Pronunciamento
do Senador Jefferson Peres, do Amazonas, em 30.08.2006,
no plenário do Senado Federal.
Sr. Presidente,
Srªs. e Srs. Senadores:
Depois de uma longa
ausência de algumas semanas, volto a esta Tribuna
para manifestar o meu desalento com a vida pública
deste País.
Gostaria
de estar aqui discutindo, a respeito das riquezas naturais
do Brasil, e não como falarei, sobre algo muito pior:
a dilapidação do capital ético deste
País.
Senador
José Jorge: poderíamos não ter um barril
de petróleo nem um metro cúbico de gás,
mas poderíamos ser uma das potências mundiais
em termos de desenvolvimento.
O
Japão não tem nada. Não tem petróleo,
gás ou riquezas minerais. A Coréia do Sul
também não tem nada disso, e nos dá
um banho em termos de desenvolvimento, não apenas
econômico, mas, também, humano.
O
que está faltando mesmo a este País –
e sempre faltou – é uma elite dirigente com
compromisso com a coisa pública, capaz de fazer neste
País o que precisaria ser feito: investimento em
capital humano.
Vejam
que País é este. Estamos aqui com seis Senadores
em pleno mês de agosto, porque estamos em recesso
branco. Por que não se reduz a campanha eleitoral
a trinta dias e transfere-se o recesso de julho para setembro?
Nós ficaríamos com o Congresso aberto, de
Casa cheia, até 31 de agosto. Faríamos trinta
dias de campanha em recesso oficial, remunerado.
Estamos
aqui no faz-de-conta. Como disse o Ministro Marco Aurélio,
este é o País do faz-de-conta. Estamos
fingindo que fazemos uma sessão do Senado, estamos
em casa sem trabalhar. Estou em Manaus há quase um
mês, recebendo, sem fazer nada para o Congresso Nacional,
pelo menos. Como se ter animação em um País
como este com um Presidente que, até poucos meses
atrás, era sabidamente – como o é –
um Presidente conivente com um dos piores escândalos
de corrupção que já aconteceu neste
País, e este Presidente está marchando para
ser eleito, talvez, em primeiro turno? É desinformação
da população? Não, não é.
Se fizermos uma enquete em qualquer lugar deste País,
todos concordarão, ou a grande maioria, que o Presidente
sabia de tudo. Então, votam nele sabendo que ele
sabia. A crise ética não é só
da classe política. Não. Parece que ela atinge
grande parte da sociedade brasileira. Ele vai voltar porque
o povo quer que ele volte. Democracia é isso. Curvo-me
à vontade popular, mas inconformado. Esta será
uma das eleições mais decepcionantes da minha
vida. É a declaração pública,
solene, histórica do povo brasileiro, de que desvios
éticos por parte de governantes não têm
mais importância. Isso vem até da classe dos
intelectuais, dos artistas. Que episódio deplorável
aquele que aconteceu no Rio de Janeiro semana passada! Artistas,
numa manifestação de solidariedade ao Presidente,
com declarações cínicas, desavergonhadas!
Um compositor dizer que política é isso
mesmo, fez o que deveria fazer, o outro dizer que política
é meter a mão na 'm...'! Um artista,
em qualquer país do mundo, é a consciência
crítica de uma nação. Aqui é
essa, é isso que é a classe artística
brasileira – pelo menos uma grande parte dela –
é o povo conivente com isso.
E
pior, pior ainda: os artistas estão fazendo isso
em interesse próprio, porque recebem de empresas
públicas contratos milionários – isso
é a putrefação moral deste País
– e o povo vai reconduzir o Presidente porque política
é isso mesmo.
Tenho
quatro anos de Senado. Não me candidatarei em 2010.
Não quero mais viver a vida pública. Vou cumprir
o mandato que o povo do Amazonas me deu; não vou
silenciar. Ele pode ser eleito com 99,9%. Eu estarei aí
na tribuna dizendo que ele deveria ter sido mesmo destituído.
O
que ele fez é muito grave. É muito grave.
Curvo-me à vontade popular, mas não sem o
sentimento de profunda indignação. A classe
política já nem se fala, essa já apodreceu
há muito tempo mesmo. Este Congresso que está
aqui, desculpem-me a franqueza, é o pior de que já
participei. É a pior legislatura da qual já
participei. Nunca vi um Congresso tão medíocre.
Claro, com uma minoria ilustre, respeitável, a quem
cumprimento. Mas uma maioria, infelizmente, tão medíocre,
com nível intelectual e moral tão baixo, eu
nunca vi. O que se pode esperar disso aí? Não
sei. Eu não vou mais perder o meu tempo. Vou continuar
protestando sempre, cumprindo o meu dever. Não teria
justificativa dizer que não vou fazer mais nada.
Vou cumprir rigorosamente o meu dever neste Senado até
o último dia de mandato, mas para cá não
quero mais voltar, não!
Um
País que tem um Congresso desse, que tem uma classe
política dessa, que tem um povo... dizem que político
não deve falar mal do povo. Eu falo, eu falo. Parte
da população que compactua com isso? É
lamentável. E que sabe. Não é por desinformação,
não. E que não é só o povão,
não. É parte da elite, inclusive intelectual.
Compactuam com isso porque são iguais, se não
piores. Vou continuar nessa vida pública? Para quê?
Para mim, chega!
Vou
continuar pelejando pelos jornais e por todos os meios possíveis,
mas, como ator na vida política e na vida pública
deste País, depois de 2010, não quero mais!
Elejam quem vocês quiserem! Podem chamar até
o Fernandinho Beira-Mar e fazê-lo Presidente da República.
Ele não vai com o meu voto, mas, se quiserem, façam-no.
O
meu desalento é profundo. Deixo isso registrado nos
Anais do Senado Federal. Infelizmente, eu gostaria de estar
fazendo outro tipo de pronunciamento, mas falo o que penso,
perdendo ou não votos pouco me importa. Aliás,
eu não quero mais votos mesmo, pois estou encerrando
a minha vida pública daqui a quatro anos, profundamente
desencantado com ela.
Muito obrigado, Sr.
Presidente.