Tudo é uma Coisa-só e um só Segredo. [Unimultiplicidade.] O bem e o mal imorredouros não existem. É preciso que, incessantemente, se excedam a si mesmos. E o que deve ser criador, tanto no bem quanto no mal, deve começar por ser destruidor, quebrar os velhos valores [e derrubar a tradição retrógrada, reacionária e acachapante do seu trono de papel-carbono]. Assim, a maior malignidade forma parte da maior Benignidade; mas, esta Benignidade é sempre criadora. Tudo o que for ultrapassado e puder ser aniquilado pela Verdade deverá, sem demora, ser aniquilado! Sempre houve, há e eternamente haverá muitas Casas a edificar! [A edificação é interminável!] [In: Assim Falou Zaratustra: um Livro para Todos e para Ninguém (em alemão: Also Sprach Zarathustra: Ein Buch für Alle und Keinen), escrito entre 1883 e 1885 pelo filósofo, filólogo, crítico cultural, poeta e compositor prussiano do século XIX Friedrich Wilhelm Nietzsche.]

 

 

 

 

Estava a velha a se balançar...
Veio a mosca azoinar...
A mosca azoinando...
E a velha balançando...
Tudo é uma Coisa-só.
Tudo é um só Segredo.

Estava a mosca a azoinar...
Veio a aranha querer jantar...
A aranha com fome...
A mosca azoinando...
E a velha balançando...
Tudo é uma Coisa-só.
Tudo é um só Segredo.

Estava a aranha morta de fome...
Veio o rato-calunga chiar...
O rato chiando...
A aranha faminta...
E a velha balançando...
Tudo é uma Coisa-só.
Tudo é um só Segredo.

Estava o rato-calunga a chiar.
Veio o gato-de-botas miar...
O gato miando...
O rato chiando...
E a velha balançando...
Tudo é uma Coisa-só.
Tudo é um só Segredo.

Estava o gato-de-botas a miar...
Veio o cachorro ganizar...
O gato miando...
O cachorro ganizando...
E a velha balançando...
Tudo é uma Coisa-só.
Tudo é um só Segredo.

Estava o cachorro a ganizar...
Veio o cacete madeirizar...
O cachorro ganizando...
O cacete madeirizando...
E a velha balançando...
Tudo é uma Coisa-só.
Tudo é um só Segredo.

Estava o cacete a madeirizar...
Veio o fogo incendiar...
O cacete madeirizando...
O fogo incendiando...
E a velha balançando...
Tudo é uma Coisa-só.
Tudo é um só Segredo.

Estava o fogo incendiar...
Veio a água apagar...
O fogo incendiando...
A água apagando...
E a velha balançando...
Tudo é uma Coisa-só.
Tudo é um só Segredo.

Estava a água apagar...
Veio o homem para mudançar...
A água apagando...
O homem mudançando...
E a velha balançando...
Tudo é uma Coisa-só.
Tudo é um só Segredo.

Estava o homem a mudançar...
Veio o seu Deus Illuminar...
O homem se Illuminando...
E em se transmutando...
Mas, a velha... Sempre a se balançar...
Tudo é uma Coisa-só.
Tudo é um só Segredo.
Coisa-só... Segredo... Unimultiplicidade...
Ilimitada Unicidade... Sem estagnação.
Como muito bem disse Nietzsche:
Sempre houve, há e eternamente haverá muitas Casas a edificar!

 

 

Sempre houve, há e eternamente haverá muitas Casas a edificar!