CARTA A GEORGE BUSH (Pai)

(Antes de ser deflagrada a Primeira Guerra do Golfo)

 

Rodolfo Domenico Pizzinga

 

Música de fundo: A Litlle Help from my Friends
(Beatles - John Lennon/Paul McCartney)

http://www.musicasmaq.com.br/friends.htm

 

 

 

MONSTROS???

 

 

 

ATÉ  QUANDO???

 

 

 

Rio de Janeiro, 11 de Janeiro de 1991.

 

Excelentíssimo Senhor

Presidente dos EUA

Geoge Bush

 

            Senhor Presidente,

          

          Espero que esta pequena carta chegue a V. Ex.ª antes de que os aliados se decidam formalmente pela guerra. Quando me refiro aos aliados, penso principalmente nos Estados Unidos da América. O poder decisório está, Sr. Presidente, nas suas mãos.

            As conseqüências, Sr. Presidente, pela suspensão de uma única vida consciente são tão imprevisíveis quanto cosmicamente inaceitáveis. Que pensar, então, de milhares — milhões, talvez — de seres humanos mortos em um eventual confronto no Golfo?

          Sr. Presidente: nada, absolutamente nada, justifica a guerra e a morte. E um confronto armado contra o Iraque é ser derrotado pelas forças que conduzem o pensamento do Líder Iraquiano. Essas forças, Sr. Presidente, querem a guerra. Elas precisam da guerra. Elas se alimentam do sangue dos heróis que tombam nos campos de batalha.

          Com a deflagração da guerra, Sr. Presidente, o ônus maior será de V. Ex.ª. Talvez V. Ex.ª não saiba, mas há também forças poderosas compelindo sua decisão pela guerra. Elas desejam dissuadi-lo de tentar uma paz negociada. Se elas conseguirem, Sr. Presidente, o maior derrotado terá sido V. Ex.ª. E, mais uma vez, o povo dos EUA será chamado a pagar a conta cósmica dessa decisão.

          Por outro lado, há um grande contingente de pessoas e de mentes lutando pela paz e desejando que a desarmonia que se instalou no Kwait possa refluir e transmutar-se em concórdia.

          Por isso é que, respeitosamente e com todo o amor que possuo, proponho, agora, um desafio: Sr. Presidente, se todos os esforços falharem, quando V. Ex.ª entender que não há mais saída, tente uma penúltima cartada. VÁ PESSOALMENTE A BAGDÁ CONVERSAR COM O LÍDER IRAQUIANO.

          O mundo inteiro apoiará essa decisão e V. Ex.ª granjeará o reconhecimento, a gratidão e o eterno respeito do povo americano. Tenho certeza de que essa atitude será totalmente positiva.

 

Atenciosamente.

Rodolfo Domenico Pizzinga

          

Rodolfo Domenico Pizzinga

Endereço: xxxxxxxxxxxxx

CEP: xxxxx - Bairro - Rio de Janeiro - Brasil

 

OBSERVAÇÃO: Este documento foi postado em inglês. Nunca recebi a resposta. Não sei se o Presidente Bush (Pai) chegou sequer a tomar conhecimento dele. Não escrevi para o Presidente Bush (Filho) porque estava convicto de que de nada adiantaria. Infelizmente, aconteceu o que... E então: A coligação anglo-americana realizou uma manobra não linear, com seu esforço principal partindo do Kuwait e, também, da Arábia Saudita, aplicando um misto das estratégias empregadas na Primeira Guerra do Golfo e na Guerra do Afeganistão, com um acréscimo de meios aeromóveis, aeroterrestres e de forças especiais, além do emprego maciço dos novos recursos tecnológicos. Uma outra direção estratégica, partindo da Turquia, somente foi empregada pelas forças especiais, para o apoio logístico e para o sobrevôo dos aviões das forças aérea e naval que bombardevam o Iraque, provenientes de bases aéreas e de porta-aviões localizados no Mar Vermelho e Mar Mediterrâneo. Do Oeste (Jordânia), também partiram ações, principalmente das forças especiais e aeromóveis. (Ten Cel Inf ANDRÉ LUIS NOVAES MIRANDA). O que aconteceu depois... nem todos soubemos. O que está acontecendo hoje, todos sabemos.

 

BUSH  FATHER

 

 

PAZ PROFUNDA

A TODOS OS ENTES

 

 

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BUSH E A ALIENAÇÃO
FUNDAMENTALISTA RELIGIOSA

(partes I, II, e III)

Fontes:

http://an.locaweb.com.br/Webindependente/
cienciareligiao/busheaalienacaofundamentalistareligiosa.htm


http://an.locaweb.com.br/Webindependente/
cienciareligiao/busheaalienacaofundamentalistareligiosa2.htm

http://an.locaweb.com.br/Webindependente/
cienciareligiao/busheaalienacaofundamentalistareligiosa3.htm

Por: Carlos Antonio Fragoso Guimarães

       Um dos principais sinais de retrocesso intelectual, que encontramos invariavelmente em épocas de crise econômico-social, é a adesão de pessoas a vertentes (religiosas ou políticas), que se caracterizam por um radicalismo severo e uma inflação do sentimento de pertença a um grupo ou instituição que assuma o papel de protetora e detentora da VERDADE, não importa que tipo de verdade (cada grupo se auto-intula detentor exclusivo da mesma e a percepção desta quase sempre se apóia sobre um estrado de poder econômico e/ou político): se a dos Adventistas Norte-Americanos que estavam certos da volta de Cristo em 1844, mas que nem por não se ter concretizado deixaram de existir e de se expandir pelo mundo, ou da racista Ku Klux Klan, ou, ainda, no Brasil, a da paramilitar católica TFP, que tanto apoio deu ao golpe militar de 1964, não admitindo mais nenhuma religião além da católico-romana (da linha da direita, bem entendido, notavelmente distante do pensamento da Teologia da Libertação de Dom Hélder Câmara, de Frei Betto, de Dom José Maria Pires, de Leonardo Boff e de tantos outros luminares do pensamento progressista na Igreja), e que, ultimamente, vêm novamente — e, diria, infelizmente — dando o ar de sua graça, seja por sua direta ressurreição ou em sua contrapartida atual nos chamados Arautos de Deus, ou em uma versão mais soft de parte da Renovação Carismática, de mesma origem norte-americana e Pentecostal das seitas fundamentalistas evangélicas que alienam ultimamente o Brasil. Cinqüenta anos de esforços por parte de católicos e de protestantes — em especial os luteranos e os anglicanos — no intuito de se conseguir uma reaproximação das duas correntes religiosas quase foram por água abaixo, quando o Cardeal Joseph Ratzinger, Coordenador da Congregação para a Doutrina da Fé (atual nome do que restou e se transformou a Inquisição) publicou um documento chamado Dominus Jesus, no qual sustenta que a única religião é a Católica e as demais, incluindo as Igrejas Protestantes, seriam meras usurpadoras ou caminhos errôneos. Os exemplos poderiam ser multiplicados.

       O fundamentalismo, porém, se entendido como a radicalização de verdades — destacando as que trazem algum retorno em forma de poder — não é apanágio exclusivo das religiões. Hoje em dia, diante da expansão da globalização econômica, fundamentalista também é a visão do Neoliberalismo e da Globalização sobre o deus-mercado a devorar pessoas, países e instituições em nome da competitividade e do lucro no menor tempo possível.

       Um dos maiores investidores financeiros do mundo, George Soros (que foi durante bom tempo o patrão do ex-Presidente do Banco Central do Brasil da horrível era FHC, Armínio Fraga) é mesmo franco ao reconhecer em seu livro A Crise do Capitalismo que a última coisa que alguém pode esperar do mercado é compaixão e solidariedade. Se alguém procura isso no mercado, vai simplesmente se afligir ao descobrir que errou de endereço. Ele é mesmo enfático ao afirmar que no mercado o único objetivo é acumular o máximo possível. Assim, o mercado é uma arena de todos contra todos, acirrando a competição a graus obsessivos e anormais. No decorrer de seu livro, Soros confirma que a crise do Capitalismo (atualmente em uma tentativa de ser encoberta por outros acontecimentos) decorre da visão econômica de mundo dominante que transforma tudo, até as coisas que subjetiva e historicamente sempre foram consideradas sagradas, em mercadorias ou pretextos para a obtenção de poder e de lucro, sem permitir qualquer possibilidade psicológica para a gratuidade.

       A ganância econômica possui um braço político cada vez mais visível, ainda que cada vez mais cínico, com irrefutáveis toques fundamentalistas quanto à Ética Protestante. A direita norte-americana de Bush é bom exemplo disto. Sua ideologia e planos de ação ficam extremamente visíveis no seguinte artigo do jornalista Argemiro Ferreira — correspondente internacional — publicado no jornal Tribuna da Imprensa, do Rio de Janeiro, em 25/03/2004:

DICK CHENEY E A NOVA ESTRATÉGIA DE DOMINAÇÃO MUNDIAL DOS EUA

       O último ataque do Vice-presidente Dick Cheney ao candidato John Kerry, da oposição democrata, é mais do que mero golpe eleitoreiro de alguém que fugiu do serviço militar na época do Vietnã (o próprio Cheney alegou ter outras prioridades) contra um herói militar legítimo — voluntário que lutou na Ásia, voltou com o peito cheio de medalhas e foi para a rua protestar contra a guerra que considerava um erro (John Kerry).

       Contra Kerry, acusado de fraco em defesa e segurança nacionais para enfrentar o terrorismo, o falcão ainda repete a mentira das armas [de destruição em massa] do Iraque e retoma o discurso de uma nova Guerra Fria. Já não invoca o fantasma do império do mal comunista. Na embalagem nova, amedronta a nação com outro mal — o terrorismo — para manter ou elevar o orçamento militar multibilionário e garantir a supremacia militar no mundo.

       As imagens das torres em chamas e do Pentágono atingido ajudaram a falsificar a [imagem] de George W. Bush, outro que teve proteção para fugir do serviço militar, como uma espécie de herói de guerra. Se ele continua a ser o terno vazio com o bolso recheado com milhões de dólares, como em 2000, Cheney é bem mais do que isso — é um dos formuladores do novo pensamento militar e estratégico de dominação mundial.

A Visão Estratégica dos Neocons

       A estratégia de segurança nacional do governo Bush já existia antes dos ataques de 11 de Setembro — antes mesmo de a direita republicana recrutar o atual Presidente — de recursos intelectuais limitados para o papel que desempenha agora. E Cheney, Secretário da Defesa no primeiro governo Bush [Pai] e um dos arquitetos da Guerra do Golfo de 1991, foi partidário da estratégia desde que ela começou a ser formulada.

       Enquanto alguns sonhavam com potenciais efeitos positivos do fim da Guerra Fria e da ameaça vermelha, que justificara os orçamentos da corrida armamentista que se seguira à II Guerra Mundial, o sonho do complexo militar-industrial era outro. Uma nova visão de política externa emergia no grupo de ideólogos neoconservadores (os neocons) que serviram ao primeiro Bush e voltaram com o segundo.

       Obviamente não estavam alheios a ela as poderosas corporações de petróleo com grandes interesses no Oriente Médio ou com seus próprios planos potenciais para essa região, da Chevron à Haliburton, passando pela Bechtel e outras, mais as beneficiárias de contratos bilionários do Pentágono. Não por acaso executivos delas passaram a integrar cargos críticos na atual equipe de segurança nacional.

Receita de uma Nova Guerra Fria

       A receita ideológica assumida pelo atual governo [Bush Filho], na política externa e na estratégia de segurança nacional, começou a nascer logo depois da Primeira Guerra do Golfo, no grupo neocon de que participavam Cheney e seu chefe de gabinete I. Lewis Libby, e onde se destacava o atual Secretário Adjunto da Defesa Paul Wolfowitz — número 3 do Pentágono ao tempo de Cheney, número 2 sob Donald Rumsfeld.

       Eles redigiram em 1991 o documento Defense Planning Guidance (DPG: Orientação de Política de Defesa), que expressa uma visão de dominação militar unilateral dos EUA. A visão foi reciclada e aprofundada pelos mesmos neocons em 1997, com seu Projeto do Novo Século Americano (PNAC), retomando expressão lançada ainda na década de 1940 pelo fundador da revista Time, Henry Luce.

       É sintomático que dois documentos do governo Bush produzidos como respostas ao desafio terrorista do 11 de Setembro, o secreto Rebuilding America's Defenses: Strategy, Forces and Resources for a New Century (RAD: Reconstruindo as Defesas da América) e o National Security Strategy (NSS: Estratégia de Segurança Nacional) oficializem o que, na verdade, já estava no DPG e no PNAC, anos antes do 11/9.

       Fica claro, assim, que os ataques ao World Trade Center e ao Pentágono foram usados como pretexto pelos neocons, no governo. Impingiu-se, com base neles, a receita ideológica de uma nova Guerra Fria, garantindo a dominação global americana. Diz o NSS, ao expor os novos desafios à segurança nacional, que o inimigo já não precisa, como no passado, de grandes exércitos e de capacidade industrial para por a América em perigo.

A Doutrina, Muito Antes do Pretexto

       Agora, segundo o NSS, grupos de indivíduos podem trazer caos e sofrimento ao nosso território a custo inferior ao de um único tanque. Nessa guerra assimétrica (nova expressão do Pentágono), os terroristas se organizam para dirigir contra nós o poder das tecnologias modernas. Mas, a estratégia já existia antes do 11/9. Não se tentou adotá-la antes porque os neocons saíram do governo com a derrota de Bush [Pai] em 1992.

       É compreensível a proliferação de teorias conspiratórias na Internet. Seria tão difícil arranjar pretexto para a nova doutrina como o foi para a Doutrina Truman em 1947, quando o governo, para convencer os americanos sobre a ameaça vermelha, teve de amedrontar o País — scare hell out of the American people — conforme a frase célebre, na época, do republicano Arthur Vandenberg, que deu apoio a Truman.

       Osama Bin Laden, enfim, realizou o sonho dos neocons. A imagem das torres em chamas é ameaça até mais concreta, para os americanos, do que a do Comunismo na Guerra Fria. Diante dela, a Pax Americana — com guerras sem fim (guerras perpétuas para paz perpétua, como disse Gore Vidal), ocupação militar, tropas espalhadas pelo mundo todo, garantindo os interesses econômicos — pode parecer menos criminosa.

argemiroFerreira@hotmail.com

       Ainda que tenhamos muito a lamentar quanto ao ocorrido no dia 11 de Setembro de 2001, devemos nos lembrar que nas torres do World Trade Center pereceram não apenas americanos cristãos, como também ateus, judeus, e mesmo árabes e ocidentais mulçumanos. Se houve fanatismo cego da parte dos perpetradores de tal crime hediondo, não menos fundamentalista foi o discurso e as ações das autoridades civis norte-americanas. A guerra contra o terrorismo no Afeganistão — onde certamente a maior parte da população não se vinculava à Al Quaeda de Osama Bin Laden, embora globalmente sofressem já há muito tempo nas mãos dos Talibãs (sem que, até esta data fatídica, o ocidente fizesse muito caso disso) — acabou por se apresentar como um show exagerado de demonstração de poderio bélico e da pujunça de quem detém o poder econômico (ironicamente, a família Bin Laden, riquíssima por suas empresas de Engenharia, possui ótimas relações com os Estados Unidos, inclusive com a família Bush). E pelo que notamos, os cabeças não pretendem parar sua luta contra o terrorismo por aqui.

       O Presidente norte-americano, George W. Bush — que, desde o início de sua questionável vitória na confusa última eleição americana, tinha um alto índice de (IM)popularidade e a (???) sorte de assumir o governo em um período de crescente recessão, mas com sólidos vínculos com as empresas petrolíferas norte-americanas — vomitou palavras de forte caráter fundamentalista após a triste terça-feira, 11 de setembro: A luta é do bem (América) contra o mal (terrorismo islâmico, ou, do jeito que a coisa vai indo, todo o Islã). Ou se é contra o terrorismo e a favor da América, ou se é contra os Estados Unidos e contra a América. O projeto de retaliação originalmente se chamaria Justiça Infinita, mas, diante de termos quase messiânicos e diante de pressões, foi mudado para Liberdade Duradora — mas, liberdade para quem? Para todos os povos do mundo? Geralmente, Bush ao fazer seus discursos sobre sua luta contra o terrorismo, sempre termina com a frase: Deus Salve a América. Bin Laden, por sua vez, usa praticamente os mesmos termos, dizendo que a guerra é entre o bem (o Islamismo tal como ele o entende) e o mal (a América). Ele também termina seus discursos dizendo: Graça e gratidão a Deus. Resta saber em nome de que deus ambos falam... Do deus dos exércitos, que prefere rios de sangue e de dor ao perdão e à compreensão? Não parece haver realmente diferença qualitativa de quem responde ao terror com terror...

       Como fala com muita lucidez Leonardo Boff: Bush interpretou a barbárie de 11 de setembro como guerra contra a humanidade, contra o bem e o mal, contra a democracia e a economia globalizada de mercado, que tantos benefícios (na pressuposição dele, chefe da nação mais poderosa e hegemônica) trouxeram para a humanidade. Quem for contra tal leitura, é inimigo, é o outro, é o diferente, é o estrangeiro que cabe combater e eliminar. Tal estratégia pode levar violência para dentro dos EUA e para todos os quadrantes do mundo. Há uma globalização do inimigo (antes, era a ex-União Soviética), que tem traços árabes, como já teve traços japoneses, vietnamitas, latinos da América-Central etc. É a violência total do sistema contra todos os seus críticos e opositores. Veja os textos de Leonardo Boff sobre os diversos fundamentalismos e os acontecimentos decorrentes do dia 11 de setembro em:

http://www.leonardoboff.com

       Leonardo Boff também observa a existência de um outro tipo de fundamentalismo — intelectual — que comparece no paradigma científico moderno: Ele está assentado sobre a violência contra a Natureza. Bem dizia Francis Bacon, pai da moderna metodologia científica: há de se torturar a Natureza, como o faz o inquisidor com seu inquirido, até que ela entregue todos os seus segredos. Impõe-se esse método violento, fundado no corte e na compartimentação da realidade una e diversa, como a única forma aceitável de acesso ao real. Desmoralizam-se outras formas de conhecimento que vão além ou ficam aquém dos caminhos da razão instrumental-analítico-mecanicista. Ocorre que o projeto da tecno-ciência gestou o princípio da auto-destruição da vida. A máquina de morte já construída pode pôr fim à biosfera e impossibilitar o projeto planetário humano. Na guerra bacteriológica, basta meio quilo de toxina do botulismo para matar um bilhão de pessoas. Existem atualmente, segundo fontes oficiais, cerca de trinta quilos de toxina do botulismo nos estoques de armas químicas nas chamadas grandes potências.[Eu, realmente, não acredito que tenham sido fabricados apenas trinta quilogramas dessa maldita toxina].

       As formas de recrutamento e de sedução destes grupos fundamentalistas (atualmente unindo religião e política) por meio de seitas são extraordinariamente simples e efetivas: diante das dificuldades do mundo atual (muitas delas criadas por grupos econômicos calvinistas), basta aceitar e aderir a alguma de suas Igrejas, professando a aceitação do Cristo segundo suas interpretações, integrando-se plenamente à comunidade dos fiés — e a pessoa se sente emocionalmente amparada e se sentindo parte de uma grande família, naquilo que é chamado de Conformismo pela Psicologia da Gestalt-Terapia, que também diz que ao lado desta vem quase sempre o mecanismo neurótico de defesa chamado de Confluência, ou seja, se me sinto inseguro ou emocionalmente fraco, procuro suprir isto com a opinião de uma congregação, que poderá me dar a impressão de suprir e dar forças. A opinião desta será então a minha opinião e assim me confundo com uma causa do grupo, podendo surgir daí o sectarismo e o fanatismo religioso. Também existe a questão do poder econômico da seita, já que o postulante terá de se esforçar para converter outras pessoas e pagar, com estas, a obrigação do dízimo. Desta forma, segundo a idéia deles, tem-se o céu garantido e a salvação da alma como uma certeza, já que apenas os escolhidos se dão conta do verdadeiro deus que, claro, é o deles. As demais pessoas estão perdidas, equivocadas ou condenadas, dependendo de como elas se posicionem ante eles — os eleitos — e cabem a estes fazer de tudo para expandir sua verdade e salvar a humanidade...

       Existem, pois, vários fundamentalismos atualmente, e todos têm em comum ser agressivos, rudes e parciais, competitivos e desumanos. No entanto, o fundamentalismo religioso é o mais falado.

       O mais recente fato , porém, que despertou a susceptibilidade intolerante e alienante dos radicais religiosos cristãos, foi o sucesso (e a consenqüente resistência) à obra literária e — mais ainda, por ser mais popular — ao filme Harry Potter, personagem criado pela escritora britânica J. K. Rowling. Não importa que estórias infantis dos Grimms, de Hans Christian Andersen, de Monteiro Lobato, de John Tolkien e tantos outros falem de magia, elfos, duendes, fadas e sacis-pererês. Na guerra das electronics churchs, para se ter domínio do universo intelectual de milhões, se uma obra acaba por se tranformar em um sucesso e, de alguma forma, faz as pessoas pensarem (e não foram poucos os que conseguiram perceber e pesquisar, a partir de livros como Harry Potter, que os chamados bruxos e bruxas — os originais, da Europa Pré-Cristã — não passavam de homens e mulheres que cultivavam uma religião apenas diferente da cristã e possuíam conhecimentos vastos em fitoterapia e medicina natural) [esta obra não serve e é censurada]. Vários livros de acadêmicos e de historiadores já falavam sobre isso, mas como eram lidos por poucos, as Pequenas Igrejas, Grandes Negócios e mega-instituições religiosas pouco lhes deram crédito. O horror da época da caça às bruxas, tanto por católicos quanto por protestantes, em especial contra as figuras femininas, podem ser melhor avaliados em aberrações históricas, como no caso da cidade de Trier, na Alemanha, que no século XV mandou para a fogueira, em uma só semana, 798 das 800 mulheres da Cidade! Salém, nos EUA, é também um outro caso famoso.

       Se levarmos em conta os números absurdos que apontam o sucesso da obra Harry Potter (mais de 130 milhões de exemplares vendidos, tendo sido o filme assistido por mais de 25 milhões de pessoas), começamos a enteder o incômodo e a movimentação destes setores conservadores. Ora, para muitas pequenas igrejas, grandes negócios e outras maiores, já multinacionais e mercantilizadoras do intelecto e da autocrítica de seus fiéis, isso é um aviso de que é necessário garantir a disputa do dízimo, ou melhor, da mente dos seus fiéis, impondo a sua verdade como se impõe a superioridade de um time de futebol: e nesse caso, quanto mais barulho, melhor. Também, é bom se salientar que boa parte da reação contrária ao imaginário mágico de Potter e de outras obras, advém da ética protestante puritana norte-americana, de base calvinista, com suas ramificações no Brasil e no mundo (a já citada Igreja Adventista, Testemunhas de Jeová, e outras de cunho milenarista/fundamentalista), e da ala católica mais tradicionalista e mais ligada ao Capitalismo, numa comprovação do que já dizia o sociólogo Max Weber no início do século XX em seu conhecido livro A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. Weber demonstrou como a ética ascética dos puritanos ajudou a construir o Sistema Capitalista. Em seu afã pelo trabalho para escapar das tentações mundanas, eles reinvestiam os lucros obtidos novamente no trabalho. Claro que chegou um tempo em que a máquina funcionava de tal forma que a motivação religiosa original foi quase esquecida. Porém, a própria máquina poderia ser utilizada no próprio âmbito religioso: quanto mais racionalizado e insípido o mundo — portanto, desencantado — mais fácil ater a atenção na produção e no controle ideológico de fiéis, conseqüentemente, maiores os lucros econômicos e políticos passíveis a serem obtidos, já que o trabalho e a adequação disciplinar aqui, neste mundo de pecados, preparam o fiel para o Reino de Deus — Reino este que mais lhes convêm interpretar. O sonhar e o imaginar devem ser sacrificados ao altar da submissão da autoridade do sujeito supostamente detentor de um conhecimento divino e mecânico sobre o mundo.

       Ainda, pior do que tudo, a luta por uma uniformização do pensamento espiritual de algumas seitas evangélicas, da TFP, dos Arautos de Deus e de parte da Renovação Carismática Católica passa ao largo (mesmo sabendo ou reconhecendo) dos estudos de Psicologia profunda e da Mitologia, em especial com Carl Gustav Jung, Mircea Eliade e Joseph Campbell, que demonstram a importância da fantasia, da imaginação mítica, para a maturação psíquica profunda do indivíduo, em particular nas imagens arquetípicas que possuem uma significação simbólica que desperta forças latentes do inconsciente e que são encontradas em todas as tradições do mundo, que incluem, sempre e invariavelmente, figuras como o Rei Sábio, a Grande Mãe, o Mago, a Bruxa, e, em especial, o Herói: aquela pessoa aparentemente simples é chamada para uma série de desafios, nos quais passa por provações de toda a sorte, morrendo e renascendo simbolicamente, mas sempre conquistando sua individuação e sabedoria própria para, enfim, ao regressar ao lar, repassar o que aprendeu. Este é o enredo, tanto das histórias dos tempos homéricos (A Odisséia), quanto dos tempos medievais (o ciclo de contos do Rei Arthur), quanto da modernidade (o maravilhoso O Senhor dos Anéis). Desprezar isso é querer reduzir o ser humano a uma máquina programada por um sistema (e o sistema evangélico norte-americano, com seus empresários tele-evangelistas e tele-radialistas, é bastante competente nisso, servindo de modelo aos imitadores do Brasil), onde não se tolera uma visão de mundo diferente daquela do sistema dominante. Não esquecendo que o Capitalismo teve, em suas origens, um grande incentivo dos puritanos protestantes, vemos que a alienada e violenta (portanto, bem pouco cristã) reação contra a literatura mítica e a filmes como Potter e o Senhor dos Anéis parece ser mais uma das facetas terríveis da Globalização Econômica, que exige uma forma de pensamento insípido. Caberia perguntar: o tal Anticristo que estes ilustres doutores tanto vêem fora, não estaria realmente, como mecanismo de projeção, em suas mentes sedentas de poder?

       Seria bom que se começasse a dar um crédito de confiança à capacidade das pessoas de pensarem por si próprias. Caso contrário, pulularão cada vez mais intermediários e intérpretes da VERDADE, ganhando bastante e fazendo muito barulho por nada. Espero que outros filmes, como O Senhor dos Anéis, e antigos seriados como A Feiticeira e Jeannie é um Gênio também possam escapar das garras da inquisição do século XXI.
 

SITES CONSULTADOS

http://www.terravista.pt/nazare/3175/photo.htm

http://www.mindspring.com/~emzeman/Disaster4.htm

 

DADOS SOBRE O AUTOR

Mestre em Educação, UFRJ, 1980. Doutor em Filosofia, UGF, 1988. Professor Adjunto IV (aposentado) do CEFET-RJ. Consultor em Administração Escolar. Presidente do Comitê Editorial da Revista Tecnologia & Cultura do CEFET-RJ. Professor de Metodologia da Ciência e da Pesquisa Científica e Coordenador Acadêmico do Instituto de Desenvolvimento Humano - IDHGE.

 

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 PAZ PROFUNDA