Rodolfo Domenico Pizzinga

 

 

 

 

 

Claude Lévi-Strauss

(Pensamentos)

 

 

 

Claude Lévi-Strauss

 

 

 

O antropólogo é o astrônomo das ciências sociais: ele está encarregado de descobrir um sentido para as configurações muito diferentes, por sua ordem de grandeza e seu afastamento, das que estão imediatamente próximas do observador.

 

Meu único desejo é um pouco mais de respeito para o mundo, que começou sem o ser humano e vai terminar sem ele. Isso é algo que sempre deveríamos ter presente.

 

Hoje, sou um opositor radical da caça; mas, no passado, não era um mau caçador, e, o que é ainda mais lamentável, eu gostava disso.

 

Eu tinha vontade de ver o mundo, de ir para bem longe. Já na infância e na adolescência, eu montava várias pequenas expedições no campo francês... Eu queria aventura, onde quer que a encontrasse... Naturalmente, quanto mais longe eu fosse, melhor...

 

Acho que o olhar distanciado pode ser aprendido; mas acho também que é algo que se pode possuir desde o nascimento, uma espécie de característica da personalidade de cada um.

 

Acho que há muitos modos de ser antropólogo e de se tornar um antropólogo. E há muitas moradas na casa do Senhor... A vocação é um dos modos; há provavelmente outros.

 

As culturas não desaparecem nunca, elas se misturam com outras, e dão origem a uma outra cultura.

 

A única esperança que nos resta é que a diversidade das culturas humanas saibam refazer diferenças... Creio que isso acontecerá ou, pelo menos, espero que sim. Este é um período crítico e, sinceramente, espero que não dure. Fissuras haverão de ser reproduzidas... Naturalmente não onde estavam antes, e, certamente, não onde poderíamos supor que surgissem. De qualquer modo, creio que a Humanidade permanecerá diversa; esta é sua única chance.

 

Se, como escrevi em 'Raça e História', existe entre as sociedades humanas um certo ótimo de diversidade além do qual elas não conseguiram prosseguir, mas abaixo do qual tampouco podem descer sem perigo, deve-se reconhecer que esta diversidade resulta em grande parte do desejo de cada cultura de se opor às que a cercam, de se distinguir delas, em suma, de serem elas mesmas; não se ignoram, imitam-se ocasionalmente, mas, para não perecerem, é necessário que, sob outros aspectos, persista entre elas uma certa impermeabilidade.

 

Que não haja oposição entre a coerção e a liberdade. Que, ao contrário, elas se auxiliem, pois toda a liberdade é exercida para contornar ou para superar uma coerção, e toda a coerção apresenta fissuras ou pontos de menor resistência que são incitações à criação. Nada, sem dúvida, consegue dissipar melhor a ilusão contemporânea de que a liberdade não suporta entraves e de que a educação, a vida social e a arte requerem para desabrochar um ato de fé na onipotência da espontaneidade – ilusão que, certamente, não é a causa; mas na qual é possível ver um aspecto significativo da crise que o Ocidente atravessa hoje.

 

A história não está ligada ao homem nem a qualquer objeto em particular. Consiste inteiramente no seu método; a experiência comprova que ele é indispensável para inventariar a integralidade dos elementos de uma estrutura qualquer, humana ou não-humana. Longe, portanto, de a pesquisa da inteligibilidade resultar na história como o seu ponto de chegada; é a história que serve de ponto de partida para toda a busca de inteligibilidade. Assim como se diz de certas carreiras, a história leva a tudo; mas, contanto que se saia dela.

 

O cientista não é o homem que fornece as verdadeiras respostas; é quem faz as verdadeiras perguntas.

 

Há, entre nós homens bem fornidos, que gozamos de todas as comodidades da vida, a nossa outra metade – homens emagrecidos pela fome e pela pobreza que mendigam às nossas portas.

 

Compreender consiste em reduzir um tipo de realidade a outro; a realidade verdadeira nunca é a mais patente; a natureza do verdadeiro já transparece no zelo que este emprega em se ocultar.

 

Os mitos não podem ser estudados isoladamente: um mito é composto de todas as suas variantes.

 

Vamos para uma civilização em escala mundial. Estamos em um mundo ao qual já não pertenço. O que eu conheci, o que eu amei, tinha 1,5 bilhão de habitantes. O mundo atual tem 6 bilhões de seres humanos. Já não é o meu mundo.

 

Todo pensador célebre pode estar certo de duas coisas: de morrer e de ser considerado ultrapassado. É uma sorte quando a primeira coisa acontece antes da segunda.

 

O dia em que se chegar a compreender a vida como uma função da matéria inerte será para descobrir que ela possui propriedades diferentes das que lhe atribuíam.

 

As estruturas não são realidades concretas; estão mais próximas de modelos cognitivos da realidade que servem ao homem em sua vida cotidiana.

 

Não dispomos de nenhum critério absoluto para julgar uma cultura em relação a outra.

 

O dever moral de cada cultura é tentar continuar sendo o que é, preservando sua identidade.

 

Nossa diferença em relação aos ameríndios, aos melanésios ou aos africanos de outrora é que não damos a mesma importância, o mesmo lugar, à história. Esse juízo que fiz é evidentemente subjetivo, o juízo de membro de uma sociedade e uma civilização. Não estou generalizando, estou me referindo à arte na minha civilização.

 

Dizer que demarcar as terras dos índios é lhes dar um direito excepcional, me parece completamente contrário à realidade. Só há um meio de tentar remediar o enorme mal que lhes foi feito no momento da colonização, quando foram exterminados por meios diretos ou indiretos. É preciso lhes devolver uma parte, ainda que pequena, do que foi o território deles, isto é, a totalidade do continente. Se eu tivesse o poder, devolveria aos índios o máximo que pudesse. Mas, ao mesmo tempo, reconheço que, do ponto de vista brasileiro, há problemas. Trata-se de um grande país, que tende a se modernizar até o seu interior mais profundo. Não tenho também argumentos decisivos a propor.

 

O que norteia o pensamento ecológico é que ele proclama a vontade de defender solidariamente a Natureza e o homem. Defender a Natureza para as necessidades e dentro dos interesses do homem. Estou convencido de que as coisas são profundamente contraditórias. Se tivesse que tomar posições ecológicas, diria que o que me interessa são as plantas e os animais – e danem-se os homens. É óbvio que se trata de uma posição indefensável. Por isto, guardo-a para mim.

 

A lição que tirei de Montaigne é que estamos condenados a viver e pensar simultaneamente em vários níveis, e que estes níveis são incomensuráveis. Há saltos existenciais para passar de um outro. O último nível é um ceticismo integral. Mas, não se pode viver com ceticismo integral. Seria preciso se suicidar ou se refugiar nas montanhas. Somos obrigados a viver, ao mesmo tempo, em outros níveis em que esse ceticismo está moderado ou totalmente esquecido. Para fazer ciência, é preciso fazer como se o mundo exterior tivesse uma realidade e como se a razão humana fosse capaz de compreendê-lo. Mas é 'como se'.

 

Estou convencido de que muito de nossas pesquisas, da Psicologia, da Sociologia, são modos provisórios de apreender fenômenos que tratamentos mais sérios vão acabar solucionando. O filósofo positivista francês Auguste Comte (1798 - 1857) já tinha dito isso antes de mim.

 

O mundo é de tal riqueza – e estamos tão longe de esgotar todas essas virtualidades – que me parece ingênuo querer criar fora disso. Quando vejo um quadro não-figurativo, penso que é sempre menos belo do que o espetáculo não-figurativo que me oferece a Natureza, na forma de um cristal, um jogo de luz etc.

 

Pergunta de um repórter da Folha: Em uma entrevista recente a Catherine Clément, o senhor disse que todos os autores de verdade, em arte, são estruturalistas.

Resposta de Lévi-Strauss: Não me lembro de ter dito isso. Creio que uma das formas de interpretar e de compreender a criação artística é abordá-la pelo ângulo estruturalista. Mas não me lembro de ter dito que todos os verdadeiros autores são estruturalistas. Você me desculpe eu lhe dizer isto, mas, quando dou uma entrevista, respondo qualquer coisa [risos].

 

Sempre haverá o inacessível!

 


Claude Lévi-Strauss
(Bruxelas, 28 de novembro de 1908)

 

 

 

 

 

 

 

 

Sempre haverá o inacessível!

Sempre haverá o intocável!

Sempre haverá o ininteligível!

Sempre haverá o irrealizável!

 

 

Oras Bolas! Fazer o quê?

Por exemplo: jamais saberemos o porquê

de a unidade sustentar a Unidade!

 

 

Poderemos sentir, poderemos intuir,

poderemos elaborar mil e uma teorias.

Mas, por maior que seja o inteligir,

prevalecerão símbolos e alegorias.

 

 

Se o Universo é finito, porém ilimitado,

é impossível para qualquer ser-no-mundo

compreender o Todo-Sempre-Um-Ilimitado,

seja vivo do lado de cá, seja vivo além-mundo!

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fundo musical:

Un Homme et une Femme (Pierre Barouh, Jerry Keller & Francis Lai)

Fonte:

http://www.blueman.name/Films_et_TV.php#