A TEORIA DO AMOR CONSOANTE
O PENSAMENTO PANTITEÍSTA DE
CUNHA SEIXAS*

Rodolfo Domenico Pizzinga

Música de fundo: Foi Deus
Fonte:
http://www.geocities.com/Athens/Crete/3073/guethmid.htm

 

 

(Pequena Homenagem
à Terra de Minha Mãe Pituça
— esteja em PAZ

que era Católica
e devota de Santo António,
mas aprendeu um pouquinho
sobre o Pantiteísmo
depois que eu defendi
minha tese de doutorado.
Eu, agora, também
chorei um pouquitinho.)


FOI DEUS


 

Amália  Rodrigues

Amália da Piedade Rodrigues – 1920-1990

 

90

Letra: Alberto Janes
Música: Alberto Janes


 
Não sei... não sabe ninguém,
Porque canto o fado neste tom magoado
De dor e de pranto.
E neste tormento, todo o sofrimento,
Eu sinto que a alma cá dentro se acalma
Nos versos que canto.

Foi Deus... que deu luz aos olhos,
Perfumou as rosas,
Deu oiro ao Sol e prata ao luar.
Foi Deus... que me pôs no peito
Um rosário de penas
Que vou desfiando e choro a cantar.

E pôs as estrelas no céu.
E fez o espaço sem-fim.
Deu o luto às andorinhas.
Ai… E deu-me esta voz a mim.

Se canto, não sei porque canto,
Misto de ventura, saudade, ternura
E talvez amor.
Mas sei que cantando
Sinto o mesmo quando
Me vem um desgosto,
E o pranto no rosto nos deixa melhor.

Foi Deus... que deu voz ao vento,
Luz ao firmamento
E deu o azul às ondas do mar.
Foi Deus... que me pôs no peito
Um rosário de penas
Que vou desfiando e choro a cantar

Fez poeta o rouxinol.
Pôs no campo o alecrim.
Deu as flores à primavera.
Ai… E deu-me esta voz a mim.

 

 

 

       Para conhecer a DOUTRINA PANTITEÍSTA leia neste site FILOSOFIA PORTUGUESA (III). Este trabalho pretende, resumidamente, revisitar a Teoria do Amor proposta por Cunha Seixas.

 


SÍNTESE CRONOLÓGICA
DA VIDA DE
JOSÉ MARIA DA CUNHA SEIXAS
(LINHA DE TEMPO)
 
 

CUNHA SEIXAS

JOSÉ MARIA DA CUNHA SEIXAS

 

* 26 de Março de 1836 - Nasceu na Vila de Trevões, ao norte da Beira-Alta, Portugal, pertencente, hoje, ao Conselho de São João da Pesqueira, Distrito de Viseu, Portugal. Era filho de José Maria da Cunha Seixas e de Maria Antónia d'Azevedo e Cunha. São João da Pesqueira — que tive a oportunidade de conhecer, assim como Trevões — foi berço de inúmeras personalidades que se destacaram nas artes, nas letras, na política, na religião, e noutros setores da atividade e da criatividade humana. Nada mais, nada menos, do que dezoito pesqueirenses ilustres honram a galeria e o sangue das suas progenituras, algumas delas seladas com a humildade honrosa do berço da sua origem. Cunha Seixas foi um deles.

   

S.João da Pesqueira

S.João da Pesqueira

 

S.João da Pesqueira

S.João da Pesqueira

 

S.João da Pesqueira

S.João da Pesqueira
 

VALE DE FIGUEIRA - S. JOÃO DA PESQUEIRA
ARMAS – Escudo de prata, com uma asna de negro ao revés, acompanhada de um ramo de figueira de verde, frutado de púrpura; brocante, um rosário de azul, posto em círculo. Coroa mural de prata de três torres. Listel branco, com a legenda a negro: VALE DE FIGUEIRA - S. JOÃO DA PESQUEIRA

 

 

Trevões

Trevões

 

Várzea de Trevões
ARMAS – Escudo de ouro, dois pés de linho de verde, folhados e floridos do mesmo e botoados de ouro, com os pés passados em aspa; em chefe pomba do Divino Espírito Santo de prata, nimbada de vermelho, tudo entre duas palas diminutas, ondadas de azul e prata de três tiras. Coroa mural de prata de três torres. Listel branco, com a legenda a negro: VÁRZEA DE TREVÕES

 

Paço Episcopal de Trevões

Paço Episcopal de Trevões

 

1850 - Tomou ordens menores.

1858 - Matriculou-se nos Cursos de Teologia e de Filosofia da Universidade de Coimbra.

1859 - Matriculou-se no Curso de Direito da Universidade de Coimbra.

1860 - Dirigiu a publicação coimbrã O Acadêmico.

1862 - Assinou o Manifesto dos Estudantes da Universidade de Coimbra à Opinião Ilustrada do País.

1864 - Publicou seu primeiro livro - ESTRÉIAS. Em 27 de Junho, obteve o grau de Bacharel na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, tendo sido aprovado Nemine Discrepante e condecorado com as Honras de Accessit, distinção que já obtivera nos 2º, 3° e 4° anos do Curso de Direito.

1865 - Publicou A Dotação do Culto e do Clero. Nessa época escrevia para a Gazeta de Portugal.

1868 - Passou a defender, em diversos artigos, a instituição do júri em Portugal.

1870 - Publicou A Fênix ou a Imortalidade da Alma Humana (Fragmento de um Livro Inédito).

1878 - Concorreu ao provimento da cadeira História Universal e Pátria do Curso Superior de Letras, com a tese que depois fez publicar: Princípios Gerais de Filosofia da História. Em Lisboa prevalecia, por aqueles tempos, o Positivismo. Cunha Seixas, espiritualista confesso, foi reprovado no concurso.

1879 - Publicou, em resposta à reprovação no concurso acima aludido, a Galeria de Ciências Contemporâneas. Abandonou a Advocacia por um ano. Publicou no Comércio de Lisboa diversos artigos sobre Moral, Direito, Psicologia, Filosofia etc.

1880 - Publicou Fantasias d'Amor. (É um livro de ficção em prosa dedicado à desconhecida e Excelentíssima Senhora D. G., inspiradora de seu contento. Há fundamentadas evidências de que o conteúdo desta obra seja autobiográfico. O estudo comparativo desse livro singular com o poema A Castelã, Balada Fantástica, incluso na obra O Pantiteísmo na Arte, Cânticos e Poesias - publicado em Lisboa três anos depois - reforça esta hipótese). Voltou a advogar por insistência de amigos. Passou a exigir do Partido Progressista reformas políticas e o cumprimento do programa partidário. Não obtendo êxito, afastou-se da política. Nesse ano, escreveu vários artigos de crítica literária no Diário do Comércio.

1881 - Publicou Uma Digressão Pela Literatura. Escreveu e publicou diversas críticas literárias no Distrito de Beja.

1882 - Defendeu a reforma das recebedorias da comarca (Relatório e Projeto de Lei apresentado na sessão da Câmara Eletiva de 13 de Março de 1882). Nessa época, escrevia para o Comércio de Portugal, Jornal em que, de Janeiro a Março, publicou 46 (quarenta e seis) artigos sobre o Sistema Pantiteísta.

1883 - Publicou Teoria das Ações de Filiação Ilegítima, O Pantiteísmo na Arte - Cânticos e Poesias, e, também, Ensaios de Crítica Filosófica ou A exposição do Atual Estado da Filosofia.

1884 - Escreveu extenso relatório acerca da liberdade de imprensa e das suas imunidades. Publicou Estudos de Literatura e de Filosofia Segundo o Sistema Pantiteísta.

1885 - Publicou Princípios Elementares de Direito Civil Português para uso dos Liceus, Elementos de Direito Público Constitucional Português Para Uso das Escolas Normais e dos Liceus e Lucubrações Históricas. Provavelmente, neste ano, em primeira edição, também fez publicar Elementos de Moral Segundo os Programas das Escolas Normais e dos Liceus.

1887 - Publicou o Tratado de Filosofia Elementar Para Uso dos Liceus.

1893 - Foi um dos diretores do Almanaque Primeiro de Dezembro para 1894. Sai a 4ª edição dos Elementos de Moral...

† 27 de Maio de 1895 - Faleceu em Lisboa com a prematura idade de 59 (cinqüenta e nove) anos, tendo deixado no prelo sua obra-mestra: Princípios Gerais de Filosofia.

1897 - São mandados imprimir por seu devotado irmão, Eduardo Augusto da Cunha Seixas, alguns poucos exemplares da obra completa Princípios Gerais de Filosofia, contendo, em 1072 (mil e setenta e duas) páginas, a síntese do pensamento do brilhante Filósofo Beirão. Para elaborar minha Tese de Doutorado - A Doutrina Pantiteísta Segundo José Maria da Cunha Seixas - tive que ir a Portugal (1987) para garimpar documentos e obras de Cunha Seixas não existentes no Brasil. Surpresa! Ao receber, na Universidade de Coimbra, para consultar o monumental Princípios Gerais de Filosofia, percebi, estupefato, que o livro jamais fora examinado. A obra havia sido editada à moda antiga (ou seja, com as páginas dobradas quatro a quatro) e permanecia intocada quase um século depois de haver sido impressa!!! Fui, nesse sentido, o primeiro a consultar (com todo cuidado) a obra-prima de Cunha Seixas, pelo menos em Coimbra. Confesso que, apesar do cuidado que me impus ao abrir o livro com uma espátula (essa tarefa coube a mim), rasguei um tantinho de uma ou outra página.
 

PERFIL MORAL
 

       Das obras do Autor Trevoense extraíram-se alguns pensamentos que, acredita-se, auxiliarão a compreender de maneira focalizada seu perfil moral: considerou a abolição da pena de morte em Portugal uma alta conquista; como teórico antiiberista defendeu de maneira altiva a independência de Portugal; patrocinou a causa dos direitos do homem por estarem estabelecidos na inviolabilidade de consciência; festejou, em diversas oportunidades, a liberdade de imprensa; sobre a liberdade concluiu: ...é ordem, harmonia, ventura, beleza, justiça e moralidade; manifestou-se a favor da expulsão dos jesuítas e louvou a anteposição às demasias da Igreja e da Cúria Romana determinadas pelo Marquês de Pombal; foi favorável à todas as medidas tomadas pelo Marquês de Pombal no que tangeu à limitação dos poderes e prerrogativas dos tribunais inquisitoriais; considerou a reforma do ensino na Universidade de Coimbra como ... um dos fatos mais agigantados... da célebre administração pombalina; aplaudiu o instituto do Beneplácito Régio, ou seja, ... o direito de [os estados] revisarem a legislação e as ordens pontifícias e eclesiásticas, para só se dar execução e caráter de obrigatório àquele que, conquanto dentro da esfera espiritual, não estivesse em desacordo com as prerrogativas nacionais, com os costumes da nação e com os direitos dos povos; condenou, com Paschoal José de Mello Freire, o direito romano ... por contrário à razão e aos usos da nação..., como também o direito canônico ... por impróprio, ilegítimo e incompetente... ambos vigentes no século XVIII; e pugnou pela paz perpétua requestando que acabe em santo amor toda a contenda.

 

A TEORIA DO AMOR
 

       Um dos mais profundos observadores da Natureza do homem foi, segundo Cunha Seixas, o filósofo francês Maine de Biran (1766-1824), que, a partir de 1794 até seus últimos dias, anotava em seu Journal Intime suas elucubrações, suas conversas e suas preocupações. Quase nada publicou enquanto viveu, mas sua obra é muito ampla. Entretanto, havia projetado para os anos de madureza, segundo Alexandre Fradique Morujão, uma espécie de tratado sobre a natureza humana ou antropologia filosófica, incorporando versões revistas de anteriores ensaios.

 

Maine de Biran

Maine de Biran

 

       Em Fantasias d'Amor, Cunha Seixas noticia que Maine de Biran estabelecera três vidas ou idades para a humana evolução.

       A primeira ou 'animal' é a das sensações de pena e de prazer; a dos instintos e das necessidades orgânicas; a da inconsciência e da involuntariedade. A segunda ou 'vida do homem' é a do movimento voluntário: a do eu, a da personalidade, a da inteligência e da força livre. Há, porém, a terceira vida, que é a do 'espírito' ou 'vida divina', na qual, submetida a animalidade, habituada a alma à virtude sem esforço e sem as lutas anteriores, o espírito se eleva à razão, a Deus e ao amor.1 (Grifos meus).
 

       Cunha Seixas nunca pôde conceber o amor como mera brutidão do desejo, como irônica e bolorentamente defendiam os materialistas de sua época. O amor sentido e experimentado pelo ser humano, para ele, não pode ser explicado (se explicação há!) simplesmente pelo resultado de interações físico-biológicas. As suas RAÍZES PRIMORDIAIS, penso eu, encontram-se ancoradas nas atualidades ideais, o HARMONIUM UNIVERSAL, parte inalheável do TODO CÓSMICO, impossível de ser percebido ou adequadamente compreendido pela razão humana. O amor é, em primeiro lugar [disse Cunha Seixas], a idéia de belo.2 Segundo a Doutrina Pantiteísta, tudo no Universo respeita uma Lei de Três Estágios - a Lei Pantiteísta: SER, MANIFESTÇÃO, HARMONIA. Para o mundo psicológico há, no refletir seixino, também, um ternário, qual seja:

       No mundo psicológico, o primeiro período caracteriza-se pelo instinto, pela intuição e pelas sensações. O segundo, pela involuntariedade, pela inteligência e pelos sentimentos. O terceiro, pela liberdade, pela razão e pelo amor universal, o que tudo implica a harmonia.3 (Grifos meus).

       Estes conceitos foram baseados nas observações do Filósofo Português oitocentista das crianças, dos adolescentes e dos homens já na fase adulta, e que, outrossim, se acham patentes na história da Humanidade, dos povos e dos indivíduos. Contudo, percebe-se nitidamente a sombra intelectual de Maine de Biran nessa proposta (o que não é desdouro), a qual, aliás, já fora discutida por Cunha Seixas na Galeria de Ciências Contemporâneas.

       Prosseguindo no exame das meditações de Cunha Seixas sobre o amor, extraiu-se o seguinte conselho lapidar: ... não há amor sem que o objeto amado corresponda ao ideal de cada um...4 Apesar de o lado físico ser por muitos considerado (ilusória e aparentemente) de fundamental importância para o estabelecimento do amor, este - o desejo carnal - vai gradualmente perdendo sua força e sua relevância, ao mesmo tempo em que avultam progressiva e paulatinamente todas as características de uma vida superior. A mera atração pode, portanto, em um dado instante, ser fatal, mas não é definitiva; se o amor não corresponder a um padrão de idealidade, não poderá prosperar. Assim, o amor fundado na atração física e na beleza plástica é frágil e fugaz. Melhor seria dizer: é quimérico. Há, portanto, uma abismal diferença entre amor e paixão. Se bem compreendi o pensamento de Seixas, amor radica na espiritualidade; a paixão, na lascívia.

       Cunha Seixas condenou veementemente as teorias materialistas que ainda prosperavam na segunda metade do século XIX, particularmente nas plagas lusíadas, que consideravam e admitiam a mulher como um ser inferior ao homem (e até certo ponto incapaz), como se esta fosse uma espécie de termo intermediário (herança cultural maldita) entre o homem e reino animal. Nesse sentido, ponderou:


       A verdadeira filosofia considera ambos os seres [homem e mulher] como iguais em mérito e desiguais nas características e na missão, porque as qualidades especiais do homem não são as da mulher [e vice-versa], e há, assim, duas metades, física e moralmente, que devem se fundir na harmonia da união, sendo meio desta o amor, onde é fácil achar-se o elemento 'físico ou dos sentidos', o 'imaginativo ou da exaltação das qualidades1, que o homem atribui à mulher que ama, e esta ao homem a quem se dedica, e o 'elemento moral' que é superior a todos...5 (Grifo meu).


 
       Segundo o Pai do Pantiteísmo, no amor, o corpo não deve ser desterrado em sacrifício do espírito; antes, se completam um ao outro. Disse textualmente: ...vivemos espiritualmente mediante condições físicas;6 o que nada obriga ou indica que o ser deva resvalar para o materialismo e para um comportamento desregrado com relação aos prazeres do sexo. O amor é um sentimento sublime, que conduz, sobretudo e principalmente, a uma disposição afetiva de generosidade, desprendimento e dedicação, ... para sermos tudo em outrem, para fundirmos o nosso ser no ser amado...7 Quando se manifesta o amor, sobressaem e prevalecem bondade, abnegação, dação, solidariedade e uma dose relativa de renúncia, todas essas virtudes conducentes à elevação da consciência. Sim, isto é verdade. Mas, o amor de baixo - digo eu - é um reflexo distorcido do AMOR DE CIMA, já que EM CIMA NÃO É COMO É EMBAIXO. Cunha Seixas, que sofreu as desventuras do amor, mas que intuitiva e especulativamente tentou destrinçar esta categoria insubstituível da humana existência neste Plano de compulsória manifestação, obviamente, apresentou uma reflexão filosófico-emotiva (moral) do amor. Para a época, isso valeu e conveio muito, pois foi uma verdadeira luz em meio ao praticamente nada que eram o comportamento e o pensamento lusófono, nomeadamente em Portugal. Fernando Pessoa só nasceria em 1888 para iluminar a terra lusitana - e o Mundo - por apenas quarenta e sete anos! Entretanto, apesar de já não mais estar (e estar) entre nós, sua Luz não se apagou. Quem olhar para o LESTE, verá Pessoa nu e sem adornos, montado em um corcel branco, a proclamar: NEÓFITO, NÃO HÁ MORTE!

       Entretanto e ousadamente, o combativo Trevoense, em várias passagens de sua vasta obra, opinou (corretamente) que outra característica do amor - o verdadeiro e duradouro amor - é a LIBERDADE, constituindo-se em sua própria essência. Escreveu textualmente: O verdadeiro amor é o que se funda em maior liberdade.8 Quando o verdadeiro amor nasce, os vícios morrem, as más paixões desaparecem e o homem se torna livre. Invocando Victor Hugo (1802-1885)9, perfilhou seu pensamento quando este afirmou que o ato de amar conduz a uma imensa vontade, que acaba por se traduzir na mais ampla liberdade.10 Os dois pensamentos a seguir também são de Victor Hugo: O homem é um oceano; a mulher, um lago. O oceano tem a pérola que o embeleza; o lago tem a poesia que o deslumbra. E: O homem é uma águia que voa; a mulher um rouxinol que canta. Voar é dominar os espaços; cantar é conquistar a alma. Mas, de todas as reflexões de Hugo, a que mais me comove é: Escuta tua consciência antes de agir, porque a consciência é DEUS PRESENTE NO HOMEM. (Maiúsculas minhas).


Victor Hugo

Victor Hugo

 

       O amor real, puro, implica sempre em maior liberdade, pois, se o amor, pela prevalência das qualidades retromencionadas, conduz à elevação da consciência dos seres que se amam, estes, natural e espontaneamente, tornam-se menos oprimidos e conseqüentemente, mais confiantes, mais independentes e, repetindo, mais livres. O amor é, segundo Cunha Seixas, LIBERTADOR. Portanto, a ação libertadora do amor engrandece o homem, torna-o plenamente responsável, fortalece a razão e alça-o ao ignoto, ao misterioso, ao insondável. No Cântico do Amor, Cunha Seixas deixou escrito:

Porque a alma que não ama,
Não avança com a flama
Até a etérea guarida,
Mansão do Mais Elevado.

..................................

Quem não ama é qual brilhante,
Que não está lapidado:
Pelas artes preparado,
Só então é rutilante.

..................................

O infeliz que não amou,
Nunca sai da escuridade.
Porque em sua soledade
Jamais a aurora assomou.

.................................

Não amarmos é martírio,
Que se torna insuportável.
Amor é dita inefável:
Amor é supremo empíreo.
11


       Para concluir este trabalho, apresenta-se, então, a Teoria do Amor do Filósofo Trevoense. A Teoria do Amor (não poderia ser diferente) está atrelada à Lei Trinitária Pantiteísta: O Ser, a Manifestação e a Harmonia (consultar a referência 13). Cada ente tem seu ideal próprio que o faz se dedicar a outro ser humano, ideal esse que se constitui no princípio embrionário do amor. Na Teoria do Amor do Filósofo Pantiteísta, o Ser é duplo, representado pelo homem e pela mulher. A Manifestação opera-se pela união, pelo casamento. A Harmonia aparece no último termo, que é a família12, que, em relação à sociedade, é um Ser que oportunamente se desenvolverá, alcançando, no município, na nação ou em um outro lugar em que possa prosperar, nova Harmonia.13

 

.... SER –› MANIFESTAÇÃO –› HARMONIA –› SER...


 

DADOS SOBRE O AUTOR

 

Mestre em Educação, UFRJ, 1980. Doutor em Filosofia, UGF, 1988. Professor Adjunto IV (aposentado) do CEFET-RJ. Consultor em Administração Escolar. Presidente do Comitê Editorial da Revista Tecnologia & Cultura do CEFET-RJ. Professor de Metodologia da Ciência e da Pesquisa Científica e Coordenador Acadêmico do Instituto de Desenvolvimento Humano - IDHGE.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


* Este trabalho, inteiramente reformulado, constituiu um dos itens abordados em minha tese de doutorado A Doutrina Pantiteísta Segundo José Maria da Cunha Seixas, defendida em 1988.
1. Op. cit., p, 140.
2. Fantasias d'Amor. Lisboa: Empreza Litteraria Luso-Brazileira Editora, 1880, p. 136. Cs. tb. o poema A Um Realista, In: O Pantiteísmo na Arte, Cânticos e Poesias. Lisboa: Typographia da Bibliotheca Universal, 1883, p. 139.
3. Fantasias d'Amor, p. 141.
4. Op. cit., p. 144.
5. Op. cit., p. 148. Cunha Seixas, no livro Teoria das Ações de Filiação Ilegítima, defendeu a posição da mulher, que, naqueles tempos sombrios, era considerada inferior e subalterna a do homem. Inclusive a homenageou, chamando-a ... o anjo da casa, p. 81. Na p. 319 enfatizou: A lei civil deve, quanto ser possa, dar mais proteção à mulher. Em Lucubrações Históricas, faz novas referências nas páginas 4, 8, 10 e 16. Registra-se, nesta oportunidade, que Antero de Quental, companheiro de Cunha Seixas nos bancos escolares da Universidade de Coimbra, no Acadêmico, na Rolinada etc., também agasalhava idéias superlativamente progressistas relativas à mulher. A Rolinada, assim denominada em virtude de um dos apelidos do Duque de Loulé, Rolim, Chefe do Governo vigente à época, e que teve como fonte a recusa do perdão de ato pedido pelos estudantes ao Governo pelo nascimento do príncipe herdeiro, futuro D. Carlos I. Por fim, a célebre Questão Coimbrã ou, como também é denominada, do 'Bom Senso e Bom Gosto' que opôs Antero de Quental a Castilho em resultado de certas considerações que este teceu a Antero e a Teófilo Braga no prefácio de um poema de Pinheiro Chagas e que, para além de uma questão literária que aparenta, é, sobretudo, um protesto moral, uma revolta contra Castilho, os professores, a Igreja Católica, o regime político e o rei D. Luís. Acesso em 22/2/2004 no site:
http://www.citi.pt/
6. Op. cit., p. 149.
7. Op. cit., p. 152.
8. Op. cit., p. 159
9. Nascido em Besançon em 1802 (o século tinha apenas dois anos), Victor Hugo era filho de um general do Império. Muito jovem, ainda, compôs numerosos poemas. Aos quinze anos recebeu um prêmio em um concurso de poesia da Academia Francesa. A partir desse momento, resolveu dedicar-se à carreira literária: Serei um Chateaubrian ou não serei nada. Apaixonado, generoso e dotado de uma extraordinária capacidade de trabalho, Hugo escreveu uma obra colossal e variada. A partir de 1822, integrou-se ao Romantismo e, em breve, se transformaria no porta-voz desse Movimento. Nos seus escritos, reserva lugar preponderante aos estados de alma. Demonstra uma forte tendência ao estranho, ao maravilhoso, ao exótico e ao pitoresco. Em 1830, estréia Hernani, obra teatral que representa o fim do classicismo, e desencadeia uma polêmica apaixonada. Essa obra expressa novas aspirações da juventude. Para Hugo começa então um período de fecundidade. Rival de Lamartine, deseja se afirmar como o único e maior poeta lírico da França. A partir de 1835, empreende várias viagens pela Europa. Ao mesmo tempo, escreve ainda numerosas obras de teatro. Sua glória de poeta é finamente consagrada em 1841, com a sua eleição para a Academia Francesa. No mesmo ano Luís Felipe o nomeia par de França. A essa altura, Victor Hugo é um homem bem sucedido, leva uma vida burguesa e dedica-se muito pouco a toda criação verdadeiramente nova. Mas, ao ser deflagrada a Revolução de 1848, se entusiasma com os valores revolucionários das camadas miseráveis e rompe com o partido da situação. Torna-se deputado e se destaca por sua eloqüência e por sua radical oposição a Luís Napoleão Bonaparte. Quando ocorre o Golpe de Estado de 2 de Dezembro de 1851, Hugo combate nas barricadas e quando Napoleão, o pequeno se torna Imperador, vê-se obrigado a se exilar. Refugiado em Guernesey, Hugo redige ferozes panfletos contra o regime imperial. Mas, também, escreve grandes painéis novelescos e poéticos, em particular A Lenda dos Séculos (1859-1883). Esta obra épica evoca a história do mundo e mistura constantemente lenda com realidade. Para ele, o mundo é o terreno onde se defrontam os mitos, o bem e o mal, a bondade e a crueldade. Do mesmo modo, escreve alguns romances, entre eles Os Miseráveis (1862). Quando explode a Guerra de 1870 e o Império desmorona, Hugo regressa à França: é um símbolo da resistência republicana. Sua atividade literária se reduz, então, consideravelmente. Quando morreu, em 1885, a República lhe presta homenagens fúnebres nacionais. Com ele desaparece um dos grandes gênios da língua francesa. Victor Hugo despertou imenso entusiasmo e fervor popular e deixou sua marca na literatura de todo o século XIX, e, ainda, em boa parte do século XX.
10. Apud José Maria da CUNHA SEIXAS, op. cit., p. 161. (A obra de Victor Hugo referenciada é: Les Chansons des Rues et des Bois, livro 1°).
11. Op. cit., passim.
12. Na Teoria das Ações de Filiação Ilegítima, capítulo XXV e seguintes, Cunha Seixas, consultando Ahrens, Paul Janet, Coelho da Rocha Mello Freire, Ulpiano e Correa Telles, tratou da família em geral, dos parentes etc. Em resumo, tem-se o que segue: 1° Que a família, no sentido restrito, compreende as pessoas do mesmo sangue ou a estes ligadas, que vivem na casa do pai;Que compreende, no sentido lato, todos os parentes, ainda afins, por muito remotos que sejam, se conhecem ou o pai ou o pretendente;Que não é indispensável a convivência dos parentes remotos com o pretenso pai para se considerarem família; Que os criados, em geral, não são família pela nossa legislação antiga e moderna, e deverão considerar-se como fazendo uma parte importantíssima do público., p. 139.
13. Filósofo português
(Trevões, 1836 - Lisboa, 1895), criador de um sistema filosófico que denominou Pantiteísmo e que se apresenta como uma pessoal e original dissidência do Krausismo, tal como este era entendido por J. M. Rodrigues de Brito, cujo magistério filosófico viria a marcar, de forma decisiva, o percurso especulativo dos dois mais importantes pensadores da geração portuguesa que se afirmou a partir de 1865.

       Ao designar por Pantiteísmo o sistema filosófico que desenvolveu e expôs ao longo da sua obra especulativa (A Fênix ou a Imortalidade da Alma Humana, 1870; Princípios Gerais de Filosofia da História, 1878; Galeria das Ciências Contemporâneas, 1879; Ensaios de Crítica Filosófica, 1883; Estudos de Filosofia e Literatura, 1884; Lucubrações Históricas, 1885; Elementos de Moral, 1886; Princípios Gerais de Filosofia, 1898), Cunha Seixas procurou tornar claro que a respectiva matriz era a intuição primordial de que Deus está em tudo, como centro de todas as coisas e nelas manifestado.

       Para o pensamento pantiteísta, o ponto de partida do conhecimento era duplo: subjetivamente, seria o pensamento, enquanto, objetivamente, se encontraria na idéia de ser. Na verdade, sendo sempre o conhecimento um ato do espírito que pensa, o respectivo ponto de partida não poderia ser o sentimento nem a vontade, que são apenas excitantes ou motores do conhecimento, mas o pensamento. Por outro lado, porque o conhecimento não pode deixar de partir de algo que seja imediato, possível, certo e intuitivamente evidente que lhe dê um mínimo de garantia, e porque tais atributos só se encontram nas idéias e nas leis da razão e nos axiomas que decorrem delas. Todo o conhecimento se funda, necessariamente, na crença no próprio espírito. Como todo o pensamento e todo o juízo se reportam ou envolvem sempre a idéia de ser, ela será o ponto de partida objetivo do conhecimento.

       De acordo com a Filosofia Pantiteísta, o conhecimento exprime-se num juízo, na afirmação, ainda que implícita, de uma relação, a qual obedece a três leis, a da substância, a da manifestação e da harmonia, e em cujo processo cabe distinguir três momentos. No primeiro, imperam as idéias experimentais, particulares e contingentes, referidas a um objeto da natureza, enquanto, no segundo, dominam as idéias reflexivas, de caráter geral e abstrato, e, no terceiro, tudo se processa já no plano das idéias racionais ou ontológicas, inatas ao próprio espírito, universais, absolutas, necessárias e invariáveis.

       É a circunstância de as idéias desta terceira espécie serem tanto leis do espírito como elementos dos seres, havendo, por isso, correspondência ou equivalência entre as categorias da razão e as categorias do ser, que torna possível o conhecimento e faz que a Ontologia seja, a um tempo, ciência do ser nas suas determinações mais gerais e ciência das idéias – elementos na sua maior extensão e profundidade, com abstração de qualquer ente individual.

       Esta dupla natureza das idéias racionais explica que seja também por meio de um processo trágico de ser, de manifestação e de harmonia que a ordem ontológica se desenvolve e se concretiza e a finalidade de cada ser se coordena, dinamicamente, com a dos demais seres, contribuindo todos e cada um deles para a realização dos mais altos destinos do Universo. Cada ente é, assim, algo individualizado, dotado de finalidade própria, constituindo um infinito relativo que, no seu movimento próprio, se manifesta, relacionando-se com todos os outros do mesmo gênero e, através deles, com a ordem mais global do ser.

       A idéia de ordem, associada à idéia dos seres como infinitos relativos, conduz o nosso espírito à noção de um Ser Perfeito e Absoluto, que tenha em si o seu próprio fim e que, na sua unidade e simplicidade, seja causa e ordenador dos restantes seres. Dado que, no entanto, o finito não pode existir sem a sua Causa Geradora e como o infinito é também a eternidade e a imensidade, Deus está em tudo, conferindo a todos os infinitos relativos sua realidade e sua subsistência, sendo, porém, deles perfeitamente distinto, pois o eterno e imenso não pode confundir-se com o transitório e o limitado. Daí que, apesar de nos movermos, sermos e vivermos em Deus, participando da sua realidade, com Ele não nos confundimos nunca.

       Sendo embora abscôndito na sua natureza e, como   tal, inacessível a toda explicação ou demonstração, Deus manifesta-se no Universo e patenteia-se intuitivamente à razão, como inteligência suprema, lugar e fonte de verdade e de vida e sede do infinito e do absoluto. Deste modo, Deus não é inteiramente incognoscível, sabendo nós Dele, através da sua manifestação, que é absoluto, omnipotente e perfeito, imutável e uno, infinito, eterno, omnisciente e omnipresente, sendo seus atributos supernos a verdade, a bondade e a beleza.
Fonte: http://www.instituto-camoes.pt/entrar.html
(Acesso em: 22/2/2004)

 

Bandeira da Várzea de Trevões

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SITES CONSULTADOS
 

www.hermitage-montreuil.com/phototheque.htm
www.instituto-camoes.pt/cvc/filosofia/rep4.html
http://educar.no.sapo.pt/ensino.htm
http://www.cm-sjpesqueira.espigueiro.pt/index.asp
http://consciencia.org/imagens/banco/L-Q/maine.html
http://eira.espigueiro.pt/gac-trevoes/patrimonioarquitectonico.html
http://www.fisicohomepage.hpg.ig.com.br/sjp-varzeatrevoes.htm
http://www.cm-sjpesqueira.espigueiro.pt/
http://www.360portugal.com/
http://www.cm-sjpesqueira.espigueiro.pt/galeria_fotos/index.aspS
http://raizes.no.sapo.pt/TextoPaisagem1.htm
http://www.fisicohomepage.hpg.ig.com.br/sjp-valefigueira.htm

 

PAZ PROFUNDA

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