Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

O Testamento do Pizzaiolo

 

 

 

 

Abaixo está transcrito o personalíssimo, unilateral, gratuito, solene, revogável e curto testamento – escrito de próprio punho – de um agonizante pizzaiolo apamestino, naturalizado brasileiro, que morreu de morte morrida sem ter tido tempo de fazer a pontuação e de acentuar as palavras (vai ver que, só para criar uma cizânia, não quis pontuar nem acentuar o testamento; vai ver que não sabia nem uma coisa nem a outra; vai ver que esta estorinha nunca aconteceu):

 

 

 

 

 

 

 

 

O malandreco do sobrinho (em terceiro grau) acentuou e pontuou assim:

 

Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho. Jamais será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres.

 

 

 

A irmã (só por parte mãe) resolveu pontuar e acentuar da seguinte forma:

 

Deixo meus bens à minha irmã; não a meu sobrinho. Jamais será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres.

 

 

 

O padeiro amassou e assou desta maneira:

 

Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho? Jamais! Será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres.

 

 

 

Os pobres da cidade meteram a colher no documento e rabiscunharam e palpitaram sabiamente:

 

Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho? Jamais! Será paga a conta do padeiro? Nada! Dou aos pobres.

 

 

 

 

 

 

Moral da Estorinha
(que vai ver que nunca aconteceu)

 

 

na maioria das vezes, ignoramos.

Em geral, nossa vida é hipotética,

quando só deveria ser categórica.

 

Normalmente, não raciocinamos.

Uma autoridade falou? Aceitamos.

Ilógico ou chulo, justo ou razoável,

já aderimos se julgamos palatável.

 

Qualificamos1 por crer em Deus.

Até matamos em nome de Deus!

Ao trajarmos o paletó de madeira,

nos acanharemos de cada leira.2

 

 

 

 

 

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Notas:

1. Melhor: pré-qualificamos, isto é, qualificamos de antemão (geralmente condenando) formando antecipadamente um conceito ou uma opinião, sobre algo ou sobre alguém, sem completa visão do assunto. O sinônimo disto é: preconceito. Em termos religiosos, isto pode ser traduzido por fanatismo – zelo religioso obsessivo que pode levar a extremos inomináveis de intolerância e de barbárie.

2. No sentido de hábito extravagante. Prática repetitiva; costume esquisito, peculiar; excentricidade; fixação repetida. Pior quando é monomania.

By the way: por acaso, alguém supõe que poderá escapar de vestir, sabe-se lá quando, um 'wooden tuxedo'?* Será que, em inglês, existe isto? Será que os extravagantes, os monomaníacos, os déspotas, os totalitários, os vitalícios, os fanáticos, os ultramontanistas, os canalhíssimos, os torturadores, os inquisidores et cetera e tal, que pensam que são imortais, já encomendaram os seus wooden tuxedos? Por precaução, deveriam já, já. Do jeito que as coisas vão, do jeito que andam desmatando o Planeta, em breve, poderá vir a faltar wood. Para registro no caderninho de notas: ninguém será arrebatado ou ficará para semente. A vida e a morte são tão certas quanto a Vida e a Morte.

* Tuxedo (ou tux) – que significa traje masculino semiformal para eventos noturnos, atendendo à exigência de gravata-borboleta preta e paletó preto ou azul-marinho (smoking) – teve sua origem em New York, no século XIX. Na realidade, sua história remonta ao ano de 1860, quando a empresa Henry Poole & Co. costurou uma jaqueta para The Prince of Wales da época trajar em jantares informais. Vinte seis anos depois, em 1886, o Sr. James Potter, de Nova York, em uma ocasião formal em Sandringham, no Reino Unido, visitou e filou um jantar na residência do Prince of Wales Albert Edward, que possuía um tchã, tchã, tchã, tchã britânico irresistível. Suspense!

Uma observação cultural (sem uma importância assim lá tão importante, mas que é cultural, isso ela é): o Príncipe Albert Edward, depois coroado como Sua Majestade Eduardo VII do Reino Unido, nasceu em 9 de novembro de 1841, no Palácio de Buckingham, Londres; foi batizado em 25 de janeiro de 1842, na Capela de St. George, Windsor; reinou de 22 de janeiro de 1901 a 6 de maio de 1910; morreu em 20 de janeiro de 1936, com 70 anos, em Sandringham House, Norfolk; e foi sepultado em 29 de janeiro de 1936 no mesmo local em que foi batizado, na Capela de St. George, Windsor.

Continuando: James Potter ficou tão impressionado com a chic vestimenta trajada pelo Prince of Wales para o ágape real, que, quando retornou a N. Y., contratou imediatamente o alfaiate real Henry Poole para fazer uma para si (sem quaisquer diferenças, qualitativa ou quantitativa). E recomendou enfaticamente: — Quero uma jaleca igualzinha a do Príncipe. Sem tirar nem pôr um só fiapinho. Caso eu note alguma diferença, não pago. De jaleca principesca em punho, Potter voltou para sua residência em Nova York e passou a exibir exibicionisticamente seu novíssimo traje em seu clube preferido, o Tuxedo Park Club. Logo, outros macaquinhos de imitação do clube recreativo nova-iorquino se puseram alegremente a copiar o modelito da vestidura, até que a novidade – 'alfaiatizada' em N. Y., mas, como idéia de esnobação, trazida do outro lado do Atlântico – veio a ser formalmente adotada como uniforme informal para jantares de gala e outras festanças. Os alfaiates adoraram! O que não se sabe, até hoje, 15 de agosto de 2007, é se o Príncipe gostou da imitação ou se, de esguelha, observou britanicamente a façanha com um quê de to make of little, pensando britanicamente que ela iria to go a little way. A denominação tuxedo originou-se daí. The end.

Agora, 'wooden tuxedo' fui eu que inventei. Acho que vou patentear a idéia. Talvez eu fique rico.

 

Páginas da Internet consultadas:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Eduardo_VII_do_Reino_Unido

http://www.capitanbado.com/home2006/index.php?subaction
=showfull&id=1186326913&archive=&start_from=&ucat=&

http://pt.wikipedia.org/wiki/Smoking

 

Música de fundo:

Cuando me Enamoro
Intérprete: Gigliola Cinquetti

Fonte:

http://www.momentos.hpgvip.ig.com.br
/midis_italianas.htm