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313 d. C., o Imperador Constantino – aproveitando-se da
grande difusão e aceitação do Cristianismo
– apoderou-se maquiavelicamente dessa incipiente
Religião e deu início a uma reestruturação
religiosa conforme seus interesses políticos. Doze anos
depois, em 325 d. C, no Concílio de Nicéia por
ele convocado, é fundada, oficialmente, a Igreja Católica;
mas, em 323 d. C. Constantino já havia prudentemente
se convertido ao Cristianismo. E assim, a Igreja Católica
passou a ser e a fazer parte ativa do sistema político
que estava no poder. Daí em diante, como informa o escritor
Roberto C. P. Júnior, as convenientes misturas do Paganismo
com o Cristianismo foram crescendo, principalmente em Roma,
dando origem ao Catolicismo Romano. Pode-se concluir, então,
que a Igreja Católica não foi fundada por Pedro
e está longe de ser a Igreja primitiva dos Apóstolos,
que não era propriamente uma igreja, mas, sim, diversas
ekklesias (ajuntamentos, muitas vezes secretos, de
convocados onde eram lidas e discutidas as cartas e as mensagens
dos Apóstolos, e tinham, em determinadas ocasiões,
um sentido mais político do que religioso). Então,
Ekklesia tou Theou (Igreja de Deus) é uma mera
reivindicação humana posterior. Contudo, há
uma Santa Igreja Gnóstica, Invisível, Verdadeira
e Eterna que nada reivindica.
O tempo passa, e como não
poderia deixar de acontecer – e aconteceu – veio
a draconiana asseveração: Fora da Igreja não
há salvação. Isso foi apenas mais
um passo para a afirmação do poder clerical, pois
já estava em vigor a quintessência teológica
Credo quia absurdum (Acredito, mesmo que seja absurdo),
imposição quintessencial criada pelo prestigiado
teólogo e apologista cristão Tertuliano (155-220
d. C.). Estavam assim abolidas todas e quaisquer meditações
e reflexões místicas. Pelo menos em público.
Só passaram a importar as decisões autoritárias,
curiais e verticais promanadas da Igreja. Era a Idade Média!
Entre
os manuscritos encontrados no Mar Morto – Biblioteca de
Nag Hammadi – figura o Evangelho (apócrifo?!)
atribuído a Felipe (consultar o versículo 91 do
Evangelho de Felipe), constituído de uma compilação
judiciosa de ensinamentos gnóstico-iniciáticos,
obviamente do conhecimento de Jesus. O Gnosticismo deriva do
Pitagorismo, do Platonismo, do Zoroastrismo e do Mitraísmo,
com raízes bem fundadas nas tradições iniciáticas
egípcia e mesopotâmica.
No
Evangelho de Felipe está escrito: Os que
herdam dos mortos estão eles mesmos mortos e são
herdeiros de mortos. Os que herdam dos vivos vivem eles próprios
e são herdeiros de quem está vivo e de quem está
morto. Os mortos não herdam de ninguém, pois como
pode herdar aquele que está morto? Se aquele que está
morto herda de quem está vivo, não morrerá.
Antes, viverá com maior razão. O viver e
o morrer desta Sentença precisa ser compreendido, em
momentos específicos, como Viver e como
Morrer. Quem é herdeiro do que é
vivo? Herdeiro do que é vivo é todo
aquele que Morreu para Viver.
Aqueles que cobiçam, procuram e festejam as coisas deste
mundo mortos estão, pois, herdam dos mortos, estão
eles mesmos mortos e são herdeiros de mortos. Por
isso escreveu Felipe: Aquele que acreditou na Verdade
encontrou a Vida e corre o perigo de Morrer,
pois está Vivo. Então, Morrer
é Nascer Iniciaticamente para a Eterna
Vida e morrer para a vida terrena no sentido ilusório,
consumista e materialista. O fato é que é impossível
Nascer depois de se estar morto. Só
é possível Morrer se se está
vivo; e só é possível Viver,
Morrendo. Quem Morre Vive para
o Eterno Sol. Mas, a ninguém é
dado escapar da Noite Negra da alma.
No início século
XIII, Santo António de Lisboa (Fernando Martini Bulhões)
ensinou que a Noite Mística (Noite Negra ou Noite Obscura)
da alma é o vestibular da ascensão mística.
Nesse sentido, o Santo referiu-se à Noite como a obscuridade
dos místicos — mysticorum obscuritas.
A Noite não tem, ordinariamente, a duração
da noite física. A Noite tem começo (Conticinium),
meio (Media Nox) e fim (Aurora), e o tempo
de duração é individual. Durante sua manifestação,
a Noite tem e traz conseqüências terríveis,
dentre as quais o Santo aponta: privação da luz
da razão; o ser torna-se frágil e o conhecimento
adequado de nada adianta; o eu interior fica em trevas e o homem
é tentado a tudo abandonar (trevas da consciência);
a claridade tentadora da prosperidade mundana entenebrece a
alma e se transmuda em caligem da morte; a Noite é um
amplo campo de adversidades em que a alma anda às apalpadelas
sem consciência de si mesma. A Noite é, pois, uma
etapa da reintegração (regeneração)
do homem à sua imaculada, cósmica e divina origem.
E, nesse aprendizado, terá que eliminar, minimamente,
a soberba do coração, a lascívia da carne,
a avareza do mundo, a ira, a vanglória, a inveja e a
gula, que compõem as sete violações capitais
enunciadas na teologia católica. Contudo, isso é
apenas uma parte da Transmutação Místico-Alquímica.
A animação abaixo pretende, pictoricamente, mostrar
esse entendimento.
Continua o Evangelho de
Felipe: A luz e as trevas, a vida e a morte, os da direita e
os da esquerda são irmãos entre si, sendo impossível
separar uns dos outros. Por isso, nem os bons são bons,
nem os maus são maus, nem a vida é vida e nem
a morte é morte. Assim é que cada um virá
a se dissolver em sua própria origem desde o princípio;
mas, os que estão além do Mundo são indissolúveis
e eternos. Simplesmente o que esta sentença quer
ensinar é que somos todos um. Mas, somos um no Todo e
com o Todo e individualmente um como individualidade. Contudo,
só não sofreremos os efeitos da entropia universal
e não seremos reciclados se Nascermos
para a Eternidade. Este é o sentido da frase: os
que estão além do Mundo são indissolúveis
e eternos. Isto está vinculado ao Nascer/Morrer
da sentença anterior. O Crestos Solar
veio para que pudéssemos Viver conscientemente
para e na Eternidade. Esse é o único sentido que
pode ser atribuído à salvação —
que só depende de nós. O desde o princípio
significa desde o momento em que o ente se tornou autoconsciente.
Esse foi o princípio da peregrinação —
semelhante a mineral... semelhante a vegetal... semelhante a
animal... homem... Somos todos um.
Escreveu Felipe:
Só há um NOME que não
se pronuncia no Mundo: o NOME que o Pai deu
ao Filho. É superior a tudo. Trata-se do NOME
do Pai, pois o Filho não chegaria a ser Pai se não
houvesse se apropriado do NOME do Pai. Quem está de posse
desse NOME O entende, mas não fala DELE;
mas, os que não estão de posse DELE não
O entendem. A primeira súplica do Pai Nosso
(Oração das Sete Súplicas)
é exatamente: Santificado seja o Vosso NOME.
Só quem Morre e Vive
realiza o SANTO NOME.
Ensina Felipe:
Cristo encerra tudo em Si Mesmo – seja homem, seja
anjo, seja mistério – incluindo o Pai. O Pai,
o Filho, o Espírito e as coisas conformam uma Unidade
que tem aparência de multiplicidade. As coisas, entretanto,
não conhecem essa Unidade, pois recitam: faça-se
a minha vontade humana e não a Tua. Para Viver
é necessário que se faça a Tua Vontade
— a Vontade do Mestre Interior (in Corde) constuído
pela nossa Vontade Cósmica, Una e Indissolvível.
O Evangelho de Felipe
ensina: Os que dizem que o Senhor primeiro morreu e depois
ressuscitou, enganam-se, pois primeiro ressuscitou e depois
morreu. Se alguém não conseguir primeiro a ressurreição
não morrerá... Este passo do evangelho filipino
é difícil de ser entendido, mas se pudermos admitir,
literalmente, a Ressurreição
como o retorno da Morte à Vida,
então fica, de certo modo, compreensível
que antes de poder Morrer o Iniciado terá
que conhecer seu inferno pessoal e suas construções
demoníacas, transmutá-los alquimicamente e, então,
Ressuscitado para a Vida,
poderá Morrer. Não é mesmo
possível Morrer sem Ressuscitar.
É nesse sentido que Felipe,
no versículo 23, ensina: Há os que têm
medo de ressuscitar nus e por isso querem ressuscitar em carne...
Nem a carne [nem o sangue] herdarão o Reino...
Por isso disse Jesus: 'Aquele que não comer a minha Carne
e não beber o meu Sangue não tem Vida em si. E
Felipe explica: Sua Carne é o Logos [Verbum]
e seu Sangue é o Espírito Santo. Nesta Carne
[e neste sangue] tudo está contido. O resumo
de tudo isso é muito simples: fora só reina a
ilusão, e o Reino ao qual aludiu Jesus está
no interior de cada um de nós. O Reino, assim,
é e não é deste Mundo!
No versículo
37 do evangelho filipino está escrito: O que o pai
possui pertence ao filho, mas enquanto este é pequeno
não se lhe confia o que é seu. Quando se faz homem,
então dá-lhe o pai tudo quanto possui. O
ente encarnado, para fazer jus ao que é seu, precisa
se alquimiar de pequeno em Pequenino – Homem e Iniciado.
Então, em um Santo Momento, perceberá que tudo
estava, desde sempre, em seu próprio interior. In
Corde.
Muito se tem
comentado sobre a famosa frase pronunciada por Jesus, quando
já estava pregado na cruz. Em Mateus XXVII, 46, lê-se:
Eli, Eli, lamma sabacthani? Em Marcos XV, 34, está
escrito: Eloi, Eloi, lamma sabacthani? Estas duas frases
de sentido idêntico têm sido traduzidas por Meu
Deus, meu Deus, por que me abandonaste? Todavia, ou esta
frase tem um sentido oculto, ou as palavras foram mal interpretadas,
ou as duas coisas. A transliteração hebraica dos
dois Evangelhos e os manuscritos gregos estão corretos,
e não existe margem para dúvida ou discussão.
Mas o sentido – o verdadeiro sentido – é
outro, e diametralmente oposto do que foi admitido, ou seja:
DEUS MEU, DEUS MEU, COMO ME GLORIFICASTE!
Já no versículo primeiro do Salmo XXI está
registrado ALI, ALI, LMH HhZBTh-NI? Esta frase quer
significar: Deus meu, Deus meu, porque me desamparaste?
Mas Jesus também poderia ter bradado Heloi, Heloi,
LMH ShBHhTh-NI como assegura Harvey Spencer Lewis, FRC
– (Sâr Alden) – 1º Imperator da Ordem
Rosacruz AMORC
para este Segundo Ciclo Iniciático.
Fica a pergunta: Por que a
falsidade consentida de tradução? Simplesmente
porque a frase ALI, ALI, LMH ShBHhTh-NI era a fórmula
final esotérica e sacramental dos Ritos Iniciáticos
do Antigo Egito, e era pronunciada após terríveis
provas de Iniciação nos Mistérios (ditos
pagãos). Aceitar e traduzir a frase corretamente, equivaleria
a admitir que Jesus havia sido um Iniciado. A frase DEUS
MEU, SOL MEU, ESPARZISTE SOBRE MIM OS TEUS FULGORES era
a exclamação derradeira proferida pelo Iniciado,
quando, então, era já considerado como FILHO E
GLORIOSO ELEITO DO SOL. De qualquer forma, no Evangelho
(apócrifo) de Felipe, versículo
72, a frase iniciática ALI, ALI, LMH ShBHhTh-NI
está assim escrita: Deus meu! Deus meu! Por que Senhor,
tanto me glorificas?
EPÍLOGO
Estas reflexões
sobre o evangelho filipino estão incompletas. Mas creio
que com estas especulações preliminares, qualquer
um que venha a se debruçar sobre este apócrifo
certamente o lerá com outros olhos. Isto poderá
ser feito consultando online um dos Websites
citados, ou lendo o referido Evangelho no livro Apócrifos
II (Os Proscritos da Bíblia) citado abaixo na bibliografia.
Mas, não
posso deixar de fazer um último acréscimo. Combinando
os versículos 55 e 60, temos: ... a companheira [de
Cristo é Maria] Madalena. [O Senhor amava Maria]
mais do que a todos os discípulos [e] a beijou
na [boca repetidas] vezes... Reparai na união
[sem mancha], pois tem [um grande] poder.
Já tive oportunidade de fazer referência ao
fato de que o matrimônio espiritual não é
necessariamente sexual. E, se os orgãos genitais são
perfeitos para alquimicamente receberem e transmitirem energia
(sem ejaculação), os lábios são
igualmente poderosos. Como escreveu Felipe no versículo
42, toda relação sexual entre seres dessemelhantes
entre si é adultério. Então, se Jesus
e Maria Madalena formavam um casal é porque eram misticamente
semelhantes.