrar prazeres trazem consigo maior número de males que de prazeres.

 

O homem é rico desde que se familiariza com a pobreza.

 

O impossível reside nas mãos inertes daqueles que não tentam.

 

 

 

 

O prazer de fazer o bem é maior do que o de recebê-lo.

 

O prazer é o primeiro dos bens. É a ausência de dor no corpo e de inquietação na alma.

 

Os grandes navegadores devem sua reputação aos temporais e às tempestades.

 

Os prazeres do amor jamais nos serviram. Devemos nos considerar felizes se não nos aborrecerem.

 

Somente o justo desfruta de paz de espírito.

 

Tu, que não és senhor do teu amanhã, não adies o momento de gozar o prazer possível! Consumimos nossa vida a esperar e morremos empenhados na espera do prazer.

 

Quem não considera o que tem como a maior riqueza, será sempre desditoso, ainda que seja dono do mundo.

 

Aquele que melhor goza a riqueza é aquele que menos necessidade dela tem.

 

O desejo é a causa de todos os males.

 

Não temos tanta necessidade da ajuda dos amigos quanto da certeza da sua ajuda.

 

Só há um caminho para a felicidade. Não nos preocuparmos com coisas que ultrapassam o poder da nossa vontade.

 

O homem sereno procura serenidade para si e para os outros.

 

Entre os homens, na maioria dos casos, a inatividade significa torpor, e a atividade, loucura.

 

Queres ser rico? Pois não te preocupes em aumentar os teus bens, mas sim em diminuir a tua cobiça.

 

As pessoas felizes lembram o passado com gratidão, alegram-se com o presente e encaram o futuro sem medo.

 

O justo é tranqüilíssimo; o injusto é sempre muito solícito.

 

A amizade e a lealdade residem em uma identidade de almas raramente encontrada.

 

Todo o desejo incômodo e inquieto se dissolve no amor da verdadeira Filosofia.

 

 

 

 

Nunca se protele o filosofar quando se é jovem nem se canse de o fazer quando se é velho, pois que ninguém é jamais pouco maduro nem demasiado maduro para conquistar a saúde da alma. E quem diz que a hora de filosofar ainda não chegou ou já passou assemelha-se ao que diz que ainda não chegou ou já passou a hora de ser feliz.

 

Assim como realmente a Medicina em nada beneficia se não liberta os males do corpo, assim também sucede com a Filosofia se não liberta as paixões da alma.

 

Não poderá afastar o temor de aquilo a que damos importância quem não souber qual é a natureza do Universo e que se [pre]ocupe com as fábulas míticas. Por isto, não se podem gozar prazeres puros sem a ciência da Natureza.

 

 

 

 

Os átomos encontram-se eternamente em movimento contínuo, e uns se afastam entre si uma grande distância, outros detêm o seu impulso, quando, ao se desviarem, se entrelaçam com outros ou se encontram envolvidos por átomos enlaçados ao seu redor. Isto produz a natureza do vazio, que separa cada um deles dos outros, por não ter capacidade de oferecer resistência. Então, a solidez própria dos átomos, por causa do choque, lança-os para trás, até que o entrelaçamento não anule os efeitos do choque. E este processo não tem princípio, pois que são eternos os átomos e o vazio.4

 

A serenidade espiritual é o fruto máximo da justiça.

 

Se queres enriquecer Pítocles, não lhe acrescentes riquezas: diminui-lhe os desejos.

 

Realmente não concordam com a bem-aventurança preocupações, cuidados, iras e benevolências. O ser bem-aventurado e imortal não tem incômodos, nem os produz aos outros, nem é possuído de iras ou de benevolências, pois é no fraco que se encontra qualquer coisa de natureza semelhante.

 

É insensato aquele que diz temer a morte, não porque ela o aflija quando sobrevier, mas porque o aflige prevê-la: o que não nos perturba quando está presente inutilmente nos perturba também enquanto o esperamos.

 

O essencial para a nossa felicidade é a nossa condição íntima. E desta somos nós os amos.

 

Se recusas todas as sensações, não terás possibilidade de recorrer a nenhum critério para julgar as que, entre elas, consideras falsas.5

 

Da superfície dos corpos se desprende um eflúvio contínuo, que se não manifesta como diminuição, visto que se encontra compensado pelo afluxo, e conserva durante muito tempo a posição e a ordem dos átomos do corpo sólido.

 

 

 

 

Não haveria erro se não concebêssemos também outro movimento em nós próprios, unido com ele, mas distinto. Por isto, se não é confirmado ou desmentido nasce o erro; se é confirmado ou não desmentido, a verdade.

 

Temos de saber extrair pelo raciocínio conclusões concordantes com os fenômenos. A sensação deve nos servir para proceder, raciocinando, à indução de verdades que não são acessíveis aos sentidos. E assim, é verdadeiro tanto o que vemos com os olhos como aquilo que apreendemos mediante a intuição mental.6

 

[Para a explicação dos fenômenos naturais] não se deve recorrer nunca à natureza divina; antes, deve-se conservá-la livre de toda a tarefa e em sua completa bem-aventurança.

 

Devemos estar sempre atentos ao método da multiplicidade [de causas possíveis para os fenômenos naturais]. Adquire-se tranqüilidade sobre todos os problemas resolvidos com o método da multiplicidade, de acordo com os fenômenos, quando se cumpre com a exigência de deixar subsistir as explicações convincentes. Pelo contrário, quando se admite uma e se exclui a outra, que se harmoniza igualmente com o fenômeno, é evidente que se abandona a investigação naturalista para se cair no mito.

 

Antes de mais, nada provém do nada, pois que, então, tudo nasceria sem necessidade de sementes. E, se se dissolvesse no nada tudo o que desaparece, todas as coisas seriam destruídas, anulando-se as partes nas quais se decompunham. E também é certo que o todo foi sempre tal como é agora e será sempre assim, pois nada existe nele que possa ser mudado. Com efeito, mais além do todo não existe nada que penetrando nele produza a sua transformação.

 

O Universo é corpo e espaço. Com efeito, a sensação testemunha em todos os casos que os corpos existem e, conformando-nos com ela, devemos argumentar com o raciocínio sobre aquilo que não é evidente aos sentidos. E se não existisse o espaço, que é chamado vazio, lugar e natureza impalpável, os corpos não teriam onde estar nem onde se mover.

 

Alguns corpos são compostos, e outros elementos dos compostos; e estes últimos são indivisíveis e imutáveis, visto que é forçoso que alguma coisa subsista na dissolução dos compostos. Se assim não fosse, tudo deveria se dissolver em nada. São sólidos por natureza, porque não têm nem onde nem como se dissolver. De maneira que é preciso que os princípios sejam substâncias corpóreas e indivisíveis.

 

Não é necessário supor que em um corpo limitado existam corpúsculos em número infinito nem de qualquer tamanho. Por conseguinte, não só devemos excluir a divisão ao infinito em partes cada vez menores, para não privarmos o todo da capacidade de resistência e nos vermos constrangidos, na concepção dos compostos, a reduzir os seres ao nada mediante a compressão, como também não se deve supor que nos corpos limitados exista a possibilidade de continuar passando até o infinito a partes cada vez menores. Porque, se se afirma que em um corpo existem corpúsculos em número infinito e em todos os graus de pequenez, é impossível conceber como terminaria isto, e, então, como poderia ser limitada a grandeza de cada corpo? Qualquer que fosse a grandeza dos corpúsculos, também seria infinita a grandeza dos corpos.

 

Os átomos têm uma inconcebível variedade de formas, pois não poderiam nascer tantas variedades, se as suas formas fossem limitadas. E, para cada forma, são absolutamente infinitos os semelhantes, ao passo que as variedades não são absolutamente infinitas, mas simplesmente inconcebíveis. E se deve supor que os átomos não possuam nenhuma das qualidades dos fenômenos, exceto forma, peso, grandeza e todas as outras que são necessariamente intrínsecas à forma. Porque toda qualidade muda, mas os átomos não mudam,7 visto que é necessário que na dissolução dos compostos permaneça alguma coisa de sólido e de indissolúvel que faça realizar as mudanças, não no nada ou do nada, mas, sim, por transposição.

 

Há mundos infinitos ou semelhantes a este ou diferentes. Com efeito, sendo os átomos infinitos em número, como já se demonstrou, são levados aos espaços mais distantes. Realmente, tais átomos, dos quais pode surgir ouse formar um mundo, não se esgotam nem em um nem num número limitado de mundos, quer sejam semelhantes quer sejam diversos destes. Por isto nada, impede a infinidade dos mundos.

 

A alma é corpórea, composta de partículas sutis, difusa por toda a estrutura corporal, muito semelhante a um sopro que contenha uma mistura de calor, semelhante um pouco a um e um pouco a outro, e também muito diferente deles pela sutileza das partículas, e também, por este lado, capaz de se sentir mais em harmonia com o resto do organismo. Tudo isto manifestam as faculdades da alma, os afetos, os movimentos fáceis e os processos mentais, privados dos quais morremos. E é necessário admitir que a alma leva em si a causa principal das sensações, mas certamente estas não se produziriam se, de algum modo, não estivessem contidas no resto do organismo. E o resto do organismo, tendo preparado esta capacidade causal, participa ele próprio, por meio dela, de semelhante condição, mas não de todas as condições que ela adquire. Por isto, quando a alma se separa do corpo, este perde a sensibilidade. Efetivamente, não tinha em si esta faculdade, mas preparava-a para a outra, nascida juntamente com ele, a qual, posteriormente, pela faculdade nela desenvolvida por meio do movimento, desenvolvendo imediatamente para si a condição da sensibilidade, dava participação ao corpo, por contato e correspondência. É por isto que a alma, enquanto permanece no corpo, nunca pode perder a sensibilidade, mesmo se desaparecer alguma parte do corpo, enquanto persiste uma excitação à sensação, mesmo se desaparecer também alguma faculdade da alma em virtude de uma destruição do corpo, quer no seu todo, quer nas suas partes. O corpo, pelo contrário, mesmo que fique intato, quer no seu todo, quer nas suas partes, deixa de possuir sensibilidade quando dele se afastou o princípio que retém unida a multidão dos átomos que constituem a natureza da alma. E, também, no entanto, é verdadeiro se dizer que, logo que se dissolve inteiramente o corpo, a alma se dissipa, e, disseminada, perde a sua força e os seus movimentos, de tal modo que também ela se torna insensível.

 

Nem a posse das riquezas nem a abundância das coisas nem a obtenção de cargos ou o poder produzem a felicidade e a bem-aventurança; produzem-na a ausência de dores, a moderação nos afetos e a disposição de espírito que se mantenha nos limites impostos pela Natureza.

 

Como o prazer é o primeiro e inato bem, é igualmente por este motivo que não escolhemos qualquer prazer; antes, pomos de lado muitos prazeres quando, como resultado deles, sofremos maiores pesares. Portanto, preferimos muitas dores aos prazeres quando, depois de longamente havermos suportado as dores, gozamos de prazeres maiores. Por conseguinte, cada um dos prazeres possui por natureza um bem próprio, mas não se deve escolher cada um deles; do mesmo modo, cada dor é um mal, mas nem sempre se deve evitá-las. Convém, então, valorizar todas as coisas de acordo com a medida e o critério dos benefícios e dos prejuízos, pois que, segundo as ocasiões, o bem nos produz o mal e, em troca, o mal, o bem.

 

Realmente, não sei conceber o bem, se suprimo os prazeres que se apercebem com o gosto, e suprimo os do amor, os do ouvido e os do canto, e ponho também de lado as emoções agradáveis causadas à vista pelas formas belas ou os outros prazeres que nascem de qualquer outro sentido do homem. Não é também verdade que a alegria espiritual seja a única da ordem dos bens, porque sei também que a inteligência se alegra pelo seguinte: pela esperança de tudo aquilo que nomeei antes e em cujo gozo a natureza humana pode permanecer isenta de dor.

 

Quando te angustias com as tuas carência, te esqueces da Natureza: a ti mesmo te impões infinitos desejos e temores. Então, quem obedece à Natureza e não às vãs opiniões, a si próprio se basta em todos os casos. Com efeito, para o que é suficiente por natureza, toda a aquisição é riqueza, mas, por comparação com o infinito dos desejos, até a maior riqueza é pobreza.

 

É fácil tudo o que a Natureza quer e difícil o que é vaidade.

 

Encontro-me cheio de prazer corpóreo quando vivo a pão e água, e cuspo sobre os prazeres da luxúria, não por si próprios, mas pelos inconvenientes que os acompanham.

 

A quem não basta pouco, nada basta.

 

Quem menos sente a necessidade do amanhã mais alegremente se prepara para o amanhã. A vida do insensato é ingrata; encontra-se em constante agitação e está sempre dirigida para o futuro. Recordemos que o futuro não é nosso, para não termos de esperá-lo como se estivesse para chegar, nem nos desesperarmos como se, em absoluto, não estivesse para vir.

 

Cura as desgraças com a agradecida memória do bem perdido e com a convicção de que é impossível fazer que não exista aquilo que já aconteceu.

 

 

 

 

A justiça não tem existência por si própria, mas sempre se encontra nas relações recíprocas, em qualquer tempo e lugar, em que exista um pacto de não produzir nem sofrer dano. Entre os animais que não puderam fazer pactos para não provocar nem sofrer danos, não existe justo nem injusto; e o mesmo sucede entre povos que não puderam ou não quiseram concluir pactos para não prejudicar nem ser prejudicados.

 

Das normas prescritas como justas, o que é considerado útil nas necessidades da convivência recíproca tem o caráter do justo, embora no fim não seja igual para todos os casos. Se, pelo contrário, se se estabelece uma lei que depois não se revela conforme a utilidade da convivência recíproca, então, já não é mais uma lei justa nem conserva o caráter do justo.

 

O sábio não participará da vida pública se não sobrevier causa para tal. Vive ignorado.

 

Realizará o sábio coisas que a lei proíbe, sabendo que permanecerão ocultas? Não é fácil encontrar uma resposta absoluta!

 

A Natureza, única para todos os seres, não fez os homens nobres ou ignóbeis, mas, sim, as suas ações e as suas disposições de espírito.

 

O que é agora, será e sempre foi no tempo transcorrido.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

_____

Nota:

1. Esta sentença pode ser interpretada de duas maneiras: 1ª) verbatim, litteratim et punctatim (palavra por palavra, letra por letra e ponto por ponto); ou 2ª) considerando que não reencarnamos jamais iguaizinhos ao que fomos no passado, pois, como disse o filósofo, cientista, matemático, diplomata e bibliotecário alemão Gottfried Wilhelm von Leibniz (Leipzig, 1º de julho de 1646 – Hannover, 14 de novembro de 1716), sempre alguma coisa muda e outra permanece, e basta que só uma coisinha mude para não sermos mais rigorosamente iguais ao que fomos antes.

 

 

 

2. Aqui, novamente, esta sentença pode ser interpretada de duas maneiras: 1ª) verbatim, litteratim et punctatim; ou 2ª) considerando que, sempre, fomos, somos e seremos filhos da Eterna Vida – um em tudo e em todos e tudo e todos em nós. Se prevalecer este segundo entendimento, é fato: sempre sairemos da vida do mesmo modo como nascemos.

3. Novamente, duas possibilidades se afiguram: 1ª) verbatim, litteratim et punctatim; ou 2ª) considerando o vizinho como nossa Consciência – nosso Átomo-semente, nosso eu Interior.

4. Aqui, há um equívoco perdoável, digamos assim, pois, não há vazio no Universo.

5. Por isto, tenho dito: não adianta fugir do pecado ou de lugares, por assim dizer, pecaminosos. O pecado deve ser compreendido, vencido e dominado, não temido ou, meio que, posto para escanteio. Você põe um pecado para escanteio, alguém bate o corner, e o pecado entra.

6. Não é (bem) assim. O que vemos com os olhos, geralmente, é ilusivo. O que apreendemos mediante a intuição mental também poderá ser enganador. É por isto que a grande dificuldade na Via Prestigiosa da Iniciação é separar o trigo do joio, isto é, decantar o que efetivamente é um discernimento autêntico do que é fantasia criativa. Mas, o que é um discernimento autêntico? Por isto, não há uma verdade absoluta; todas as verdades apreendidas ou intuicionadas são relativas. Conseqüentemente, é inteiramente inútil, como muitos fazem, ler a Bíblia ao pé da letra. E assim, BeREShITh BaRA ELOHIM, simbolicamente, significa no começo – e equivale às cifras 2–200–1–300–10-400. Estas seis cifras simbolizam as seis Forças Cósmicas que presidiram a obra, ainda inconclusa, dos seis dias. Este saber também se encontra expresso no Hexagrama de Salomão. BaRA – que significa criar (no sentido de concepção mental da criação) – possui as cifras 2-200-1. Sobre a palavra ELOHIM (ALHIM) duas observações devem ser feitas: sua terminação IM indica caráter plural (AL e ALH) e expressa precisamente Justiça Divina. Então, o entendimento de que no princípio criou Deus o céu e a Terra está rigorosamente truncado, até porque a presumida criação está em curso, e antes do Período Terrestre se manifestaram os Períodos Lunar, Solar e de Saturno.

7. Na época de Epicuro, os fenômenos radioativos não eram conhecidos ou, se, um dia, foram conhecidos, este conhecimento havia sido perdido ou estava oculto a sete chaves. A radioatividade, como hoje a conhecemos, é um fenômeno natural ou artificial, pelo qual algumas substâncias ou elementos químicos, chamados radioativos (radioisótopos ou nuclídeos radioativos), são capazes de emitir radiações, as quais têm a propriedade de impressionar placas fotográficas, ionizar gases, produzir fluorescência, atravessar corpos opacos à luz ordinária, provocar alterações moleculares (impedimento da divisão celular, danificação da divisão celular, modificações na estrutura genética das células reprodutoras, destruição total da célula) etc. As radiações emitidas pelas substâncias radioativas são principalmente partículas alfa, partículas beta e radiação gama. Entretanto, o que, exatamente, Epicuro chamou de átomo? Lembremos que a palavra átomo vem do grego, atomos, os, on – que não pode ser cortado, que é indivisível. Abaixo, a animação de uma fissão nuclear.

 


 

Páginas da Internet consultadas:

http://media.photobucket.com/image/hell+gif+/
mycopyguy_2009/1246040194_doggie-hell.gif

http://pt.wikipedia.org/wiki/Epicurismo

http://pt.wikipedia.org/wiki/Epicuro

http://frasesdomsn.blogspot.com/
2011/03/minuto-sabedoria.html

http://asatech.wikispaces.com/Japan

http://www.argim.net/descargar/
266157/animacion-atomo/

http://search.4shared.com/postDownload/ML1r
MQLP/Epicuro_-_Trechos_selecionados.html

http://www.physics.usyd.edu.au/
~helenj/LivesoftheStars.html

http://pensador.uol.com.br/autor/epicuro/2/

http://pensador.uol.com.br/autor/epicuro/

http://izismile.com/2009/07/28/
hitler_in_gif_animations_18_gifs.html

http://www.csb.yale.edu/userguides/
image/moviemaker/anim_gif.html

http://physics.ucsd.edu/students/courses/
winter2008/physics110b/strings.html

http://pt.wikiquote.org/wiki/
Epicuro_de_Samos

 

Música de fundo:

Forrest Gump Theme
Compositor: Alan Silvestri

Fonte:

http://beemp3.com/