A CARPIDEIRA (ODE AO GÁS DE PUM) (Com medida nem sempre igual)
Rodolfo Domenico Pizzinga
Música
de fundo: Raindrops Keep Falling
A carpideira chegou E foi logo festejada. Chorou, chorou e chorou No velório da Tia Ada.
Tia Maria Ada era gorda, Mas, muito bem-humorada. Seu apelido era 'maria-gorda', Mas, era excelente advogada.
Enquanto estava acordada Não parava de comer. Coitada! Pobre Tia Ada! Mal podia se mexer!
Para andar, era amparada, Pois sozinha ela caía. Pelos pobres era amada, Qualquer que fosse a etnia.
Ada exercia o Direito Sem nenhuma covardia. O que não estivesse direito A boa Ada combatia.
Por causa da obesidade Teve um infarto fulminante. Mas deixou muita saudade Pelo seu jeito flamejante.
Certa vez, um estuprador Quase foi absolvido. Sem roupa e com ardor Fez com que fosse punido.
Houve um fuzuê no Forum. — Ela tirou a roupa! Quase não houve quorum. — Como pôde a garoupa?
'Maria-gorda' e 'garoupa' Eram seus dois apelidos. Pois a plebe não poupa Os da 'sorte' desvalidos.
Enfim, o seu dia chegou. No velório, muito choro. Barnabé se emocionou E quase perdeu o decoro.
Pode parecer incrível, Mas, a carpideira alugada – Biruta e muito sensível – Ficou toda urinada!
Mas, o pior não foi isso. Acabou sucedendo o incomum. Sem qualquer compromisso Tia Ada soltou um pum!
— Estamos todos perdidos! Estão bombardeando o cemitério! Entre choro e gemidos, Comentou o medroso Helleuthério.
— Bomba coisa nenhuma. Foi a Ada que peidou. Replicou Dona Criciúmma. — O fedor é que evaporou!
— Mas, será o Benedito! Comentou 'Seu' Barnabé. — Que fato mais inaudito. Valha-me meu São Tomé!
A coisa não parou aí. Foi um pum atrás do outro! — Mas ela só comia açaí! — Comentou o grego Papadoutro.
Pela baixa madrugada, Nas ventas da carpideira Sete puns deu Tia Ada. Quem mandou ficar na beira?
Com a metralhadora ligada, Não parava de peidar. Dona Aurora, embasbacada, Resolveu se aliviar.
E o velório virou uma orquestra. Todo mundo pôs-se a peidar. Ora, se peidava a boa mestra, A farra era peidorrar sem parar.
Nas capelas adjacentes Foi um tumulto federal. Os que estavam presentes Foram ver o carnaval.
É que o velório da Ada Virou uma pândega geral. E a obesa malsorteada Peidava sem suplicar aval.
No final, o cemitério inteiro Fez um lindo poema sinfônico. Só mesmo o povo brasileiro Pra ser tão estereofônico.
Puns de todas as qualidades, Tons, odores, tessituras. Em todos trouxe saudades Dos tempos de travessuras.
Fininhos ou ribombantes, Inodoros ou mal cheirosos, Silenciosos ou tonitruantes, Ouvir... Como eram gostosos!
Barnabé não se avexou. Deu um pum tão barulhento Que quase o esquife derrubou. Aquele peido, sim. Foi um portento!
Papadoutro, encabuladíssimo, Deu um pequeno punzito. Ficou logo vermelhíssimo Com sua ventosidade-apito.
Em silêncio, no ataúde, Tia Ada parecia aprovar As demonstrações de saúde, E todo aquele matraquear!
Já na alta madrugada, Começou a chover e trovejar. Mas, em seu ataúde, Ada Não parava de peidar!
E seus parentes e amigos Cantavam com muita alegria. Peidavam até pelos umbigos. Uma alucinação parecia!
A peidaria era infernal, Mas, de certa forma perigosa. Pois, lá fora o temporal Rugia de forma tormentosa!
Eram tantos peidos e trovões Sacanocraticamente juntos! Como foi possível tais canhões Não incomodarem os defuntos?
Os defuntos não ouviam, Mas os fantasmas voavam. Vinham, olhavam e iam, Mas não ameaçavam!
Quando acabou a cerimônia Foram todos para casa. Depois, confessou Dona Antonia: — Fiquei com o rabo em brasa!
MORAL DO CONTO-ODE
Peido eu, peida a Rainha. Peidam todos pelas ruas. Peido é uma besteirinha, Pior são as falcatruas.
Peidam o Papa e o Presidente, E o rico peida também. Pobre, se peida, nem sente. Pode não peidar alguém?
Tossir, coçar e espirrar São atos considerados normais. Por que arrotar e peidar São tachados de anormais?
Ainda que não seja comum, Os mortos dão seus peidinhos. Mas, pior do que qualquer pum São os nossos desalinhos!
Peidar é um ato fisiológico, Como suar, cagar e mijar. O que é totalmente ilógico É estuprar, roubar e matar!!!
Puns, muçulmanos e negros, Excepcionais, pobres e mal feitos, Nordestinos, sem-terra e labregos São vítimas de preconceitos.
Prostitutas e homossexuais Também são discriminados. Mas, somos in potentia iguais; Diferimos por nossos passados.
Finalmente, devo ponderar: Não se pode peidar a esmo. É preciso respeitar Os outros e a si mesmo!!!?
Mas, um pum eventual Não pode ser condenado. Isso é muito natural. Afinal, o que há de errado?
Agora, homem que peida muito, Precisa tomar muito cuidado. Um simples peido fortuito Pode deixar o infeliz todo cagado!!!
PRESENTE DO VERBO PEIDAR
Eu peido Tu peidas Ele peida Nós peidamos Vós peidais* Eles peidam
COMPARE...
|